Sobre doação de órgãos
Achei este texto útil, resolvi compartilhar
Existe muita morte besta no mundo. Mas morrer por falta de empatia para mim de todas é a pior. Tem gente que atravessa a rua e morre, pega um resfriado e morre, engasga e morre. Tudo morte besta. Mas morrer porque alguém disse “não” é a mais besta de todas.
A Tati morreu depois de esperar por dois anos um coração que não chegou. Meus olhos doem de tanto que já chorei. Ela era minha amiga e todas as vezes que ela internava (sei bem o que é isso) eu passava no quarto dela para visitar. Ela ia para Olimpíadas comigo, já era coisa certa. Só estávamos esperando o coração chegar.
A caminho do velório dela hoje me veio algo na cabeça:
“Deus nos dá dois presentes ao nascer:
Um deles é a vida. Esse ele nos dá para gente mostrar nossa CORAGEM. Porque viver pede muita coragem! Pede ousadia, pede que a gente se entregue de corpo e alma!
O segundo é o dom de dar a vida. Esse ele nos dá para gente demonstrar a nossa GRATIDÃO. Porque sabendo valorizar o primeiro presente queremos que outros também possam viver e sentir essa alegria.
A vida começa com coragem e termina com gratidão”
A Tati esperou dois anos e nesses dois anos (eu tive o cuidado de ir buscar os números exatos oficiais) 5493 famílias disseram “não” para doação de órgãos. Nesses mesmos dois anos 218 pessoas morreram esperando um coração. A distância entre os 5493 e o 218 é tão grande que nem precisamos que todos doassem para ninguém morrer na espera. Ela morreu de morte besta.
Olhando sua mãe, seu pai e seus familiares eu tinha apenas a certeza que eles não precisavam estar chorando, que suas amigas não precisavam estar vestindo preto. Ninguém precisava estar ali, nem eu. Ver o velório dela tão jovem, me fez imaginar como teria sido o meu velório se o coração não tivesse chegado. Tinha tantas, mas tantas flores lá que nem dava para ver a parede. Ela era muito querida. Imaginei que seria muito provavelmente algo bem parecido.
Mas não foi. Minha mãe chorou muito mas de alegria quando o coração chegou. Meu pai filmou quando eu fiz discurso na Uti agradecendo todo mundo. Meu irmão foi o primeiro a me ver acordar da cirurgia. E meu amor não me perdeu e vivemos cada dia dessa vida linda e maravilhosa que pulsa dentro de mim. E devia estar pulsando dentro dela.
Tem gente que não aceitou morte besta e foi estudar e assim criaram vacinas, tratamentos, cirurgias. Ninguém tem que morrer de morte besta.
Eu também não aceito sua partida minha amiga. E me despedir de você só me dá mais forças para lutar para que ninguém morra por falta de empatia, por um “não”, por falta de informação.
Eu sempre tive medo de virar uma estatística. Um dígito a mais na planilha de “pessoas que morreram na espera”. Ano que vem quando saírem os dados de 2019 eu não verei um número “x”, mas um “x - 1 + Tatiane Penha Losa”. Cada número tem um nome, uma família, uma história. Você não vai ser um número amiga. Você será lembrada. Te prometo! Luta comigo lá de cima para mudarmos tudo isso.
E para todos que leram esse texto levem para sempre em suas vidas:
A VIDA COMEÇA COM CORAGEM E TERMINA COM GRATIDÃO
APROVEITE A VIDA E DEPOIS DOE A VIDA.
Patricia Fonseca