Nem peixe, nem golfinho
Vinícius, aos cinco anos, encantado com as lendas do Saci Pererê, Curupira, Boitatá:
- "Boto é um golfinho cor de rosa, vovó".
- "Não, meu amor, boto é um peixe grande de rio".
Ana, a irmã mais velha correu pra ajudar:
- "Boto é um boto. Não é peixe, nem golfinho. Ele sai da água, vira um homem bonito que seduz e engravida as mulheres, depois vai comprar cigarro e nunca mais volta, igual os pais de cinquenta por cento dos meus colegas de classe".
Assim, a historinha que deveria ser engraçada acabou gerando uma reflexão séria. O valor da presença do pai pode estar sendo subestimado com o impulso crescente da busca da mulher pela autossuficiência? Ou os homens estariam se esquivando da responsabilidade sobre a prole? O que há de tão oneroso em dedicar tempo aos filhos? Ou acredita-se que o cumprimento da Lei sobre o pagamento de pensão seja suficiente? Os efeitos profundos e, muitas vezes, duradouros, não nos dizem o contrário?
"...Perda de autoestima; dificuldade de construir vínculos; dificuldade de estabelecer confiança ; de reconhecer limites e aprender regras de convivência social; insegurança; agressividade e rebeldia, medo excessivo, revolta. Dificuldade de concentração, baixo rendimento escolar..." (E.B.P. Benczik - doutora em psicologia escolar e do desenvolvimento humano pelo Instituto de Psicologia da USP).
Chama atenção o fato de que Ana poderia ter dito a mesma coisa com alguma simpatia, mas não. Seca, árida, até um pouco sarcástica, demonstrou indignação e repulsa com a situação considerada 'normal'.
..Na idade dela, meu único problema era descobrir quem arrancou a cabeça da minha Barbie... e você, o que pensa?