Relato de minhas memórias

RELATOS DE MINHAS MEMÓRIAS

Eu, Maria de Lourdes Dias da Silva Tajra, nascida no dia 23 de janeiro de 1950, filha de Antônio Alves da Silva e Almira Dias da Silva. Nascida de origem de pais agricultores humildes. Somos filhos de uma família com 15 irmãos. Quando meu pai se casou com minha mãe, ele era viúvo e já tinha nossa irmã mais velha, (filha da sua primeira esposa) Maria Celeste da Silva já tinha (1,6) um ano e seis meses de idade. Minha mãe a criou juntamente conosco, filhos de sangue de coração, todos numa união muito bonita. São meus irmãos mais velhos: Maria Celeste da Silva Lima, Manuel de Araújo Silva, Santina Alves de Medeiros, Geraldina Silva de Góes, Almira Silva Dantas, Irene Silva de Góes, Maria Beatriz da Silva Meira, Teresa Silva Dantas, Geraldo Alves da Silva, Maria Silva de Barros, Maria do Céu Silva Martins, Antônio Alves da Silva Filho, João Batista da Silva, Maria José da Silva, Maria de Lourdes Dias da Silva Tajra. (João e Judite morreram pequenos.)

Falar um pouco da minha infância é muito bom, muito gostoso e tempo de muitas saudades. Meu pai foi um homem de caráter, digno, cumprindo todas as missões do que é ser pai, esposo e além de tudo mais amigo. Ele nos criou dentro de disciplina, dentro de um contexto em que a união faz a força porque um pai com 15 filhos, onze mulheres e quatro homens, criar no cabo da enxada, no trabalho braçal e dar o sustento para família e dar acima de tudo o amor, a união e o caráter, é muito bonito. Isso foi o que meu pai e minha mãe Almira Dias, uma doméstica exemplar do lar, que se juntou a meu pai para construir essa família linda que eu tenho muito orgulho de fazer parte dela. Sabemos que as dificuldades foram enormes, imensas, mas diante das adversidades da vida eles souberam vencer, lutar e criar essa família tão numerosa. Minha mãe era a filha mais velha da união de Justino Dias de Araújo e Santina Fausta de Araújo. Meu pai a conheceu e logo em seguida se enamoraram, se casaram e com pouco tempo meu pai assumiu toda a responsabilidade e assim surgiu no meu avô a vontade de desbravar o mundo lá fora e mudou-se com toda a família para São Paulo. Ficaram aqui: meu pai, e minha mãe já com Celeste e depois com Neneco, Santina, Almira, Geraldina, Beatriz e Teresa meu pai achou que ia também ter um sonho de ir lá fora buscar melhoras, se estabelecer lá em São Paulo. Meu avô Justino Dias foi a primeira vez deixando minha avó Santina Fausta aqui. Meu pai Antônio Alves, quase que era rimo de família, como se diz assim, foi quem assumiu minha avó Santina Fausta. Então com as saudades e as dificuldades encontradas lá em São Paulo, ele retornou pela primeira vez. Depois, na segunda vez meu pai voltou novamente, e não se adaptou bem devido ao clima e outras dificuldades. Voltou para o seu torrão Barros Brancos, lá no nosso município de Jardim do Seridó, onde ficou e conseguiu levar a frente a união e o trabalho que ele tanto desejava para criar seus filhos. Ele lutou muito e teve ajuda por exemplo de minhas tias, Teresa Silva de Medeiros e Ana Silva. Tia Teresa, trouxe alguns dos meus irmãos para morar na cidade, vinha um de cada vez. Primeiro ela trouxe o filho (Neneco) mais velho homem porque sabia que necessitava que o futuro era ter um filho, uma pessoa que realmente desse um respaldo pra papai na sua velhice. Então ela tirou primeiro meu irmão Neneco para estudar fora. Ele estudou em Natal e depois em Maceió porque aqui em Natal ainda não tinha o curso de Direito que ele fazia e com todas as dificuldades ele realmente saiu um vencedor

Falar de meu irmão Neneco, dispensa qualquer comentário, mas vou relatar aqui alguma coisa que eu lembro do meu tempo de infância junto a ele. Sempre foi aquele menino íntegro e exemplar que galgava conseguir o que estava escrito já por Deus, o que viria para ele para nos fortalecer e que realmente ele sempre aquela criança, aquele rapazinho já adulto sempre foi muito esforçado. Lutou, fez os estudos dele, começou em sua residência a ser alfabetizado pela sua mãe Almira Dias nas suas primeiras caligrafias. Depois, continuou estudando numa escola na Viração sendo sua educadora a professora Altiva até a terceira série. Depois vem para Jardim estudar na casa da minha tia Tereza e depois Caicó. Lá ele prestou o vestibular e foi aprovado. Estudava e ia fazer as provas em Maceió. Aqui em Natal, quando os primos se aproximavam de férias, todos eles muito empolgados para irem veranear em praias, ele voltava a sua origem seu torrão lá no nosso sítio, chegava e ia ajudar meu pai. Quantas vezes ele me disse que ia vender melancia na feira. Botava a carga em Moreno (o jumentinho) com os urus e levava as melancias para vender lá fora. Sempre aquele menino dedicado e pensando no futuro que viria pela frente. Quando eu era criança, uma das coisas que eu mais esperava era a semana santa, que realmente Neneco sempre vinha e trazia muitas coisas. Era quando a gente via mais fartura na mesa, com bacalhau, biscoito recheado etc. Trazia aquela cestinha de biscoito, que na época tinha. Inclusive ele levava uma para mamãe e sempre levava uma para mim. Uma pequenininha, não sei se vocês lembram como era a cestinha. Era uma latinha com um aro e quando ele chegava para me entregar dizia: “Essa é para Marilu!” Porque a latinha tinha o biscoito que tinha a marca Marilu. Então ele sempre era muito esperado com muita alegria nesse período de férias que ele vinha passar e conviver com a gente e quantas vezes ele saía exatamente para ajudar papai. Nunca mediu esforço para estar presente na nossa vida. Realmente ele era uma pessoa que merecia vencer, ter um futuro pela frente, mas até então ainda não tinha alcançado. Lembro também, que ainda hoje ele é lembrado pela música Índia. Realmente ultimamente era o que ele mais cantava. Era uma coisa muito linda, que inclusive ele ensinava a música que ele sempre cantou para sua esposa Janice. Também lembro que quando ele chegava lá em casa, armava uma rede na sala grande da casa e ele sempre cantava outras músicas. “Mais uma luz se apaga, mais um sonho que chega ao fim “Lembro muito ele cantando essa música, como também “Por que não paras relógio” Não gosto nem de lembrar. Ele foi uma pessoa especial nas nossas vidas que veio como o nosso segundo pai. Ele conseguiu e venceu com os méritos dele mesmo, de chegar aonde ele chegou. Eu posso escrever aqui todos as atividades que ele exerceu, mas ele galgou muitas coisas a passos lentos e chegou até onde chegou porque Deus o conduziu até o final da sua vida. Um homem cristão, de uma fé muito grande e que hoje eu sei que lá no reino do céu ele ainda continua a nos iluminar. Esteja onde ele estiver, ele é muito amado. Eu louvo a Deus todas as noites em minhas orações, porque realmente ele merece um lugar no reino da Glória. Ele sempre será lembrado como uma pessoa que realmente só quis o bem das pessoas, lutou e ajudou a muitas pessoas da família e que só fez o bem.

Daí se estender pelas minhas lembranças de criança, eu vou relatar algumas passagens que realmente eu convivi. “Da alegria de criança, o meu tempo de criança” Lembro de quando, eu muito pequenininha, a minha vó faleceu em 1953. Ela terminou os seus últimos dias morando com nossa família no sítio Barros Brancos. Ela tinha um carinho muito grande por nós. Inclusive quando eu e Maria José saíamos de casa para procurar favelas ela ficava a nos chamar “Cadê minhas menininhas dos vestidinhos vermelhinhos, levaram minhas menininhas” e no dia do seu falecimento, eu me lembro plenamente. Foi um dia que eu ainda era muito criança e não entendia o que estava acontecendo, (do fato real), que era a despedida dela. Mas lembro do translado do corpo dela que foi levado num caminhão para ser sepultado na cidade.

Ainda muito pequenininha, mais lembranças, como sempre. Meu pai, aquele homem que lutou, que batalhou sempre, aos sábados ele ia para a feira de Jardim do Seridó e quando era de tardezinha eu lembro que eu e Maria José tomávamos banho e mamãe dava banho na gente e depois saíamos, muitas vezes para brincar numa faveleira, derrubada a beira da estrada, enquanto ficava esperando papai. Nessa faveleira, ficávamos brincando, fazendo que era um caminhão, um zum, zum, zum a balançar. Quando papai surgia lá na estrada, a gente sentia muita alegria ao vê-lo chegar, porque realmente era finzinho de tarde e a gente já sabia que o papai trazia além dos sustentos dos alimentos da nossa família, trazia aquele amor, aquele regresso de paz. O que ele mais desejava era a felicidade e a paz com a família. Chegava, tirava os urus com as coisas. Ele vinha em Maravilha, tangendo Moreno na frente com a feira. Muitas vezes ele trazia umas balinhas de hortelã e dava para mim, Maria José e João. Mas sempre naquele perfil do homem sério que vive para sua família, labutando e só para querer dar o melhor para a gente. Depois eu lembro também eu era muito pequena, Geraldo já era rapaz e Almira, (que é minha madrinha e minha irmã), ela tinha muito apego comigo. Era quem cuidava de mim e que cuidava exatamente dos meus cabelos loirinhos e muito grandes. Madrinha sempre cuidou muito bem de mim e Geraldo também, Ele era muito apegado comigo como eu também era apegada a ele, seguindo os passinhos dele. Ele ia também para a rua no sábado. Quando ele voltava, lembro como hoje, no domingo de manhã eu já estava muito de prontidão a esperar, porque toda vez ele trazia chocolate, aquele chocolate Torrone e confeitos para mim. Estava até um pouquinho enciumada porque ele sempre teve essa preferência assim por mim.

Certa vez, ele e Almira sempre compravam um óleo para meu cabelo, e ele comprou um óleo de nome Glostora e madrinha sem comentar com ele, nem com ninguém, ela aparou meu cabelo. Quando Geraldo viu, foi uma teima daquelas. Se chatearam muito e ele disse simplesmente: que daqui para frente, pode cortar o cabelo de cuia que eu não ligo mais, eu não trago mais óleo” depois foi contornada a situação e voltou a da mesma alegria.

Realmente a nossa infância foi marcada por muitas coisas lindas, brincadeiras que na época a gente não dispunha de subsídios para que realmente pudesse comprar. Os nossos brinquedos eram confeccionados em casa mesmo. Era brincar de curralzinho de gado de osso, com as bonecas de sabugo. A gente ia para o barreiro velho e quando o milho estava exatamente já começando ver as bonecas dos cabelinhos, a gente quebrava e papai sempre reclamava porque prejudicava o milho no futuro. Também as galinhas de Pereiro que a gente tirava e brincava com elas, com aquilo tudo junto a vizinhança, como meus primos e sobrinhos.

Quando eu nasci, minha irmã Santina já era casada e eu dizia inclusive, que ela não era minha irmã, porque eu não a conhecia dentro de casa. Por sinal eu tenho sobrinhos mais velhos do que eu. Ela morava no sítio distante e sempre vinha a família. Toda vida ela foi muito amorosa, sempre vinha passar uma data especial conosco e quando ela vinha, eu sempre tinha assim aquele negócio, não é minha irmã, mas ela sempre teve muito carinho por mim. Certa vez ela costurou um vestido para sua filha Neide, um vestido de bolinhas e trouxe também um para mim. Quando me arrumaram, Neide começou a chorar dizendo que eu estava com o vestido dela, foi muito difícil ela convencer. Daí botou o vestido de Neide para que realmente ela visse que não era o vestido dela. Isso sempre nós convivemos nessa situação.

Geraldina casou-se também e realmente eu era muito pequena nesse período. Ela foi morar distante e madrinha Almira ficou. Foi quando comecei minhas primeiras letras, aprender exatamente na escola em nossa casa. A gente elaborava brincadeiras e daí tornou-se realmente uma família. Quando Almira (minha madrinha) começou a namorar com Pedro, ele vinha sempre aos domingos lá para casa e não tinha outra, eu tinha um ciúme de madrinha. As cadeiras eram colocadas para o casal e eu me sentava do lado de madrinha. Meu Deus do céu! Quando Pedro ficava lá em casa eu estava lá, do lado deles. O tempo foi passando, teve o casamento de Irene e Almira, no mesmo dia. Foi lá no sítio mesmo, a festa foi muito bonita. O casamento foi feito pelo meu padrinho padre Aluízio Rocha Barreto e foi só felicidade nesse período.

Nossas brincadeiras sempre continuaram. Quando o barreiro velho estava cheio de fruta a gente ia para beira do rio para ver as enchentes, ver a chegada da água que começava pouquinha e ia aumentando de volume. Papai ficava com a gente lá sempre desfrutando daquelas maravilhas junto com todos os nossos irmãos. Também lembro que nós saíamos para procurar gravetos, tinha uma disputa entre mim, Maria José e João para ver que fazia o maior molho de gravetos. Todo mundo sabe o que é graveto, exatamente eram aqueles Marmeleiros sequinhos para a gente acender o fogo. Papai tinha exatamente uma queijeira e também um fogão de lenha e o forno de fazer os queijos e bolos. Quando a gente precisava exatamente acender e quando ia torrar o café no caco, quantas vezes mamãe ficava lá naquele fumaceiro e tudo isso foi vivenciado pela gente, mas realmente todas as dificuldades foram seguindo, mas a gente foi labutando, depois quebrando e foi vencendo essas dificuldades. Vivenciamos muitas coisas que nos fizeram felizes no tempo de criança: Brincar de correr, subir em porteira, ficar em cima das babujes, se esconder nos de fedegosos. Quando chovia, as vezes íamos buscar raízes e se estávamos gripados, mamãe fazia leite com mastruz, de capitãozinho e outras coisas do interior. Isso eram as ervas medicinais pra gente. Isso era notório.

Quando eu já estava mais crescidinha, tinha umas Caieiras que ficavam muito grandes e na época de chuva enchiam d’agua. Quando tiravam o barro para fazer tijolos os quais eram arrumados nessas caieiras para queimá-los. Botavam lenha naquela boca de forno e o fogo passava a noite todinha queimando. As vezes vinha cantador e vinha muita gente que ficava ao redor da caieira. Mas o que eu quero dizer é o seguinte. O perigo sempre existia, quando tiravam o barro, ficavam aqueles buracos enormes e era caminho que dividia os sítios de papai e tio Luiz de França. Mamãe tinha muito medo desses buracos porque tinham umas hortas muito bonitas que ela fazia, e o caminho para o sítio do meu tio Luiz era do lado desses buracões, dessas cacimbas.

Quando chovia no sítio do meu tio Luiz de França tinha um pé de Umbuzeiro de umbus muito grandes. Lá a gente corria, quando chegava a chuva os umbus caíam e pareciam laranjas, tudo no chão e a gente pegava e quando voltávamos sabíamos que íamos levar um carão de mamãe porque ela não queria que a gente fosse para as bandas da caieira. Mas eu me lembro que a gente tanto tirava umbus como também umas frutinhas das carnaubeiras que caíam. Eu colocava até na barra do vestido.

Muitas outras lembranças trago hoje junto comigo e não esqueço dos meus tempos de criança convivendo com meus irmãos lá no nosso sítio, nas nossas brincadeiras de crianças. “criança feliz, feliz a cantar” “Eu quero contar do fundo do meu coração, as boas lembranças, muitas saudades eu vou lhe contar” Até hoje ainda me vem a saudade, sinceramente eu sinto saudade sim, do meu tempo de criança da nossa família. Uma das coisas que eu achava mais linda e que marcou muito a minha infância, era um terço que se rezava em família. Papai reunia todos os filhos, numa sala em frente à imagem do coração de jesus e se rezava o terço que Almira minha irmã tirava. Nos intervalos dos mistérios papai e ela cantavam “perdão meu jesus, perdão Deus de amor” Era uma coisa linda, eu que era pequena ainda, bem pequena, muitas vezes com preguiça, fingindo que estava com sono, saia da sala e ia para a minha rede. Papai ia me buscar e me pegava, botava na perna dele e eu ficava assistindo o texto até o final. Era uma coisa que sinceramente eu acho que isso me fazia feliz. Quando terminava, todo mundo dizia, bença papai, bença mamãe e todo mundo já procurava o seu cantinho, sua redinha para dormir e amanhecer o dia na paz, na felicidade. Isso é uma coisa que até hoje eu lembro desse terço lindo.

Continuando falando das minhas peraltices de criança e lembranças boas que eu tenho com meus irmãos, pode ser que algum fato relatado depois venha antes, mas isso não vai alterar as lembranças, os momentos que passamos. Quando era pequena. realmente a gente vivenciava muita coisa linda, muita coisa boa. De acordar cedinho, tinha dia que tinha matança de carneiro, papai dependurava o carneiro lá na frente da casa, tirava o couro e espichava-o. Mamãe fazia aquelas paneladas, aquelas coisas todas. Era uma alegria porque a gente sabia que ia ter melhorias nas comidas, mas ao mesmo tempo vinha o sentimento porque o animal estava perdendo a vida, mas isso era normal. Também tinha matança de porcos. No dia de matar um porco, João de Verônica vinha logo cedinho e a gente acordava com aqueles movimentos pois naquela época era tudo muito artesanal muito fraca, a morte do animal não era de tiro, era de muito sofrimento e papai não deixava de jeito nenhum ninguém se aproximar, mas a gente escutava. Depois se fazia o chouriço, muito bom por sinal, muita banha com muitas especiarias e botava nas latinhas e durava muito tempo para a gente comer com farinha. Era muito bom e muito gostoso.

Na semana santa era uma coisa que realmente era sagrado. Lembranças bem ativas na minha memória era tempo de umbu para fazer umbuzada e fazer coalhada. Quando chegava à noite, mamãe colocava os pratos sobre a mesa, tinha uma bacia com a coalhada e papai pegava uma rapadura bem grande, raspava-a bem fininho, “vaco, vaco, vaco, vaco “e botava por cima das coalhadas nos pratos cada um de nós.

Lembranças são lembranças! Me lembro também, a minha primeira vez que apanhei. Mamãe e papai nunca bateram nos filhos, mas foi uma única vez, não sei quantos anos eu tinha. Lá em casa tinha o terreiro bem grande e mamãe estava bem ocupada e me pediu para eu botar milho para as galinhas e eu não gostava de chamar galinhas. Olhei para ela e disse “vou não” Não vai o que muleca. E não deu outra, ela deu uma chinelada na minha bunda. No final coloquei o milho das galinhas.

Lá na nossa casa, tanto na frente como atrás, tinha uns pés de algaroba que foi João Batista quem os plantou. As irmãs tinham: laranjeira, espirradeira, bugaris, tupi etc. Mas João plantou os pés de algaroba, tanto na frente de casa e também lá atrás. O pé de trás era atrás de um banheiro e ele cresceu e teve uma galha que quis cair e ficou torta. Eu fui me sentar nessa galha, chorando porque tinha levado a chinelada, apesar de mamãe não ter batido com força.

Todas as manhãs, por volta das 9 horas, a gente já começava a se preparar para ir para assistir aula no salão vizinho a nossa casa que minha irmã Almira era quem ensinava. Teve um dia que eu estava chateada por causa de umas sandálias que eu não gostava de usar, feitas de pneu de carro e que que amarravam atrás, era uma coisa grosseira. Para as outras irmãs eram umas chinelinhas de sola, feita lá por Isac, e não eram mais amarradas para trás, eram bem arrumadinhas. Eu estava com muita raiva porque eu não queria essa sandália, eu queria uma sandália daquelas que as meninas usavam, mas assim mesmo fui para escola. Chegando lá tudo desparecia quando a gente encontrava aquela meninada. Na hora do recreio brincávamos de anel, recitar poesia e tudo era brincadeira. Tinha uns passeios escolares que madrinha fazia, mas ela não me levava porque eu era muito pequena. Tínhamos fardamento, todos bem arrumadinhos, mas as sandálias dos pés eu não gostava não.

Um dia, eu me lembro, que mamãe tinha uma tia legítima dela que morava lá no Riachão e estava doente. E mamãe tirou um dia de domingo para ir visitá-la comigo e Maria José. Ela queria nos levar para nos mostrar a tia e nós fomos de farda da escola. Descemos de rio abaixo, eu, mamãe e Maria José. Eu tossia tanto que sujava a farda toda. Mas mamãe ia limpando aquele negócio, e o tempo foi passando. Chegando lá na casa da minha tia, tudo agoniado com sol muito quente, aí ficamos lá o resto do dia. Quando foi de tarde, eu piorei da gripe devido ao sol que foi quente demais. Essa gripe virou uma coqueluche. No outro dia, Maria começou a me ajudar, cuidar de mim, fazer chá do mastruz com leite. Ela dormia comigo lá no quarto de vovó e me levantou muitas vezes de noite tossindo muito que ela me sacudia pra cima para eu não me sufocar.

Eu me lembro das noites nas calçadas, quando debulhávamos feijão, cantávamos, olhávamos para as casas de tio Nozinho, Luiz de Zumba, Oscar, tio Luiz, Severino. Era muito gostoso, papai sempre reunia a gente de noite nas calçadas e quando era noite de lua, vinham aqueles vizinhos mais próximos e brincávamos de roda, peteca, de anel, de tudo. Uma das passagens que eu lembro também, esperava muito por esses tempos, eram as vindas de minhas irmãs casadas que geralmente, algumas delas vinham passar o São João com a gente. Ah era muito bom, uma noite de São João com muita fartura, com muita comida de milho, de bolo preto. Era uma semana muito esperada, minhas irmãs faziam muitas adivinhações, das bananeiras, da água na bacia. Papai botava o milho para assar na fogueira, botava para assar debaixo da terra. Os momentos mais esperados eram os da semana Santa quando Neneco chegava e também a semana do São João porque minhas irmãs casadas e os sobrinhos chegavam aumentando a família. Certa vez papai foi abanar as brasas da fogueira para passar por cima e ficamos chorando muito. Mas sei que ele passou para o outro lado, só não sei se foi por cima das brasas ou pulando a fogueira.

O tempo de inverno era bom. Quando o ano era bom de chuva, realmente a gente ia correr por aquelas babugens. Toda vez que tinha um ninho de galinha a gente corria e ia dizer a mamãe. As vezes já fazia muito tempo e a galinha já estava choca e Mamãe já trazia para os pintos nascerem em casa. Tudo era muito bom. O melhor de tudo era exatamente aquela fartura que estava no barreiro velho, ele dava uns melões muito bons, mamões, melões, milho e feijão. Quando o riachinho botava água, mem. se fala que realmente aí refrescava todo o barreiro velho que dava até duas quebradas de milho acontecia porque realmente o tempo que chovia era muito bom. E na infância, conviver e lidar com as adversidades da vida a gente conviveu. Manuel Costa botava a gente em cima da carga de estrume que ia levar para papai plantar as batatas. De ver desnatar leite na desnatadeira saindo leite e a nata pelo cano certo.

Muita coisa interessante eu me lembro que eu convivi na minha infância. Na boquinha da noite de lua que a gente ia para lá para a vazante, exatamente para plantar batata, feijão e papai ia cavando as covas e alguns iam botando as sementes, outros tirando as folhas secas. Como eu tinha raiva e muito medo porque realmente uma folha seca que as vezes tinha cururu (sapos) as vezes papai pegava os sapos pelas pernas e ia jogar fora de cima de um lajedo. Ai Jesus! Me doía porque eu tinha medo, mas não queria também que ele fizesse aquilo.

Minha infância foi muito boa. Quando no inverno o rio vinha com muita água a gente ficava vendo muita coisa passando no rio, arvores, cocos, entulhos... Era muito bonito realmente. A minha vida de criança foi muito interessante. Meus primeiros anos ali deixaram saudades. Foram lembranças que marcam até hoje e sabe-se que realmente um tempo muito feliz. Sei lá a inocência que ainda não sabia o que era o sofrimento, era uma coisa que realmente a gente viveu sem pensar o que seria o futuro do amanhã, da união, amizade e o carinho que a gente tinha, o amor dos nossos pais pela gente era a felicidade completa.

Eu vou contar todas as minhas peripécias, aventuras, convivências do meu período de criança. Tem muitas e muitas histórias, mas eu vou primeiro aqui relatar, (eu jamais poderia deixar de lembrar) a Caatinga D’anja de fora, aquele pedaço de terra tão cheia de pedregulhos. Frutos, não dava nada. Então papai desbravou e lá fez o desmatamento para o plantio de algodão. Acho que também, alguma coisa de feijão. Nela, ele trabalhou muito com minhas irmãs, com meus irmãos e todo mundo era incluído nesse trabalho da Caatinga D’anja. Mas as lembranças que eu tenho muito nítidas, era quando ele saía de manhã cedo com Antônio, João e as meninas Maria, Docéu e ficava lá. Saía de manhã cedo e só voltava à tardinha. Quando chegava a hora do almoço, mamãe preparava um almoço para eles almoçarem. Lembro que ela o colocava, num caldeirão grande: feijão, arroz em cima (fazendo as divisões) Lembro como se fosse hoje, colocava uma vasilha com cuscuz, aí pegava um pano amarrava bem amarrado às vezes a gente levava água, rapadura, alguma coisa assim em separado, uma água mais fresquinha, mas o papai já levava sempre quando ele ia, o potinho da água. Levava tudo que ia precisar no trabalho dele, enxada, fação etc. Quando chegava a hora, Mamãe mandava a gente deixar esses almoços todos os dias. Quando a gente chegava lá, tinha um pé de pereiro muito grande, que já estava um pouquinho lá no canto, melancia já bem friínha. Aí papai estendia uma toalha de mesa no chão, botava umas pedras nas pontas para o vento não se levantar, espalhava os pratos de porcelana branco e botava comida para todo mundo que estava trabalhando e para a gente que ia de casa, eu, Maria José e mais alguém que não estou me lembrando. Nessa hora ele quebrava numa pedra, uma melancia bem vermelhinha e a gente ia comer melancia e eles almoçando. Descansava um pedaço e quando o sol estava mais frio, ele já voltava ao trabalho com a turma, mas não deixava eu e Maria José ir apanhar não. A gente tinha uns bisaquinhos que mamãe tinha feito, e a gente doida para apanhar algodão e disputar quem apanhava mais entre eu e ela. E quando dava 4 horas, quando o sol já estava mais ameno, aí ele a gente ir se meter no meio das outras e apanhar o algodão. Eu querendo apanhar o algodão, pelo menos para tirar do casulo, tirava só a metade, mas eu queria era apanhar mais. Diziam, Ah! tem que tirar todinho, não pode deixar, assim é perda, não sei o que, aquele negócio todo.

Quando dava de tardezinha lá vinha a gente com aquelas mucutinhas. Só tinha um punhado de algodão, bem pouquinho né. Mas isso tudo era motivo de muita satisfação e muita perseverança para a gente tá ali junto com ele e os irmãos, fazendo aquela batalha toda. Todos chegavam, iam pesar na balança para ver quem tinha apanhado mais. Irene era quem mais apanhava algodão. Depois tinha que colocar num saco bem grande e botar lá no paiol, lá no depósito que chamávamos de Quarto Caroço.

Foi uma grande batalha de papai e os filhos desmatando a caatinga, toda a vegetação que tinha na época para depois torná-la num terreno para o plantio de feijão, milho, melancia e algodão (que era o que dava mais) etc . Nossa vida lá no sítio realmente era de alegria ao ver o rio cheio, os animais e tudo aquilo satisfazia todo o nosso ego.

Lá em casa tinha muitos animais. As vacas se chamavam Boa Sorte, Mancinha, Corneta e também um touro muito bonito chamado Azulão, que era mesmo quem comandava as vacas e os bezerrinhos. Uma das vacas morreu, apesar de papai tem feito muitas garrafadas para salvá-la e o seu bezerrinho ficou sendo criado com a ajuda de uma mamadeira. Como também tinha uma borreguinha que foi criada rejeitada sendo alimentada pela mamadeira. Tanto o bezerrinho quanto a borreguinha se criaram. Além do gado, havia muitos animais de estimação: Campo Lino, que era o cavalo branco de Geraldo, Maravilha, que era a burra mula de papai, que todo mundo andava nela por ser muito mansinha. Mesmo assim, Beatriz resolveu dar um passeio nela que saiu correndo desembestada e quando passava por baixo de uma oiticica passou direto e ela ficou dependurada numa galha e evitou de ser degolada.

Isso tudo eu me lembro que aconteceu, tinha também o cachorro Veludo, o jumento Moreno, Roxinho, os gatos Neve e Romeu, este era lavrado de branco e amarelo e meio esquisito. Também tinha uma gata chamada Marta Rocha, era uma gata de madrinha Almira que por sinal era muito querida e tratada com muito carinho por ela e todo mundo por lembrar Marta Rocha, a nossa miss Brasil.

Certa vez mamãe que era uma pessoa muito dinâmica, gostava muito de ajudar a família, certa vez fez uma tachada de sabão. Já terminou já bem de tarde, já era noitinha. Quando realmente depois de todo mundo já acomodados nos seus cantos e tudo mais, se ouviu uma troeira lá de cima da cozinha, pega não pega. Simplesmente era uma cobra que atacou Marta Rocha e ficaram brigando para se defenderem e terminaram caindo dentro do tacho de sabão que ainda está muito quente. A gata conseguiu sair, mas saiu toda queimada. Não sei nem como é que ela sobreviveu, mas a cobra ficou lá dentro do sabão, morreu lá e foi muito ruim. No outro dia mamãe teve que cuidar do sabão porque ninguém queria mais saber do sabão, não podia ficar com ele e tinha que botar fora. A gata ficou ferida, mas depois se recuperou e deu tudo certo.

Eu, ainda bem pequena, recordo que minha irmã Maria Celeste morava lá no alto, do outro lado do rio. Quando estava para descansar de um filho, mamãe sempre mandava as meninas para ajudar na casa dela. Não sei se foi Jurandir, mas sei que eu era pequena nesse tempo e sei que ele tem mais ou menos a minha idade. E Docéu foi quem foi passar uns dias com ela. Nesse período, ela ia ficar lá por muitos dias para cozinhar e eu ia para brincar com meus sobrinhos. Passados dois dias, estava um período que o rio era sempre cheio, antes de fazer o açude Gargaleiras. Eu fui certa que ia ficar lá o tempo que quisesse. Na casa de Celeste tinha uma janela que a gente olhava e via a casa de papai onde eu morava. Com dois dias, eu comecei a olhar de tardezinha e bateu a saudade de mamãe. Aí comecei a querer ir embora. Quero ir para casa de mamãe, eu quero ver mamãe. Tói, meu cunhado, que era bem calmo e não era de discutir, disse: o rio está com água de cintura. Celeste falou: assim não dá certo, não dá certo Tói, deixa essa menina ficar. Tói disse: ela vai, ela vai chorar e eu vou levar. Quando ele tinha passado da última vez no rio ele já estava com água na cintura e dava para levar. Ele era um bom nadador e não me botou no pescoço, ele me botou no ombro dele do lado esquerdo e ficou me segurando com o braço direito dele e eu agarrada no pescoço dele, ele nadando só com o braço direito. Só que quando ele entrou no Rio eu não sei se era um buraco que tinha ou um Remanso, eu sei que cobriu. Homem que coisa e eu agoniada e ele passou sufoco e foi nadando sempre enviesando para sair antes de chegar na Pedra Grande e não morrer porque era perigoso devido um remanso que a água jogava na pedra. Conseguimos sair vivos. Agora era pensar como voltar para casa. Me deixou em casa. Papai dizia: não dá para você voltar, o rio está muito cheio. Tói dizia: tio Antônio, vai dar certo, eu vou e vocês ficam aqui, todo mundo olhando e daqui para lá eu vou exatamente fazer o contrário eu vou subir até a casa de tio Silvestre e de lá eu desço. O rio lá é mais largo, está mais raso e dá para mim sair mais ou menos nas imediações de minha casa. Ele conseguiu e deu tudo certo. Docéu ficou lá e eu vim ele me deixou e deu tudo certo.

Eu gostava de ficar esperando amanhecer o dia porque tinha aquelas alegrias da gente. Pegar aquelas frutinhas Canapu, Coroa de Frade, Xique Xique, e Gogóia. Quantas vezes saíamos para abrir os quixós, para tirar os preás e ninguém tinha coragem. Até Veludo se metia para ajudar a pegá-los. Hoje, a gente já não come mais preá. Antigamente quando realmente sabíamos que era um preá dali da região de capim, trazia para casa e tratava-o para comer. Mamãe tratava, salgava, assava e depois enfarofava. Ficava delicioso.

No ano de 1955, papai começou a construir a casa lá de Jardim. Era muito trabalho, muita agonia, aquela coisa e Geraldo a frente lhe dando todo apoio. Inclusive ele e Oscar bateram os tijolos. A longo prazo com poucos recursos que tinha, a casa foi construída. E logo depois viemos morar em jardim. Eu era muito apegada com Geraldo, toda vida fui e fiquei uns tempos morando em sua casa, não por muito tempo. Tem umas passagenszinhas que eu lembro que aconteceram. Papai fez a casa do sítio Barros Brancos no ano de 1940, logo que regressou de São Paulo.

Certa vez no sábado Geraldo ia para rua e vinha em Maravilha. Para me trazer, ele botou a cela e colocou uma toalha, sei lá, um negócio que eu não me lembro, (coxim) que era para ficar em cima na garupa. Eu não podia vir montada na burra normalmente como todo mundo andava numa cela, tinha que vir de banda. Papai também só deixava as meninas andarem no cilhão e quando eu montei na burra, Zezé, minha cunhada, estava sentada debaixo do alpendre. Ela chamava Geraldo de bem. Bem, essa menina vai lhe dar trabalho, leva essa menina logo escanchada na garupa que ela segura na sua cintura e não cai. E quando chegou no Riacho do queijo eu caí. Ele me puxava outra vez, mandava eu botar o pé no estribo da sela e me jogava por cima de banda de novo, mesmo assim eu voltava a cair. Finalmente ele conseguiu deixar eu ir e chegamos em jardim. Nessa época, tinha muitos cajus e Zezé sempre fazia doce de caju. Eu adoro doce de caju. Uma vez ela fez um doce e colocou numas doceiras e colocou na petisqueira. Quando ela foi dormir, eu saí de mansinho e tirei umas rodelas de caju e me melequei toda. Só sei que ela nunca reclamou nada.

Isso foram coisas que eu me lembro muito bem dessas passagens quando determinado tempo eu acho que uns 10 a 11 anos acho que era mais ou menos não sei não me lembro um dia João foi chegou lá no sítio aí eu me lembro demais a gente sentado lá no batente do terreiro da cozinha, aí ele disse: mamãe mandou dizer que é para você ir para rua que ela está com saudade de você e que você precisa estudar, mas eu quero ficar aqui. João tanto que fez, tanto que fez que me convenceu que mamãe estava com saudade e que eu precisava estudar eu sei que eu voltei para a rua. Logo comecei e já me matriculei no colégio para estudar. Fiz o exame de admissão e já comecei a estudar.

Eu era muito aventureira e gostava de passar férias na casa das minhas irmãs. Uma das aventuras é que papai ia passar uma semana lá em Cruzeta na laje que era Dina e Irene que moravam lá. Eu fiz questão e também fui passar 15 dias com elas. Então papai disse: eu vou deixá-la e volto e ela fica lá e tudo bem. Eu fui, quando cheguei fomos logo para a casa de Irene. Papai ia passar dois dias na casa de Irene e três na casa de Dina e voltaria exatamente no sábado. Quando eu cheguei na casa de Irene, já de tarde, logo comecei a olhar um escuro diferente, olhava só via cinza no ar, aquele negócio assim. Papai no outro dia ia para casa de Dina então eu resolvi ir também ir com ele. Quando nós chegamos lá em Dina foi aquela recepção, ela estava muito feliz. Ela sempre me chamou Lourdinha e foi logo juntando os meninos e conversamos bastante. A noite foi boa demais. Jantamos e fomos dormir.

Quando foi no outro dia de manhã, não sei quantos meninos tinham lá naquela época. Eu sei que muito bem de Joãozinho, que era bem branquinho. Na frente da casa tinha um barreiro, tinha canoa e nós fomos todo mundo pinotar dentro do barreiro e na canoa. Só que quando a gente foi para a canoa os meninos levavam cada um uma latinha e eu não sabia para que aquela latinha. Eu estava muito empolgada. Sentamo-nos nos bancos da canoa e fomos desbravar e aventurar. Eu não sabia remar, quem remava eram os meninos. Não me lembro se era Gracinha, Corrinha, Mirinha ou Dantinha, só sei que João e Alberto Luiz eram ainda pequenininhos. A canoa começou a encher com água e os meninos desgotando, desgotando e então entendi o motivo das latinhas, mas eu não tinha latinha para tirar a água. No fim deram uma manobra na canoa e chegaram num canto mais raso que deu para sairmos. Dina quando viu ficou preocupada e começou a dizer: vem meninos pra cá, isso é um perigo! Ficamos mais um pouquinho tomando banho e voltamos para casa.

Quando chegou o dia que papai disse que vinha embora, eu olhava e só via serra, muita serra, era cinza, e papai na sexta feira se arrumando que no sábado ia sair de volta pra casa. Ajax ia deixá-lo lá na rodagem para ele pegar o caminhão da feira, tipo Pau de Arara que ali passava pegando passageiros. Saía pela estrada de Cruzeta, passava lá no sítio de Ajax e depois ia por São José do Seridó e findava em Jardim. Era um caminhão Pau de Arara com bancos, mas não tinha a cobertura de lona. Era um bate e volta. Quando chegou o momento da volta de papai eu disse que queria voltar e Dina tentou me convencer a ficar, mas papai resolveu me trazer de volta. Na manhã seguinte, bem cedinho, Ajax selou dois burros e saímos. Ele em um e papai em outro comigo na garupa. Fomos lá para a estrada e em determinada subida um dos burros ia muito devagar e Ajax começou a dar chibatadas para não perdermos a hora do caminhão passar. Finalmente o caminhão chegou, mas eu não sabia subir e os feirantes me puxaram e me jogaram dentro do caminhão e saímos para Jardim. Lá na entrada, próximo a padaria de Vicente e a casa de Clenita o carro parou, descemos e fomos direto para casa. Quando mamãe me viu disse: e essa menina voltou também Antônio. Papai respondeu: ela queria voltar e eu a trouxe.

Na minha infância pelo sítio a gente sempre estava unidos, acompanhava um, acompanhava outro, ficava do lado de um, lado do outro e assim a gente foi vivendo e crescendo. Essas lembranças marcam. Quando íamos brincar ou fazer qualquer coisa a gente tinha sim umas parcerias: eu e Maria José, João e Antônio, Maria e Docéu. Eu lembro de uma vez, não sei se foi um maribondo que ferroou a mão de Antônio, a qual inchou muito e ele não estava aguentando. Ele mandou eu pegar e segurar na mão dele, para ele cortá-la. Peguei a mão dele, eu não sei se quando ia cortar, se estava arrependido e desistiu. Depois mamãe foi fazer umas massagens com folhas de um mato, ela botava na manteiga quente, esquentava e colocava em cima do inchaço. Lembro também de uma vez que João e seu primo Paulo de Severino Nozinho, arengaram, apesar de serem grandes amigos. Realmente ele gostava de implicar. A situação lá em casa ficou complicada. João ficou chateado, pegou uma faquinha que ele tinha e foi lá para debaixo do pé de juá que tinha na subida do barreiro velho e ficou lá o dia todo, por muito tempo e a gente chamava e ele nada fazia. Eu fui lá, chalerei João, chalerei, mas ele só queria esperar Paulo passar para se vingar. Não sei o motivo dessa vingança.

As meninas sempre iam extrair dentes na rua e certa vez eu fui com Docéu, íamos de manhã, ela extraía o dente e já voltávamos em seguida. Quando a gente vinha voltando pela estrada, ela já com o dente extraído, eu acho que era até como um corredor que era o açude do Poço Doce que era de Zé do Ouro. Eu vinha com Docéu, já bem cansada, aí uma vaca de bezerro novo, disparou atrás da gente, que Jesus Amado Pai! Docéu se esparramou no chão, coitada. Logo que caiu já se levantou e saiu correndo, fugindo da vaca e ainda bem que na frente da gente encontramos um Passa Disso e pulamos o mesmo, mas e o medo de Docéu ter problema com o dente porque realmente a queda foi grande. Mas chegamos em casa, mamãe lavou com sal e deu tudo certo, graças a Deus, não teve nada

Fui uma pessoa que realmente sempre gostou de passar férias na casa de minhas irmãs. Já fui lá para Celeste, já tinha ido lá para as meninas Dina e Irene, isso eu já era grande e morava na rua. Teresa (Tetê) veio passear lá em casa, era época de São João. Ela com uma amiga dela Francisca, passaram um dia lá em casa. Combinamos que no outro dia eu ia para casa de Tetê, para passar as férias lá. Lá tinha uma festa e disseram que tinha um baile em São José do Seridó. Francisca muito animada me convidou e nós fomos. Ajeitaram o meu cabelo, fizeram um penteado, e me vestiram com um vestido arrumado. E logo fomos para pegar um ônibus até a entrada para Caicó onde a gente soltava e seguia para casa de Tetê. Quando chegamos lá, já era bem tarde, quase noite. Fomos logo cuidar porque vamos ter que ir para São José, cada uma em um jumento. Eu bem arrumada em cima do jumento. Eu sei minha gente, que quando chegamos lá em São José, não era baile de orquestra, festa nenhuma, era um São João. Eu toda arrumada. Pense num maracatu, toda papagaiada. Onde é que já se viu, o povo vestido de São João e a gente toda arrumada, eu e a menina de penteado e tudo. Sei que ficamos lá, dançamos, ficamos por lá a noite toda. No outro dia voltamos nos animais para a casa de Tetê. Fiquei uns dias lá em casa de Tetê que era vizinha a de D Modesta. Lá aparecia muito sobrinhos de dona Modesta que vinham de Caicó, lá em Zé do Carmo, o qual era um sobrinho de D, Modesta e seu Zé Estevam. Não me lembro, mas sei que vinha muita gente lá, sobrinho, neto, filho, aquele negócio todo. As vezes de noite vinha todo mundo brincar, era alegria total.

Num determinado dia teve a inauguração da luz de Paulo Afonso em Jardim do Seridó em 1966. Todo mundo se animou e Terezinha, que era cunhada de Tetê e irmã de Justino, botou na cabeça de Zé Nilton de Zé do Carmo que era mais velho, para pegar a caminhonete para irmos todos para Jardim. Só que as minhas coisas ficaram todas lá em Tetê porque eu ia para voltar. Cheguei em Jardim fui em casa, tomei um banho, me arrumei e vamos para festa lá do clube. Essa era uma festa, um baile mesmo. Não sei nem qual era a banda que estava tocando nessa inauguração na energia de Paulo Afonso. Dançamos a noite toda, mas quando voltamos para casa que eu fui lá trocar de roupa para voltar para o sítio de Tetê, quem disse que papai deixou. Ela veio e fica e aí minhas coisas tinham ficado tudo lá em Tetê. Chorei de raiva, mas não voltei mais.

Quando eu chegava numa casa de minhas irmãs para passar férias, os pobres do marido era quem não gostavam porque eles iam dormir na sala para eu dormir no quarto com minhas irmãs eu tinha medo. Isso aconteceu lá em Tetê e outra vez lá em Beatriz, mas como eu já conhecia a casa que eram de meus pais eu não tinha medo de dormir. Nessa época Valcineide era pequena e dormia comigo num dos quartos. Quando foi uma noite Neide acordou aos gritos: mamãe mamãe, mamãe, assombrada e chorando dizia: aqui tem uma velha fazendo careta pra mim (até fazia os gestos na boca) Foi muito reboliço que não teve mais quem fizesse eu dormir mais nesse quarto. Fomos eu e Neide dormir na cama de Beatriz e Vicente foi para a sala. Ainda passei mais uns dias por lá, mas não sentia mais segurança porque o medo de dormir era grande.

Também fui passar férias na casa de Santina, minha irmã. Não sei se foi ela que veio ou se foi Ivo, só sei que fui passear lá. Chegando lá, tudo era muito bom, tinha muitos meninos, muita gente e meu cunhado Chico Suzana, com aquela calma sempre cuidava de tudo. A sua casa tinha uma meia parede e antes de dormir eu e Neide ficávamos conversando, as vezes lavando louça até tarde. Sempre conversava com ela. Uma noite, Toinho que era muito presepeiro, se enrolou num lençol branco e começou a andar em cima da meia parede, exatamente em frente ao quarto da gente. Eita que medo! A gente pensava que era uma alma. Gritava e chorava, aquele negócio todo, todo dia ele tinha uma presepada.

A melhor coisa do mundo era quando amanhecia, mais ou menos cinco e meia (5:30h) aí chegava o meu cunhado Chico Suzana e chamava os filhos: Tatinho, Ivanildo (chamava Bia), Elói, Paulo, Toínho, chamava um por um. Tá na hora meu filho! Essa ladainha se repetia todo dia de manhã. Eles não queriam se levantar para ir ao curral para tirar leite. Eu fiquei um tempo lá por Santina. Um dia fui com Ivonete, que lavava roupa num açude que tinha uma sobra muito boa e uma pedra onde ela lavava a roupa. Aí eu entrei na água pois eu já sabia nadar. Quando eu estava lá no meio do açude, ainda bem que Ivonete viu e gritou por mim porque estava bem próximo de mim. Vinha uma cobra de cabecinha levantada. Que aperreio! Ivonete começou a jogar pedra de lá e eu nadei muito até sair fora da água. Pra mais nunca eu quis ir tomar banho nesse açude. Jesus!

Como eu estava lá em Santina e ainda não tinha ido a casa de Maria (que morava no sítio Bezerro) resolveram ir me deixar lá para passar um dia e dormir lá e no dia seguinte Raimundo me trazia de volta para casa de Santina. Quando chegou a hora da gente vir para Raimundo me deixar, ele selou dois cavalos. Na hora que ele foi me montar eu não alcançava o estribo para me montar na sela. Raimundo me puxou pra cima da sela eu caí no pescoço da burra. Raimundo dizia, você parece que é doida, isso eu chorava, ria com as coisas de Raimundo. Mas voltamos já à tardinha e chegamos à noite lá em Santina e depois vim para a rua e ficamos lá mais um dia em que teve uma festa da padroeira. Nesse tempo Neide já namorava com Lali e tinha uma menina de Floresta que se tornou minha amiga. Passamos mais uns dias por lá e voltamos em seguida para Jardim.

Certo dia, papai saiu para passar uma semana lá em Cruzeta, nas casas de Irene e Dina. Ele foi primeiro para o sítio de Beatriz, depois para a Viração. Lá pegou um carro e foi para Cruzeta, mas só que ele disse a mamãe que queria passar uns três dias e voltava. Passou bem uma semana e mamãe sem saber notícia dele. Não sabia se ele estava em casa de Beatriz ou em Cruzeta. Ivo, que era o neto mais velho dele chegou lá em casa e perguntou: cadê vovô? E responderam: foi lá no sítio e depois ia para Cruzeta e ninguém sabe onde ele está. Vamos procurar vovô. Passamos por Beatriz e ele já tinha ido para Cruzeta. Fomos buscar o vovô. Quando já estava ficando tarde aí chegamos em Cruzeta. Só que ele já estava em casa de Chico Louro, pai de Zezé, já para dormir, para no outro dia cedo vir para Jardim. Se nós tivéssemos vindo atrás dele sem saber onde ele estava, aí tinha levado a noite toda até de madrugada e iríamos andar muito. Quando ele nos viu chegar, ficou emocionado e disse: “eu vim para demorar mais um pouco, mas agora vou mesmo voltar para Jardim”.

Em jardim eu só estudava. Era o ano de 1971 mais ou menos. Nesse ano no mês de julho meus pais se mudaram para Natal e eu fiquei até terminar o ano letivo em Jardim e depois vim para Natal. Eu vim morar na rua Clementino Câmara 228, B. Vermelho e fui matriculada no Ginásio Batista em frente à minha casa. Só comecei a trabalhar em 1972 quando apareceu o Nordestão. Eu me candidatei e um mês antes do Nordestão inaugurar a gente já estava fazendo treinamento e fazendo arrumação das lojas. Foi aí que começou a jornada para minha vida profissional. Quando eu comecei a trabalhar eu não sei por que que eu fui fazer pedagógico no Instituto Kenedy, porque entrei no Nordestão e segui a carreira no comércio e nunca me interessei de fazer nenhum concurso e muito menos de ser professora. Por isso eu passei exatamente galgando lá no Nordestão posições. Comecei na farmácia como operadora de caixa, depois fui iniciando as compras. Ficava superfeliz numa farmácia da loja quando estava organizando. Comecei exatamente nas farmácias, no caso eram farmácias que hoje são da Globo. Antes elas eram todas do Nordestão, então eu entrei com uma farmácia e quando eu saí, que as farmácias foram vendidas para a Globo eu estava trabalhando e comprando para nove (09) farmácias. Saí do departamento comercial da empresa do Nordestão e fui para o central assumir lá. Quando as farmácias foram vendidas para Globo, esta queria que eu fosse trabalhar com eles usando o nome da Globo, mas o Nordestão também me convidou para eu ficar. Foi quando, conversei com meu chefe que era Antídio o qual disse-me: Eles sabem quem você é. Eles querem que você vá para lá, mas aqui a gente está combinado. Você aqui já sabe dos pros e contras, já conhece tudo e me ofereceram para mim ficar exatamente comprando a parte de bazar. Eu acho que foi nos anos de 85 por aí 85 e 86 que a farmácia foi vendida. Eu fiquei lá até 97 quando fui ser compradora, assumindo uma área muito grande. Comecei com bazar, que depois além do bazar, da bomboniere, papelaria descartado, então estava muito grande. Fui inaugurado farmácias. Fiz uma inauguração da loja 05 que é a da Redinha. Naquele tempo vendia de tudo de eletrodomésticos: fogão, geladeira. A época era de muita dificuldade porque quando havia promoção a gente botava o vídeo no ar e quando faltava um determinado produto que acabava devido o preço que era bom, aí tinha que retirar o vídeo do ar porque não podia ser divulgado com um produto faltando.

Depois fui trabalhar no Supermercado Seridó , hoje Rede SUPERSHOW do meu sobrinho Marinaldo. Na primeira vez trabalhei 10 anos com ele, depois sai e ele me convidou de novo. Voltei e fiquei mais 4 anos.

Hoje estou aqui nessa situação graças a Deus. Estou mais velha, mas mesmo assim eu sei que eu ainda tenho muita coisa para ajudar alguém. É muito ruim a gente se sentir inútil, saber que ainda temos alguma coisa de conteúdo para que possamos oferecer para as pessoas, principalmente em se tratando de trabalho e o mercado infelizmente, hoje já não oferece mais oportunidade para essas pessoas. Hoje eu não trabalharia mais. Porém na época, tempos atrás, o mercado se fechava para as pessoas que saiam de um trabalho com uma certa idade

Quero dizer que essa foi a minha vida. Fui criada no seio de uma família onde prevaleciam os costumes de amor e carinho, pelos nossos pais, pelos nossos irmãos, onde crescemos juntos e unidos. Até hoje eu posso até dizer que ninguém nunca teve desavença com ninguém. Meu irmão Neneco, quem já está lá no reino da Glória, (nosso segundo pai) era muito presente na minha vida. Sempre era o irmão que mais vinha aqui em minha casa. Sempre que acontecia alguma coisa de família que precisava conversar, ele vinha a minha casa. Ele sempre dizia: “O nó começa em mim e você é a ponta do nó” Eu sou o começo. Começa em mim e termina em você. Para as conversas, no caso. Eu só tenho de agradecer a Deus. ELE foi muito maravilhoso na minha vida.

Esse é o meu relato que eu faço da minha juventude, da minha infância, das minhas alegrias, das minhas tristezas. De tudo que eu passei e consegui passar. Não tudo, porque tem muitas coisas que não falei para não me alongar. A parte que eu tenho, que é o meu maior presente do mundo da minha vida que hoje mesmo na idade mesmo com todo o sacrifício que a gente enfrenta e há anos atrás há 35 anos Jesus me presenteou com uma coisa mais divina na minha vida que foi exatamente a minha filha Rhaylla Louyse da Silva Tájra. Minha filha legítima, que não saiu das minhas entranhas, mas eu tenho certeza e não tenho medo de errar e dizer que se tivesse saído das minhas entranhas, talvez eu não a amasse tanto o quanto a amo. Ela é a razão do meu viver, é tudo para mim. Quero que Deus me dê então muitos anos de vida para que eu posso deixá-la encaminhada, para eu ter paz e possa reconhecer que ela é uma pessoa que realmente luta pela vida, ela desbrava e já passou por muitas coisas na vida dela. Também já sofreu quando era criança no colégio, mas eu sentia como mãe, e hoje eu vejo a mulher que ela se transformou. Rhaylla não é minha filha adotada, ela é minha filha legítima, mais do que legítima do meu coração, é TUDO. Minha filha, você é a luz que ilumina o meu caminho, é quem dá motivo para que eu possa caminhar ainda esses dias e quero muito estar sempre com você, fazendo por você, para você realmente usufruir, você ser feliz. Você é uma pessoa maravilhosa. Eu te amo minha filha, eu tenho certeza e digo a você sem medo de errar. Quantas vezes eu digo: eu te amo eu também escuto você dizer eu também te amo mãe. Agradeço a Deus por todas essas maravilhas que ele já me deu e você em especial, que foi o que deu sentido na minha vida nesses últimos dias nesses momentos, nesses anos em que estamos juntas. Seja forte, siga sua caminhada. Hoje eu sei que você está sendo uma pessoa temente a Deus, crendo, orando e rezando. Muito bonito minha filha! Eu fico feliz, tenho que aplaudir e dizer: Seja você, faça por você e você. Continue sendo essa mulher forte e batalhadora que você já passou por muitos obstáculos, muitas coisas, mas que Deus está com você e Nossa Senhora vão lhe proteger e levar à frente e você vai vencer. Eu te amo, também amo toda a minha família, de coração mesmo.

Agradecendo a Deus: Obrigada Senhor! Obrigada por ter me dado uma família linda, maravilhosa e uma filha linda, querida e que eu amo tanto. Amo vocês que moram no meu coração.

Quero fazer uma conclusão para falar um pouco dos meus ídolos, dos ídolos sim, meus pais: Antônio Alves da Silva e Almira Dias da Silva que humildemente na sua existência nos seus dias de vida desde as nossas infâncias eles realmente nos acolheram, eles nos educaram, eles nos criaram sempre no caminho da paz. Meu pai, aquele homem sério, bondoso, viveu uma fé imensa, muito religioso, muito temente a Deus e que sempre olhou para todas as pessoas ao seu redor com o coração bondoso. Meu pai era aquele homem que não tinha ambição, ele queria o melhor para todos. Era muito bonito, meu pai era lindo. Eu achava, era um homem interessante. Ele não usava perfume, mas gostava de tomar banho com sabonete cheiroso. Comprei muitas vezes para ele, o sabonete Francis, logo quando ele surgiu no comércio numa caixinha na cor roxa. Ele só gostava do sabonetinho roxo. Mesmo quando esse faltava no comércio e eu trouxesse outra fragrância, ele sempre adivinhava. O mais que ele podia fazer às vezes, era pegar o vidro do perfume, virava-o no lenço e botava no bolso. Ele não gostava de usar perfume. Foi aquela pessoa que sempre manteve o caminho na linha, ajudando e orientando. Muitas vezes até já disse. A tradição de família é uma coisa que influencia muito na construção dos sucessores a continuarem a família. Ele mesmo de longe, quando eu tinha qualquer situação, ele chamava uma de minhas irmãs e para me orientar, mas ele sempre estava na orientação acompanhando a evolução da família. Ele mesmo apesar da pouca instrução da escolaridade, ele sempre foi uma pessoa que se manteve íntegro. Posso falar de mim para com ele e ele para comigo. Tivemos algumas divergências em determinadas situações, mas sempre o perdão dele vinha. Certa vez, numa situação que estávamos divergindo, ele chegou para mim, me olhou e disse: “Minha filha, você sabe a situação como está, você sabe que o seu pai tem um coração bondoso, um coração de perdoar, não tem problemas nenhum com as nossas divergências, mas sua mãe que é uma pessoa mais cautelosa, que tem um coração um pouco mais duro para realmente assimilar certas situações e divergências que aconteceram no tempo de juventude por não concordar com certas coisas, talvez com certas atitudes que surgiram na vida a fora” Ele era o meu melhor amigo, se tornou aquele pai que sempre me acolhia.

Muitas vezes eu chegava cansada do Nordestão, eu fumava nessa época, fumei muito e ele dizia: “Minha filha, eu já pedi muito para você parar com esse cigarro, mas como você diz que é um passatempo, que é o que a leva mais a pensar a seguir com esse vício, então agora só lhe digo uma coisa: “Nunca peça cigarro a ninguém, sempre compre cigarro seu dinheiro” Quantas vezes ele sempre demonstrou aquele aconchego comigo. Certa vez, eu estava deitada e mamãe estava fazendo canjica e ele veio me acordar dizendo: “Minha filha, como você gosta de canjica quente, sua mãe está tirando do fogo, venha comer”

Uma data que eu não posso esquecer foi o último ano que ele passou vivo, era o dia 23 de janeiro de 1977, dia do meu aniversário. Antônio estava passando férias com os filhos e Maricota conosco aqui em Natal. Eu era muito apegada com o Renato. Ele era assim aquela luz no meio da sala cantando: “Só pretendo morrer, depois de 2001” Era uma criancinha, sapeca que alegrava muito. Era aquele dia que ele estava de férias aqui, então nesse dia do meu aniversário eu estava deitada e papai pegou os meninos, ele e Maricota e entraram no meu quarto para cantar parabéns. Me acordaram cantando e dando-me os parabéns. Não esqueço nunca, isso foi no dia que realmente foi meu último aniversário que ele passou vivo, dia 23.01.1977. No dia 24 conversamos muito à tarde, eu e ele lá na área de casa. Logo depois eu saí para a casa de uma amiga minha que estava chegando de São Paulo. Papai veio a falecer exatamente quando foi atropelado ao atravessar a rua na saída da igreja São Pedro. Esse dia sempre me é lembrado. Ele tinha se tornado o meu grande amigo. Em ocasiões, sempre uma coisa que eu lembro: Ele sempre me recomendava muito: “Minha filha, reze muito, minha filha reze muito. Eu sempre ouvia aquelas palavras dele e isso me confortou muito meu coração porque esse dom eu levo pra sempre na minha vida, as rezas que ele me pedia que eu rezasse muito. Ele sempre queria que eu rezasse muito.

Minha mãe, aquela mulher íntegra, dispensa qualquer comentário. Era aquela mãe bondosa, não sei se porque eu era caçula, ela sempre teve um apego muito grande comigo. Foi uma coisa que realmente Deus mostrou em minha vida, cruzou nossos caminhos e ajudou muito em certos momentos da minha vida. As vezes fazia vista grossa das minhas ignorâncias, talvez das minhas atitudes, mas ela sempre pedia para eu realmente caminhar em paz Eu sei que até com minhas irmãs ela teve conversas pedindo para que aliviassem os atritos porque eu precisava caminhar na vida serena. Porque até com minhas irmãs, como Tetê ela chegou a pedir, até ao próprio Neneco. ” Olha, cuida de Lourdes” Isso eu sei que ela vivia com o coração cheio de esperanças, mas com a morte de meu pai ela realmente ficou no início com muita saudade. Ela sempre pensava como eu seguiria minha vida em frente e ela sempre norteava meus irmãos para que realmente a gente tivesse sempre unidos, que a gente tivesse paz. Ela sabia que realmente só quem estava em casa naquele momento, era eu de filha. Findamos numa cumplicidade tão grande que ela conversava comigo até pelo olhar, Com o gesto do olhar dela eu já entendia e já sabia o que ela queria. Ela sempre me amou muito, isso eu tenho certeza. Terminando os dias de vida dela, realmente ela sofreu muito devido a muitas coisas que debilitou a saúde dela e ela se foi em 15.12.1985. Minha mãe foi uma guerreira, uma mulher que viveu para o lar para os filhos, para o marido. Nunca eu tive inveja de nada na vida, de quem era bonito, de quem era rico, de quem era muita coisa, Muitas vezes senti assim dentro de mim, aquilo não era inveja, mas era assim aquela coisa. Quando eu trabalhava e chegava alguma senhorinha na farmácia para comprar um remédio com alguma receita, toda arrumadinha eu mentalizava comigo. “Deus eu não peço nada no mundo de riqueza, de boniteza. Eu queria muito ter visto a minha mãe a caminhar, ir a um supermercado, a farmácia para comprar o remédio dela, coisa que minha mãe nunca fez. Viveu exclusivamente para a família: como mãe, como esposa e como dona de lar. Minha mãe, parabéns! Viva, esteja onde estiver. Sempre vou lembrar todos os seus méritos, que foram extraordinários, que você demonstrou ser uma pessoa perseverante, uma pessoa linda por dentro e por fora”

Hoje quero dizer a meus irmãos que nós já estamos mais velhos e ainda temos muita oportunidade de continuar nossas vidas, continuar nossa caminhada com alegrias, na paz, na União. Nossos pais sempre nos mostraram o caminho certo e não vamos pensar por que a velhice chegou, chegou. Pode eu ir amanhã, outro pode ir depois, como outros já se foram, mais sempre naquele pensamento imbuído na nossa fé, na nossa união e na nossa criação. Somos seres vindos de pessoas genuinamente honestas e humildes, mas de muita fé no coração. Deus sempre nos acompanha, sempre está do nosso lado, sempre nos tiras das situações que já passamos e enfrentamos. Vamos continuar na nossa fé, rezando e pedindo melhores dias de vida. Mas vamos sorrir, vamos viver a vida que Deus está nos oferecendo. Eu sou muito grata porque todas essas pessoas nascidas e criadas no seio de uma família tão linda, tão querida e todos com o coração tão bondoso, isso se estende também para meus sobrinhos, para meus cunhados, que vamos viver na paz e na união. O perdão é a base de tudo. Nada de ódio no coração, não vamos assimilar coisas ruins para ninguém, porque na nossa família o que existe e o que reina, é um amor. E olha que, a família é numerosa: de filhos, netos, bisnetos, tataraneto e vamos dar continuidade. Quem já está se indo, eu que vou ter que ir, quero que minha filha plante a semente dela: de paz e carinho e de amor. Quero que todos os meus sobrinhos também continuem o legado na união, na paz e na benfeitoria. Uma família que se tornou uma tradição de amor, respeito e paz. Isso eu quero deixar essa mensagem para meus irmãos e para minha família.

Amo todos vocês! Adoro especialmente todos. Não tem um diferente do outro. Posso ser singular mais para uns porque são mais do meu aconchego. Sei que tem pessoas que são mais próximas de mim, sei que tem pessoas que me tem como mãe e eu tenho pessoas como filho legítimo. Continuemos a caminhada unidos: na paz e amor no coração. Eu amo todos vocês, não sei que me espera pela frente que dias virão, mas quero continuar lutando, vivendo e sorrindo porque: a felicidade, a paz e a saúde são as únicas coisas que a gente não pode comprar. O dinheiro pode comprar muita coisa, porém o amor, a paz, a saúde e a felicidade são coisas lindas do coração. Amamos uns aos outros como Deus nos tem amado e especial a minha filha Rhaylla. Continue para vencer, por você, para você e você. Siga em frente, na sua fé, na sua história e na sua caminhada que dias melhores virão.

Amo vocês!

Lourdes Tajra

05/12/2024

Artmaze
Enviado por Artmaze em 05/12/2024
Reeditado em 16/12/2024
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