O segurança da boate

Em 1994, voltei a Brasília para nova temporada na capital de todos os brasileiros. Logo fiz uma assinatura do jornal Correio Braziliense para os finais de semana, já que, nos dias úteis, lia no trabalho.

Num sábado, como de costume, fui pegar o jornal e, então, "surprise": não havia jornal. Liguei para o Correio, pediram um tempinho para verificar. Esse tempinho virou um fim de semana inteiro. Só na segunda, responderam que estava tudo normal. Como sugestão, que eu me informasse com o porteiro ou o síndico do prédio. Bom, pensei: vamos esperar que tenha sido uma falha única e pronto.

No outro sábado, aconteceu a mesma coisa. Voltei a reclamar, deram a mesma resposta: o jornal estava sendo entregue pontualmente, entre cinco e seis da manhã, aos sábados e domingos. Petrônio, o síndico, acionado, pediu um tempo para verificar. Dias depois, disse, com certo receio, que os jornais chegavam, sim, mas suspeitava de um rapaz, segurança de boate, que morava no último andar da minha portaria. Ele chegava de manhãzinha, depois do horário de entrega dos periódicos. Era filho de um de meus colegas de trabalho.

- É só uma suposição, é a única pessoa que entra de manhãzinha na sua portaria.

Como sair dessa? O pai era gente boa, colega de trabalho... Eu teria de provar e, para isso, teria de levantar cedo, indispor-me, quem sabe, com um colega. Seria um desgaste enorme. A solução teria de ser por outro caminho. Pensa, rapaz, pensa!

Aí vem a ideia genial: escreveria um bilhete e colocaria na nossa portaria. Era isso mesmo!

Depois de uns três dias, redigi esta mensagem, que digitei e colei no sagão, ao lado da caixa de correio: "Num país onde tão poucos leem, é reconfortante saber que contribuo para que alguém, provavelmente sem condições financeiras para assinar ou adquirir jornais, pegue os meus para ilustrar-se. Ainda mais louvável é fazer isso nos finais de semana, onde poderá tingir-se de cultura nos vários cadernos especiais. Solicito, por oportuno, ao meu já querido sócio intelectual que, ao terminar sua leitura, recoloque o jornal onde o encontrou. Também quero deliciar-me com as várias colunas de fim de semana. Cordialmente, apto. 204."

Resultado: ninguém vestiu a carapuça, não me indispus com vizinhos e voltei a receber pontualmente as edições de sábado e domingo. Game over.