A armação da barraca

Quanto gosto não dava, ainda como estudante de primário observar, em minhas idas e vindas matinais escolares, aquela tão gostosa e pública ereção, guindada pela mais pura devoção...Levava dias, mas não mais que uma semana. Seus operadores, experimentados e bem destros, mestre de obras, carpinteiros e demais obreiros, levavam toda fé no que faziam naquele iniciozinho de agosto, invariavelmente, entrava ano, saía ano. Afinal era a barraquinha da padroeira da Velha Serrana, Nossa Senhora do Pilar.

A novena começava a seis de agosto, com rezas na matriz, imponente, logo ali de frente, nos fins de tarde e se prosseguia noite adentro com o movimento dentro e em torno da barraca, uma bela estrutura de madeira coberta de folhas de palmeira. Entre um e outro mourão que sustentavam a estrutura, um cercado leve, com parapeito para que a maioria do populacho pudesse de todos os lados, observar as manifestações artísticas e recreacionais que se faziam no palco - que premiava atores da cidade e atraía nomes consagrados, principalmente da capital, Belo Horizonte, geralmente - em meus tempos de criança - sob o comando de Ubaldino Guimarães, grande apresentador ...Célio Balona, os Cariúnas, o repentista Caxangá,

o comediante circense Del Mário, engraçado que ele só, mas mais, se acompanhado da filhinha prodígio Delmari, ainda muito mió...

E entre uma e outra atração, os infalíveis pregões do leiloeiro e perdigoteiro Pedro Panelão, com seu refrão olha o bandejão, as cantadas de víspora e os avisos do pároco Guerino Pontello, figura central das celebrações litúrgicas, e naturalmente, homenagens intermináveis.

A circulação no interior da barraca, apinhada de mesas e cadeiras de madeira que, suponho, pertenciam o clube social, de profanas iam logo a sacras, tudo em nome e louvação da Virgem do Pilar, era restrita aos que alugavam o espaço para consumo de comes e bebes e às graciosas meninas que prestavam os serviços de garçonaria. Seu símbolo mais visível e cobiçado, era um abridor de garrafas, além é claro, da faceirice que literalmente incapaz de armar e desarmar espíritos barraqueiros...

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 05/11/2024
Reeditado em 05/11/2024
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