O COMEÇO A PARTIR DE UM FIM
O dia amanheceu chuvoso. Uma chuvinha fraca e aquele friozinho gostoso que só dá vontade de ficar na cama o dia inteiro. a vida do adulto não permite esse luxo, afinal era sexta e o trabalho a esperava. Com muito sufoco, Maria resolveu sair da cama, tomou um banho demorado, preparou um belo café da manhã, pegou a sua marmita e saiu para trabalhar.
O dia passou arrastado e não foi como ela gostaria, com tantas demandas ela ficara ocupada todo o tempo e não teve chances de conversar com Peu, seu noivo, que aguardava uma resposta, mas ela não checou suas mensagens em nenhum momento. Foi somente ao chegar em casa, por sinal, após o horário do evento, que ela viu suas mensagens e as várias ligações dele. Se adiantou no banho e saiu as pressas, mas ela não percebeu que o sinal fechou e ao curzar a outra avenida foi surpreendida por outro veículo. O carro de Maria parou a metros do local do acidente, após capotar várias vezes. O socorro demorou a chegar e vários curiosos já estavam no local. Maria, coitada, continuava presa entre a bagunça que ficou seu carro. Ela respirava fracamente e estava desacordada. Foi quando começou a parar que a ambulância chegou. Fizeram os primeiros atendimentos no local e a encaminharam para o hospoital mais proximo. Lá fizeram contato com Peu a partir do seu telefone, que apesar de ter danificado a tela, ainda era possível visualizar. Peu saiu as pressas para o hospital. Foram momentos terríveis para todos que a conheciam, principalmente para ele. Ela permaneceu vários dias em tratamento intensivo, preicsou passar por várias cirurgias e continua em estado grave na UTI. Maria está em coma desde o acidente. Durante todo esse tempo, seu noivo esteve ao seu lado. Ele té se afastou do trabalho para dedicar-lhe tempo necessário na recuperação. Ele estava horrível. Não se alimentava bem. Mal dormia. Os banhos de hospital eram rápidos e não ajudavam na situação, ele estava deplorável. O cenário mudou somente no 47° dia após sua entrada no hospital, quando ela abriu os olhos, mas fechou logo em seguida A partir daí foram vários procedimentos, porém ela permanecia desacordada. Já não reagia aos estímulos, o coração ainda batia, mas por causa dos aparelhos. A equipe médica já sabia que Maria havia partido. Ela estava em morte cerebral. O mundo de Peu caiu. A família de Maria não aceitava o diagnóstico. Os amigos estavam inconsoláveis. Todos estavam assim. E o hospital precisava da autorização da familia para seguir com o protocolo de doação dos orgãos, para desligarem os aparelhos em seguida. Afinal, Maria era declarada doadora de orgãos. Eles precisavam agir rapidamente para a comunicação por morte encefálica, mas a família continuava relutante, acreditando que ela poderia acordar a qualquer momento. Uma triste ilusão. Exaustivo para todos. Para Peu era melhor aceitar a morte, afinal ela morreu para outros tivessem suas vidas salvas, embora a mãe de Maria não pensasse igual. A tentativa de fazer com que a familia de Maria aceitasse ainda durou tempo suficiente, mas acabaram aceitando e deram autorização para a retirada dos orgãos.
Maria morreu, mas outros pacientes ganharam mais tempo de vida. Sabe-se que isso não é a melhor coisa a dizer sobre a morte de alguém, mas é uma grande chance que a medicina proporciona.
Foi muito difícil para a familia de Maria aceitar que ela não está mais aqui. Que ela não poderá realizar o sonho de ser mãe. Que ela não cuidaria mais de suas plantas, seu cachorro e fazer o almoço de domingo que ela gostava tanto. Ainda dói, mas todos seguem tentando encontrar conforto entre eles. Peu iniciou a terapia para aceitar que não a teria mais em sua vida. Ela não suportava lembrar que que nunca realizariam o sonho do casamento na fazenda da família. Ele estava sem chão. Precisava voltar ao trabalho, mas não sabia nem por onde começar. As contas estavam acumulando e ele precisava retomar a vida.
Foi um longo período até que todos tivessem, ao menos, um minimo de conforto. A dor continua, mas eles se apegavam ao fato de que Maria salvou a vida de outras pessoas e trouxe de volta a felicidade de suas famílias. Era exatamente isso que lhe dava força para não cair. A vida de Maria valeu tanto que sua morte se tornou tão importante quanto. Maria era luz ma vida daqueles que viviam na escuridão. Maria era um anjo. Maria é vida. Uma história triste, mas com um final emocionante. Um começo a partir de um fim.
Mario Henrique
14/07/2024