Memo-desmemo-3-questão infantil

Sei que toda a memória é traição ao presente quase mais do que ao passado, porque ignoramos o futuro, logicamente, mas o passado dança na nossa memória entre nuvens, névoas, brêtemas e lôstregos, dúvidas e luzes ...

Uma memória torna-se-me em lôstrego quase de sombras e fogos cegadores ... Conto:

Devia eu de ter uns cinco anos. Na casa de meus avôs. Meu avô, lembro vagamente, barbeava-se ou talvez acabava de se vestir.

Veem? Sombras bretemosas atravessadas por lôstregos, raios de luz ou de sol, tímidos e acariciantes. Fruo hoje os agarimos, essas carícias inocentes das mães e das avós, que então me envolviam.

E da sombra ou dos lôstregos surgiu em mim a pergunta misteriosa ou violentamente nescia, passível sempre pela inocência que os adultos concedem aos meninos:

-Abuelito, si cumplo años rápidamente, cuándo te alcanzaré? (1)

Meus avôs riram a graça e, acho, mas não recordo, que tentaram convencer-me da impossibilidade que escondia a minha ousadia interrogativa. Ou talvez calaram, após rirem. Também não lembro se me refugiei nalgum recanto e continuei aquelas reflexões impossíveis até lhes dar alguma solução.

...

(1) A pergunta vai em castelhano, porque em castelhano a enunciei. Não em vão sou natural de Valhadolid (Spain). Toparemos em diante com mistérios maiores do que este.