Sobre o luto
Dois meses sem você, meu pai. Queria te contar tantas coisas... No dia da sua partida, o Flamengo ganhou de 6x1 do Vasco. Imaginei sua emoção assistindo ao jogo e a casa toda ouvindo sua narração: "Juiz ladrão! De onde isso é uma falta? Goooooool uhuuuu!", batendo palmas, todo eufórico no sofá, sem decidir se pulava ou ficava sentado. Foi uma verdadeira homenagem do Mengão ao seu maior e mais fiel torcedor.
Ontem, observando o céu às 23:00, fixei o olhar em uma estrela, que brilhava mais do que as outras. Me peguei sorrindo, lembrando de você, observando as estrelas no meio do quintal, apontando para a constelação de Orion, dizendo onde ficava a localização de Vênus e Marte. Várias foram as vezes que você colocou suas músicas, sentou na cadeira de balanço no quintal e as apreciou por um longo tempo, enquanto observava o céu. Esses dias ouvi que nós somos feitos da matéria das estrelas; penso que o que pulsava no seu peito, durante esse tempo, era a saudade do eterno, o ponto de partida do qual todos viemos e para onde retornaremos um dia.
Penso que quando um músico morre, toda a natureza faz um minuto de silêncio. Os olhos dos animais ficam entristecidos. Passarinhos entoam cantigas em honra daquele que tanto levava luz por onde passava. Toda a fauna e flora param por um instante, acompanhando aquela alma em direção à luz das estrelas.
Como vai fazer falta o seu sorriso! Suas piadas e a maneira singular de gargalhar: encolhendo os ombros e estreitando os olhos. O famoso ritual de sempre que era preciso nos dizer seu e-mail, uma piada surgia: "Meu e-mail é Jôooromao15…" e depois era o primeiro a rir das próprias gaiatices.
Lendo suas memórias de garoto, me deparei com um trecho onde você diz que seu sonho era ter um emprego, poder ajudar seus irmãos e sua mãe, e que eles pudessem te enxergar como o grande homem que era. Você conseguiu! Hoje toda a família se reúne para te enviar amor ao seu coração! Olha quantas pessoas te amam!
O grande homem que carregava na alma o menino sonhador que nasceu em uma casa de palha,pobrezinha, na batateira, e conseguiu cativar, com simplicidade e alegria, tantos corações por onde passava. Que você possa ter uma feliz eternidade ao lado de sua mãezinha que lhe fazia tanta falta e de Sullivan, que sei que você amaria ter acompanhado o crescimento dele também. Fico imaginando a emoção que foi esse reencontro.
Ficamos por aqui, meu pai, com o coração cheio de saudade. Olhe por nós aí de cima, viu!
Tomando a liberdade de fazer uma releitura da música do grande Nelson Gonçalves,eu digo:
Eu não sabia que doía tanto,
Um violão no canto
Um teclado vazio
Sem ti
Se eu soubesse o quanto doi a vida
Essa dor tão doída não doía assim
Naquela casa tá faltando ele
E a saudade dele tá doendo em mim!