🌺114🌺 - O SEGREDO DA MINHA AVÓ
Retirado do meu Álbum de Mémorias, hoje contarei da minha avó Dona Benzinha.
Poucas palavras sempre serão insuficientes e transbordariam a minha avó, que só caberia em um alfabeto inteiro. Nascida em uma pequena cidade rural, esposa de um fazendeiro, era uma bela mulher, alta e de porte elegante, personalidade autoritária que comandava toda a família com um simples olhar e nunca contrariada. O nome era Auta, porém tratada por Dona Benzinha (corruptela de benzinho), costume antigo de criarem sempre alcunhas como Jana, Cotinha, Maninha etc.
Vaidosa, famosa por sua beleza na juventude, talhava feito navalha conversas sobre idade – “Vamos parar com essas tolices?” Assunto afastado firmemente sem ninguém ousar contrariar. Aliás, contar da idade nunca pertenceu ao cotidiano na casa da minha avó, e até penso que os seus oito filhos, na maturidade, já desconheciam uns a idade dos outros. Idade perde a importância com a chegada dos anos.
O meu irmão mais velho foi o seu primeiro neto e afilhado e, aproveitando-se desse fato, minha avó nós ensinou a chamá-la de “Dinda Benzinha”, como se afilhados fossem todos os três filhos da minha mãe, livrando-se do indesejado “avó”, sinal de tempos corridos, traças que caminham sem permissão na linha da nossa vida. Com a chegada dos outros netos, ficou aceitável o título de avó. Porém, nós, só na sua velhice avançada a chamamos avó. Mesmo assim, ao pedir-lhe a benção, respeitávamos: “A benção Dinda!”
Contudo, tenho curiosa lembrança que o seu documento de Identidade nunca foi objeto de cofre, apesar de não ser, também, algo tão acessível, guardado em sua cômoda, sobre o que me ponho a matutar a verdade dos dados. Antigamente, em pequenas vilas e cidades interioranas o registro de nascimento era por declaração do pai, nem sempre com datas corretas. Há histórias que um determinado pai ao se dirigir à Comarca esqueceu as datas de nascimento e registrou todos os quatro filhos em igual dia.
Depois que minha avó deixou de ser nossa, mais dúvidas foram lançadas sobre a idade pela sobrinha Mercedes, filha do irmão Artur, afirmando categoricamente ter minha avó falecido aos 92 anos, posto que era mais velha dois anos que o seu pai. Este fato, tenho certeza absoluta ter causado desassossego e um franzir de cenho reprovador na face espiritual de Dona Benzinha.
Resultado, paira sobre as nossas carinhosas memórias a linda convicção de que nunca saberemos a idade real da minha avó e, mais, certeza tenho que ela não declarou quantos anos tinha para entrar no céu e ouço a sua voz firme e autoritária: ”Que conversa besta é essa São Pedro?!” O Porteito do Céu deve ter sorrido e permitido a entrada. Dona Benzinha não era fácil não!
Minha avó e os seus oito filhos, aniversário de “80” anos.