Aventura de bicicleta na década de 1950
No final da década de 1950, o Brasil ainda estava se desenvolvendo e muitas regiões, especialmente áreas rurais e pequenas cidades, mantinham-se intocadas pelo progresso. Foi nesse cenário que dois jovens aventureiros, Sinésio e Gerson, decidiram embarcar numa viagem memorável que marcaria suas vidas para sempre.
Era julho, tempo de férias escolares, e a reunião de jovens da igreja IPI Central de Campinas, em Jacutinga, Minas Gerais, prometia ser um evento importante. Movidos pelo espírito de aventura e pela amizade, Sinésio e Gerson decidiram fazer a viagem de bicicleta. Não eram bicicletas modernas com marchas e suspensões; eram simples bicicletas sem marchas, adequadas apenas para terrenos planos, mas cheias de história e prontas para uma nova.
Na madrugada do dia da partida, às 3 horas, os dois amigos saíram de Campinas. A cidade ainda dormia, e as ruas estavam silenciosas sob a luz da lua. Pedalavam com vigor, com a brisa fria da madrugada contra seus rostos, e a empolgação de quem começava uma grande aventura.
Às 8 horas da manhã, sentiram a necessidade de uma pausa. Pararam ao lado de uma pequena lagoa para descansar e comer um lanche. Ali, descobriram que estavam em Souzas, um quase-bairro de Campinas, percebendo que haviam pedalado em círculos durante horas. A decisão foi tomada de seguir pelos trilhos de uma pequena estrada de ferro, na esperança de evitar novos desvios.
As horas seguintes trouxeram novos desafios. Em determinado momento, Gerson, que pedalava na frente, não viu uma passagem inferior para gado e caiu, despencando cerca de três metros. A queda foi forte, mas felizmente Gerson sofreu apenas ferimentos leves. A bicicleta, porém, teve alguns raios da roda danificados. Usando a engenhosidade e recursos limitados, os dois improvisaram um conserto, desmontando outros raios para não deixar faltar raios contíguos.
Continuaram a jornada, enfrentando um incidente inusitado: uma abelha arapuá entrou no ouvido de Gerson. Essas abelhas não são venenosas, mas o ruído que fazem dentro do ouvido é insuportável. Sinésio, com improvisações dignas de um escoteiro, fez uma pinça de galhinhos e conseguiu retirar a abelha, permitindo que continuassem o trajeto.
Próximo ao meio-dia, chegaram a uma longa ponte de trem sobre um rio seco, com pedras expostas. A ponte, feita para trens, tinha apenas uma tábua estreita entre os trilhos para pedestres. Decidiram que, se um trem aparecesse, jogariam as bicicletas fora e se deitariam nos dormentes para salvar suas vidas. No meio da ponte, perceberam que faltavam algumas tábuas e tiveram que colocar as bicicletas em um trilho, andando cuidadosamente pelos dormentes e empurrando as bicicletas.
O trem apitou, e o coração de ambos disparou. Preparavam-se para jogar as bicicletas e deitar-se, quando perceberam que o trem estava parado em uma pequena estação, oculta por uma curva. Alívio e riso nervoso os acompanharam enquanto continuavam a pedalar.
Ao abandonar a ferrovia, enfrentaram as famosas montanhas de Minas Gerais. Subir com bicicletas pesadas e mochilas de 20 kg em estradas íngremes e pedregosas era um desafio hercúleo. Com todos os atrasos, começou a escurecer, e encontraram uma fazenda onde pediram abrigo. Foram acolhidos com hospitalidade e permitidos a descansar em um armazém, além de se saciarem com muitas laranjas colhidas na fazenda.
Finalmente, após mais de 16 horas de jornada e exaustão, chegaram a Jacutinga e encontraram o local da convenção. A viagem, que deveria durar cerca de 5 a 6 horas em condições normais, tornou-se uma épica de resistência, amizade e improviso. Anos mais tarde, essa aventura ainda seria lembrada, especialmente porque Sinésio acabou se casando com a irmã de Gerson, solidificando ainda mais os laços criados nessa jornada inesquecível.