Paz em mim
A primeira vez em que foi abandonada, escolheu entre ficar e partir. E partiu.
A segunda vez em que foi abandonada, escolheu entre crescer ou morrer. Escolheu crescer, enquanto todos diziam que você estava fazendo uma escolha errada, mas ali, você já não poderia mais voar.
As outras muitas vezes, nem sequer foi escolhida para poder ser abandonada. Viveu de migalhas, de esperanças vazias. O fardo era pesado demais.
A terceira vez. Você não acreditou que era possível, mas foi escolhida até o final. Até o final. Você precisou gritar para que ele fosse embora. Afinal, quando ele ficava, te fazia sangrar.
A última vez. Ainda aos cacos. Você se permitiu ser escolhida. E acredita que não será abandonada. Mas tudo parece soprar os medos em seu ouvido.
Quando sua mãe te diz para parar, para ser leve, para não ser professora, militante, porque ninguém gosta disso o tempo todo, eu me pergunto: o que sobra de mim? O que sobra do outro em mim? Se eu estou em um lugar tão grande de privilégio, porque ninguém escolhe trilhar os mesmos caminhos que eu?
A última vez. Será a última. Você não consegue mais ser abandonada. Não consegue mais se diminuir para caber em lugar nenhum. Para caber em peitos que te querem mansa, feminina, gentil.
Afinal, suas contas estão ai, e se você abrir mão, vai sobreviver de que?
Não sabe mais como ser uma versão sustentável de você.
Haverá uma paz em algum lugar?
Haverá um minuto de valor pelo que você é? Quando nem o que você faz é o bastante.
Haverá amor para você?