O RAPAZ DO CHAPÉU...

A estação ferroviária deserta. O normal, dado a hora avançada. Não me preocupei em confirmar o horário do comboio seguinte. Sentei-me, abri o livro na página marcada e tudo ao redor desapareceu. Até que ouço o toque, desafinado, de uma flauta. Um rapaz, com ar de cowboy, mas sem chapéu, tocava para mim. Não estava ali mais ninguém. Continuei a leitura. O rapaz continuou a desafinar. Olhei, de relance, à procura do chapéu que lhe faltava na cabeça, para depositar umas moedas e talvez ele mudasse de poiso. Não havia chapéu. Guardei o livro e aproximei-me. Fez-me duas perguntas, se tinha um cigarro e que livro estava a ler. Dei-lhe o cigarro e mostrei-lhe o livro: "A Redundância da Coragem" de Timothy Mo. Fiz-lhe um resumo da história. Ele gostou e lamentou a improbabilidade de vir a conhecer o final. Num gesto altruísta passei-lhe o livro para a mão. É um empréstimo, disse-lhe. De hoje a 15 dias, à mesma hora, vou estar aqui. E passados 15 dias também. E dificilmente aqui retornarei.

A estação ferroviária deserta. O normal, dado a hora avançada. Não me preocupei em confirmar o horário do comboio seguinte. O som de uma flauta, o rapaz, com ar de cowboy, mas sem chapéu, tocava para mim. Aproximou-se, pediu-me um cigarro. E devolveu-me o livro.

Paula de Eloy
Enviado por Paula de Eloy em 03/03/2024
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