O homem cavalo
Naqueles anos dourados, entre 1970 e 1980, em um cenário repleto de histórias e mistérios, havia um personagem singular que cavalgava em São Paulo, Bom Retiro, Lapa, Osasco, chegando a Barueri e seguindo na sua romaria. Ele se tornara uma figura enigmática, conhecido por todos como “O homem cavalo”.
Vestindo suas calças desgastadas, ele caminhava pelas ruas com um longo rabo de cavalo preso na parte traseira, imitando os movimentos graciosos e majestosos de um equino. Seus passos eram marcados pelo som peculiar de um relincho, uma imitação imperfeita, mas cheia de uma autenticidade cativante.
Sua presença causava alvoroço entre os moradores do bairro. As crianças, curiosas e ávidas por aventuras, não conseguiam evitar olhar com admiração e curiosidade. Quem era aquele rapaz? Por que ele escolhera adotar tal comportamento? O que teria levado alguém a se tornar um equino em forma humana?
As respostas para essas perguntas eram tão misteriosas quanto o próprio rapaz do rabo de cavalo. Meu pai, com seu jeito de contador de histórias, compartilhou uma versão intrigante. Segundo ele, o rapaz fora um jovem brilhante, dedicado aos estudos, mas sua busca incessante pelo conhecimento o levara a um desequilíbrio mental. Ele se tornara uma espécie de "burro", termo utilizado para descrever aqueles que perdiam a sanidade.
Essa versão, contada por meu pai com um tom de seriedade, mexia com a imaginação dos meus amigos e com a minha própria. Surgiam dúvidas e questionamentos sobre os limites do conhecimento e o preço que se poderia pagar por uma mente ávida por aprendizado.
Porém, a história do rapaz do rabo de cavalo ia além das suposições de meu pai. Diziam que ele mesmo arrancara o rabo de um cavalo encontrado morto nas redondezas, como se buscasse uma conexão com a força e a liberdade daqueles majestosos animais. Outros diziam que foi praga de mãe.
O fato é que ele usava um rabo autêntico fixo no cinto e às vezes aparecia com uma cela no lombo. Era uma figura estranha, mas dócil e de boa aparência. Despertava medo e ao mesmo tempo a curiosidade de todos que o observavam cavalgar pelas ruas empoeiradas. Seu passado permanecia envolto em segredos. Ninguém sabia onde ele vivia, quem eram seus pais ou se tinha uma família que o acolhesse. Ele era uma figura solitária, que se tornou parte do cenário do bairro, percorrendo ruas de terra e casas empoeiradas, deixando uma marca indelével na memória das crianças e jovens daquela época.
As histórias que giravam em torno do rapaz do rabo de cavalo eram como fragmentos de uma mitologia local. Elas se entrelaçavam com o cotidiano da comunidade, despertando uma mistura de fascínio e compaixão. Ele representava o enigma da existência humana, com seus caminhos inusitados e imprevisíveis.
Os anos se passaram, e as ruas evoluíram, transformando-se em asfalto e prédios modernos. A infância deu lugar à maturidade, mas a figura do rapaz do rabo de cavalo permaneceu como uma lembrança recheada de mistério.