LETRAMENTO VISUAL: A COMPETÊNCIA LEITORA EM FOCO

Nos últimos trinta anos, as discussões atinentes ao Letramento proliferaram-se consideravelmente. Consoante Soares (1998), uma vasta quantidade de autores brasileiros advindos de uma gama de campos de estudos – Ciências da Linguagem [Linguística], Ciências da Educação [Pedagogia] etc. – tem se debruçado sobre essa temática, produzindo, assim, novos paradigmas para o cenário educacional. Nos anos de 1980, os trabalhos acadêmicos sobre a temática do Letramento brotam em uma grande diversidade de países europeus e em países da América Anglo-Saxônica. Aqui, no Brasil, esses trabalhos irrompem no ano de 1986. Autoras, como Mary Kato, Leda Verdiani Tfouni, Magda Becker Soares, Ângela Del Carmen Bustos Romero de Kleiman e Roxane Helena Rodrigues Rojo são grandes responsáveis pela propagação das Teorias do Letramento nas universidades brasileiras e nas mais diversas secretarias de educação dos estados brasileiros (SOARES, 1998).

Entretanto, inicialmente, o conceito de Letramento abarcava apenas as competências linguísticas da leitura e da escrita. Nessa perspectiva, a noção de Letramento estava diretamente atrelada ao ato de lançar mão das ferramentas linguísticas da leitura e da escrita em uma perspectiva de cunho social. O propósito, aqui, era romper/ quebrar com as práticas pedagógicas, que limitavam o uso dessas competências linguísticas à condição de meras atividades escolares. De acordo com Perrusi & Calland Rosa (2005), nas unidades escolares brasileiras, o ensino da leitura e da escrita se limitava ao contexto educacional, isto é, aos propósitos escolares, erradicando, dessa maneira, as práticas sociais.

Na visão de Dionísio (2011), nos dias atuais, em face da disseminação/ propagação das Tecnologias da Comunicação e da Informação – TICs e do brotar de uma gama de estudos acadêmicos, surgiram algumas modificações no conceito de Letramento. Tais modificações transcendem a perspectiva da limitação às ferramentas linguísticas da leitura e da escrita, englobando, desse modo, diversificados tipos de letramento. Emerge, portanto, a noção de Múltiplos Letramentos. É, nesse contexto, que se fala em Letramento Digital, Letramento Literário e, sobretudo, Letramento Visual. Este último, objeto de estudo deste texto. Todos esses tipos de letramento, agora, transcendem a perspectiva do uso da leitura e da escrita enquanto tarefas escolares, abrangendo, com isso, a realidade circundante (PERRUISI & CALLAND ROSA, 2005).

Quando falamos, aqui, em estudos acadêmicos que contribuíram para o brotar de mudanças na noção de Letramento, referimo-nos, nesse ponto, aos postulados da Teoria da Semiótica e/ ou Semiologia Social, que trazem à tona o conceito de Multimodalidade. No dizer de Dionísio (2005; 2011), a Multimodalidade refere-se às mais distintas formas e modos de representação utilizados na construção de uma dada mensagem, tais como: palavras, imagens cores, formatos, marcas/ traços tipográficos, disposição da grafia, gestos, padrões de entonação etc. (DIONÍSIO, 2005; 2011). A multimodalidade engloba, portanto, a escrita, a fala e a imagem. No entanto, neste texto, detemo-nos à multimodalidade visual, que resulta de arranjos imagéticos construídos linguisticamente por duas ou mais formas de representar uma mensagem, transcendendo, com isso, a primazia dada

à palavra.

Tendo como pano de fundo esse contexto paradigmático, emergem as discussões concernentes ao Letramento Visual, que diz respeito à competência leitora visual e/ ou imagética. Na ótica de Silvino (2012), o Letramento Visual pode ser definido como a construção de efeitos de sentido, a partir de textos imagéticos. Isto é, textos construídos com base na linguagem não-verbal, em alguns casos, a partir da mescla da linguagem escrita e imagética. Nesse tipo de letramento, a produção de sentido se dá, por intermédio da percepção dos mais diversos traços semióticos do texto. Ora, o leitor deve atentar para os mais diversos aspectos e marcas textuais materializados no texto, como, por exemplo, ilustrações, cores, formatos, formas, disposição, elementos tipográficos etc. (DIONÍSIO, 2005; SILVINO, 2012). O leitor, então, vai lançar mão da sua percepção, atentando, desse modo, para os mais diversos elementos multissemióticos materializados na construção linguística de um gênero textual e, a partir desse ato, atribuir/ elaborar sentido. Essa nova perspectiva recebe o nome de Leitura Semiótico-discursiva.

Nessa direção, Dionísio (2011) postula que escrita e imagem são postas em uma perspectiva de articulação/ junção, em face do propósito de contribui para o processamento textual por parte do leitor. Ora, uma dada mensagem pode ser construída com base na linguagem imagética, ou melhor, com base na articulação/ integração do plano verbal e visual. Esses diferentes modos de construir/ representar uma dada informação ocasionam alterações na forma como as pessoas constroem/ atribuem sentido face o texto, o que, por conseguinte, ocasiona o brotar de uma nova competência de leitura - Competência Leitora Imagética e/ ou Visual.

Para concluirmos esta escrita, recorremos à fala de Dionísio (2011, p. 138), que diz que, “na atualidade, uma pessoa letrada deve ser alguém capaz de atribuir sentidos a mensagens oriundas de múltiplas fontes de linguagem”. Partindo dessa perspectiva, na sociedade contemporânea, a competência leitora é algo de fundamental importância e como tal deve abrangem suas múltiplas modalidades. Em outras palavras, nessa sociedade marcada pela constante proliferação das Tecnologias da Informação e da Comunicação - TICs, as pessoas devem estar aptas a compreender, ou melhor, a elaborar sentido e significação face os mais diversos tipos de textos construídos com base nas mais distintas modalidades da linguagem [escrita, oral e, sobretudo, não-verbal/ imagética] (DIONÍSIO, 2011). Tal postura reflete a essência da perspectiva do Letramento Visual.

Referências

BRANDAO, A. C. P. (Org.) ; CALLAND ROSA, E. (Org.) . Leitura e produção de textos na alfabetização. Belo Horizonte: Autentica, 2005.

DIONISIO, A. P. . Gêneros Textuais e Multimodalidade. In: KARWOSKI, A. M. ; GAYDECZKA, B. ; BRITO, K. S. (Org.) . Gêneros textuais: reflexões e ensino. São Paulo: Parábola Editorial, 2011.

_____. Multimodalidade discursiva na atividade oral e escrita (atividades). In: MARCUSCHI, L. A. ; DIONISIO, A. P. (Org.) . Fala e Escrita. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.

SANTOS, C. F.. As representações da escrita e seu ensino por professores das séries iniciais. Letras (UFSM) online, v. 22, p. 85-106, 2012.

_____. Letramento e ensino de História: os gêneros textuais no livro didático de História. In: Anais do 4º Simpósio Internacional de Estudos de Gêneros Textuais, Universidade do Sul de Santa Catarina, Tubarão, Santa Catarina, 2007.

_____. Formação em Serviço do Professor e as Mudanças no Ensino de Língua Portuguesa. Educação Temática Digital - ETD, Campinas, SP, vol.3, nº. 2, p.27-37, jun. 2002a.

_____. O ensino da leitura e a formação em serviço do professor. Teias, Rio de Janeiro, ano 3, v. 05, n. jan/jun, p. 29-34, 2002b.

SILVA, S. P.. Pedagogia da Leitura: o que mudou nos últimos trinta anos?. Querubim, v. n.º 21, p. 130-137, 2013a.

_____. Concepções de Linguagem e Fazer Docente: um olhar sobre as práticas pedagógicas do ensino da leitura. Urutágua, v. n.º 28, p. 39-53, 2013b.

_____. Didática do Ensino da Língua: Concepções de Linguagem e Práticas Docente de Leitura e Escrita. ArReDia, v. 1, n.º 1, p. 63-82, 2012.

SILVA, S. P.; LUNA, T. S.. Da decodificação à construção de sentido: concepções de leitura subjacentes aos livros didáticos de língua portuguesa e adotados pela secretaria de educação do estado de Pernambuco (1979-2012). Olh@res, v. 1, n. 2, p. 365-388, 2013a.

_____. Da decodificação ao sentido: concepções de leitura subjacentes aos livros didáticos de língua portuguesa e adotados pela secretaria de educação do estado de Pernambuco (1979-2012). In: Anais do XXI Encontro de Pesquisa Educacional do Norte e Nordeste - EPENN, 2013, Recife - PE, 2013b.

SILVA, S. P. et al.. Francisca Julia e a Inserção da Mulher no Campo Literário: um Intermédio entre o Parnasianismo e o Simbolismo. Raído, v. 5, n. 10, p. 405-427, 2012a.

SILVA, S. P. et al.. Mudanças Didáticas no Ensino da Leitura: uma análise das habilidades de leituras requeridas pelo Prova Brasil e pelo Saeb no Ensino Fundamental/ Médio. Travessias (UNIOESTE. Online), v. 6, p. 01-31, 2012b.

SILVINO, F. F.. Letramento Visual. In: Anais dos Seminários Teóricos Interdisciplinares do SEMIOTEC – I STIS, 2012. Disponível em: http://www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/stis/article/view/2116/2714. Acesso em: 18 ago. 2013.

SOARES, M. B.. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 1998.