Motivos para se considerar o ensino de Língua Portuguesa como uma fraude utópica
O ensino de Língua Portuguesa é um fracasso no Brasil, conforme muitas pesquisas já divulgaram e de acordo com o que muitos estudiosos da língua já observaram. É um sonho, uma fantasia para os PCN's, mas uma mentira na prática escolar. Vários podem ser os motivos disso, mas acredito eu que essa defasagem se dê principalmente à falta de foco das instituições nos estudos da linguagem. Os Parâmetros Curriculares Nacionais trazem questões bastante interessantes para o ensino de língua, porém ela ainda se deixa perturbar pelo fantasma da norma-padrão, por vezes tão rasa e supérflua que não efetiva o processo ensino-aprendizagem de forma coerente. Isso faz com que muitos mostrem aversão ao Português e que a sociedade, +/- 70% analfabeta funcional, não tenha o grau de letramento desejado pelas grandes camadas sociais. Abaixo, cito alguns dos motivos que, na minha visão, fazem com que o ensino de LP se caracterize como fraude e utopia, não surtindo bons efeitos nas instituições de ensino:
* A escola quer ensinar uma língua que já possuímos
Em palavras mais requintadas, não se adquire um conhecimento que já se tem internalizado. Até onde eu sei, ninguém vai à escola aprender a falar Português, porque já o faz. O contato com a linguagem ocorre muito antes do que se pode imaginar. O que vamos aprender são regras, e elas não são capazes de explicar todo o fenômeno da língua. É clichê, mas aquilo que dizem é verdade: para toda a regra há exceção. E são essas exceções que deveriam ser ensinadas, ou melhor, estudadas, analisadas, argumentadas entre os professores e os alunos, porque a língua, como ciência, não apenas se aprende, se estuda, se critica.
* A escola nos ensina uma língua que parece estar distante do nosso Português brasileiro
É justamente aí que mora o problema! O que aprendemos não é diretamente nosso; advém do estudo de gramáticos do Português Oficial, ou seja, o de Portugal! As gramáticas portuguesas tentam reunir em regras os fenômenos linguísticos, só que de forma bastante falha, porque, obviamente, são muito rasas e fazem o polo oposto da Linguística. Exemplo de como essa Língua portuguesa se dá é no ensino do conteúdo surreal de colocação pronominal. Irritantemente, se ouve (ou "ouve-se", como preferem, rs) que não se pode iniciar frase com pronome. Isso é uma convenção deles, devido à peculiaridade de sua fala, mas para nós, é um absurdo, sendo que o natural do brasileiro é dizer Me dê (ou "me dá") um pedaço do seu lanche ao invés de Dê-me um pedaço do seu lanche. E, só pra constar, o que é cabível para eles pode não ser para nós, em nossa diversidade linguística. Convenhamos, soa muito estranho falar assim e, na escrita, chega a ser cômico! Ah, e certamente, alguém deve estar se contorcendo vendo o meu pra sublinhado logo acima. Sim, o certo deveria ser "para", né? Pros portugueses, pois lá, até mesmo na fala, eles enunciam assim; nós não. Não falamos Português, falamos Brasileiro. Nosso Português não é o europeu, mas sim o brasileiro. Novamente digo, devemos estudar as variações, os fenômenos, as possibilidades da nossa língua, que é muito mais rica e viva do que aquela da época de Camões (também português...).
* O professor finge que ensina e o aluno finge que aprende
Muitos dos profissionais da educação, que se formaram em Letras, usam da gramática normativa para ensinar os seus alunos, e aí adentram muito na noção de certo e errado. Volta e meia os estudantes são corrigidos e até mesmo punidos por suas variações linguísticas, num preconceito tão grande do educador que chega a se transmitir como vírus na sociedade, passando de um para o outro, fazendo com que até mesmo os colegas de classe se corrijam. O profissional diz que o sujeito é o termo essencial da oração, sem comentar que, às vezes, ele não existe. Orgulhosamente, fecha a gramática, acreditando que ensinou, e o aluno, frustradamente, estuda para a prova, decorando esse conceito e se esquecendo logo adiante, porque isso não lhe coube em todas as suas situações de uso, não lhe fez sentido. Apenas para a prova. Por um minuto, ele até pensou que aprendeu.
* A gramática é um corpo morto
Certamente, poucos se dão conta, mas, nas aulas de Língua Portuguesa, estudam um pouco de anatomia. Dissecamos o corpo morto da gramática para tentar compreender a linguagem, que é viva e está em movimento. Tentamos utilizar aquilo que já é inútil e que não serve para mais nada na promoção do conhecimento. Pois é, é ela que aprendemos na escola. Quando um professor explica um conteúdo gramatical, se baseou diretamente naquilo que foi escrito. Algo curioso, por exemplo, é que a gramática não sofreu tantas alterações assim desde sua primeira aparição. A Grammatica de Lingoagem Portuguesa, de Fernão de Oliveira, desde o século XVI continua influenciando outras, "modernas". Com isso, as aulas de Português se transformam, de certa forma, em aulas de História, pois professores e alunos, sem perceber, trabalham como se tivessem estudando a anatomia de uma múmia.
* A gramática não é uma ciência
O que se ensina nas aulas de Português, a não ser gramática, muitas das vezes? Quando nos referimos a linguagens, não estamos falando de ciência exata, mas há quem esquece disso. Como toda ciência humana, alguns tantos conceitos da gramática devem no mínimo ser objetos passíveis de argumentação e análise crítica, pois ela é tão limítrofe que aborda somente o básico. E se ciência é tudo aquilo que se promove por meio da pesquisa e da observação, esse manual não pode se conceber como tal, pois é incapaz de explicar todos os fenômenos da língua. Toda ciência tem um ponto de partida e um de chegada e, nesse meio tempo, a análise de progressos, para observação, contestação e argumentação. O ponto de partida da gramática, vamos supor, seja o substantivo abstrato. O ponto de chegada é dizer que nome de países se classificam como concreto. Por quê? Somente porque sim, porque alguém quis assim! Que estudo, que progresso, que análise, que levantamento de dados teve nisso? Como concebê-la como ciência? Seu rival, a Linguística, sim é ciência. Saindo do mesmo ponto de partida, ela poderá refutar esse resultado (que saiu do nada!!!!!) a que chegou a gramática.
* O ensino de Língua Portuguesa, muitas vezes, é a fonte do preconceito linguístico
Se alguém ousa a enunciar "truxe", ao invés de "trouxe", "talba", no lugar de "tábua", pronunciar "rúbrica", no lugar de "rubrica", o mundo acaba. Lá vai o professor e corrige. O Word também me corrigiu agora. :( Ah, o que dizer então das gírias, da variação dos adolescentes? Isso percorre por fora da escola também, com a influência uma vez tida por esses mesmos educadores que um dia lhes deram aula, fazendo com que uns corrijam aos outros, dizendo qual a forma correta de falar, quando, na verdade, o que importa mesmo é a comunicação efetiva dos falantes. A mídia, só pra constar, também faz isso. A fonte de qualquer preconceito é a ignorância. Há preconceito com gays, negros e por aí vai, pois são diferentes e não seguem os "padrões". Com a gramática, ocorre a mesma coisa: há preconceito com o falar diferente, porque aquele padrão embalsamado parece ser único, privilegiado pelos que se julgam falar o culto, o correto. Ocorrendo isso, ignoram-se as variações históricas, geográficas, sociais, situacionais, etc., todo o movimento natural e comum de qualquer língua.
* Questões por vezes mais interessantes perdem o foco para os estudos gramaticais
Muitas alunos apresentam problemas de escrita durante a fase escolar e até mesmo depois de formados no Ensino Médio. Ingressam em cursos superiores carregando consigo as mesmas dificuldades. Isso porque, na escola, o tempo que se dedica para o estudo de regras gramaticais é enorme, e os livros didáticos contribuem com o equívoco, uma vez que se propõem a elevar em suas páginas a norma-padrão (muitas vezes incabível) do que propor estudos e análises de gênero textual, interpretação, leitura, escuta, escrita e fala (quatro habilidades no ensino de LP, segundo os PCN's). A prioridade passa a ser, então, a análise linguística (ou melhor, gramatical) do Português que se diz oficial. Não digo que aprender gramática não seja importante, alguns pontos até são, mas a escola, como maior espaço de letramento na sociedade, deveria se propor à abordagem e à adaptação da realidade e do conhecimento trazido por seu público-alvo, seus alunos, acolhendo e trabalhando a diversidade, sem excluí-la.
Certamente, há muitos outros pontos a se discutir. Esses, até mesmo na minha prática profissional, vejo como os mais predominantes. Não serei hipócrita em dizer que não me encaixo em algum desses aspectos discutidos acima. Infelizmente, me ocorre também, e é por isso que eu digo que o ensino de Língua Portuguesa é um vírus desgraçado que te carcome aos poucos e, quando menos se espera, você se deixou infectar um pouco. Porém, é preciso que reflitamos sobre o que estamos fazendo de diferente com a nossa tão rica língua (não a de Camões, mas a de Manuel Bandeira, a "Língua certa do povo / Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil"), se, claro, buscamos por mudanças. O nome da disciplina ("Língua Portuguesa"), em si, já é um erro àqueles que pensam como eu. Por que não poderia ser mudada para "estudos linguísticos"? É necessário viabilizar mais clareza e utilidade a essa importante disciplina!
* A escola quer ensinar uma língua que já possuímos
Em palavras mais requintadas, não se adquire um conhecimento que já se tem internalizado. Até onde eu sei, ninguém vai à escola aprender a falar Português, porque já o faz. O contato com a linguagem ocorre muito antes do que se pode imaginar. O que vamos aprender são regras, e elas não são capazes de explicar todo o fenômeno da língua. É clichê, mas aquilo que dizem é verdade: para toda a regra há exceção. E são essas exceções que deveriam ser ensinadas, ou melhor, estudadas, analisadas, argumentadas entre os professores e os alunos, porque a língua, como ciência, não apenas se aprende, se estuda, se critica.
* A escola nos ensina uma língua que parece estar distante do nosso Português brasileiro
É justamente aí que mora o problema! O que aprendemos não é diretamente nosso; advém do estudo de gramáticos do Português Oficial, ou seja, o de Portugal! As gramáticas portuguesas tentam reunir em regras os fenômenos linguísticos, só que de forma bastante falha, porque, obviamente, são muito rasas e fazem o polo oposto da Linguística. Exemplo de como essa Língua portuguesa se dá é no ensino do conteúdo surreal de colocação pronominal. Irritantemente, se ouve (ou "ouve-se", como preferem, rs) que não se pode iniciar frase com pronome. Isso é uma convenção deles, devido à peculiaridade de sua fala, mas para nós, é um absurdo, sendo que o natural do brasileiro é dizer Me dê (ou "me dá") um pedaço do seu lanche ao invés de Dê-me um pedaço do seu lanche. E, só pra constar, o que é cabível para eles pode não ser para nós, em nossa diversidade linguística. Convenhamos, soa muito estranho falar assim e, na escrita, chega a ser cômico! Ah, e certamente, alguém deve estar se contorcendo vendo o meu pra sublinhado logo acima. Sim, o certo deveria ser "para", né? Pros portugueses, pois lá, até mesmo na fala, eles enunciam assim; nós não. Não falamos Português, falamos Brasileiro. Nosso Português não é o europeu, mas sim o brasileiro. Novamente digo, devemos estudar as variações, os fenômenos, as possibilidades da nossa língua, que é muito mais rica e viva do que aquela da época de Camões (também português...).
* O professor finge que ensina e o aluno finge que aprende
Muitos dos profissionais da educação, que se formaram em Letras, usam da gramática normativa para ensinar os seus alunos, e aí adentram muito na noção de certo e errado. Volta e meia os estudantes são corrigidos e até mesmo punidos por suas variações linguísticas, num preconceito tão grande do educador que chega a se transmitir como vírus na sociedade, passando de um para o outro, fazendo com que até mesmo os colegas de classe se corrijam. O profissional diz que o sujeito é o termo essencial da oração, sem comentar que, às vezes, ele não existe. Orgulhosamente, fecha a gramática, acreditando que ensinou, e o aluno, frustradamente, estuda para a prova, decorando esse conceito e se esquecendo logo adiante, porque isso não lhe coube em todas as suas situações de uso, não lhe fez sentido. Apenas para a prova. Por um minuto, ele até pensou que aprendeu.
* A gramática é um corpo morto
Certamente, poucos se dão conta, mas, nas aulas de Língua Portuguesa, estudam um pouco de anatomia. Dissecamos o corpo morto da gramática para tentar compreender a linguagem, que é viva e está em movimento. Tentamos utilizar aquilo que já é inútil e que não serve para mais nada na promoção do conhecimento. Pois é, é ela que aprendemos na escola. Quando um professor explica um conteúdo gramatical, se baseou diretamente naquilo que foi escrito. Algo curioso, por exemplo, é que a gramática não sofreu tantas alterações assim desde sua primeira aparição. A Grammatica de Lingoagem Portuguesa, de Fernão de Oliveira, desde o século XVI continua influenciando outras, "modernas". Com isso, as aulas de Português se transformam, de certa forma, em aulas de História, pois professores e alunos, sem perceber, trabalham como se tivessem estudando a anatomia de uma múmia.
* A gramática não é uma ciência
O que se ensina nas aulas de Português, a não ser gramática, muitas das vezes? Quando nos referimos a linguagens, não estamos falando de ciência exata, mas há quem esquece disso. Como toda ciência humana, alguns tantos conceitos da gramática devem no mínimo ser objetos passíveis de argumentação e análise crítica, pois ela é tão limítrofe que aborda somente o básico. E se ciência é tudo aquilo que se promove por meio da pesquisa e da observação, esse manual não pode se conceber como tal, pois é incapaz de explicar todos os fenômenos da língua. Toda ciência tem um ponto de partida e um de chegada e, nesse meio tempo, a análise de progressos, para observação, contestação e argumentação. O ponto de partida da gramática, vamos supor, seja o substantivo abstrato. O ponto de chegada é dizer que nome de países se classificam como concreto. Por quê? Somente porque sim, porque alguém quis assim! Que estudo, que progresso, que análise, que levantamento de dados teve nisso? Como concebê-la como ciência? Seu rival, a Linguística, sim é ciência. Saindo do mesmo ponto de partida, ela poderá refutar esse resultado (que saiu do nada!!!!!) a que chegou a gramática.
* O ensino de Língua Portuguesa, muitas vezes, é a fonte do preconceito linguístico
Se alguém ousa a enunciar "truxe", ao invés de "trouxe", "talba", no lugar de "tábua", pronunciar "rúbrica", no lugar de "rubrica", o mundo acaba. Lá vai o professor e corrige. O Word também me corrigiu agora. :( Ah, o que dizer então das gírias, da variação dos adolescentes? Isso percorre por fora da escola também, com a influência uma vez tida por esses mesmos educadores que um dia lhes deram aula, fazendo com que uns corrijam aos outros, dizendo qual a forma correta de falar, quando, na verdade, o que importa mesmo é a comunicação efetiva dos falantes. A mídia, só pra constar, também faz isso. A fonte de qualquer preconceito é a ignorância. Há preconceito com gays, negros e por aí vai, pois são diferentes e não seguem os "padrões". Com a gramática, ocorre a mesma coisa: há preconceito com o falar diferente, porque aquele padrão embalsamado parece ser único, privilegiado pelos que se julgam falar o culto, o correto. Ocorrendo isso, ignoram-se as variações históricas, geográficas, sociais, situacionais, etc., todo o movimento natural e comum de qualquer língua.
* Questões por vezes mais interessantes perdem o foco para os estudos gramaticais
Muitas alunos apresentam problemas de escrita durante a fase escolar e até mesmo depois de formados no Ensino Médio. Ingressam em cursos superiores carregando consigo as mesmas dificuldades. Isso porque, na escola, o tempo que se dedica para o estudo de regras gramaticais é enorme, e os livros didáticos contribuem com o equívoco, uma vez que se propõem a elevar em suas páginas a norma-padrão (muitas vezes incabível) do que propor estudos e análises de gênero textual, interpretação, leitura, escuta, escrita e fala (quatro habilidades no ensino de LP, segundo os PCN's). A prioridade passa a ser, então, a análise linguística (ou melhor, gramatical) do Português que se diz oficial. Não digo que aprender gramática não seja importante, alguns pontos até são, mas a escola, como maior espaço de letramento na sociedade, deveria se propor à abordagem e à adaptação da realidade e do conhecimento trazido por seu público-alvo, seus alunos, acolhendo e trabalhando a diversidade, sem excluí-la.
Certamente, há muitos outros pontos a se discutir. Esses, até mesmo na minha prática profissional, vejo como os mais predominantes. Não serei hipócrita em dizer que não me encaixo em algum desses aspectos discutidos acima. Infelizmente, me ocorre também, e é por isso que eu digo que o ensino de Língua Portuguesa é um vírus desgraçado que te carcome aos poucos e, quando menos se espera, você se deixou infectar um pouco. Porém, é preciso que reflitamos sobre o que estamos fazendo de diferente com a nossa tão rica língua (não a de Camões, mas a de Manuel Bandeira, a "Língua certa do povo / Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil"), se, claro, buscamos por mudanças. O nome da disciplina ("Língua Portuguesa"), em si, já é um erro àqueles que pensam como eu. Por que não poderia ser mudada para "estudos linguísticos"? É necessário viabilizar mais clareza e utilidade a essa importante disciplina!