NEM UM POUCO

não quero nem um pouco

nem duas colheres

de sopa

da vida destes homens e mulheres

cuja vida escrita na roupa

se resume à comida de sempre no prato

e à palidez duma foto 3x4

não quero nem um pouco

nem duas colheres

de chá

da dor destes homens e mulheres

que andam pra lá e pra cá

entre o aperto da condução

e o conforto mentiroso da televisão

o que eu quero

é esfregar a essência

na cara daqueles

que querem controlar a existência

não quero nem um pouco

nem duas colheres

de café

da dúvida destes homens e mulheres

que não sabem onde botar os pés

porque não há certeza de chão

nem amanhecer para a escuridão

não quero nem um pouco

nem duas colheres

de sobremesa

da vida desses homens e mulheres

jogados na correnteza

seja rio ou mar

não há como não se afogar

o que eu quero

é esfregar a essência

na cara daqueles

que querem controlar a existência