"Anos Irresponsaveis" cap 17
Capitulo17
“NOITE VELOZ”
Estacionamos em frente à escola e seis jovens desorganizados e barulhentos se espremeram dentro do carro.
- meu deus o que é isso?!?- exclamou meu tio enquanto assistia as cotoveladas e pontapés dos que tentavam se acomodar no banco traseiro.- ei por que o nanico magrelo não vai no colo dessa tia gordona?- perguntou ele sem se preocupar com as palavras.
Aline e o Mauricio olharam para ele de cara feia e os outros deram risadinhas.
- E esse ai, com cara de viado.-continuou ele.- pode ir no seu colo né Anne?
David fechou a cara e o William, o Rafael e a Lara se dobraram de rir.
- E esse palerma de dentes grandes no colo dessa franga cor de rosa.- continuou ele.- assim só ficaria ai atrás à tia gorda, esse balofo metido a motoqueiro e a franga rosa.
Caímos na gargalhada.
Mas assim se fez.
No caminho conversamos.
- como vocês fizeram?- perguntei ao bando de uma maneira significativa que meu tio não entendesse, pois ele achava que todos ali tinham autorização dos pais, mas é claro que isso não existia.
- Usamos o truque do sono.- respondeu a Aline bem disfarçada.
- Ah...
- O que quer dizer?- perguntou Mauricio tonto.
- O TRUQUE DO SONO.-repetiu Lara fazendo um sinal explicativo com as sobrancelhas.
- Não sei o que quer dizer.-respondeu ele.
- O TRUQUE Mauricio.- disse Rafael impaciente.
- Ah ta, a nossa mentira...
PÁ!PÁ!PÁ!
seis mãos despejaram cascudos na cabeça do...
- IMBECIL!- isso diz tudo.
- O que significa isso exatamente?- quis saber meu tio quando paramos no semáforo.
- Não é nada querido tio.- respondi falsamente e dei uma olhada de esguelha para o Mauricio que dizia “seu idiota, você vai ver”.
E assim seguimos viagem por umas três horas, passando por rodovias movimentadas, lugares bonitos e bairros boca lixo que mais pareciam um imenso curtiço. Não tínhamos idéia de onde meu tio nos levava, mas estávamos super animados e não calamos a boca nem mesmo quando nos perdemos e ele berrou: “ah, seus pestinhas, calem essas bocas! estou tentando me localizar!”.
Quando nos “achamos” no mapa continuamos a viagem por mais um tempo até chegar em uma estrada no meio do nada que levava a lugar algum, e que tinha muito pouco movimento de carros. Estávamos no quilometro 140 da estrada quando meu tio pegou a direita, entramos num trecho cheio de arvores que tapavam quase toda a visão, e por um momento eu e minha turma pensamos que estávamos indo para um encontro com o Tarzan.
Mas eis que de repente começamos a ouvir uma musica distante e as arvores sumiram quando entramos num grande campo que estava simplesmente apinhado de gente e no fundo um grande casebre velho chamava a atenção de todos.
- uau!- exclamou o William quando saímos do aperto do carro.
- Olhe só isso pessoal!- completou Rafael.
- Estou no paraíso!- suspirou o David olhando para as dezenas de garotas com mini saias, mini shorts, mini blusas, mini-tops, talvez até mini calcinhas, ou calcinha nenhuma.
Estávamos em um extenso campo abarrotado de gente: homens e mulheres, conversando, dançando, bebendo, fumando, se atracando, um começo de uma briga e muito mais. Pessoas super bonitas, outras feias, todas com visuais exóticos e alienados, como uma japonesa de cabelos rosa-shocking e um cara com um tigre tatuado no braço, um chapéu de abas e um lenço branco.
Isso sem contar os carros, dezenas de carros e motos, dos tipos mais diferentes: grandes com grafites maneiros, pequenos com desenhos simpáticos, motos turbinadas até os dentes e caminhonetes com desenhos de chamas.
- Nem vem David, eu vi aquele loiro primeiro.- falou Aline referindo-se a um loiro aguado que passava.
- Se ele tiver irmã ele é todo seu.- respondeu o David sem dar atenção ao comentário.
- Muito bem, vamos nos inscrever.- ordenou meu tio.
Ele nos conduzio ate um negão com pinta de malandro que estava na porta do casebre.(que era de onde vinha a musica eletrônica imensamente alta).
- E ai chara, como vai?- cumprimentou tio Nelson.
- Levando chara, levando.- respondeu o negão.- que criançada é essa? Resolveu trazer as crias?
- Que nada,-respondeu meu tio nos olhando e sacudindo a cabeça do David.- essa aqui é minha sobrinha,- continuou ele me puxando a frente.- ela vai correr por mim hoje.
O negão me olhou de cima abaixo.
- a corredora é boa,- disse ele lambendo os lábios. Colocou uma mão no meu rosto.- mas será que corre bem?
- Aposte pra ver.- respondi em tom de desafio.
Meu tio olhou para ele satisfeito e disse.
- prepare o troféu, é mais uma pra família.
- Falo chara, falo.
- É isso ai pessoal estamos dentro.- disse meu tio se voltando para nós.
- Uhuhu!!
- Ei tio mas agora podemos entrar ai nesse bar, parece que esta bombando.- pediu Aline.
- Certo criançada, mas não usem drogas e não injetem nada.- aconselhou ele.- não quero ninguém fazendo xixi no meu carro. Mas vamos lá!
Entramos no casebre e quase que imediatamente me lembrei da tribe house, o cenário era quase o mesmo, mas este o bar parecia aqueles de filmes de camboy de faroeste: tinha um grande balcão de madeira, onde algumas garotas com roupas minúsculas dançavam escorregando por um ferro, se entrelaçando, se abaixando aponto de mostrarem a calcinha, como as coyotes daquele filme “show bar”. Enquanto isso caras musculosos enchiam copos e mais copos de bebidas, fazendo malabarismo com as garrafas que entregavam e passando a mão pelas pernas da dançarinas.
Já os “clientes” dançavam ao som da eletrônica altíssima, jogando os cabelos, descendo até o chão, passando as mãos uns nos outros, se entrelaçando, as pernas entre as dos outros, alguns dançavam até se beijando. Mas outros simplesmente bebiam até cair, fumavam e uns já se atracavam selvagemente aqui e ali, arrancando blusas e saias.
Sem falar nos visuais que eram dos mais variados possíveis: cabelos pretos, brancos, azuis, verdes, rosas, amarelos e tinha uma garota, que estava num beijo grego com mais duas, com cabelo cinza e mechas laranjas. Também havia muitos gays e lésbicas, ou seja lá o que fossem, mas se atracavam uns com os outros se chupando, beijando, alguns até masturbavam os outros! Deus!
Meu tio não parecia se importar muito com isso, e foi direto ao bar pedir alguma coisa.
- UAU! Anne isso aqui é demais!- exclamou Aline olhando em volta e dando pulinhos.- acho que é melhor que a tribe! Ei mas será que seu tio vai nos deixar beber alguma coisa?
A resposta veio quando meu tio voltou com sete garrafas.
- vocês são de menores, não podem beber muito.- disse ele entregando uma garrafa para cada um.- por isso aqui só tem uma garrafa de smirnoff para cada um certo?
- Oh beleza!- exclamamos felizes apanhando as garrafas.
- Agora finjam que não têm nada a ver comigo e vão se distrair por ai.- falou ele como se estivéssemos no zoológico, saindo de perto da gente.
- Uhu! Agora o bicho vai pegar!- gritou Aline virando a garrafa de sminorff e entrando no meio da multidão que dançava.
- É isso ai vamos nessa!- berrou o William e cada um saiu para um lado dançando e bebendo, atrás de uma boa aventura.
Eu puxei a Lara pra dançar e entramos no meio da multidão.
A paty usava um vestido rosa tomara-que-caia super curto e eu um top vermelho, calça preta e botas, o que quer dizer que ficou muito fácil de deslizarmos as mãos uma pela outra enquanto dançávamos, nos entrelaçávamos assim como os outros. Nos agarramos num beijo louco enquanto mexíamos ao som da música, de repente um corpo veio por trás de mim e outro atrás da Lara, a garota do cabelo rosa e a do cabelo laranja se juntaram a nós na nossa dança e no nosso beijo e ficamos assim por um bom tempo, nos beijando, agarrando, mãos deslizando até que nossos corpos ficaram cansados e saciados por demais e pediram um pouco de descanso e ar fresco.
Sai com a Lara para fora, que desabou num banco e eu fumei um cigarro, dado pelo meu tio para que eu saísse logo de perto dele.
E enquanto puxava meu fumo vislumbrei a Aline entrando num jipe com um morenão 80 por 99 e desaparecendo de vista.
- lá vai ela pega mais um.- disse eu para Lara rindo.
- Tudo bem, deixa ela ser feliz como agente. – falou ela se levantando e me beijando.
Quando pensamos em entrar novamente para dançar mais um pouco a voz do negão malandro anunciou pelas caixas de som.
- corredores a seus postos!
Senti um treco no estomago e meus joelhos quase cederam.
- ai meu deus! Não vou conseguir fazer isso!- exclamei de repente me sentando de novo e acendendo outro cigarro.
- É claro que vai.- disse Lara se ajoelhando na minha frente.- você é boa, sabe disso. Aprendeu a dirigir em uma semana, aposto que esses caras daqui não fizeram o mesmo.
- É mas eles têm mais experiência não?- retruquei quase enfiando o cigarro na boca e mastigando puro.
- E dai, isso não quer dizer nada!- disse ela me chacoalhando pelos ombros.- olha Anne, você é incrível, eu nunca conheci alguém como você, em todo os sentidos. Confio muito na sua capacidade e acredito em você. O importante não é você ganhar, é a sua primeira vez, mas você nunca vai saber se não tentar. Você pode até ganhar, mas se não arriscar pra vê jamais saberá disso.
A olhei nos olhos e aqueles olhos profundos me deram uma grande onda de coragem e consegui me levantar bem na hora que meu tio e a turma vinha vindo.
- é isso ai doutora, bola pra frente! Ta na sua hora!- disse meu tio me dando um tapinha nas costas, jogando meu cigarro fora e me levanto pro carro.
- É isso ai Anne, confiamos em você!- berrou Mauricio me jogando um beijo.
- Vai que é tua!! Uhuhu!
Entrei no carro meio corajosa e meio relutante. E de repente comecei a sentir uma coisa estranha, uma espécie de agonia no pé do estomago (se é que isso existe), misturado com um calafrio e uma gota de nervosismo.
- muito bem Anne, tente relaxar e curtir a coisa.- disse meu tio na janela, tentando me dar uma força.- não fique nervosa, leve tudo como uma brincadeira, é sua primeira vez, não precisa se preocupar em ganhar (é claro que isso é mentira) apenas corra, e não tente ultrapassar seus limites, vá até onde der. Ok?
- Ok tio. Valeu!- agradeci, tremendo com as mãos no volante.
Liguei e fui acelerando.
Ao lado se encontrava uma Hillux preta que era dirigida por um outro negão careca de músculos grandes, que estava ao lado de um carro verde pilotado por uma loira bonitona, que estava ao lado de um jipe pilotado por um cara forte de cabelos castanhos e tatuagem.
- todos prontos?- perguntou o negão.
Uma garota de cabelo roxo se postou à frente dos carros, colocou a mão dentro da camiseta...
- ai meu deus!- exclamou o negão ao meu lado.- como alguém se concentra com uma maravilha dessas?
“Ele estava concentrado? Puxa, então digam hei-hou em homenagem a ele, pois eu estou quase me borrando. Minhas mãos estão tremendo e eu sinto que não devia ter comido tantos salgados, agora eles querem sair (pela boca é claro). Ai deus o que eu vou fazer?
Correr né, sua anta!- falou minha voz interior
É fácil pra você dizer isso né? Mas bem vamos lá. É agora”.
Num movimento rápido e repentino ela tirou o sutiã e o jogou ao vento.
Vuallá!!!!!!
Os quatro carros dispararam como foguetes, todos lado a lado no principio.
No momento em que larguei toda a tremedeira e o nervosismo passaram e logo eu estava conduzindo o carro levemente a noventa por hora, sem a menor dificuldade.
“esta no sangue!- pensei quando fizemos a primeira curva deixando a multidão para trás.”
O negão passou a frente, eu acelerei ainda mais e emparelhei com o tatuado, a loira ficou para trás.
- COME POEIRA GURIA!- berrou o tatuado para mim passando a minha frente.
- VOU COMER TUA MAE!- gritei em resposta e acelerei mais um pouco.
Passei a frente dele e mostrei-lhe o dedo.
- COME POEIRA MANÉ!!
O negão estava bem à frente, se eu acelera-se mais o alcançava e...
- A MERDA, EU NÃO ACREDITO!!
Logo à frente, na estrada semideserta, um grande caminhão quebrado estava parado fechando todo o caminho e uma pequena fila de carros se formava atrás dele.
- ai e agora?!- parei ao lado do negão que me olhou de cara feia; uns sete carros atrás de nos estavam o tatuado e a loira.- ah, se agente estivesse na contra mão seria mais fácil e... ah, mais que idéia brilhante Anne! Vá pela contra mão.
Olhei para a pista ao lado, poucos carros passavam e de repente, sem pensar direito, me joguei contra os carros que vinham.
VRUM!VRUM!VRUM!
Eu ia em frente sem desviar de ninguém, eles desviavam amedrontados e atrapalhados, quase rodopiando na pista, e soltando impropérios conforme passavam.
- DIABO!- berrou o negão quando eu passei na frente dele.
Cheguei no cruzamento e peguei a direita, voltando pra mão.
Olhei para trás e não vi nenhum dos meus oponentes, o caminhão fez um grande barulho de quem voltava a funcionar.
- UHUHU! É ISSO AI! TA NO SANGUEEEEE!!!
Continuei meu caminho sem parar nem para ver quem vinha atrás. Entrei em outra rua coberta de arvores, a musica alta começava a ficar perto novamente e quando avistei o negão entrando na rua, atrás de mim...
- UHUHU!!!! É ISSO AI ANNE!!!
O casebre estava de volta, agora todos pareciam estar do lado de fora, e o Mauricio, David, Rafael, Aline, William, Lara e principalmente meu tio pulavam e berravam como loucos quando passei a linha de chegada com um breque brusco mas feliz.
Desci do carro e fui devorada por uma chuva de mãos que me ergueram no ar e me jogaram pra cima varias vezes gritando:
- CALOURA!CALOURA!CALOURA!
Quando me colocaram no chão o negão chegou acompanhado de perto pelo tatuado e lá longe vinha desanimada e irritada a loira aguada.
- é isso ai malandragem,- começou o organizador malandro.- muito bem caloura, muito bem. É isso ai pessoal, é assim que se deve fazer, não importa a sua idade, você tem que ir lá e mandar brasa, sem medo dos grandões. E esse tipo de atitude corajosa merece só uma coisa: - ele se virou e pegou algo na mão da garota do sutiã. Virou-se.- O TROFEU “NOITE VELOZ”
- UHUHUH!!!!!!!
Ele me entregou o troféu que recebi com as mãos tremulas.
O ergui no ar, como stalone, em rocky balboa, e uma nova onda de gritos e palmas caiu sobre mim.
- nossa Anne,- falou Aline quando toda e euforia já havia passado.- foi incrível, vocês saíram como balas de um revolver, e foi mais da hora ainda você voltando: os pneus fumaçando, rápida como um raio e sozinha, única na pista...nossa incrível!!
- Você nem sabe como isso é difícil,- falei largando a lata de cerveja.- toda hora um deles passavam na frente, sem contar que também havia os outros carros na pista e eles eram muito moles. Eu só consegui passar na frente quando paramos com um caminhão quebrado a frente, tinha num monte de carros e ninguém conseguiu passar, ai então eu entrei na contra mão e fui que fui.
- E os outros carros?- perguntou William impressionado.
- Eles viam e eu ia, sem desviar, eles que desviavam,- respondi satisfeita.- eu fiquei com um pouco de medo no começo, porque parecia que eles iam bater em mim, ou capotar quando desviavam desajeitados, não foi tão agradável essa parte. E eu acho que os outros vieram atrás de mim quando viram que eu passei com sucesso.
- E quando vocês saíram?- quis saber o David.- eu fiquei tão preocupado.
- Ah, eu também, eu estava mó nervosa quando ele mandou agente ir pro carro, mas quando eu comecei a dirigir todo o nervosismo passou e eu me senti livre, leve e solta, sem nenhuma preocupação. Me senti como um pássaro no ar.
- Essa é minha sobrinha!-falou meu tio orgulhoso me agarrando pelo pescoço.
A noite terminou com muita bebida, cigarros doados pelo meu tio, dança, muitos beijos e muitas outras diversões e acabou tudo com sete jovens paspalhos dormindo, amontoados no banco do carro.
- É pessoal,- falei quando deixamos eles enfrente a escola no dia seguinte.- agora vamos dar uma trégua nas maracutaias, eu acho que não vamos nos dar bem se continuarmos saindo toda hora, nossos pais podem desconfiar.
- É eu também acho.- concordou Rafael.
- Ah, cale a boca seu palerma,-mandou Mauricio provocando risadinhas.- quem se importa com você?
- A sua irmã, com certeza!!! –retrucou Rafael, provocando risadinhas ainda maiores.
- Ei Anne, vamos logo.- chamou meu tio.- eu quero dormi, acho que vou ficar com ressaca.
- Só você tio?- disse Aline pondo a mão na cabeça.- eu também acho que bebi demais.
- Eu não, mas beijei muuuuito!- disse Lara piscando pra mim.
- Rsrs, é véro. Mas bem é isso ai, pessoal, até mais.
- falo Anne, e parabéns!
- Valeu!
- Tchau Anne.
- Falo Anne, falou tio.
- Falo galera.