O Robozinho do Futuro
Luquinhas era um garoto solitário. Desatento, trapalhão, perdia as canetas que pedia emprestado. Os coleguinhas não queriam mais lhe emprestar materiais. E nem brincar com ele.
Ele brincava sozinho. Um dia ele lamentou com a mãe. Era noite e passou uma estrela cadente no momento em que conversavam.
- Faça um desejo, filho!
Ele fez. Queria ter um amiguinho.
Alguns dias depois, jogava futebol sozinho quando a bola caiu no quintal de um vizinho. Luquinhas nunca conseguiria pegar aquela bola por conta própria. Mas ele não esperava ter uma ajuda inusitada. Algo ou alguém veio voando, entrou no quintal, pegou a bola, saiu do quintal e a entregou nas mãos do menino.
Luquinhas se assustou e saiu correndo de volta para casa. No entanto, na entrada da casa, estava o ser que pegou a sua bola. Ele tinha o tamanho de uma criança - o mesmo tamanho de Luquinhas. Parecia um robozinho. Ele não tinha pele. Sua aparência era cinza brilhante. Seus olhos eram azuis, sem o pontinho no interior das pupilas. Não tinha roupa.
- Amigo. - disse o Robozinho, que lhe entregou a bola. Logo os dois estavam brincando juntos de futebol.
- De onde você é? - perguntou Luquinhas. - Você é estranho!
O robozinho apenas disse: “amigo”.
- Você veio para ser meu amigo!? A estrela cadente atendeu meu pedido!
No começo, Luquinhas tentou esconder o amigo em casa. Mas não demorou para que sua mãe descobrisse.
- Onde você achou esse brinquedo, Luquinhas?
- Não é brinquedo, mãe! Ele é meu amigo.
- Vai ter que pedir a seu pai, se quiser ficar com ele.
Todavia, a mãe de Luquinhas se encantou com o robozinho. Ele voava e pegava as coisas inalcançavéis para ela em locais altos na cozinha e em outras partes. Ajudava ela a se livrar da papelada - a mãe de Luquinhas era advogada e precisava jogar muitos papéis fora.
O pai chegou em casa. Era um homem desajeitado, porém divertido e carismático. Costumava perder instrumentos dos colegas engenheiros - sim, leitor, tal pai tal filho. Era o contraste da esposa, uma advogada racional que gostava de tudo organizado.
Pois saiba, leitor, que o pai adorou o robozinho e não pensou duas vezes em adotá-lo. Ele ficou impressionado com a tecnologia da máquina e ficou obcecado em descobrir sua origem. O pai leu dezenas de artigos por semanas e notou que não havia nada no mundo que explicasse como o robozinho funcionava. Era como se ele fosse de outro planeta ou de um futuro muito, muito distante. O pai e a mãe de Luquinhas lhe fizeram várias perguntas. Mas ele só respondia: “amigo”. Não havia nenhum indicativo da origem dele, a não ser o nome de uma suposta marca “AI Boy”. Mais uma vez o pai pesquisou e não havia nada sobre isso na internet e nem em lugar algum. Apenas percebeu que o robozinho pensava e agia como humanos, apesar de não falar muito.
De qualquer modo, o robozinho continuava ajudando a família, o que o fez ser amado pela aquela casa. Em alguns momentos, ele era organizado, para atender a mãe de Luquinhas. Em outros, ele era criativo, para atender o pai. E combinava essas dois comportamentos para brincar com Luquinhas, que o via como seu único e melhor amigo.
Durante seis meses, a relação entre o robozinho e a família foi maravilhosa. Aliás, a família cuidou para que ninguém mais soubesse do robozinho.
Até que aconteceu algo estranho.
O braço direito do Robozinho assumiu uma forma muito diferente do seu braço esquerdo. Em vez de um braço com mãos e dedos, como de uma criança humana, a sua nova forma adquiriu uma aparência e um jeito de funcionar que tornava o Robozinho menos "humano". Por exemplo, no lugar dos dedos, a mão dele passou a ter uma pinça, que faz coisas básicas, como pegar ferramentas.
O pai de Luquinhas tirou uma foto e foi atrás de informações. Ele notou que o braço direito do robozinho se tornou um braço robótico que ele já tinha visto antes. Desta vez, encontrou-se bastante informação. O pai percebeu que o braço era de um modelo de robô que já existia naquele ano. No entanto, a mente e habilidade desse modelo não chegavam nem perto da tecnologia que criou a mente do robozinho. Era uma máquina útil, mas que não possuía uma consciência capaz de fazê-la agir como uma criança humana. Nunca poderia ser amigo de Luquinhas tampouco realizar as tarefas para o pai e a mãe.
E a coisa só piorou. O Robozinho estava se transformando, pouco a pouco, numa máquina com menos inteligência e menos capacidade humana.
Luquinhas ficou preocupado com o amiguinho e pediu que ele revelasse como a família poderia ajudá-lo. Os olhos do Robozinho começaram a brilhar e a reproduzir algo que parecia um vídeo. Luquinhas e seus pais assistiram.
Nas imagens aparecia um professor alemão que começou a falar de “ordem do mundo”, isto é, um modo como as coisas estão organizadas. Mas o que seria isso, perguntou Luquinhas. O professor explicou: o mundo é feito de entes, de coisas. Tudo que existe é um ente, uma coisa, inclusive o ser humano. Porém, o ser humano é um ente que tem a capacidade de compreender e estudar essas coisas. Há períodos em que o humano pensa o ente de uma forma; há outros períodos em que pensa de outra maneira.
Olhe para seu quarto. Verá que ele está organizado de um jeito. A cama pode estar do lado da estante dos livros. A TV pode estar de frente para a porta. É um modo como você organizou as coisas no lugar onde você dorme. Daqui a alguns anos, você pode pensar em outra maneira de deixar seu quarto arrumado, mudando a cama de lugar ou comprando novas coisas para colocar. A tecnologia pode criar novas coisas e isso nos faz pensar de outro jeito.
Imagine também que você é um aluno do mesmo colégio onde estuda, mas 200 anos atrás. Comparando o colégio de antes e o atual, serão colégios bastante diferentes, com formas diferentes de ensinar, organizar e tratar os alunos. A escola é um ente. Uma ordem do mundo diferente também é pensar um jeito diferente de fazer escola, pois o humano pensava a escola de outro jeito.
E o que isso tem a ver com a transformação do Robozinho?
O Robozinho vem de um futuro distante, em que há uma ordem do mundo diferente da ordem que existe na época em que vive Luquinhas e seus pais. A mudança em seu corpo e na sua mente é para encaixá-lo naquele tempo em que Luquinhas e sua família vivem. Imagine, leitor, se alguém precisasse encaixar um cubo de madeira em um espaço vazio com formato de uma bola. Seria necessário cortar o cubinho para que ele fique no formato redondo. É mais ou menos o que está acontecendo com o Robozinho. Ele só ficará bem se voltar ao futuro de onde veio.
- Como vamos fazer isso, Robozinho? - perguntou Luquinhas.
O Robozinho apontou para o carro. Depois que a família entrou no veículo, ele deu as coordenadas para onde ir. A família não sabia para onde estava indo.
O carro foi até uma parte distante e deserta da cidade. No meio de um pequeno matagal, havia uma cratera. A familia levou o robozinho até lá, a pedido dele. Dentro da cratera, havia uma nave.
- É claro! - disse a mãe. - Aquela estrela cadente que vimos foi isso, filho!
Eles colocaram o robozinho dentro da nave, que também parecia estar se transformando.
- É hora de se despedir, Luquinhas. - disse o pai.
Luquinhas abraçou o Robozinho. Ele estava chorando.
- Você é o meu melhor amigo. - disse Luquinhas.
- Amigo. Melhor amigo. - o Robozinho o abraçou. Também parecia triste.
Ele conseguiu ligar a nave, que voou e sumiu nos céus, diante da família imersa em tristeza e saudade.
Dias depois, o pai e mãe de Luquinhas refletiam sobre as intenções do Robozinho. Perguntaram-se: por que, com tantas crianças por aí, ele procurou logo o Luquinhas? Uma pergunta intrigante, mas não teria como saber a resposta.
Entretanto, a chegada do Robozinho deixou um impacto positivo na vida de Luquinhas. Suas habilidades interpessoais melhoraram de forma significativa e ele fez amigos. Nunca mais ele brincou de futebol sozinho.
FIM