O Insensatinho
O GAROTO Danilo precisava de uma alguma ideia para apresentar seu trabalho escolar na segunda-feira. Ele era 6ª série e tinha que levar algum objeto que não exerça a sua função. Por exemplo, um colega irá levar um martelo que não martela. Uma menina teve a ideia de levar uma caneta que não escreve. Os alunos foram escolhendo as ferramentas inúteis que iriam levar e acabou não sobrando nada para Danilo.
Então ele saiu pela rua. Pensou em um chapéu que não esconde a careca ou não protege do sol. Um vizinho lhe recomendou a “Chapelaria Maluca” na outra avenida. Danilo entrou na loja e um homem excêntrico, com rosto pintado e cabelo extravagante, o atendeu.
- Olá, rapazinho. Eu sou Aliço. Que chapéu você quer? - disse o Chapeleiro, quase cantando.
- Nunca vi esse nome. - disse Danilo, rindo.
- Tudo aqui é original. Até meu nome.
- Tem algum chapéu que não faça o que um chapéu faz?
O Chapeleiro procurou, procurou, procurou… E nada.
- Desculpa, amiguinho. Não tem.
A Chapelaria Maluca tinha de tudo. Chapéus com formato de planeta, com formato de prédio… Tinha chapéu gelatina, chapéu gosma etc. Esses chapéus, sem dúvida, eram esquisitos e nada convencionais, mas eles não subvertiam a função fundamental do chapéu. Todos cobriam a careca, todos protegiam do sol, todos mudavam a aparencia.
Danilo saiu da loja, porém recebeu uma informação importante. O Chapeleiro disse para ele ir até uma loja de lanternas no fim da rua.
- Um bigodudo é o dono. - afirmou o Chapeleiro.
O garoto foi até a loja indicada, A Loja das Lanternas.
- Boa tarde. - disse Danilo, entrando na loja.
- Boa tarde. Meu nome é Frederico. O que você quer, garoto?
- Uma lanterna inútil.
- Mas como assim?
- Uma lanterna que não ilumine.
- O quê? Acho que o garotinho não sabe o que quer. Deixa eu te mostrar minha variedade de lanternas.
Frederico mostrou diversas lanternas para Danilo. A primeira foi a Lanterna Metafísica.
- O que é metafísica? - perguntou Danilo.
O dono da Loja das Lanternas lhe explicou: pediu-lhe que imaginasse um boneco marionete de madeira que se move aparentemente sozinho. A física estuda o boneco, ou seja, aquilo que vemos, sentimos etc. A metafísica estuda aquilo que faz o boneco se mover, mas que não enxergamos.
Danilo adorou a explicação. Quase levou a lanterna, mas lembrou da exigência da professora. Então, ele desistiu de vez quando Frederico explicou que a Lanterna Metafísica iluminava seres metafísicos para que eles apareçam para a sensibilidade humana.
A outra lanterna que Frederico mostrou é a Lanterna Dialética.
- O que é dialética? - mais uma vez perguntou Danilo.
Frederico, de novo, lhe explicou: imagine que as cores brancas e pretas estejam brigando entre si. A branca defende uma ideia, que chamaremos de tese; a preta defende uma ideia oposta à da branca, por isso chamaremos de antítese. Uma forma de conciliar os argumentos deste debate é formando uma síntese: ou seja, um argumento que supere a contradição. Mas isso não quer dizer que surgirá a cor cinza. Pode surgir uma cor roxa, amarela, azul… dada a complexidade do argumento sintético.
Danilo ficou fascinado. Todavia, a Lanterna Dialética ainda fazia o que uma lanterna comum faz, apesar da sofisticação.
Foi então que Frederico apresentou-lhe a Lanterna Diurna. Não havia nada de interessante nessa lanterna. A não ser a história que ouviu. O último usuário dela estava utilizando-a no meio da rua, “procurando Deus”. Era uma lanterna que funcionava durante o dia e que precisava da luz solar para ligar. Portanto, Danilo, enfim, conseguiu cumprir seu objetivo, pois lanternas são inúteis durante o dia.
Na segunda-feira, ele levou e apresentou. A professora gostou da proposta e pediu a lanterna emprestada. O que Danilo não esperava era que ela não devolveria mais.
A professora nunca mais foi a mesma. Ela começou a fazer indagações filosóficas. A vizinha, certa vez, viu que ela estava usando a lanterna para procurar o “mundo das ideias”. Não achou.
De qualquer maneira, Danilo levou nota 10.
FIM