Aprendendo a ser extraordinário (Continuação do livro “Pássaro Branco”, de R. J. Palacio) - Parte II
Não dava para acreditar no que tinha acontecido comigo: Eu finalmente havia encontrado o Julien! Justo o que eu mais queria! Enquanto nós sorriamos de tanta felicidade, uma mulher saiu do banheiro e me disse:
- Oi, garoto! Está conhecendo o Julien?
- Emily! Que bom você chegou! Acredita que esse menino aqui é o neto da Sara?
- Sara? Aquela Sara de quem você tanto fala?
- Isso mesmo.
- Nossa!
- Por favor, Julian, nos leve até a casa dela. Por favor!
- Claro. Será um prazer pra mim.
Saímos da cafeteira e guiei eles direto para a casa da Grandmère. “Nossa, ela vai ter uma grande surpresa!”, foi o que eu pensei. Mas, no meio do caminho, senti algumas dúvidas. Então, perguntei ao Julien Beaumier:
- Como foi que você conseguiu escapar dos nazistas? Eles não estavam perseguindo você numa floresta?
- Bom, eu corri deles sem as minhas muletas, mas aí acabei caindo num buraco escondido no meio da floresta, onde bati a cabeça e apaguei. Depois disso, eu não sei o que aconteceu com os outros homens que também estavam fugindo.
- Mas, se você ficou preso naquele buraco, como saiu de lá?
- Uma família que estava passeando na floresta me encontrou por acaso. Eles me levaram para casa deles e cuidaram de mim.
- Sério? Quem eram essas pessoas?
- Você já conheceu uma delas. A Emily ainda não tinha nascido quando os pais dela, Adilson e Clarisse, me encontraram sem minhas muletas.
- Mas, se você perdeu as suas muletas, como conseguiu andar de novo?
- A mãe da Emily tinha vivido por um tempo na Austrália, onde trabalhou ao lado de uma enfermeira chamada Elizabeth Kenny. Foi lá que ela aprendeu um novo método para tratar pacientes quem sofrem de Poliomielite, assim como eu.
- E você melhorou?
- Essa foi uma ajuda bem significativa na minha vida. Consegui fazer muitas coisas. Mas, agora que já estou idoso, não tenho muitas forças nas pernas, por isso fico a maior parte do tempo nesta cadeira de rodas.
- Então, você ficou morando com a família da Emily?
- Sim. Sempre considerei a Emily como uma irmãzinha que eu nunca tive. Depois da morte dos pais dela, a Emily prontamente aceitou cuidar durante todos esses anos. Isso é algo que sempre serei grato enquanto eu viver.
- Tem uma coisa que não faz sentido nessa história. Se você estava vivo, porque não procurou a minha Grandmère e os seus pais?
- Bem, como eu bati a cabeça quando caí no buraco, eu perdi toda a minha memória, incluindo o meu nome. Quando finalmente me lembrei de quem eu era e quem eram os meus pais, descobri que eles já haviam morrido. Pensei que havia acontecido a mesma coisa com a Sara, até que conheci você.
- Uau, que história! a Grandmère vai ficar feliz quando ter ver.
- Espero que sim. Faz muito tempo que eu não a vejo.
- Você está pronto para isso?
- Estou.
Ajudei a Emily a colocar o Julian dentro de casa. Quando cheguei, a Grandmère estava enxugando os pratos. Então, eu falei:
- Grandmère, já cheguei!
- Já voltou? Que rápido! – daí ela parou de enxugar os pratos e olhou para a Emily e o Julien - E quem são essas pessoas?
- Você não mudou nada, Sara. – disse o Julien
- Espere, já nos conhecemos? – perguntou a Grandmère, enquanto ela olhava para o homem na cadeira de rodas sorrindo – Agora sim, eu lembrei. Reconheceria esse sorriso em qualquer lugar. Julien, é você.
- Olá, Sara.
- Você está vivo, Julien. Está vivo! Que bom te ver. Nem sei o que dizer . . . E você sempre perdia no belote pra mim . . .
- Eu posso até ter perdido a memória, Sara, mas disso eu me lembro e é mentira. No começo, eu sempre ganhava de você. – daí, os dois riram e se abraçaram. A Grandmére olhou para mim e disse:
- Muito obrigado, Julian.
Fiquei muito feliz de ouvir isso. Nem preciso dizer também que no final, eles se casaram. Ah, que dia feliz foi o casamento do meu honônimo, Julien! E eu me sentia ainda mais feliz por saber que tive alguma coisa a ver com a união desse casal.
Toda a minha família veio na festa de casamento. Foi demais! Todos estavam se divertindo. Até acho que, a Emily se divertiu muito com o meu tio avô, Frank.
E eu, normalmente, sou igual ao meu homólogo de Madagascar, o rei Julien: adoro curtir uma festa. “Eu me remexo muito/Eu me remexo muito/Remexo (Muito!)” Mas, apesar de todos estarem dançando e se divertindo, ainda sentia um vazio dentro de mim. Então, o novo marido da minha Grandmére veio conversar comigo.
- Não está se divertindo tanto quanto queira, não é? – perguntou o Julien.
- Não, não é isso – respondi – É que ... Eu estou feliz com por ter ajudado vocês dois, mas ... Mesmo assim, isso não apaga o que eu fiz no passado.
- Eu entendo. A Sara me contou sobre o porque você saiu da sua escola.
- Contou tudo? – ele acenou com a cabeça – Até sobre o Auggie?
- Sim, também.
- É, acho que você está decepcionado. Alguém que foi homenageado com o seu nome maltratou alguém que precisava de ajuda.
- Todo mundo comete erros, Julian.
- Bom, você não.
- É claro que sim. Eu cometi um erro quando tentei recuperar o caderno de desenhos da Sara. Sem perceber, coloquei ela em perigo de ser descoberta.
- Tá, mas você estava tentando ajudar ela!
- É verdade. Porém, depois eu joguei a raiva na Sara, como se ela tivesse algo haver com isso.
- Disso eu também me lembro. – concordei – Mesmo assim, eu ainda acho você extraordinário.
- Você também é desse jeito.
- Na verdade, não. O Auggie que era extraordinário! Eu via isso, ficava com inveja, e perturbava ele quando era criança.
- É, mas você não é mais aquela criança. Você é um adolescente, não concorda? – Eu acenei com a cabeça – Viu só, Julian? As pessoas podem mudar.
- Acha que eu mudei?
- É óbvio que sim! Sei que não conheço esse Auggie e os seus outros colegas, mas tenho certeza de que, se eles vissem tudo o que você fez, diriam que você é extraordinário.
- Então, eu sou uma pessoa extraordinária?
- Olhe ao redor, Julian! Sem você, eu jamais teria reencontrado o amor da minha vida, e esse casamento nunca teria acontecido! Acha que isso é pouca coisa?
- Tem razão. – sorri e apontei para o Julien - Isso o que algo que um Julian faria!
- Lembre-se Julian: “Ninguém nasce extraordinário, aprende a ser.” E você se tornou assim.
Nunca me esqueci dessas palavras até hoje, mesmo que já tenha passado algum tempo que voltei para casa. E nunca vou me esquecer disso.
Daí, um dia, eu estava numa cafeteira quando apareceu uma menina com deformação no rosto, igual ao Auggie. Ela sentou entre mim e uma mulher que estava com uma criança bem pequena.
Quando a criança viu o rosto da garota, ela começou. A mãe dela pediu desculpas a menina, e foi se levantando para ir embora. Mas, eu não queria apenas ficar ali só assistindo. Eu não queria errar outra vez.
- Senhorita, - daí, eu me levantei - o que essa mulher quis dizer também é aquilo que eu quero dizer: Desculpa. Somos indignos de estar diante da tua presença.
Depois de sair da cafeteira, me senti feliz em ter dito aquilo. Só voltei lá na outra semana, e não é que aquela menina apareceu de novo? Ela me reconheceu, e falou:
- Muito obrigado. Agradeço por ter dito tudo aquilo naquele outro dia. Ninguém nunca fez isso por mim.
- Não foi nada.
- Você ainda não me disse seu nome.
- Ah, verdade. O meu nome é Julian, e o seu?
- Me chamo Sara.
- Sara? Nome legal!
- Muito obrigada. Também acho.
Não adianta negar! Eu continuo o que o meu homófono começou. A missão de todo Julien é salvar cada Sara. Isso é extraordinário, não acha?