Para o meu maior medo.

Eu descobri recentemente que o medo da morte que me assombrava noites a fim não era tão sufocante quanto o medo de partir e quebrar a todos que me cercam. Eu descobri que as noites sem fim, onde a ansiedade bate e o sono é levado para o abismo, eram resultantes do meu medo de abandono. Eu tenho medo, sabe? De partir e deixar as pessoas que me cercam com uma dor irreparável no peito, tenho medo do eco incessante que isso causará, tenho medo das partículas de dor irreparáveis que irá eclodir e repartir microscopicamente todo o âmago das pessoas a minha volta.

Eu tinha medo das noites insones quando todos meus demônios saiam e, como em um truque de mágica barato, começavam a sua incansável batalha em me despedaçar. Eu tinha medo das máscaras que construí de mãos dadas com o tempo, afinal, ele sempre encontrava uma mineira de deteriorar todas elas. Eu tinha medo dos sorrisos que eu estupidamente colocava em favor daqueles que nunca iriam me conhecer completamente, eternamente. Eu tinha medo que alguém pudesse abrir as portas do meu peito, adentrar e fazer morada. Eu tinha medo de tudo que me desse uma fagulha de esperanças de pertencimento de liberdade e de paz.

Mas eu descobri recentemente que o meu maior medo é partir, sem começos, meios e infelizmente sem um fim. Às vezes quando a longitude das noites me assombrava eu pensava em várias formas de partir e de me libertar de todo o caos que me habitava e de certa forma ainda habita em mim, mas aqui estou eu vivendo, apesar de tudo.

Me lembro exatamente o momento em que decidi ficar. Lembro do rosto que me fez querer, das mãos cansadas do tempo, do pedido de socorro silencioso que ecoou noites adentro. Lembro do sorriso fácil e dolorido, das conversas cheias de lembranças e memórias que gostaria de realizar, do tempo que não irá voltar.

Da dor que perdurou.

Do tempo que não estagnou.

Por que as pessoas sempre precisam ter data de validade?

Me lembro do desenho infantil feito com os lápis de cores, desenho este que qualquer um julgaria ser de uma criança que acabara de descobrir sobre as cores e a beleza do mundo. Há se soubessem o peso que o tempo carrega, ah se eu soubesse o peso que o tempo iria impor sobre mim. Se eu ao menos soubesse que, dentre todos os medos que foi instaurado, costurado e impresso na minha pele, como membrana mesmo, que de todos esses medos o que eu mais temia, que mais temo, é de me encontrar em um lugar sem você.

O tempo está correndo e não sei qual botão aperto para diminuir sua velocidade, não sei qual botão que aperto para reiniciar as memórias, para me dar mais alguns anos a mais, não sei como formatar ou controlar a dor que está aos poucos adentrando em mim, não sei como te pedir perdão pela minha falta de empatia, pela pessoa áspera que me tornei, não sei como te pedir desculpas por toda a dor que vive em mim, não sei como pedir apenas um abraço.

Ah mãe, suas mãos já estão calejadas e seu semblante dolorido. Mas se eu soubesse que o que mais me doeria seria não ver as tardes intermitentes de brigas, se eu soubesse que a dor do vazio da sua perda seria tão barulhento assim, eu teria me ajoelhado antes, pedido perdão antes e visto com mais carinho as lombadas cansadas das suas costa.

Eu tenho medo do vazio da sua partida.

Eu tenho medo do barulho ensurdecedor da sua ida.

A que Deus eu me ajoelho pedindo calmaria?

A que Deus eu rezo, pedido por mais um minuto?

A que Deus eu me rendo, por mais um simples sorriso?

Eu só espero e rezo por mais tempo.

Você ainda está aqui, e eu já olho com os olhos cheios de lagrimas para você. Como eu conserto o vazio quando você se for?

Como eu reaprendo a respirar?

Espero que o tempo seja mais gentil dessa vez. Espero que os anos passem mais devagar, que os dias sejam longos e que você me perdoe pelo meu caos.