Brigadeiro a Flores - Cap. 15: Observando

"Você acha que ele mandou escreverem aquelas coisas por causa de você ter recusado a proposta dele?" Bianca perguntou à Erva, que estava sentada na escada que dava ao estoque da Brigadeiria, comendo brigadeiro.

"Com certeza!" Ela disse revirando os olhos ao se lembrar de Bernardo e a proposta. " O que ele tem na cabeça? Sério? Ele vive em outro mundo?"

"Com certeza! Ele é estranho. Primeiro faz bullying contigo, e manda fazerem violência física. Depois ele propõe para vocês andarem juntos?!"

"Desde que eu pedisse desculpas em público."

As duas riram. "Ele é bipolar".

"E está com a reputação impactada". Disse Dona Esmeralda descendo as escadas. Erva se movimentou para sair do caminho. "Você estragou o mundo dele, garota".

"Como assim?" Erva disse confusa.

"Ai criança. A família Assumpção é muito importante no mundo dos negócios. A mãe desse garoto é presidente de tudo e tem uma cara azeeeeda! Ela deve ter ensinado ele a ser desse jeito. Controlador."

"O Bernardo?!". Erva apontou.

"Isso" Confirmou Dona Esmeralda. "Bom, eu tenho vocês como parte da família". Erva e Bianca sorriram. "Então, eu fiquei preocupada quando você me falou sobre o que estava vivendo na universidade e fui pesquisar um pouco sobre esses garotos, pois os nomes Moralles e Assumpção não me eram estranhos. Se eu pesquisei certo na internet" a senhora sorriu, "um é dono de uma rede enorme de planos de saúde e o outro de grandes negócios do país. Inclusive tem parentes no senado.".

"Pesquisou certo sim, o Bernardo é muito influente na sociedade".

"Então, minha querida. Eu já me deparei com pessoas assim quando era jovem. Antes de conhecer meu amado e falecido dono desta Brigadeiria." Dona Esmeralda disse e as meninas se olharam, lá vinha mais uma história da dona da loja. Ela amava ficar associando o tempo atual com quando era jovem, e as meninas gostavam de ouvir, pois sempre tinha uma lição no fim. "Ele era o dono do bairro. Minha nossa, um verdadeiro homem do perigo."

"O dono do morro" Erva comentou.

"Isso mesmo. Vocês deve falar assim agora, então é como se ele fosse isso. Dono do morro". Dona Esmeralda disse com um sorriso e Erva e Bianca riram. "Ele tinha tanto poder, todos os respeitavam. Onde passava, todos até viravam o rosto. Acontece que quando me mudei para a cidade, eu não sabia de nada sobre isso, e o tratei como qualquer outra pessoa, não virei o rosto e briguei com ele quando passou de carro em uma monte de folhas que tinha acabado de juntar após limpar minha calçada." Ela parou e pegou uma brigadeiro tradicional para comer. "Cara folgado." Ela mordeu o brigadeiro. "Ele tentou brigar comigo, mas eu fui resistente, e bati boca com ele. Como todo mundo percebeu que eu, uma novata, fiz o que fiz e não aconteceu nada comigo, as pessoas começaram a perder o medo e bater boca com ele também. Criei um caos. O castelo dele foi desmanchando e ele veio conversar comigo para ajudá-lo a restaurar a ordem, pois eu causei tudo aquilo." Ela deu risada. "Acabou que nos casamos. E todo mundo voltou a respeitar, sem medo, nós dois."

Erva e Bianca se entreolharam. "Então, a Erva precisa casar com o Bernardo?" Bianca disse com rugas na testa tentando entender.

"Eu não, credo!" Erva disse jogando um pano na amiga.

"Não, eu só quis ilustrar que a Erva quebrou o palácio desses meninos. Ela mostrou que as pessoas podem enfrentar eles e lutar para ficar na escola, sem medo." Dona Esmeralda explicou.

"Huuum isso faz sentido. A proposta do Bernardo foi para eu ajudar a restaurar o império de medo que eles construíram." Erva disse pensativa.

"Exaaato! Porque eles devem estar vendo que logo mais ninguém vai 'respeitar' as ações deles. Fazer o que eles querem".

"E como eu disse 'não' e estou lutando, ele tentou atacar minha pureza."

"Ele vai tentar de tudo."

"Babaca! Vocês acreditam que eu precisei desligar meu celular porque uns idiotas, a mando dele, óbvio, ficaram me ligando e mandando mensagem a respeito do que escreveram no mural?"

"Inacreditável!"

"Vou ficar incomunicável até amanhã. Espero que parem, senão vou trocar de número."

"Já devia trocar de celular, né amiga?" Bianca falou dando um sorrisinho e se referenciando ao celular que funcionava a maior parte do tempo só na tomada.

"Quando eu me formar, amiga!" Erva disse sem graça. "Está dando para usar ainda" ela sorriu.

Quebrei o império dele! Será que algum dia ele vai parar de me atacar por isso? Ele é tão idiota e criança? Como pode existir gente assim? Erva pensava enquanto arrumava as coisas da Brigadeiria para fechar.

"Oi, já fechamos!" Bianca disse.

"Eu vim falar com a Erva."

Erva ouviu a voz de Gabriela e se virou. "Gabi?"

"Podemos conversar?"

"Ah! Claro, eu estou terminando e daí já saio"

"Ok".

Erva finalizou o que precisava e seguiu com Gabriela pela avenida Faria Lima.

"Me desculpe vir sem avisar".

"Que isso?! Você pode vir à Brigadeiria quando quiser."

"Você entendeu o que quis dizer".

Erva sorriu.

"Eu quis te dar apoio hoje. Maaaas..."

"Já falamos sobre, Gabi! Não precisa se preocupar! Eu sei que enquanto isso não acabar, é melhor para você ficar longe".

"Eu acho que vai acabar rápido." Ela disse sorrindo.

"Como assim?" Erva disse sem entender.

"Huuum você não viu o grupo hoje?"

"Não. Eu desliguei meu celular ao ver que estavam falando aquelas mentiras."

"Aaah, entendi. Bom, o Bernardo meio que falou para todo mundo parar de fazer algo contra você" Ela disse pegando o celular e mostrando para Erva. "Parem já! Essa ordem não foi dada! Quando eu descobrir quem fez isso, vai pagar!"

Ele me defendeu? "Mas..." Erva estava paralisada. "Por que ele fez isso?"

"Não sei. Talvez ele tenha mudado de ideia?"

"Não!" Erva disse entregando o celular para a amiga. "Ele.. quer dizer... será? Será que ele pode mudar de ideia? Eu achei que foi ele quem tinha mandando escreverem aquilo."

"Pelo visto não foi não." Gabriela falou com um sorriso. E Erva ainda estava chocada. "Pode ter sido alguém sem noção. Mas é bom porque, por mais que ele não tenha dito oficialmente que a tarja vermelha foi retirada, isso fez o pessoal ficar mais quieto, ou seja, você pode ter paz". Ela sorriu.

Erva sentiu um alívio e acompanhou o sorriso. "Ah, lembrei!" Então abriu a bolsa e pegou dois brigadeiros rosas dentro de uma caixinha. "Vamos comemorar comendo brigadeiro de morango, eu sei que você gosta!"

Gabriela aceitou e as duas andaram mais um pouco, conversando, rindo e comendo. Até que Gabriela precisou ir embora, então Erva a deixou perto do prédio onde o pai da moça trabalhava e seguiu para o ponto de ônibus.

Alguns instantes atrás, Bernardo chegou na Brigadeiria e deparou com ela fechada. "Droga! Eu achei que isso funcionava 24h. Onde será que aquela garota mora? Quero muito dizer a ela que não fui eu quem mandou escrever aquelas coisas e que já mandei pararem de implicar com ela. Quero dizer que me importo!" Ele disse chateado. Mas não demorou muito e reconheceu dois uniformes sentados na praça com uma escultura de baleia enorme próxima a elas. Então ela tem amigos? Pensou. Ele se aproximou um pouco, mas não muito, pois não queria ser visto, e viu Erva rindo com uma garota, que percebeu ser da universidade só porque estava de uniforme. Achei que a ordem era ninguém conversar com ela? E por que ela sorri?

Ele continuou ali e depois que a garota entrou em um prédio, deixando Erva sozinha, ele resolveu se aproximar. Mas parou.

Erva, deixou Gabriela e foi em direção ao ponto de ônibus, onde, para sua surpresa, se deparou com um F4.

"Benício?"

"Ah, oi!" O Moralles disse calmamente. Erva praticamente viu seus lábios mexerem em câmera lenta.

"Não sabia que F4 pegava ônibus" disse sorrindo, usando a comicidade para disfarçar seu coração batendo de uma forma desconhecida. Droga, por que estou nervosa? Não é medo ou nervoso. Calma Erva!

"Eu não vim pelo ônibus". Benício falou e Erva percebeu que ele realmente não estava sentado virado para a rua mas sim para um outdoor com a foto de uma modelo. Ela então reconheceu quem era, a moça do discurso do vídeo da faculdade.

"Ah! Esta não é Sophie Abraão?" Erva perguntou e só obteve um aceno de cabeça. "Que legal!! Não sabia que ela era modelo!" Benício continuava em silêncio. "Foi por causa dela que eu fui para John Safra. Eu vi um discurso dela em um vídeo, e me apaixonei.".

"Ela é apaixonante mesmo." Benício falou, e Erva notou que ele não tirava os olhos do outdoor.

"Huuum você a conhece? Digo, pessoalmente?"

"Sim. Somos am... nos conhecemos desde criança".

"Entendi. Que legal!"

"Você já gostou de alguém?"

Erva arregalou os olhos. Como assim? Por que ele está me perguntando isso? "Eu... aaah, todo mundo já gostou de alguém, né?" Sorriu para disfarçar. "Por q... por que está me..."

"A vida é esquisita! Às vezes a gente conhece pessoas que nunca imaginávamos conhecer e... e ela mexe com tudo." Benício continuou com seus pensamentos falados.

Por que ele está me dizendo essas coisas? Será que ele está falando de mim? Ou... Erva olhou para o outdoor. Ou dela? Ela suspirou.

Benício olhou para Erva, se levantou e foi para perto dela. Ela o olhou para e ele estava sério. Os dois ficaram se olhando por um tempo e aquilo a deixou quente. Ele sorriu. Ela continuou séria.

"Tá tudo bem?" Erva praticamente sussurrou.

"Sim." Ele continuou sorrindo.

O coração dela batia mais rápido e agora sua respiração também estava descontrolada.

"Eu preciso te dizer que você é interessante" Benício disse e Erva prendeu a respiração. Eu? "Eu estava todo pensativo, sério, e quando te olhei vi um negócio, cheguei mais perto de você e realmente, de todas mulheres que já conheci, você é a única que não se importa em sair sujinha para a rua." Ele sorriu mais ainda e apontou em seu rosto o local, para lhe mostrar que ela estava suja no rosto dela.

"Ah, minha nossa..." Erva desconsertada, começou a limpar seu rosto. "Eu comi brigadeiro". Benício sorria para o jeito da garota.

"Não se preocupe". Ele disse a tranquilizando. "Bom, já está na hora de eu ir embora. Não esperava te encontrar aqui, mas foi bom."

"Ah, ok!" Ela disse se ajeitando e sorriu para a frase final dele. "Eu trabalho aqui perto."

"Ah! Legal! Onde?"

"Na Brigadeiria Sonhos Realizados".

"Huum nome interessante! Se eu comer lá, meus sonhos se realizarão?"

Erva sorriu. "Não sei, mas os meus estão". Ela disse e Benício sorriu. Erva então ficou sem graça. "Quer dizer! A faculdade! Direito! Não você... você não é meu sonho. É a faculdade!"

Benício riu mais ainda. "Eu tinha entendido"

"É que na minha cabeça ficou um duplo sentido".

"Um pouco" ele deu risada. "Mas eu entendi, não se preocupe."

Ela sorriu também.

"Bom, como você vai voltar? Quer carona?"

"Aaah, não precisa! Muito obrigada! O ônibus passará daqui a pouco". Erva olhou o relógio e não parava de falar sorrindo. Ela sentia que algo dentro de si estava feliz.

"Tudo bem. Até mais então." Benício disse se dirigindo para um estacionamento próximo. Ele olhou mais uma vez para o outdoor. E então se virou para Erva. "Ah, você sabe a distância da França até o Brasil? Quantas horas levaria um voo?"

Erva franziu a testa. "Aaah não. Umas 12?" Chutou para não ficar sem responder.

"Huuum não sei. Vou pesquisar! Até amanhã"

"Até!" Ela acenou sorrindo.

Bernardo viu Erva encontrar Benício no ponto de ônibus e assistiu toda a interação deles. Ele estava longe, então não ouviu nada da conversa, mas observou o quanto Erva sorria, viu Benício bem próximo dela e fechou a mão em um punho ao ver os dois sorrindo juntos, como se nada mais importasse. Ele foi embora aí. Eu dei tudo para ela e ela não sorriu assim. É por isso que ela tem lutado? Por causa deles? Por que o Benício está falando com ela? Se encontrando com ela? Ele já esqueceu a Sophie? Eles me pagam!