Uma amizade extraordinária (Continuação de “Plutão”, de R. J. Palacio) - Parte I

Bom, mais um dia nasceu para todos. Ontem, foi um dia complicado. “Ah, como eu não gosto de segundas-feiras!” Pareço até o Garfield falando.

Mas, falando sério mesmo, a segunda-feira foi um dia difícil: soube que a cachorrinha do meu melhor amigo, Daisy, tinha morrido, tive dificuldades na escola e soube que minha mãe tinha sofrido um acidente de carro.

No entanto, por mais incrível que pareça, dormi feliz quando confirmei que eu não havia ocasionado esse acidente, mesmo que indiretamente. Isso me ensinou que o aquilo que minha mãe, Lisa, disse era verdade: precisamos dar de nós mesmos para ajudar os outros.

Ontem, o dia pareceu ter mais de 24 horas, mas agora começa um novo dia especial, onde vai acontecer um monte de coisas boas. Bom, é o que eu espero.

Porém, logo que eu acordei, ouvi um barulho. Meus pais estavam brigando de novo, provavelmente por meu pai ter dormido aqui em casa depois de ter ajudado minha mãe. Eles perceberam que eu entrei no quarto, e pararam de discutir. Daí, minha mãe falou:

- Volte para o seu quarto, Christopher.

- Mãe, eu só queria dizer . . .

- Faça o que ela disse, filho. – interrompeu o meu pai - Isso é conversa de adulto.

Eu ia dar meia volta e fazer isso, mas parei e continuei falando:

- Antes de ir, preciso falar uma coisa. – daí, disse aquilo que estava a muito tempo no meu coração - Sei que isso é conversa de adulto e que o mundo dos adultos é diferente do mundo das crianças, mas eu sei de algo que vale nos dois: não é certo fazermos coisas das quais não concordamos plenamente com o coração.

Meus pais olharam para mim surpresos, parecia que eles não esperavam que o filho deles fosse dizer isso, ainda mais com uma estrelinha grudada na testa desde ontem. Então, continuei:

- Não perceberam? Vocês não querem ser divorciar. O coração de vocês não querem levar essa decisão adiante.

- Como pode ter certeza disso? – perguntou minha mãe.

- Você não viu a forma como o papai te ajudou desde que você saiu do hospital? Ele ficou aqui até agora porque se preocupa muito com você. E tenho certeza que você também sente o mesmo em relação a ele.

- É verdade. – responderam os dois juntos.

- Então porque vocês dois não deixam o orgulho de lado e salvam o casamento de vocês? Isso é muito mais importante. E tenho certeza que vocês querem isso também.

Os meus pais ficaram em silêncio, olhando eu sair do quarto. Eles estavam muito surpresos pelo filho deles ter falado tudo aquilo. Sabe o que eu acho? Quando surgem problemas, os adultos deveriam ouvir mais as crianças. Se fizessem isso, provavelmente eles parariam de agir feito crianças.

Bom, tendo resolvido esse problemas com meus pais, tomei meu café da manhã e me arrumei para ir escola. Foi meu pai que me levou de carro até lá. Porém, quando eu cheguei, a pessoa mais improvável resolveu falar comigo. Era a Katie McAnn, a menina que estava com raiva de mim ontem. Ela disse:

- Oi, Chris.

- Oi – respondi meio desconfiado, sem saber o que ela queria.

- É que eu soube que sua mãe sofreu um acidente ontem, e vim dizer que eu sinto muito.

- Tudo bem. Obrigado, Katie.

- E eu também queria te pedir desculpas por ficar te encarrando com raiva.

- Ah, tá tudo bem. Eu já esqueci isso. Aliás . . . – e antes que eu pudesse terminar a frase, ela me abraçou. Eu estranhei um pouco, mas eu precisava de um abraço. – Como eu ia dizendo, eu trouxe o trombone para você usar hoje.

- Obrigado, Chris. – disse a Katie pegando o instrumento das minhas mãos – Perdão se eu acabei fazendo você ter que tocar com aquele trombone velho.

- Tudo bem. Espero que a Lisa, sua mãe fique bem. – daí, ela entrou na escola.

Engraçado como as pessoas mudam de humor rápido. Ontem, a Katie não estava com cara de que queria ser minha amiga. E hoje, ela até me abraçou. Que inesperado.

A terça-feira estava começando bem para mim, e continuou assim. Graças as dicas que o Auggie me ensinou, eu consegui completar a prova de Matemática. Não sei se estava certo, mas eu fiz.

E depois, na aula de educação física eu não precisei ficar esperando sentado ou pegar um short reserva, porque eu mesmo lembrei de levar o meu pra escola. Essa aula foi demais!

No almoço, eu me senti observado, e quando eu me virei para ver quem estava me olhando, a Katie desviou o olhar e continuou comendo. Porque será que estava me olhando? Agora, eu não fiz nada de errado.

E na aula de música, eu ainda me senti observado pela Katie, mesmo se ela virasse a cabeça quando eu olhava. Fiquei com nervosismo por causa disso, então pensei que ela estava olhando para mim porque estava com pena. A outra hipótese seria que ela gostasse de mim, o que me deixa ainda mais nervoso.

Por fim, na última aula, eu entreguei o meu trabalho de ciências para a minha professora. Ela ficou feliz, e eu também, mesmo sabendo que não conseguiria ter a mesma nota que os outros. Mas, me senti como se tivesse cumprido o meu dever.

Mas, quando fui para o ensaio da banda de rock da escola, encontrei saindo do auditório quem eu menos esperava: o Ennio, Harry e o Elijah. Perguntei porque eles estavam saindo sendo que nós iríamos ensaiar agora. Daí, eles disseram que tinham conversado com o Sr. Bowles, falando que os três queriam sair da banda para tocar a música “Seven Nation Army" no concerto de quarta-feira.

- E o que aconteceu? – perguntei ao três.

- O John pediu desculpas por ele não ter conseguido tocar a música que nós queríamos. – respondeu o Elijah - E o Sr. B disse que uma banda é como uma equipe e não pode haver divisão, e também que ele tinha escolhido a música “The Final Countdown" porque essa era a música que todos sabiam tocar juntos.

- Eu concordo – respondi – Nós somos uma equipe, e para ser sincero, somos ótimos quando tocamos juntos.

- Mas você conseguiu tocar a música que nós escolhemos. Porque não aceitou o meu convite para entrar na nossa banda?

- Não podemos deixar o John sozinho. Pensem nele, por favor!

- Ah, tá. – respondeu Ennio – Então, nós todos vamos ter que tocar uma música que não gostamos só porque o John não conseguiu aprender “Seven Nation Army”?

- É mesmo – falou Harry – Porque temos que nos amoldar a necessidade de alguém?

Então, eu fiquei em silêncio por um segundo e daí respondi:

- Harry, eu pensava a mesma coisa quando minha mãe passava um tempão ajudando o meu melhor amigo e a mãe dele. – depois que disse isso, comecei a chorar – Só que, ontem, ela sofreu um acidente enquanto dirigia. E precisou acontecer isso para eu perceber que aquilo que a minha mãe disse era verdade: nós temos que fazer tudo ao nosso alcance para ajudar os outros. Tudo bem se vocês não querem mais fazer parte da banda, mas eu quero, porque precisam de mim, e nós precisamos de vocês.

Depois que entrei no auditório, não sei o que aconteceu com o Ennio, o Harry e o Elijah. Mas, o Sr. B, o John e eu sentimos falta deles no ensaio. Então, o Sr. Bowles disse, enquanto enrolava os cabos:

- Não se preocupem, pessoal. Nos saímos bem hoje. E vamos arrasar amanhã à noite. Vejo vocês amanhã! Tchau!

O final do dia para mim foi até melhor que o início. Interessante isso: a terça-feira é o oposto da segunda-feira. Resumidamente, o meu dia terminou comigo jantando com os meus pais e com eles contando que, após terem conversado bastante, eles decidiram desistir de se divorciar. Fiquei tão feliz por dentro. Era uma alegria inexplicável. E os meus pais até me agradeceram por dizer o que eu sentia, mesmo que a decisão tenha sido só deles.

Dormi tão feliz aquela noite. Mas, a única coisa que eu não sabia era se o dia seguinte seria tão feliz quanto o anterior. Pensei que não, mas, foi aí que eu estava totalmente enganado.

Tiago Salpin
Enviado por Tiago Salpin em 17/08/2023
Reeditado em 20/09/2023
Código do texto: T7863989
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