LEO - CAPÍTULO I - VELHARIA
CAPÍTULO I - VELHARIA
- Mas, mamãe! Aquela casa velha, caindo aos pedaços!? O que o velho pensou que a gente podia fazer com aquela velharia toda?
- Sinceramente, não sei, filhota, mas já que eu herdei, é nossa. Fazer o quê?
- E você pretende morar lá?
- Não, claro que não, nós já temos o nosso lugarzinho aqui. O máximo que eu posso fazer é mandar reformar e alugar. Vai render uns trocados extras.
Essa conversa foi tida entre Gilda, professora de trinta e seis anos e sua filha Cristina de dezesseis, que acompanhava os movimentos da mãe que se arrumava para sair para o trabalho, deitada de bruços na cama dela.
Gilda havia acabado de herdar de um velho amigo de seu pai, uma casa nos arredores da cidade e esse era o motivo da conversa. A casa já não era habitada por uma família há mais de dez anos e Cristina abominava a ideia do velho que havia morrido na semana anterior, embora Gilda não retrucasse. Tinha um carinho especial pela família Torres.
A professora ajeitou os cabelos diante do espelho e deu um beijo rápido no alto da cabeça da filha.
- Te cuida, hein, filhinha. Eu volto cedo hoje. Não tenho as duas últimas aulas e acho que o Ivan vem me trazer pra casa.
Cristina fez uma careta ao ouvir o nome do atual pretendente da mãe e aceitou seu beijo.
- Tchau, mamãe, boa aula. Juízo, hein!
Gilda sorriu e saiu.
- Ah, mamãe? - chamou Cristina, correndo atrás da mãe.
- O que é? – disse Gilda, parando na porta já com a mão na maçaneta.
- Já que a gente não tem como devolver aquela velharia, posso ir ver a casa velha hoje?
- Sozinha?
- Com a Leila. Posso? Não tenho nada que fazer mesmo à tarde.
- E o trabalho de Geografia?
- Terminei ontem à noite.
- Tudo bem. Pode, mas cuidado, viu? Tudo lá está muito velho. Seo Samuel morava sozinho e aquilo tudo não é limpo há muito tempo. Não mexa em nada que você não tenha certeza que é firme e confiável... Aliás... não mexa em nada.
- Positivo! – a garota falou, imitando um robô.
Gilda saiu da casa, entrou no Fusca 78 que estava na garagem e foi embora.
No mesmo instante, Cristina fechou a casa e saiu, indo para a casa do lado. Do portão, gritou:
- Leila!
Minutos depois, a menina apareceu na janela, uma garota loira, uns meses mais nova que ela, mas também com dezesseis anos.
- Que é?
- Quer ir comigo até a casa que minha mãe ganhou? Queria ver como é por dentro.
- Não posso. Estou estudando Matemática. Prova, hoje, de recuperação.
- Você não disse que só tinha ficado em Inglês?
- Só em Inglês... e Matemática, falou ela, encolhendo os ombros. – Não vai dar, não. Minha mãe me mata se eu tirar vermelha de novo.
- Poxa! Que chato.
- Eu passo na sua casa depois da aula, amanhã.
- Tudo bem, disse ela, despontada. – Tchau.
Leila entrou em casa novamente. Cristina ficou indecisa entre voltar para casa e ficar sozinha até o irmão chegar da faculdade ou ir até a casa velha sozinha, mesmo sabendo que a mãe ficaria muito zangada com ela. Estava realmente muito curiosa em conhecer a velharia, apesar de não querer morar lá. Contradições de adolescentes.
Mas seus pés pareciam ter vida própria. Começou a andar pela calçada. Atravessou a rua, caminhou cerca de quatro quarteirões e chegou à estação velha de trem, desativada há mais de dez anos. Atravessou os trilhos e chegou à rua dos ferroviários, como era chamada, por ser aquela rua onde moravam os antigos trabalhadores da ferrovia.
O casarão ficava no final daquela rua e Cristina não demorou a chegar lá.
Continua...
LEO – CAPÍTULO 1
“VELHARIA”