Capítulo 27 – Não consigo me lembrar de te esquecer - Parte I


 
Na visão de Lana as horas simplesmente não passaram. Ainda se sentia no mesmo lugar em que viu o corpo desfalecido de Ander. Muitas pessoas tentaram falar com ela, tentaram afastá-la dele, mas de nada adiantou. Só soltou Ander quando já estavam na ambulância, rumo ao hospital. Ela ligou para Alexia e depois para a tia dele para dar a terrível notícia do acidente.

Os enfermeiros tentaram tranquilizá-la dizendo que não era nada grave, mas Lana não ouvia a nenhum deles. Não queria ser tranquilizada, queria que Ander apenas acordasse. Sozinha na sala de espera, sentiu o peso da culpa machuca-la e entregou-se as lágrimas. Não que tivesse vergonha de chorar, já perdera isso há um bom tempo. Mas ela chorou tanto que acabou chamando a atenção de um jovem médico que passava por perto. Sem dizer nada, o rapaz pegou um copo e encheu com água do bebedouro.

- Ele vai ficar bem. – Disse, entregando a ela.

- Você é o médico dele? – O rapaz, um esguio negro de sorriso delicado confirmou com um aceno de cabeça. – Como ele está? – Lana bebeu a água num só gole.

- Estável. É um rapaz muito forte.

- Por favor, eu imploro, ajude ele. – Ela segurou a mão dele, desesperada. Os olhos verdes claro dele fizeram um intenso contraste com os dela. Lucas sentiu-se estranhamente atraído por Lana.

- Sim. – Não era do feitio dele enquanto médico fazer promessas, mas a resposta praticamente voou de sua boca. – Vou fazer de tudo para ajudá-lo.

- Obrigada. – Ela soltou a mão dele. O rapaz deu um quase sorriso e saiu, em silêncio.
 
Vencida pelo cansaço, Lana adormeceu no banco de madeira da sala de espera. Acordou pela manhã coberta por um lençol branco. Não tinha ideia de quem tinha colocado ali. Tirou o celular do bolso de sua jaqueta e viu 2 mensagens de Alexia no visor.

“Amiga, eu e minha mãe estamos chegando em 1 hora. Me manda o endereço do hospital.”

Lana prontamente digitou o endereço e se jogou novamente no banco. Quando acordou, sentiu alguém fazendo carinho em seus cabelos.

- Oi, amiga. – Era Alexia. Lana sentou-se, sonolenta. – Como conseguiu dormir nesse lugar?

- Não sei. Simplesmente apaguei depois que te mandei a mensagem. Não vi a hora passar. Ainda sinto como se tivesse na avenida vendo seu primo todo ensanguentado e jogado perto de um bueiro. Foi horrível, Lexi.

- Eu imagino. – Alexia respirou fundo. Queria contar sobre a proposta de Bruno, mas não era a hora certa. - Minha mãe está na recepção se identificando. Vai pra casa, toma um banho e tenta descansar. Hoje nós ficamos por aqui.

- Não consigo.

- Lana, por favor. Eu te dou notícias.

- Tudo bem. Eu volto amanhã bem cedo.

As duas trocaram um rápido abraço e Lana seguiu rumo a porta de saída da sala de espera. Não viu absolutamente nada ao seu redor, apenas chegou em casa, tomou um banho e dormiu pesado como há anos não dormia. No dia seguinte, ao acordar, viu uma mensagem de Alexia no visor de seu celular.

“Amiga, bom dia! Espero que tenha conseguido dormir. Venha para o hospital o mais rápido que puder.”

Dinorá miou, chamando a atenção de Lana.

- Já coloco sua comida, Dinorá. – Ela se levantou, trôpega e foi em direção ao armário da cozinha. Sorriu esperançosa com uma possível melhora de Ander. – Pronto, gata gorda. – Ela encheu o pote de comida da felina. – Agora vou tomar banho e depois trazer o Ander pra casa.
 
(...)
 
Quando Lana chegou no hospital, às 08 horas, se identificou na recepção e conseguiu permissão para entrar no quarto. Queria esperar por Alexia, mas a ansiedade falou mais alto e ela seguiu pelo corredor, rumo ao quarto de Ander. Conforme a orientação da atendente encontrou o quarto 98B.

Abriu a porta e encontrou Ander dormindo. Sentiu o coração disparar, mas dessa vez, de alegria. Ela se aproximou dele.

- Que saudade de você, meu amor. – Murmurou, baixinho, bem perto de seu ouvido. Virou seu rosto, selando os lábios de forma apaixonada. Ander abriu os olhos, assustado. Não havia resquício algum de reciprocidade. Ele empurrou Lana com nojo, a fazendo cair na poltrona de visitas.

- Quem é você? – Pergunto agressivo, enquanto limpava os lábios. Lana surpreendeu-se com o tom de suas palavras. – Que droga de hospital é esse que as pessoas entram nos quartos e beijam desconhecidos?

- Isso é algum tipo de piada, Ander? – Agora o coração de Lana batia de forma alarmante no peito. Algo estava errado. – O que está acontecendo?

- Não, não é piada! Cadê minha tia? Cadê a Alexia, cara? – Ele mediu Lana dos pés à cabeça. – Pergunto mais uma vez, quem é você? Seu namorado sabe que você entra nos quartos beijando desconhecidos? Se é que um tipinho que nem você tem namorado.

Lana soube que perdeu totalmente o controle ao subir na cama e estapear Ander. Ele tentou segurá-la, mas a força feminina conseguiu render ao menos dois tapas em seu rosto. Ela chorava e batia nele sem entender o motivo de estar sendo tratada daquela forma. Todas as emoções desenfreadas fizeram Lana explodir.

- LANA, NÃO! – Alexia correu para tirar a amiga de cima do primo. – Deus do céu! MÃE! CORRE AQUI!

Naquele momento, o médico entrou no quarto e tirou Lana de cima de Ander, agarrando-a firmemente pela cintura. Em seguida, Eleanor entrou no quarto, tentando entender o que acontecia.

- É, não tivemos tempo de conversar com ela. – O médico manteve um tom de voz ameno em meio ao caos que acontecia no quarto. Lana chorava tanto que começava a faltar o ar nos pulmões.

- Eu... Não... Consigo respirar.

- TIREM ESSA MALUCA DAQUI! – Eleanor abraçou o sobrinho de lado e sentiu pena de Lana. Era uma notícia muito difícil a que teriam que contar a ela.

- Calma, Ander. – Alexia se aproximou de Lana. – Amiga, nós precisamos conversar...

- O que está... – Ela tentava controlar as lágrimas. – Por que ele está fazendo isso, Lexi? O que está acontecendo?

O médico Lucas olhou para Eleanor, que balançou a cabeça positivamente, dando a ele a permissão de revelar a Lana o que acontecera com seu sobrinho.

- Lana... Vamos sair um pouco do quarto. Alexia, nos acompanhe, por favor. – Alexia passou o braço pela cintura de Lana, ajudando a amiga a andar até a saída. Ao fundo, era possível ouvir Ander esbravejando sobre as agressões de Lana. – O Ander sofreu uma lesão cerebral, é um quadro temporário, mas devido a intensidade, ele foi afetado profundamente. Fizemos alguns testes e ele lembra da tia, não lembra a última vez que viu a mãe, lembra da Alexia, até mesmo de como perdeu o pai, mas de você ele não lembra.

- Você está dizendo que ele lembra de todo mundo, mas não de mim?

Novamente, Lana sentiu-se sem ar e agora tonta com a informação.

- Sim, ele não lembra de você. Mas isso não significa que nunca mais lembrará. É um processo. Precisamos que você seja forte, pois contamos com a sua ajuda para que ele recupere a memória.

“Fizemos alguns testes e ele lembra da tia, não lembra a última vez que viu a mãe, lembra da Alexia, até mesmo do pai, mas de você, ele não lembra.”

“Mas de você, ele não lembra”. – Repetiu, mentalmente. “Ander não lembra de mim. Não lembra de mim.”

Nada mais fazia sentido.

Tamiris Vitória
Enviado por Tamiris Vitória em 09/02/2021
Reeditado em 19/01/2024
Código do texto: T7180597
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