Capítulo 9 – Aquele com a primeira briga feia de Lana e Ander

 
O meu sábado começou com uma irritada Lana Hassenback andando de um lado para o outro na minha cozinha.

- Você podia muito bem ter evitado aquilo, Ander!

- Sim, com certeza. Da próxima vez eu vou num supermercado na zona Norte só para te fazer feliz! – Tentei ser engraçado, mas ela interpretou como desdém. – Você ficou nervosa só pelo encontro? Qual é, Lana! Nós transamos depois que você o deixou numa festa sozinho, lembra? Ontem foi uma brincadeira de criança. Até gostei dele!

- Por que você está falando desse jeito?

- Desse jeito como?

- Você está falando com esse jeito maldoso! Aquilo tudo foi... Foi...

- Desagradável? Ruim? Terrível? O que foi aquilo, Lana? Tenho a leve impressão que você só se tocou que o Bruno existe entre nós depois de ontem. Ele existe e é o seu futuro marido! – Me aproximei dela, pressionando-a contra a mesa. – E olha só... – Toquei sua orelha com os lábios e segurei a mão usada para me afastar. - Você o traiu comigo.

As íris esverdeadas arregalaram espantadas ao ver a maldade nas minhas palavras. Não fora minha intenção, mas parece que Lana tinha perdido o bom senso dando uma crise a troco de nada.

- Achei que tudo aquilo poderia ser esquecido.

- Eu também achei que poderia ser esquecido, mas você parece que ficou extremamente nervosa ou sei lá, envergonhada, com o que aconteceu ontem. Agora eu te pergunto... Por quê?

- Ander...

- Se é para esquecer, vamos esquecer, mas não adianta você agir como se quisesse me esconder dele. Isso é ridículo! A traição é uma realidade e eu também! Ou agora que ele me conhece você vai simplesmente se afastar? Agora não é mais tão divertido me manter na sua vida simplesmente por ser egoísta demais para me deixar partir?

Suas expressões foram da surpresa, indo ao puro choque e por fim, à lágrimas de raiva. Pela primeira vez, em todos esses anos, fui capaz de atingi-la com minhas palavras. Ela me deu um empurrão e seguiu em direção a cozinha.

- Volta aqui, Hassenback! - Eu a puxei pela cintura e a joguei contra a parede. Ela se debateu, tentando escapar dos meus braços. Segurei seu rosto, forçando Lana a me olhar. – Eu estou cansado de me sentir um babaca usado por você! Na verdade, acho que tudo isso para você é um grande e divertido jogo no qual eu e o Bruno somos seus subordinados. Quando se cansar de nós vai fazer o que? Nos substituir?

Como resposta, recebi um tapa tão forte no rosto que fiquei meio zonzo.

- Você é um imbecil, Ander! Eu te odeio!

Ela saiu do meu apartamento batendo a porta com muita força. Soltei o ar preso durante todo o tempo da briga e precisei me sentar na cadeira.

Liguei para Alexia depois de meia hora refletindo sobre toda a briga com Lana.

“Opa!”

- Você já sabe ou posso te contar em primeira mão?

“Não sei, mas recebi uma mensagem em caps lock com os dizeres ‘EU ODEIO O ANDER!’ Bem, acho que você fez alguma coisa.”

- Eu fui no mercado ontem e encontrei nada mais, nada menos que o digníssimo Bruno.

“O Bruno da Lana?”

- É.

“Tu tá de sacanagem.”

- Não, não estou. Eles estavam no mesmo mercado que eu. Comecei a conversar com ele sobre macarrão sem saber que era o mesmo Bruno, até o momento em que a Lana apareceu.

“E aí?”

- Eu tentei levar aquilo numa boa, mas (...) - Quando terminei de contar o encontro no mercado, Alexia riu alto. – Ela ficou muito nervosa, sério! Inclusive, doeu o tapa!

“Ainda não consigo acreditar que você desestruturou minha amiga!”

- Eu sei que peguei pesado, mas caralho, Lexi! O jeito que ela agiu foi completamente sem noção. É como se tivesse percebido que o traiu comigo e não queria lidar com nada daquilo, sabe?

“É, não podemos negar que você falou pra magoar mesmo, mas acredito que o problema não foram as palavras, mas sim o modo que foi dito.”

- Você acha que eu devo me desculpar? Eu confesso que mesmo depois de ter dito aquilo ainda estou com sentimento de culpa. Meio aliviado, mas culpado.

“É o modo que você falou... Olha, eu acho que você deve sim se desculpar. Não pelas palavras, mas pelo modo que foi falado.”

- Eu acho que realmente não poderemos ser só amigos.

“Lógico que não! Vocês se amam, Ander. Quando um parar de amar o outro, quem sabe!”
 
Conversamos mais um pouco, até que precisei desligar, já que tinha algumas coisas do trabalho para adiantar. Nesse tempo, recebi a ligação de Gabi me chamando para sair, mas acabei recusando. Preciso falar com a Lana.

Convencê-la a me encontrar era totalmente fora de cogitação. Precisei pensar num plano B, que foi busca-la no trabalho. Como eu não sabia o local, precisei da ajuda da Lexi. Cheguei em frente ao prédio colorido às 18 horas. Lana apareceu alguns minutos depois. Vestia uma calça jeans preta, blusa regata vermelha com uma jaqueta por cima. Uma leve brisa fria ameaçava queda de tempo na cidade. Ao me ver, sua expressão severizou-se. Parecia um ursinho de pelúcia bravo.

- E aí, Lana Hassenback!

- Não vou nem perguntar como você descobriu o local que trabalho. – Ela parou na minha frente com os braços cruzados, o rosto ainda muito bravo, não combinando em nada com a trança enorme e angelical que usava.

- Já sabe a resposta, não é? 

- Sei. O que faz aqui?

- Ah, vim olhar a vista desse bonito prédio colorido. - Ela revirou os olhos e ficou ao meu lado. Eu a olhei de soslaio. – Deve ser legal trabalhar com Marketing Digital.

- Paga as minhas contas. – Respondeu, dando de ombros.

- Lana. – Respirei fundo e tirei um embrulho em cima do banco do passageiro. – Desculpa pela grosseria na briga de ontem. – E entreguei a ela. – Espero que você ainda goste de chocolate com licor.

Ela não demonstrou nenhuma reação de início, mas depois, olhou o buquê cheio chocolate e deu um meio sorriso, ainda muito duro.

- Eu ainda gosto. Obrigada. – Eu a abracei de lado e beijei o topo da sua cabeça. – Ander.

- Oi, Lana.

- Me desculpe também por ter exagerado e pela outra briga que tivemos. Eu sabia que você se sentia daquele jeito, mas vê-lo falar foi difícil.

Alisei seu rosto, carinhosamente. Quando de modo impulsivo, Lana selou seus lábios nos meus. Segurei sua cintura com medo dela se afastar. O beijo veio natural, mas triste. Não sei se é possível um beijo ter sabor, mas aquele em especial, teve.

- Sermos amigos é uma loucura, Ander. Acho que você já imaginava isso, eu também, mas é tão difícil não ter você depois que sei como é tê-lo. Eu sou uma pessoa egoísta e você não merece ficar preso a mim. Nós devemos ficar longe um do outro, dessa vez, de verdade.

Sim, eu sei, vocês estão pensando: “mas de novo essa garota está te deixando, Ander?”. É, de novo. Assim como o beijo, suas palavras tinham um sabor diferente. Ela realmente queria me tirar da vida dela. E dessa vez, de verdade.

 

Tamiris Vitória
Enviado por Tamiris Vitória em 03/01/2021
Reeditado em 18/01/2024
Código do texto: T7151131
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