IV.1 CAPÍTULO - O MILAGRE... EU ESCUTO SUA HISTÓRIA.

A varanda da casa é imensa e com uma vista deslumbrante... de frente para o nascente, e diante de uma magnifico jardim! As crianças caminham devagar e em silencio. Cercam a senhorinha que, sentada em sua banqueta acolchoada, continua tecendo sua bela manta colorida, solfejando uma canção muito antiga. Sarah, sentada ao lado de Inaiê, olhando-a, ansiosa, a espera da história do dia. Não aguentando a demora, pergunta.

______ Vovó, qual a parte da história de Vali Oãs Cricosfan, a senhora vai nos contar hoje?

Rafael se aproxima da vovó e toca em seu ombro.

______Posso sugerir, vovó? Já conversamos sobre o assunto…

______Pode sim meu amor! Qual parte todos gostariam de ouvir?

______Sobre a cura dos habitantes! Sobre a chegada de Valentina ao Vilarejo!

______Está bem. Mas antes quero saber, como foi a aula hoje?

______Foi maravilhosa vovó!

______Então, terei imenso prazer em contar mais uma história sobre Vali Oãs Cricosfan. Sentem-se e façam silencio. Era uma vez, uma bordadeira chamada Valentina. Ela chegou ao vilarejo numa charrete puxada por uma dupla de cavalos negros como uma noite de Lua Nova. Sua charrete era semelhante a um caramanchão florido, cheirando a jasmim. No arco que sustentava a cobertura, havia um letreiro, pintado em azul lavanda, onde estava escrita a seguinte frase: “SENTE-SE, ME CONTE SUA HISTÓRIA E GANHE UMA PRENDA!” A charrete parou no centro do vilarejo. Com a ajuda do cocheiro, uma senhorinha muito simpática desceu. O cocheiro trouxe para o chão um tapete colorido, uma pequena mesa montável e vários objetos. Entre eles um bastidor, um pau-de-chuva, um sussurrador e uma cesta repleta de pequenas sacolas coloridas, fechadas por laços de fita. Novelos de lã de várias cores. Um artefato, igual ao “papagaio tirador da sorte”, todo feito de madeira, posto em movimento por uma manivela. Duas cadeiras. A senhorinha sentou-se em uma das cadeiras, pegou o bastidor, prendeu nele um tecido semelhante a seda e principiou a bordar, com extrema delicadeza. As pessoas começaram a se aproximar, curiosas. O “papagaio”, tagarelava, anunciando eufórico: “SENTEM-SE. SENTEM-SE. CONTEM SUAS HISTÓRIAS PARA VALENTINA E GANHEM UMA LINDA PRENDA! VENHAM TODOS. VENHAM...” as pessoas foram trazendo cadeira, bancos, tamboretes e em pouco tempo havia se formado uma plateia ao redor da carroça e da contadora de histórias.

______Quem foi a primeira pessoa a contar sua história para Valentina, vovó?

______Gerôncio.

______Mas ele não estava preso?

______ Ele foi solto por bom comportamento e também por que Celeste alegou que tudo o que havia acontecido fora um lamentável acidente! Gerôncio foi posto em liberdade, mas apesar de tudo, não aprendeu nada. Continuava sendo arrogante e inescrupuloso.

______Misericórdia!!!

______Imagino o que ele aprontou com a pobre da Valentina!

______Vamos ouvir a vovó.

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IV.1 – CAPITULO – A NÃO CURA DE GERÔNCIO

Como sempre, as crianças acompanham atentas o desenrolar da história e se abstraem da realidade, embarcando num mundo encantado, onde tudo é possível. A vovó conta, com detalhes, os acontecimentos de Vali Oãs Cricosfan. Um homem de aparência desleixada mas ainda assim extremamente arrogante, arrasta, com brutalidade, a cadeira que está vazia, senta-se e olha a idosa, com uma expressão de pura animosidade. A mulher levanta a cabeça e o olha com o mesmo afeto com o qual olha os outros presentes.

______ Pode falar amigo. Fique a vontade.

______Não lhe conheço e nem sou seu amigo. Você entra no meu vilarejo e, sem procurar saber se pode parar e armar sua barraca de bugigangas, já vai se aboletando. Aqui é uma comunidade e não aceitamos estranhos espaçosos... se não sabe, agora ficará sabendo: para fazer suas apresentações de feitiçarias, terá de pagar uma taxa.

As pessoas se aproximam e formam um circulo, no centro do qual ficam Valentina e Gerôncio. O olhar que dirigem a ele, não deixa dúvidas de qual lado estão. Valentina percebe a animosidade deles contra o homem a sua frente, e tenta apaziguar a situação.

______ O senhor me desculpe, mas eu não sabia desse detalhe. Com quem devo falar então, para conseguir a licença?

Gerôncio esmurra violentamente a pequena mesa, quase derrubando seu conteúdo. Seus olhos parecem boiar em sangue.

_______ Comigo mesmo!

_______Que conversa é essa, Gerôncio? Desde quando um Caminhante tem que pagar taxa para nos alegrar e fazer companhia? Você está com febre?

_______ A senhora, doutora Coralia, devia se preocupar com seus pacientes lá do PAM, não comigo!

_______Esqueceu o que Benjamim falou? Somos os dirigentes de Vali Oãs Cricosfan e todos os Caminhantes são bem vindos aqui. Em especial os que nos fazem companhia e nos alegram. Quanto aos meus pacientes do PAM, estão todos em suas casas e muito bem, obrigada.

______Você não se envergonha disso não?

______Não aprendeu nada mesmo... não adianta, ele não perde oportunidade de querer tirar vantagem das pessoas. Coisa mais feia. A senhora nos desculpe.

Valentina ergue os ombros e sorri. Gerôncio não se dá por vencido e resolve contar sua história.

______Falam do que não conhecem. Desde criança, toda minha vida vivi em função do trabalho. Sem descanso. Quando meu pai ainda estava entre nós era eu quem estava ali, ombro a ombro com ele. Trabalhando em prol do crescimento e do bem estar desse vilarejo. Vocês foram chegando, aos poucos, mas apenas para usufruir dos benefícios que tínhamos para oferecer. Digam-me, o que fizeram para melhorar a situação do lugar? Não precisam falar, eu mesmo respondo. Fizeram NADA!

______Como você tem a coragem de abrir a boca para falar tanta asneira?

______Não me provoque doutora Corália! Não vai gostar de saber o que aprendi nesses anos de prisão!

______Está me ameaçando Gerôncio? Não tenho medo de você!

O homem pára olhando fixo, para além de Valentina. Parece hipnotizado. Súbito arregala os olhos, leva as mãos ao peito e cai, sem um gemido. Coralia se abaixa e toca com os dedos indicador e médio, seu pescoço, num ponto especifico, tentando encontrar sua pulsação. Não encontra. Gerôncio está morto. Ataque cardíaco fulminante. As crianças “retornam à realidade” e ficam alvoroçadas.

______ Coitado!

______De nada lhe serviu tanta arrogância...

______... e maldade! Ele quis matar o próprio irmão e feriu gravemente a irmã... o Gerôncio era do mal!

______ Sabe, uma coisa que eu nunca entendo... eram irmãos, filhos dos mesmos pais... e porquê cargas d'água ele era tão diferente dos outros dois?

______Da mesma forma que, mesmo estando na nossa face, nosso nariz tem uma narina com o formato diferente da outra!

______Não entendi!

______Nem eu... quer saber? Vamos ajudar a vovó recolher seus objetos que está quase na hora do almoço... e hoje, o prato principal é ensopado de repolho!

______Eita meu Deus! Hoje ninguém dorme...

O som da risada infantil se espalha pelo espaço, enchendo todos de uma alegria benfazeja. Já nem lembram mais da desventura de Gerôncio.

OBS: Cap. de ELE, O MEU AMOR... MEU PEQUENO BEIJA-FLOR, em construção.

Adda nari Sussuarana
Enviado por Adda nari Sussuarana em 29/12/2020
Código do texto: T7146488
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