A ESPOSA DO SAMURAI

A ESPOSA DO SAMURAI – 28 JUN 16

A ESPOSA DO SAMURAI I

Era bem raro os antigos samurais,

envolvidos em perpétuo treinamento,

se disporem a contrair um casamento,

pois parecia responsabilidade ser demais.

Graças, porém, a ocorrências eventuais,

certo Senhor deixou em testamento

algumas terras de vasto rendimento

a um que o servira acima e além dos mais.

E dessa forma, abandonando a guerra,

já que de fato ficara sem Senhor,

o samurai foi tomar conta de sua terra,

logo a seguir pensando em se casar,

pela jovem Oiwako nutrindo certo amor,

um sentimento que aprendera a desprezar...

Oiwako só o chamava de Oto-San,

que significa “senhor meu marido”;

e o matrimônio que haviam contraído

foi coroado por enérgica paixão.

Porém não pôde provocar-lhe gestação

e Oto-San foi ficando aborrecido;

sem ter filhos, seu ardor era perdido,

maior que fosse a firme e mútua devoção.

Uma noite, foi com ela a um casamento,

no qual jovem muito bela conheceu,

chamada Matsuo... e então a quis trocar,

já não nutrindo o mesmo sentimento...

E sendo um homem feroz, o impulso seu

foi de sua amante esposa assassinar!...

E quando estavam os dois ao lar voltando,

passando a trilha por penhasco à beira-mar,

viu-se tentado a Oiwako derrubar,

que num só grito às rochas foi tombando!

Chamou os amigos, aos berros, implorando

que o ajudassem a esposa a resgatar,

pois mentiu que a não pudera segurar,

quando no limo a vira escorregando...

Achado o corpo e após feito o funeral,

pôs-se a dormir na solitária casa,

feliz com a aquisição da liberdade...

Zunia o vento através do carvalhal,

gélidos raios de luar, dedos de gaza,

silenciados os ruídos da cidade...

Mas de repente, acordou sobressaltado,

por uma voz a sussurrar: “Vingança!”

Olhou ao redor e a luz bem alto alcança:

em torno à casa só havia um descampado...

No outro dia, acordou estremunhado,

mas do projeto que firmara não se cansa:

de Matsuo vai aos pais, na esperança

de obter consentimento ambicionado...

Sendo um casal de pobres camponeses,

com doze filhas e nenhum varão,

foi uma honra lhe conceder sua mão;

mas para a boda exigiram mais três meses,

até poderem completar o enxoval,

caso contrário, sentir-se-iam muito mal...

A ESPOSA DO SAMURAI II

E nessa noite, foi dormir alegremente,

até de novo se acordar, sobressaltado,

a parede deslizando para um lado

e uma presença... gemendo horrivelmente.

Era Oiwako, descabelada horrivelmente,

semienvolta num manto esbranquiçado,

um dos olhos sobre a face pendurado...

“Quero Vingança!” – uivando ferozmente.

O samurai ergueu-se, apavorado,

e para a rua escapou, rapidamente:

chamou os criados, mas nada foi achado.

Na outra noite, foi dormir numa cabana,

a luz da lâmpada acesa permanente,

contra o retorno da visão insana!...

Porém, precisamente à meia-noite,

a lamparina pareceu ter aumentado

e nessa chama foi o rosto divisado

de Oiwako, que gemia num aboite!....

Até os bambus das paredes, como açoite,

contra ele se haviam levantado

e o samurai acordou-se, chicoteado,

e bem depressa fugiu do seu acoite!...

Mas ao ar livre viu dois outros samurais,

Gunzê e Kaminazu, seus bons amigos,

que o atacaram, com olhos apagados

e o fantasma retornou, soltando ais!...

O samurai correu dos três perigos,

os dois guerreiros parando, atarantados!

Mas o pescoço de Oiwako ali esticou-se

e o perseguiu ao longo dessa estrada!

De um só golpe, cortou-o com a espada,

mas a cabeça decepada gargalhou-se!...

“Vingança!” – disse. E o samurai desesperou-se.

Foi sobre o túmulo rezar da assassinada

e por três meses não lhe surgiu mais nada,

até que o novo casamento celebrou-se...

Mas no banquete de comemoração

apareceu-lhe à porta o seu fantasma,

em forma de esqueleto esfarrapado...

Tentou evitar dos convivas a atenção,

rindo bem alto para a assembleia pasma,

que o visitante só por ele era enxergado!...

Mas a cabeça cresceu, desmesurada

e o samurai pôs a fugir, no seu terror,

pelo fantasma perseguido com ardor

e ao precipício foi sendo encaminhado...

E bem no ponto em que a havia empurrado,

no descontrole de seu total pavor,

Oto-San se jogou contra o fragor

e sobre as rochas foi também despedaçado!

Então Oiwako mais uma vez apareceu,

em seu quimono e formosa, novamente

e o ergueu dos recifes gentilmente...

“Oto-San, serás agora sempre meu:

irás comigo para onde eu te levar,

que não deixei um só instante de te amar!...”