A pizzaria, a briga e os ex’s
- Não!
- Por favor, Leo! Eu estou implorando!!
Marine segurou Leo encostado ao carro. Ele resistia bravamente ao pedido da garota de olhos azuis turquesa.
- Eu não vou na pizzaria com a ex-namorada do Renan!
- Por favor! Ela me convidou, mas não sei se vou aguentar horas no mesmo lugar que Renan e a namorada!
- Ah, e eu vou?
- Mas eu estarei lá, a nossa união fará a força! – Leo tentou fugir de Marine, mas ela o segurou pela cintura, firmemente. – Por favor, eu juro que fico te devendo uma!
- Por que diabos você aceitou ir numa pizzaria com o primo cujo qual você mantém uma relação sexual esquisita e a ex dele, hein?
- Talvez porque eu seja estranha e goste de passar raiva?
- Ah, Marine! Puta merda!
Ela segurou o rosto dele, desesperada. As testas se encostaram e os lábios ficaram numa distância muito pequena.
- Por favor?
- Não vale usar da sua sensualidade para me convencer!
- Cala a boca! – Marine se afastou dele, rindo.
- Ok, eu aceito.
- Obrigada, Leo! – Ela olhou para o relógio em seu pulso. – Ai, estou atrasada! Até a noite, tchau!
(...)
“Mais uma vez me permitindo a uma humilhação imensa pois não sei dizer não para gente dessa família.” – Leo sentiu quando Marine segurou a mão dele, firme, com medo dele fugir do encontro com Renan e Cristina. Ele não fugiria, mas como sempre, sabia que passaria muita raiva. “Será que na outra vida eu fui algum patrão violento da família do Renan e nessa vida ele me pune?”.
- No que você está pensando? – Marine perguntou, o olhando de soslaio. A pizzaria estava bastante cheia e os dois precisavam de um esforço imenso para passar pelas pessoas sem atropela-las.
- Pensando em pizza.
- Mentiroso, você está com uma carranca!
- É a fome.
- Obrigada, sério. – Ela sorriu, realmente agradecida por não passar por isso sozinha. “Olha lá ela usando o charme e essa maldita onda de fragilidade.” – Eu não sei como passaria por isso sem você. “Como é que pode ser tão bonita?”.
- Caramba! – Renan exclamou quando os dois enfim chegaram a mesa. Cristina, de costas, olhava seu celular, distraída. – Vocês demoraram!
- Trânsito. – Leo respondeu, simplesmente. Cristina, ao ouvir a voz dele, virou-se para olha-lo e sorriu, maldosamente. Marine notou o clima automaticamente mudar. Os dois se acomodaram nas cadeiras livres. – E aí, Cristina.
- Olá! – Ela rapidamente olhou para Marine e fixou o olhar em Leo. – Quanto tempo, hein?
- Pois é. – Leo a ignorou. – E aí, cara! Já pediu a pizza?
- Já. A de sempre. – Respondeu Renan, avaliando em silêncio as roupas de Marine. – Lavou a louça?
- Lavei, Renan. – Marine respondeu, friamente.
- Ótimo.
O encontro se resumiu num clima terrivelmente pesado que Marine não conseguira decifrar de onde vinha, e em Cristina sendo sarcástica e maldosa com Leonardo. No fim da noite, Renan levantou, para ir até o banheiro e Marine o seguiu.
- Renan. – Ela o chamou, quando já estavam longe da mesa.
- Nossa, mas não resiste mesmo a ficar longe de mim, não é?
- Cala a boca! - Marine revirou os olhos. – Sempre foi assim?
- O que?
- Como o que? Cristina e o Leo discutindo e para você é normal?
- Ahh... – Ele deu de ombros. – Isso é normal até demais.
- Ah.
- Eu posso usar o banheiro em paz?
- Pode.
Renan entrou no banheiro, deixando uma pensativa Marine para trás. Ela olhou para a mesa e viu uma proximidade estranha entre Leo e a ex-namorada do primo. Não era romântica ou sexual, era odiosa. O rapaz a olhava com frieza e sussurrava algo que Marine daria qualquer coisa para ouvir.
“Por que isso está me soando tão esquisito?” – Marine se questionou, voltando para a mesa. E foi nesse exato momento que Cristina jogou suco na cara de Leo, manchando sua camisa preta. Ele se levantou lentamente, a olhou de forma mortificante e saiu.
Marine o seguiu, instantaneamente. Todos os presentes na pizzaria pararam para olhar a cena.
- LEONARDO! – Gritou Marine, correndo. Só conseguiu alcança-lo quando já estavam do lado de fora. – Me espera!
- Vamos embora.
- Ok, mas o que aconteceu ali? – Perguntou.
- Nada além dessa garota sendo a mesma imbecil de sempre! – Ele seguiu pelo estacionamento, andava batendo os pés e tremia, furiosamente.
- Ela jogou um copo de suco em você do nada?
- Não.
- Mas...
- Será que dá para gente só ir embora sem você me encher de perguntas? – Marine sentiu-se encolher diante do grito do rapaz. - Obrigado.
Marine só voltou a ouvir a voz do rapaz quando estacionaram em frente à casa dele.
- Obrigada. – Ela agradeceu, carrancuda. Leo respirou fundo e olhou para o teto do carro. – Eu posso ao menos perguntar o que aconteceu ali?
- Aconteceu exatamente o que você viu, Marine. Ela jogou suco na minha cara. – Marine olhou para a mancha na camisa masculina. – Só.
- Tudo bem.
Ela colocou a mão na porta, pronta para abri-la, mas Leonardo a impediu.
- Para.
- Parar com o que?
- Com isso. – Leo bufou, com raiva. – Olha, desculpa pela forma que eu falei com você.
- Tudo bem. – Ela manteve a mão do rapaz ali. Gostou do calor que ele emanava. – Eu não achei que era tão grande o ódio que vocês sentem um pelo o outro.
- É. Afinal o que é um casal de namorados ou ex's sem ter um amigo para a namorada vilã despejar todo seu ódio?
Marine não compreendeu todo aquele sarcasmo, mas também preferiu nem tentar entender.
Alguns dias se passaram e o acontecido na pizzaria foi deixado de lado. Ao menos para Leonardo e Renan. Marine não conseguia engolir a desculpa do rapaz. Ela resolve pensar em alguma forma de descobrir essa história. Depois de noites e noites insones, uma ideia vem a sua cabeça.
Era pouco antes da meia noite quando Marine observou a casa de Leonardo. Só tinha uma única luz acesa, a da sala. Por um impulso muito maior do que podia controlar, seguiu até a casa e entrou pela janela da cozinha. Pequena e ágil, não fez barulho algum. Mal colocou os pés no chão e sentiu seu coração disparar ao ouvir uma voz feminina provocante e ameaçadora.
Era Cristina.
“Ah!” – Ela riu, debochada. – “Você vai contar para ele então? Tudo isso para contar pontos com a prima dele? Você é nojento, Leonardo!”
- Eu vou contar porque isso já passou dos limites! Eu gostaria bastante se você tirasse a mão daí, Cristina!
“Por que? Eu não te excito mais?”
As pernas de Marine fraquejaram. “Não. Ele não pode ter traído a confiança do Renan assim! Não, merda! Será que ninguém nessa droga de cidade é confiável?”
- Não! Você não me excita mais! Já faz tempo que não sinto nada com o seu toque e achei que já tivesse feito você entender isso!
“Mente tão mal, Leonardo. Sempre mentindo mal. Sempre sendo castigado por isso! Se você está tentando contar pontos com aquela vadiazinha, aviso logo que ela está apaixonada pelo Renan, viu?”
O tom maldoso nas palavras de Cristina fizeram Marine ter ânsia de vômito. “Como é que o Renan pode amar alguém assim?” e acrescentou “Como é que o Léo pode ter se envolvido com alguém como ela?”.
- Primeiramente, ela não é vadia. E o que ela sente ou deixa de sentir pelo Renan é problema exclusivamente dela. Você que o ama deveria estar mais preocupada, não?
“Por que? Renan é completamente louco por mim!” – E ela riu. Marine engoliu seco a vontade de chorar. “Você sabe que ele não vai acreditar no que tivemos, não é?”.
- Eu pago para ver, Cristina.
“Se é assim que você prefere, tudo bem.”
Marine resolveu espiar a sala e surpreendeu-se ao ver Cristina beijá-lo. Era um beijo voraz e poderoso. Um beijo de quem já sabia que dominava. De duas pessoas que se conheciam há muito tempo.
Leo a empurrou, agressivo e limpou os lábios, enojado. Pegou Cristina pelo braço e a levou porta a fora sob gritos femininos de protesto.
Silenciosa, Marine foi até o centro da sala e se jogou no charmoso sofá cinza da casa do melhor amigo de Renan.
O melhor amigo de Renan.
O rapaz que Marine jurou ter alguma decência. O rapaz que ela sentiu um profundo afeto. Ele tinha um caso com a namorada do primo.
Ela sentia vontade de chorar e não sabia o porquê.
- Marine? O que faz aqui? – Leo perguntou, mas não teve a resposta, pois a pequena e retraída moça voou até ele. Foram tapas, socos e lágrimas. Ele tentou se defender, sem compreender totalmente porque apanhava. – Para! - Os dois caíram no sofá. – O que foi que você ouviu?
- Como você tem coragem de ter um caso com a mulher que seu melhor amigo ama? – Marine não sabia se estava defendendo Renan ou profundamente magoada por Leo ter algo com Cristina. – Vocês paulistanos são todos podres! Eu odeio essa cidade! – E um tapa foi desferido contra o rosto dele.
O silêncio foi mortificante. Leo a soltou lentamente e se afastou. Ficou de costas para ela por algum tempo. Sentia dificuldade em controlar sua respiração.
Levantou, receosa e quando o tocou, parcialmente arrependida, foi brutalmente puxada.
- Olha aqui! Você além de invadir a casa alheia como fosse um ladrão, entendeu tudo completamente errado!
- AH, ENTENDI SIM! EU ENTENDI BEM COM AQUELE BEIJO! VOCÊ É NOJ.. – O desespero de Leo em fazer Marine se calar foi tão gigantesco, que ele fez a primeira coisa que passou por sua cabeça: beijou a prima do melhor amigo. O corpo de Marine endureceu diante daquele contato físico repentino. Ele forçou a entrada de sua língua na boca dela, até sentir toda a tensão no corpo feminino diminuir. E quando aconteceu, seus dedos entraram por dentro do cabelo dela. Testas coladas, uma mão que segurou a cintura, a outra que acabou correspondendo, sem pensar.
- Eu não sou amante dela. Você entendeu tudo errado. – Ele mordeu o lábio inferior, angustiado. – Cristina é a minha ex-namorada. Eu a conheci antes do Renan, bem antes... Ela terminou comigo quando minha mãe faleceu.
Leo sentou-se no sofá, sem demonstrar o quanto aquele beijo a força mexera com ele. Marine se virou para observa-lo, mas não sabia o que falar.
- Foi uma fase de merda na minha vida. Renan e eu havíamos brigado por uma babaquice dele e só voltamos a nos falar no funeral da minha mãe. No dia seguinte ele me falou que estava namorando e no dia do meu aniversário de 18 anos eu soube que era a Cristina.
- Ela terminou com você para ficar com ele? – Marine perguntou, perplexa.
- Sim. Ela morava em outro bairro. E o nosso namoro era às escondidas. Renan não sabia dela. Ela sabia que eu tinha um amigo de nome Renan, mas diz que não sabia que era esse o Renan em questão. Quando descobri fiquei muito na merda, mas sou e sempre fui um otário na questão de amizades. Escondo isso há todos esses anos porque sei o quanto ela o fez feliz. Doeu pra caralho ouvir dela que “jamais me amaria como ama o Renan”.
- Mas ela te beijou...
Marine sentou-se ao lado dele.
- É. Ela me beijou porque sabe que eu a superei e não admite isso. Na real, acho que ela ainda me ama, mas Cristina é uma maldita de uma psicopata. É como se ela quisesse os dois, sabe?
- Eu sinto muito.
- Tudo bem, já superei.
- Você sabe que precisa contar a verdade ao Renan, não sabe?
- Sei, mas não sei como contar. E isso me deixa extremamente angustiado, porque conheço o Renan. Ele não vai acreditar em mim.
- Ele acreditará se você colocar os fatos nos olhos dele, Leo. – Ela tocou o braço dele. Sentia um estranho alívio. – Renan é burro, mas não tão burro assim.
- É. – Ele a olhou de soslaio. – Desculpa pelo beijo. Você não calava a boca de forma alguma.
- Tudo bem. – Ela sorriu, tímida. – Desculpe pelos tapas e arranhões.
- Sem problemas. Seu tapa doeu pra caramba, imagino porque até hoje Renan tem ódio do soco que você deu.
- Idiota!
Ele a abraçou de lado, surpreso e grato de ter alguém de confiança para compartilhar esse segredo. Lembrou do sabor doce dos lábios de Marine e torceu para que aquilo fosse esquecido. Mesmo que ele próprio não tivesse certeza se conseguiria esquecer.