Aos 16
Sérgio Fleming recebe uma promoção no trabalho. A mudança é não apenas financeira, como também residencial. O pai de Marine compra uma casa no bairro próximo ao seu novo emprego. Não há objeção alguma da garota quanto a mudança, mas a nova escola traz uma nova perspectiva. E essa nova perspectiva faz com que Marine fique insone em seu primeiro dia de aula. O pai tenta tranquiliza-la com palavras carinhosas, mas não obtém muito sucesso. A única forma que Marine encontra para passar tranquila pelo primeiro dia de escola é agir como se fosse invisível. Para esconder o rosto, usa um moletom grande. Para se manter inerte ao restante dos alunos da escola, ouve música com fones de ouvido em seu celular. É uma estratégia perfeita, porém ao entrar na sala de aula, os 35 alunos da sala e também a professora a observaram, embasbacados com sua beleza. Então os comentários começam a surgir. Na hora do intervalo, a estratégia de se manter invisível não fora mais tão eficaz. Um rapaz, em especial, consegue ter a atenção de Marine.
Finneas Paddock ou simplesmente, Finn, aluno do 3º ano do ensino médio a encontra no corredor após ter sido expulso da aula. O primeiro encontro é marcado por uma troca de olhares onde o rapaz consegue fazer com que a garota pense nele durante vários dias. Ele é considerado a maior velha negra de todas as professoras. Ruivo, olhos castanhos escuros, cabelos cacheados, alto, dono de um rosto forte com expressões suaves. É um dos garotos mais bonitos da escola. Finneas é filho de hippies, cheio de ideias libertárias, tem uma visão descomplicada da vida e uma simplicidade encantadora demais para não se deixar envolver. Por um mês Finn tenta conquistar a simpatia de Marine, mas ela resiste bravamente. Ele não desiste.
Após uma confusão no intervalo em que Marine é abordada de forma agressiva por uma de suas colegas de turma, ele a defende das garotas.
- Obrigada. – Ela diz, depois que Finn a leva para a quadra da escola. – Eu não sei o que o levou a fazer isso, mas obrigada.
- Eu gosto de você.
Marine vê Finn tirar uma carteira de cigarro do bolso e depois um isqueiro. Ela se senta no chão e ele a acompanha.
- Você não me conhece.
- Não conheço, mas estou tentando conhecer.
- Por que? – Eles se olharam brevemente. Tímida com a intensidade daquele olhar, Marine tenta desviar, mas Finn segura seu rosto. Ela permite aquele toque.
- Cara. Você é absolutamente linda. Dá para entender porque as meninas da sua sala te odeiam. - Sem jeito, Marine afasta as mãos de Finn. – Desculpa, não quero que fique tímida.
- O que você quer?
- Eu quero que você me deixe fazer parte da sua vida.
- Por que?
- Algo me diz que você precisa de mim na sua vida.
- Uau! – Ela exclama, debochada. Finneas ri dela. – Do que você está rindo?
- De você.
- Eu não sou engraçada.
- Você é sim. Só não demonstra isso.
- Não tenho o porquê demonstrar.
- O que a vida te fez para você ser assim, Marine?
Tinha na ponta da língua a resposta, mas ao formula-la se perdia e uma inesgotável vontade de chorar a vencia. Com Finn, surpreendentemente não se sentira assim. Havia interesse na pergunta. Não era só uma pergunta vaga como todas as outras perguntas vagas que as pessoas fazem umas às outras. Ele realmente queria saber da vida de Marine.
- Muitas coisas. A vida me fez muitas coisas. E esse monte de coisa me tornou essa garota que como dizem as meninas da minha sala, “extremamente arrogante e metida”. – Ela acabou rindo de seu próprio sarcasmo. Finn sorriu ao vê-la rir. – A vida já me tirou muita coisa, não preciso de ninguém entrando na minha vida para depois ser tirado de mim.
- E como é que você sabe disso?
- Eu simplesmente sei.
- Eu não vou sair da sua vida. A não ser que você queira me tirar da sua vida.
- Não, Finn.
- Você quer que eu faça parte da sua vida, mas tem medo de que eu vá te decepcionar, não é? – Ela assentiu, com um aperto no peito. Era um aperto diferente, um aperto de uma expectativa. De algo novo que estava prestes a acontecer. – Eu quero ser parte da sua vida, Marine Fleming.
Ela balançou a cabeça, negando por várias vezes. Olhava para o rapaz esperando por algum indício de que estivesse brincando com seus sentimentos. Não encontrou. Lágrimas começaram a escorrer por seu rosto e ao tentar esconder Finn não permitiu.
Toques de mãos, corações disparados, um corpo que pedia para ser abraçado e protegido, outro corpo que queria abraçar e proteger.
Finn conseguiu a entrada para a redoma de vidro de Marine.
Foram somente amigos por 5 meses. Finn reconstruiu a segurança e autoestima que destruíram em Marine. No 6º mês, a paixão falou mais alto e os dois se beijaram. No mês seguinte, pareciam ser uma coisa só. Inevitável. O pedido de namoro foi tão natural e irresistível que só uma única resposta era possível. O pai de Marine apesar de não confiar totalmente em Finneas, resolve não ser um empecilho. Principalmente por ver a filha tão feliz como não via há anos.
Finn é responsável não apenas pelas mudanças internas, como também externas da menina Fleming. Ele a leva para fazer a primeira de muitas tatuagens, e também o primeiro e único piercing, no septo. A primeira experiência sexual dela a faz se libertar de Renan. Ela passa a ter vontade de se sentir bonita por ele e também por si própria. Quando completaram 1 ano de namoro, Marine nada lembrava a garota apática e de olhar distante que fora um dia.
Para Marine, Finn é como sua base, sua metade, seu melhor amigo e grande amor. A dependência emocional de um pelo outro não é vista como um problema até que uma nova tragédia tem Marine como protagonista.
Na comemoração do segundo ano de namoro o casal resolve fazer uma viagem para o litoral paulista. Na estrada, um motorista de caminhão bêbado bate na moto e somente Finn é fatalmente atingido. O rapaz, no auge de seus 19 anos morre antes mesmo de chegar ao hospital. A perda de Finn faz com que Marine mergulhe numa profunda e dolorosa depressão.