Karen – Parte 2
A amizade com Karen acabou fluindo muito e facilmente. Não poderia ser diferente. Ela era sem a menor dúvida, a mulher mais simples que já conheci. Não que eu tenha um bom parâmetro para comparar, mas ela é adorável, sério. Inicialmente nos encontrávamos somente no bar do Chico, até que veio a troca de telefones e marcamos de ir ao cinema. Tive alguns flash's lembrando de Isabela, mas Karen conseguiu me concentrar nela. Falávamos de tudo. De política à arte. Ela tornava a conversa leve e divertida, como se nunca tivesse tempo ruim. E não tinha. Ao lado dela realmente não tinha nada para me lembrar o quão ruim era a fase que eu passava. Mas, a noite e sozinho, Isabela voltava a me atormentar e eu acabava indo até meu guarda-roupa sentir o cheiro dela numa blusa esquecida entre as minhas coisas. Depois precisei ouvir a voz da Karen me dizendo que tudo ficaria bem. Se isso realmente acontecerá eu não tinha como saber, mas ouvir dela me trazia uma paz. Um dia resolvemos fazer um jantar na minha casa, Karen queria fazer pizza e eu contribuiria com o vinho já que segundo ela, vinho e pizza combinam. Não sei como se explica esse tipo de coisa, aliás, não sei bem qual foi o momento em que surgiu um clima diferente na cozinha do meu apartamento, mas o fato é que surgiu. E me surpreendeu como Karen queria que aquilo acontecesse.
- Cabeludinho, experimenta isso aqui. – Ela me deu uma colher com o molho do tomate que colocaria na pizza.
- Hum... – Balancei a cabeça, assentindo. – Está ótimo.
Karen sorriu de canto, ainda segurando a panela na mão.
- O que?
- Você se sujou aqui. – Vi quando ela deixou a panela na pia e se aproximou.
- Onde?
- Aqui, Leo...
Ela tirou meu dedo da bochecha e me beijou, levemente. Não tive uma reação de início, demorei a relaxar e quando o fiz, percebi que não era errado, mas aquilo de alguma forma me incomodava. Eu queria que ela fosse minha amiga e não que me visse de outra forma, mas ao mesmo tempo aquilo soava como uma esperança. Karen era diferente. Ela me faria bem. Me reconstruiria como um homem para uma mulher. Isso é ótimo, mas então estaria usando do que ela supostamente sente para tentar salvar o que Isabela destruiu. E isso é errado.
Nasce um dilema.
- Karen...
- Pronto, limpei.
Com um passo para trás ela se afastou e continuou com o molho da pizza. Não ficou um clima pesado, pois Karen soube como conduzir a situação, tornando-a normal. Para mim sobrou ficar de espectador, pensando quando seria o próximo passo dela. Não sabia o que sentir a respeito disso tudo, mas aquilo que ela sentia me revigorava.
Durante os dias ela não comentou sobre o beijo, mas eu por outro lado continuei a pensar, tanto, que compartilhei com meus amigos para saber a opinião de cada um. Todos foram categóricos - cada um a seu estilo - mas todos com a mesma conclusão: eu tinha que seguir em frente.
Na primeira vez que realmente aconteceu algo entre nós, acabei tendo uma recaída. Sim, a maldita Isabela. Estávamos na cama, aos beijos, tudo perfeito, iria acontecer. E eu queria absurdamente que acontecesse. Olhei para Karen, tão linda, que se transformou em Isabela sorrindo, me torturando, fazendo-me lembrar que ainda pertenciam a ela todos os meus sentimentos. A morena viu no meu olhar que não era ela quem estava sendo contemplada e pela primeira vez, resolveu falar sobre sua vida amorosa.
A vida amorosa da Karen era feita de desencontros sentimentais. Era amada e quando retribuía, se via sendo abandonada, pois os namorados descobriam ainda amar as ex's. - Um ciclo sem fim, entende? Isso é uma merda! Se eu tivesse o mínimo da vergonha na cara não falaria mais contigo, mas... – Ela sentou na cama, desolada. - Eu olhava você no bar do Chico e ficava encantada. Sabia que precisava te conhecer... – Fiquei ao lado dela, mas não a toquei. Ainda não era o certo. - E depois que te conheci, não tive mais vontade de não estar perto de você, Leo.
Eu sabia que não queria a Karen fora da minha vida, mas não sabia se poderia ser o que ela realmente merece.
- Eu vou embora.
- Karen, não faz isso.
- Não dá, Leo. – A primeira lágrima escorreu pela bochecha dela. - De novo não.
E ela foi embora. Do mesmo jeito que Isabela fora, mas em outra situação. Não que mudasse a minha visão sobre aquilo. Eu tinha medo de que virasse rotina as mulheres irem embora da minha vida. Com Karen havia a possibilidade de fazer diferente, porque ela queria estar comigo. Ela me queria ao lado dela, mesmo com todos os meus problemas, mesmo com o peso de Isabela entre nós. Eu poderia ver a minha história mudar com Karen. Por que não me permitir?
No dia seguinte, à noite, fui para o apartamento dela. Como já era conhecido pelo porteiro, subi sem dificuldade alguma. Era uma madrugada fria para os padrões do Rio de Janeiro, ventava bastante, mas o céu era bonito e estrelado. Toquei a campainha, e ela me atendeu após alguns tortuosos minutos.
- Leonardo? – Ela abriu a porta, usava um pijama de preto e branco. Os cabelos estavam amarrados num coque.
- Oi.
- O que você está fazendo aqui?
- Não quero que você saia da minha vida. Você rapidamente se tornou importante demais para eu te deixar partir assim.
Eu a beijei antes de qualquer resposta que acabasse com aquela porta aberta de possibilidades. Era isso. Com Karen ao meu lado era possível ver um outro lado da história.
Talvez fosse exagero comparar, mas eu via a Karen como alguém que me salvaria de me afogar dentro do grande calvário que fora deixado por Isabela.
E por que não acreditar?