O sonho da Malu
1 ano se passou desde que Maria Luíza e eu abrimos a confeitaria. O sucesso foi estrondoso de um modo que 5 meses depois da primeira, precisamos abrir outra no centro. A notícia do bolo de goiaba com queijo tipicamente mineiro correu São Paulo e todos queriam experimentar a iguaria. Samanta e Luan agora estavam noivos, minha mãe voltou para a capital, pois não queria perder o crescimento de Miguel, ainda menos agora que Sara era presença frequente em minha casa. Não foi fácil me acostumar com aquilo, mas no fim Maria Luíza estava certa. Não precisávamos privar Miguel de conhecer a avó. E Sara era uma figura que ele adorava tanto que acabamos deixando que ela cuidasse dele para trabalharmos. Todas as coisas da minha vida estavam em paz. Meus negócios fluíam tranquilos, meu relacionamento com Maria Luíza não havia mais obstáculos a serem vencidos, mas em contraponto, ela não conseguia se livrar do pensamento de se sentir incompleta por não conseguir realizar seu desejo de ser mãe. “Eu já tenho quase 25 anos, Michel! Para de falar que até os 30 a ciência vai salvar as mulheres estéreis” ela gritou a plenos pulmões numa discussão que tivemos em casa. Acabamos desistindo de fazer o tratamento para infertilidade, pois as chances de reverterem eram mínimas. Quer dizer, em conjunto ela optou por desistir, mas eu descobri que Maria Luíza se medicava as escondidas e que o remédio mexia com seu humor e afetava sua líbido. Ela estava muito mais mal humorada (principalmente comigo), porém mais... Hã, fogosa na cama. Fora que toda quarta-feira ela religiosamente saía as 15 horas para “resolver” algo na zona oeste, mas nunca me dizia o que era. Foram meses nesse tratamento sem sucesso, até que resolvi confrontá-la. Ela confidenciou, aos prantos, que não aguentava os resultados serem os mesmos, mas que acreditava que conseguiria realizar esse desejo. Ela tinha sonhos recorrentes com duas crianças correndo na praia, a chamando de mãe.
Eu a fiz parar com o tratamento. Não foi uma tarefa simples, mas insisti que se fosse para acontecer, iria acontecer, que ela não precisava mais se sacrificar num angustiante tratamento. Toda vez que sua menstruação atrasava era motivo de tensão em casa. E a toda vez que o resultado era negativo, Maria Luíza chorava por horas a fio.
No natal, após 2 anos da inauguração da “Alô Doçura”, eis que o Papai Noel nos presenteia com algo melhor que qualquer bem material.
Sob uma reunião familiar repleta de parentes e amigos, Maria Luíza anuncia que Miguel ganharia uma irmazinhã. Foi uma verdadeira festa. Me peguei observando Maria Luíza, me perguntando se era humanamente possível depois de tantos anos juntos continuar amando-a inesgotavelmente. Será possível que o Michel de 16 anos imaginaria que seria tão feliz ao lado de sua Maria Luíza agora com 25 anos? Talvez não. Talvez aquele adolescente arrogante e orgulhoso nunca pensasse que a vida, apesar de difícil, o faria se tornar um dos homens mais felizes e apaixonados do mundo. Confesso que durante toda essa jornada ao lado dela até eu duvidei que fosse capaz disso. E esse é um dos grandes baratos da vida. Um dia, quando você menos espera a vida simplesmente começa a sorrir para você.
Jade Teixeira Taino nasceu 1 mês antes do 4º aniversário de Miguel. O nome foi uma escolha de Maria Luíza, pois dissera que o nome, de origem latina significa pedra preciosa ou pedra de jade. O nome indica as características de uma mulher forte, bonita e virtuosa. Assim como a nossa filha. Ela nasceu com 3,5 kg, com muita saúde, extremamente cabeluda e LOIRA, como a mãe. O rosto era parecido com o meu, ao nascer a cor dos olhos eram verdes, como os meus, mas alguns meses depois se revelaram duas belas íris azuis, herança da mãe. Era uma combinação e tanto. Jade, ao lado de Miguel, era um dos bebês mais bonitos que eu já tinha visto na vida. E falando no meu primeiro herdeiro, Miguel, (agora também registrado com o sobrenome “Teixeira”, já que ganhamos na justiça o direito de alterar seu nome na certidão de nascimento) adorou a irmãzinha assim que a viu, apelidando-a de... “Nana”. A médica responsável pelo parto de Malu disse que nunca viu um casal com gene tão bom para trazer belas crianças ao mundo como nós dois. Eu nem fiquei me gabando, sério!
Maria Luíza, tão acostumada com perdas, viu sua vida se completar com o nascimento de Jade. Para ela a maternidade foi simples e harmoniosa, pois aprendera muito com Miguel. Eu vivi uma paternidade de forma diferente. Era tranquilo, era bom, era delicioso estar ali e ver meus dois pequenos crescendo e aprendendo. Ver Miguel cada vez mais esperto e protetor com Jade. Ver Jade aprendendo as primeiras coisas, o primeiro sorriso, o primeiro banho, a primeira soneca ao lado do irmão, que claramente a amava muito. Entre tantas outras coisas que eu já tinha visto e via novamente, agora ao lado da mulher da minha vida. Era uma vida que nem se eu tivesse de fato pedido, imaginei que poderia ser tão boa.
- Malu, vem deitar...
Parei ao lado dela na porta do quarto das crianças. Pelo menos umas 3 noites na semana eu a pegava observando nossos filhos dormindo, completamente encantada e muitas vezes assustada.
- Só mais um pouquinho.
- São lindos, não é?
O berço que anteriormente fora de Miguel, agora pertencia a Jade. Não mudamos muito, só o pintamos de rosa e compramos uma caminha que na verdade parecia um berço para o mais velho. A decoração do quarto se dividia entre o rosa e o azul. Entre carrinhos, animais, bonecas e borboletas.
- É possível mesmo que a gente possa ser tão feliz assim? – Ela me perguntou, baixinho. Seus olhos encontraram os meus. - Eu estou tão feliz que tenho medo disso ser um sonho. - Belisquei seu braço. – Ai!
- Não é um sonho. – Ela me deu um tapa na cabeça.
- Seu idiota!
- Vem, vamos deitar. – Chamei, rindo.
Abracei sua cintura, ela encostou a porta e voltamos para o nosso quarto.
- Para duas pessoas que se odiavam até que chegamos bem longe, não é? – Maria Luíza se enroscou ao meu corpo e deitou a cabeça em meu braço. Eu assenti, rindo.
- Você não me deu sossego mulher! Tive que me casar com você.
Ela sorriu enquanto entrelaçava as nossas mãos.
- Um casamento moderno. O famoso “juntar” de escovas.
- Quer casar no papel?
- Você está me pedindo em casamento às 3 horas da manhã?
- Não sei. Estou? – Franzi o cenho, confuso. Ela revirou os olhos.
- Vou fingir que não tivemos essa conversa.
- Mas...
- Shiu!
Malu virou para o outro lado, tentando dormir.
- Malu? – Passei a mão por sua cintura.
- Hum?
- O que acha de termos mais um filho?
- Pelo o amor de Deus, Michel! Cala a boca!