Sob Olhar das Erínias — Parte Final

Cristhian, Agnes e Arthur, ficaram chocados: diante de seus olhos, a bala rodopiava lentamente a dois palmos do rosto da menina.

- Não pode ser...! - falou Cristhian, atônito.

"Impossível...", pensou a garota, não menos impressionada, "Será coisa do Arthur...?", e fitou-o. Este, por sua vez,mirava boquiaberto o projétil.

Então lembrou-se de Afrodite, e atentou ao ponto onde a vira.

Sim, Ela continuava lá. Envolvida por um sutil brilho azul-turquesa, achava-se com as mãos estendidas na direção de Agnes, e um olhar atravessado para Cristhian.

"A Senhora Afrodite protegeu-a...", surpreendeu-se o rapaz, "Hummm..."

- Não sei que truques tu tá usando, Arthur, mas não vai adiantar! - berrou Cristhian, irado. - Tenho mais onze balas, duvido você segurar todas! - e mais uma vez tomou a ex-namorada como alvo. Contudo, um espasmo violento acometeu seu pulso.

- ARGH! - berrou ele, antes de deixar a arma cair.

Com a mão contorcendo-se descontroladamente, e ardendo muito, Cristhian seguiu:

- Que merda é essa?! - cravou a vista em Arthur, que ajudava Agnes a se levantar. - Você...!

Quando fez menção de encaminhar ao outro, aquela voz maligna, lá do fundo, bradou em sua cabeça: "Deixe comigo! Você não será capaz de terminar isso... Não quando uma das três Damas Negras protege a garota... Felizmente, As Sombras não compartilham de mesma benevolência... olhe em volta, Cristhian...".

Ao fazê-lo, viu centenas de vultos miseráveis ziguezagueando velozmente em torno deles, e entre si, enquanto clamavam por mais palavras de ódio e violência, com suas vozes esganiçadas, cheias de escárnio e maldade.

- Certo! - exclamou o garoto, satisfeito. - Faça como achar melhor, o que importa é que eu tenha minha vingança!

"E terás...", jurou a criatura, antes do garoto cair de quatro e começar a berrar de dor.

Horrorizada, a jovem indagou:

- Arthur, o que tá acontecendo com ele?

- Não tenho certeza...me parece que a entidade com quem ele se aliou, está tomando o controle... Não temos muito tempo... Você tem que sair daqui, e rápido!

Pegou na mão dela e disparou à saída.

- Ninguém vai a lugar nenhum! - vociferou a criatura infernal, no controle do corpo de Cristhian, e a porta entreaberta bateu com violência (BLAM!).

Arthur tentou abri-la, mas foi inútil: ela estava emperrada. O garoto voltou-se ao ser e largou:

- Maldito...!

- O que tá acontecendo, Arthur? - repetiu a guria, cansada das meias palavras do outro, e de todos os fenômenos inexplicáveis que lhe acontecera desde que o conheceu.

O rapaz pousou as mãos nos ombros dela e, ansioso,respondeu:

- Teria o maior prazer em responder às suas perguntas. Explicaria tudo nos mínimos detalhes, só que não há tempo pra isso. Olhe pro seu namorado...

Ao mirá-lo, a guria levou um susto: Cristhian havia começado a rosnar feito um cão,enquanto contorcia-se no piso. Seus olhos estavam brancos, cheios de rugas ao redor deles, e de seus ouvidos, narinas e boca, saia uma densa névoa vermelha que subia ao teto.

- Meu Deus... - murmurou ela, horrorizada. - O que é isso...?

- Ele deve ter feito um pacto com alguma entidade maligna para poder se vingar. Isso explicaria a voz anormal dele,a força e resistência acima da média e essa transformação...a criatura está tomando o controle para poder cumprir o trato...

- Ah, Cristhian... - lamentou-se a menina. - Até onde foi capaz de chegar... - e fitou Arthur, aflita. - Temos alguma chance?

- Vejamos...

Correu os olhos pelo aposento, em busca de algo que pudesse livrá-los dessa enrascada. Lá fora a chuva havia diminuído e os trovões se acalmaram, apenas os ventos permaneciam em fúria, zunindo assustadoramente. Eis que,de repente,uma das janelas altas do galpão foi arrebentada,chamando a atenção dos garotos.Um galho grosso havia sido arremessado contra ela,entrando no galpão e caindo longe deles.

Contente, Arthur exclamou:

- Lá!Aquela é a saída! - mas diante da altura que a janela encontrava-se, seguiu quase desanimado: - Tsc, mas como iremos alcançá-la...?

- Sei como! - soltou a outra, entusiasmada. - Quando eu procurava uma coisa pra bater no Cristhian, vi numa das peças lá do fundo uma escada!Parecia tá em bom estado, e ser grande.

- Então vamos lá pegar ela!- e, com a menina à frente, partiram atrás da escada.

Enquanto isso, a possessão de Cristhian atingira uma nova etapa: o rapaz fora coberto por uma espessa nuvem escarlate, cujos relâmpagos vermelhos faziam as paredes estremecerem. Entretanto, os rosnados de dor do garoto permaneciam os mesmos,com a diferença de que agora estavam mais baixos...

Agnes e Arthur voltaram com a escada. Imediatamente a colocaram sob a janela estilhaçada. Seus corações se encheram de alegria ao verem que ela era comprida o bastante.

- Vai, Agnes!

Na mesma hora ela pôs-se a subir. Mas ao notar que o outro não a seguia, parou e berrou:

- O que tá fazendo parado aí?! Sobe logo!A escada tá forte, aguenta nós dois!

O garoto voltou-se a nuvem relampejante e, decidido, respondeu:

- Não posso. Devo ficar e aceitar o meu destino. Tenho que me redimir perante os Deuses,os quais sempre jurei honrar...- e olhou para o ponto onde vira a Deusa pela última vez.Ela continuava lá,bela e provocante em suas finas vestes negras,com os braços junto ao corpo e o cenho fechado em direção ao nevoeiro rubro.

- Do que ta falando, garoto?! - berrou Agnes, nervosa. - Vamos logo!

Arthur levantou a cabeça e vociferou:

- VAI EMBORA!

Agnes olhou-o espantada. Chegou a abrir a boca para protestar, mas desistiu: os olhos dele podia-se ver claramente uma convicção inabalável do que decidira.

"Nada do que eu diga fará mudar de ideia...", lamentou-se a jovem, antes de retornar a subida, disposta a não olhar para trás...

- Isso... - murmurou Arthur, aliviado, esboçando um fino sorriso.

Então, oriunda da nuvem rubra, retumbou uma voz fria, desprovida de qualquer sentimento:

- Tarde demais humano... As almas de vocês me pertencem! Quero a dos três! - e a nuvem começou a irradiar intensamente o seu brilho. Uma luz quente e aterrorizante.

Arthur protegeu os olhos com os braços e atentou à Afrodite. Ela ainda permanecia lá, de pé, encarando o brilho vermelho.

"Foi uma honra te servir, Grande Mãe...", pensou o garoto, emocionado. "Espero que com meu sacrifício muitos wiccanos não ajam como eu, preferindo perdoar seus desafetos, e sigam de mãos dados com a Senhora,iluminando este mundo escuro e frio..."

Eis que a deidade voltou-lhe o rosto e, satisfeita, respondeu:

- Trocou a sua vida pela a de Agnes. Reparou seu erro. Não poderia estar mais orgulhosa de ti, ,filho...

A aterrorizante luz escarlate aumentara de intensidade e calor, e com isso, o chão começou a tremer, balançando o galpão. Parte do telhado veio abaixo,caindo perto de onde Arthur estava parado,causando um estrondo e levantando uma cortinha de poeira.

"Espero que Agnes saia ilesa disso, Mãe, ela de nó três, é a que menos tem culpa nessa história...", pediu o rapaz, sem desviar a atenção da deusa.

Afrodite nada respondeu, apenas mirou o alto com um sorriso enigmático.

O rapaz fitou na mesma direção em que a Deusa olhava. E quão não foi a sua surpresa quando viu Artêmis, Deusa da caça e da Lua, uma deusa grega maior, acocorada na beira de uma viga larga.

Sobre seu físico atlético, trajava uma cintilante túnica curta esverdeada. Em cada braço ela possuía um bracelete ricamente elaborado em ouro,bem como um pesado colar que pousava-lhe sobre o peito.Atrás das costas trazia uma aljava abarrotada de flechas e numa das mão um arco de prata.Dotados de um ar rebelde,seus cabelos eram logos,volumosos e dourados como o sol.

Com seus olhos azuis, a deidade olhava fixo para Agnes, que acabara de chegar até a borda da janela arrebentada.

- Que bom... - sorriu o jovem, antes de ter sua atenção atraída pela voz da criatura.

Num tom arrogante, cheio de maldade, a criatura mais uma vez manifestou-se:

- ACABOU!

E a reluzente nuvem escarlate explodiu, transformando tudo em luz.

Gian Felipe Author e A.Henrique
Enviado por Gian Felipe Author em 13/03/2016
Código do texto: T5572072
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