A adorável Sam


- Você quer que eu deixe meu filho com uma garota de 18 anos que diz que cuidou de meia dúzia de primos? – Michel me olhou, embasbacado. Entramos no elevador da empresa. – Qual é, Malu! – Ele apertou o botão do nosso andar.

Esperei a porta fechar e dei um longo suspiro. Sei que parece loucura, mas eu tenho certeza que ele ainda vai me agradecer quando ver a ótima babá que Samanta vai ser.

Michel me olhou de soslaio e revirou os olhos, eu apenas continuei o olhando, inquisitiva, depois me aproximei dele, ficando a sua frente.

- Você não confia em mim? – A pergunta soou bem ao pé do seu ouvido. Vi com um prazer imenso os pelos de seus braços se arrepiarem.

- Isso é maldade.

- Sim ou não?

Passei a mão por suas coxas e arranhei levemente, ele se contorceu.

- Sim! Confio, droga. Você sabe que sim.

Me afastei rapidamente pois a porta parou. Saí na frente como se nada tivesse acontecido e um ranzinza Michel Taino veio atrás. Para a minha total surpresa um grupo de funcionários nos esperava. Neusinha segurava um cartaz escrito “Bem-vindo de volta, Michel!”.

Eu olhei para ele com a sobrancelha arqueada e recebi um sorriso exibido.

- Como eles sabem? – Perguntei.

- Você me conhece, sabe que eu retornaria em grande estilo.

Balancei a cabeça, atônita, mas logo acabei rindo. A volta de Michel trazia um clima bom a empresa. “Ainda bem que alguns erros que eu cometo ainda tenho tempo de corrigir.” – Pensei, seguindo para a minha sala.

A rotina de trabalho foi agitada, Michel me ajudou com alguns relatórios atrasados e só no final do expediente quando já estávamos só os dois na empresa que consegui voltar ao assunto da babá. Encostei a porta da sala dele e me sentei em sua mesa.

- Quando você vem assim já sei que tem chantagem.

- Não! – Tentei me fazer de ofendida, mas ele riu. – É sério, eu sei que parece loucura, mas confia em mim a garota é ótima.

- Ela vai morar com quem, Malu? Você já pensou nisso?

- Sim. Já pensei.

- E então?

- Comigo. Eu banco a faculdade dela e você paga um salário que dê para ela viver aqui em São Paulo.

- Mas...

Eu coloquei o dedo indicador sob os lábios dele e me sentei sem seu colo.

- Só confia em mim, ok?

Michel se limitou a balançar a cabeça, assentindo. Eu o beijei com delicadeza e senti quando ele correspondida aos poucos. Suas mãos foram para a minha cintura. Toquei seu rosto com suavidade.

- Malu...

- Hum?

- O que você ia me falar no elevador? – A pergunta me pegou tão de surpresa que eu parei o que fazia. Michel continuou analisando minhas reações, e eu sabia o porquê disso. Ele sabe quando interpreto.

- Eu ia dizer que você é bonito.

- Sim, eu sei que eu sou bonito, mas você não ia dizer isso. – Franzi o cenho para ele. – Não me olhe assim.

- Eu não lembro o que eu ia dizer Michel. – Tentei me levantar, mas ele me prendeu pela cintura. Suas mãos suavemente foram para o meu rosto.

- Ei...

Não conseguia olhá-lo nos olhos, e isso me irritava. Droga! Não pode ser tão difícil. Eu devo ter dito alguma vez para ele quando éramos adolescentes. Michel voltou a selar nossos lábios de forma casta, as mãos começaram a trilhar um caminho pelo meu corpo.

- Me lembrei de uma coisa... – Murmurei, sentindo seus lábios no meio dos meus seios. Ele me olhou, ofegante. – Eu quero ficar com você ali. – E apontei com a cabeça no lugar onde sua antiga mesa ficava.

- Por que? – Eu o olhei, significativa. – Ah, entendi.

Michel se afastou, agora afoito. Tirou o seu notebook da mesa e o colocou no sofá, depois num único gesto empurrou todas as coisas para o chão e empurrou a mesa na mesma direção que ela já estivera antes de nossa briga.

- Uau! – Exclamei, rindo. Ele me puxou para os seus braços, agora a urgência foi mutua.

- Por que não me surpreende a sua escolha, hein?

- Eu não te perdoei por aquele dia. – Confessei, beijando sua orelha e deixando uma leve mordida que o deixou arrepiado. – Eu não lido bem com essas coisas, você sabe.

- Maria Luíza... – Lentamente meu corpo foi deitado sob a mesa de Michel. – Então o que acha de eu me redimir com você? – Recebi um beijo, seguido de uma leve mordida na região da barriga, um pouco acima do umbigo. Arfei na mesma hora.

Balancei a cabeça, assentindo. Não me importei de parecer ansiosa pelo o que viria. Estava com a pessoa certa e na hora certa.

Acabei sorrindo de forma involuntária quando seus olhos se fixaram aos meus com uma devoção que eu nunca tinha visto antes. Era a plenitude do sentimento que comandava as minhas ações.

Por mais que nos conhecêssemos há anos, estar com Michel era sempre como fosse a primeira vez.



 

Belo Horizonte - Minas Gerais – 7:00

 


- Tá bem, mãe, eu sei, eu sei, não vou sair pra famosa Rua Augusta pra beber e nem pra Vila Madalena. – A mãe abraçou a filha de forma sufocante. – Mãe, eu estou indo para estudar e trabalhar, você sabe disso.

A mulher mais velha olhou a mais nova com os olhos cheios de lágrimas. Era sua única filha indo em busca do sonho do ensino superior e um emprego bom. O barulho do motor do ônibus parecia um lembrete do que esperava por Samanta.

- Eu vou te ligar sempre, mãe. Prometo!

- Tudo bem. Eu te amo, filha. Se cuide em São Paulo.

- Eu te amo, mãe. Deixe meu abraço para todos da família.

Mais um abraço foi dado. Samanta se afastou e deu as costas para a mãe, sabia que despedidas a faziam chorar, mas se chorasse, a mãe faria ela desistir do seu desejo de morar em São Paulo.

Ela subiu os 3 degraus respirando controladamente, entregou o bilhete de viagem ao motorista e procurou por sua poltrona. Por ser uma viagem num dia tranquilo, não havia muitas pessoas no ônibus. Samanta guardou suas malas no compartimento acima das poltronas e sentou. Naquele momento notou que não tinha mais vontade de chorar. A ida a São Paulo mudaria sua vida. Ela sabia. Acreditava nisso.


 

 

São Paulo – 11:00


Liguei para Bernard as 10:15 pedindo que viesse até minha casa me ajudar com Miguel, pois se eu contasse que era para realizar um favor é claro que ele não viria. Bom, ele não reagiu muito bem quando viu que o afilhado dormia tranquilamente no sofá e eu não precisava de ajuda alguma. E me xingou um pouquinho quando pedi para buscar Samanta no terminal.

- Bernard, por favor! - Segurei sua mão com força. Ele revirou os olhos, longamente. – Eu não posso ir lá busca-la, tenho que cuidar do Miguel e o Michel foi resolver uma pendência na empresa.

- Hoje é sábado!

- Sim, mas era urgente. Por favor, Bernard. – Tentei fazer minha melhor cara de piedade.

- Você sabe que é ridícula tentando me fazer ter pena, não sabe?

- Sim, eu sei.

Ameacei me ajoelhar no chão, mas ele me impediu.

- Inferno, mulher! Eu vou!

- Por isso que eu te amo! O ônibus dela estará a partir das 13:00 no terminal Barra Funda. Ela vai estar com uma placa com o nome dela, "Samanta Gouveia".

- Tá bem, Maria Luíza, tá bem. Ela sabe que eu vou busca-la?

- Sim, eu avisei!

- Certo.

- Te amo viu?

Ele fez um gesto com a mão, estilo “tanto faz” bem estilo Bernard e saiu do meu apartamento. Eu sentei no cantinho do sofá e observei Miguel dormindo. Parecia tão indiferente ao mundo que o rodeava. Era como ver uma miniatura de Michel. De início relutei em cuidar dele, mas Michel insistiu me dizendo que seria bom para mim ter um momento a sós com seu primogênito.

Toquei seu pé, tão pequeno e delicado e novamente fui invadida por um sentimento maternal que não era meu. Miguel respirou fundo e tentou virar a cabeça para se acomodar melhor. Ele estava somente de fralda, já que fazia muito calor em São Paulo e segundo o pai dele, o pequeno era muito calorento.

Como não conseguiu se acomodar melhor, ele acabou reclamando num chorinho baixo. Receosa, respirei fundo antes de pega-lo no colo e nina-lo com uma cantiga em inglês que minha mãe cantava para mim quando eu era pequena. Me deitei no sofá e o coloquei de bruços acariciando suas costinhas.


 

She was just sixteen and all alone
when I came to be
so we grew up together
My mama child and me

 


Durante a minha vida criei um receio de crianças, principalmente de bebês. Sempre preferi me manter longe de qualquer contato com eles por saber que nunca poderia ter o meu próprio filho. E de repente, lá estava eu ninando a herança do relacionamento de Michel e Elena.


Now things were bad
and she was scared
but whenever I would cry
she'd calm my fears and dry my tears
with that rock'n'roll lullaby
and she'd sing



Dei uma olhada em Miguel, e ele já tinha voltado a dormir. Diminui o ritmo da cantoria para não o acordar. E enquanto segurava sua mãozinha senti ele apertar meu dedo levemente.


Sha-na-na-na-na-na-na-na-na
It will be all right
Sha-na-na-na-na-na-na-na-na



- Durma bem, meu querido... – Murmurei, dando um beijo no topo de sua cabeça.


Let's just hold on tight
Sing it to me mama
My my my my mama
Sing it sweet and clear
sing it sweet and clear
oh, mama let me hear
That old rock'n'roll lullaby



- Malu... Ei, acorda.

Eu ouvia a voz de Michel bem longe me chamando, só então me dei conta que tinha cochilado com Miguel. Abri os olhos e encontrei um par de olhos verdes me fitando com um curioso contentamento.

- Eu cochilei com ele no colo, desculpa. – Michel sorriu.

- Você não precisa se desculpar por dormir com o meu filho no colo. – Michel sentou-se de vez no chão, mas ainda me olhava.

- Eu cantei uma música de ninar que minha mãe cantava para mim.

- Acredito que ele gostou já que parece bem confortável.

- É. – Concordei, tímida. – E como foi lá na empresa?

- Consegui resolver com o pessoal de Marketing e eles vão divulgar o comercial primeiro na internet. Precisamos de números. Pediu para o Bernard buscar a Samanta?

- Sim! Pra variar ele reclamou um pouco, mas acabou indo.

- Ele vai assustar a garota, você quer apostar?

- Eu não tenho dúvidas disso.



(...)

 

 

No outro lado de São Paulo – 12:00


Bernard estacionou o carro em frente ao terminal Barra Funda que se encontrava bastante movimentado. Deu uma olhada procurando por alguém segurando uma placa, mas não encontrou. “Ainda isso, meu Deus. Qual é o problema das mulheres com pontualidade?”

- Se eu fosse um pouquinho menos frouxo teria dito aquela folgada da Maria Luíza que não iria, mas pelo menos me livrei da consulta com a Laura. – Murmurou, num tom baixo, mesmo sabendo que ninguém ouviria, já que estava dentro de seu carro. Olhou para o maço de cigarro no outro banco e balançou a cabeça, negativamente. Tinha desenvolvido o terrível habito de fumar. Era uma forma de dizer a si mesmo que tudo continuava bem, apesar do segredo que escondia de seus amigos. Olhou novamente para a tumultuada saída do terminal quando uma garota chamou sua atenção. Ela estava ao lado de um funcionário do local, que a ajudava com as malas. Era óbvio para qualquer um que os via que o homem se aproveitava para flertar com a garota. Bernard coçou a cabeça, confuso. Algo dizia que era aquela a garota, mas continuou imóvel, observando a cena.

- Ah, droga. Ela tem uma cara de babá. Só pode ser ela.

Bernard abriu a porta do carro e encostou-se sob o mesmo. Olhou novamente para a garota que agora abria a mala, procurando por algo.

- Merda.

A garota ergueu uma placa com seu nome e Bernard bufou com raiva e foi até ela. Demorou alguns segundos para Samanta vê-lo, e quando aconteceu, houve algo naquele encontro de olhares que deixou o rapaz surpreendentemente sem jeito. E não era costume dele ficar sem jeito com mulheres.

- Oi. - Ele falou, parando na frente de Samanta, que sorriu, como se já o conhecesse. – Hã, a Maria Luíza pediu para eu vir te buscar.

- Você é o Bernard, não é? – O sotaque forte da garota fez Bernard rir descontroladamente. – Uai, do que está rindo?

- Seu sotaque... – Bernard não conseguia se controlar. Samanta ficou vermelha, e não sabia se era de vergonha ou por se sentir intimidada pela presença masculina.

- Será que você pode parar de rir?

- Sim, posso, posso. Me deixa te ajudar com as malas... – Ela deu um tapa na mão de Bernard. – Ei!

- Não preciso da tua ajuda! – Rugiu. Bernard não pode disfarçar o quanto achou sexy a garota irritada. – Só abre o carro que eu coloco minhas malas.

- Tá ok, caipira nervosinha!

Ele abriu o carro e Samanta guardou as malas no banco de trás. Ainda brava com Bernard, ela foi para o banco de passageiros e colocou o cinto.

- Não precisa ficar nervosa. – Bernard disse, quando os dois entraram no carro. Samanta se forçava a olhar para frente.

- Você é um idiota!

- Já me falaram isso algumas vezes. – A voz suave e rouca de Bernard fez Samanta ter um arrepio na espinha. E para seu desgosto, não era de medo. Bernard ligou o carro e deu partida.

- Ótimo.

- Acho bom você não me tratar assim, eu sou padrinho do bebê que você vai cuidar. – Samanta o olhou de cenho franzido. – É sério. – Ele riu da braveza dela.

- Azar o do Miguel.

- Bonitinho você puxando o “R”.

- Ah, cala a boca!

- Tudo bem.

E Bernard se calou, dirigindo pelas ruas de São Paulo. Às vezes ele olhava a garota por canto de olho, sem saber o porquê de não conseguir evitar tal atitude. Samanta tinha a pele morena, o rosto delicado e meigo. O nariz era pequeno, olhos redondos e gentis que combinavam com o cabelo castanho ondulado da altura de seu ombro, além da franjinha que entregavam a sua jovialidade. Algo nela lembrava ao próprio Bernard quando adolescente e ele sentiu um gosto ruim descer pela garganta. Era a amargura. E mais uma vez não entendeu o porquê daquilo.

Samanta também se pegou o olhando quando ele dirigia atento demais para perceber que era observado. E gostou do que viu. Bernard exalava um charme que era inigualável. Era confiante. Seguro. Ela gostou do jeito que os lábios dele formavam um sorriso canalha e sensual. E também de como o cabelo bagunçado dele parecia macio e bem cuidado. Os olhos dele eram da mesma cor das amêndoas e havia uma perturbação, um segredo atrás deles que atraiu Samanta na mesma hora. Ela não teve como fugir.

- Está gostando do que vê? – Bernard perguntou, cínico. Samanta bufou, com raiva. – Ah, qual é caipira! Não vamos começar mal assim.

- Você é um idiota e é só isso que eu tenho para te dizer.

- Eu só achei bonitinho o seu sotaque.

- Você caçoou do meu sotaque. – Ela cruzou os braços na frente dos seios, o que mais uma vez chamou a atenção dos olhos masculinos. O carro parou em frente a um elegante prédio.

- Infelizmente você vai passar muito por isso morando em São Paulo, é melhor se acostumar.

Samanta balançou a cabeça com raiva e abriu a porta do carro. Sabia que ele estava certo, mas não era as provocações de Bernard que a irritavam, e sim a magnitude que o encontro provocara em sua alma.

Ele a ajudou levar as malas até o apartamento de Maria Luíza. Quando ainda estavam no elevador, evitaram de se olhar. Samanta porquê continuava se sentindo brava consigo mesma. Já Bernard não queria que sua curiosidade o traísse resultando num interesse por Samanta.

Maria Luíza os recebeu na porta do apartamento, ela correu para abraçar Samanta como se fossem velhas conhecidas. O que fez Bernard rir da loira.

- Ah, Sam! Que honra finalmente conhece-la. Como você está?

- Eu tô” bem demais da conta dona Malu e a senhora?

Bernard deu uma inevitável risadinha. Maria Luíza o olhou, séria.

- O que eu fiz? – Perguntou Bernard, se afastando de Malu.

- Ele te provocou, não é? – A pergunta foi feita para a nova moradora. Samanta assentiu, sorrindo. Era bom saber que sua chefe a protegeria de Bernard. – Sam, pode entrar que eu preciso conversar 5 minutos com meu velho amigo.

A garota assentiu, entrando com algumas de suas malas na casa.

- VOCÊ! – Ela cutucou com o dedo indicador o peito de Bernard.

- O que? Eu não fiz nada pra ela, juro!

- Bernard, nós precisamos dela, ok? Sem provocar ou trata-la mal!

- Ok, eu prometo, não vou pegar no pé dela. Logo ela vai descobrir que o maior erro é trabalhar para dois loucos como você e o Michel.

- Cala a boca. – Malu beliscou o braço dele. – Michel foi no mercado com o Miguel, disse que depois que deixar as coisas em casa virá até aqui para conhecer a Sam.

- Ela parece uma boa garota.

Malu passou o braço pela cintura de Bernard, que correspondeu, colocando sua mão sob o ombro dela. Brigavam, se desentendiam, mas ainda eram os mesmos velhos amigos de sempre.

- Sim, ela é. Ajude-a com as malas e coloque no segundo quarto a esquerda. Eu vou pegar alguns documentos que Michel e eu fizemos para a Sam, tipo um contrato.

- Certo.

E Bernard fez o que Maria Luíza pediu, e mais uma vez para a surpresa dela, sem reclamar. Quando terminou de colocar as malas no quarto, o rapaz ficou alguns minutos contemplando o lugar. Até que notou a presença de Samanta no quarto. Ela parou ao lado dele.

- Obrigada. – Agradeceu, com má vontade.

- Por nada, caipira. – Bernard a olhou, com um meio sorriso. – Espero que você sobreviva após conhecer o assustador Michel.

Dito isso, ele deu as costas a Sam e saiu, mas não conseguiu ir muito longe, pois uma mão o segurou pela camisa, em puro desespero.

- Por que você está falando isso? Ele é bravo? – Ela perguntou, receosa. Eles estavam muito próximos um do outro, e Samanta demorou algum tempo para perceber isso. Tentou se afastar, mas agora era ele que a impedia.

- Tem medo?

- Responde a minha pergunta.

- Vou te deixar o mistério da dúvida.

Samanta sentiu quando a mão de Bernard saiu de sua cintura, mas, mesmo assim ele ainda a olhava.

- A gente se vê por aí.

Um arrepio percorreu todo o corpo da garota quando ele sorriu de canto, como se debochasse de toda a existência de Samanta. Ela poderia considerar uma afronta mas havia um algo a mais naquele olhar que foi suficiente para o coração dela bater mais forte.

- Eu preciso me manter longe dele. Eu preciso. – Samanta murmurou para o nada, ainda olhando para a porta que Bernard saíra.


(...)


- Eu falei que você ia gostar dela. – Exclamei, sendo irritantemente convencida para provocar Michel. Ele revirou os olhos, sentando-se ao meu lado na mesa da minha sala. Mais uma vez estávamos até tarde na empresa para resolvermos pendências. Normalmente, me irritaria com isso, mas devido a companhia...

- Ela é uma boa garota e meu filho gostou dela. Apesar de... – Ele ficou em silêncio alguns minutos. Sua expressão era pensativa. – Nossa, eu vou matar o Bernard.

- O que ele fez?

- Ele falou para a Samanta que eu era assustador, por isso que ela tremia daquele jeito.

- Eu pensei que era a corrente de ar que entra no seu apartamento. – Trocamos um olhar, ambos confusos. – Espera...

- As janelas estavam fechadas ontem.

- Maldito Bernard. – Ele riu, balançando a cabeça. – Ei...

- O que? – Eu o olhei.

- Você vai dormir lá em casa hoje?

- Hoje não posso, tenho que colocar minhas roupas de cama para lavar.

- Ah, fala sério Maria Luíza! – Ele exclamou, frustrado com as minhas palavras.

- É sério. Eu não tenho empregada.

- Miguel vai ficar muito, muito triste.

Michel voltou a digitar no celular uma resposta a um de nossos sócios. Um meio sorriso nasceu em seus lábios, me fazendo sorrir também. Dei um suspiro involuntário e irritantemente apaixonado, depois virei seu rosto, suavemente e selei nossos lábios.

- Obrigada.

Ele encostou sua testa na minha e abriu os olhos. As íris verdes estavam começando a testar a minha decisão de não ir pra casa dele.

- Você não precisa agradecer.

- Preciso.

Nossos lábios começaram a se roçar, devagar. Ele passou o nariz pelo meu, lentamente. As mãos dele começavam a me rodear, firmes, me prendendo nos braços dele. Os lábios dele tocaram o meu pescoço e o arrepio foi imediato. Michel deu um sorriso que foi mais do que o suficiente para beija-lo com toda a minha vontade.

- Por favor, tem certeza de que não quer dormir lá em casa? - A pergunta foi feita bem próxima ao meu ouvido. Estava sentada no colo dele, que tinha levantado os braços da cadeira de couro preto da sala. – Pensa... O Miguel dorme a noite toda...

- Michel... – Ele apertou a minha cintura, ameaçando levanta-la. – Eu realmente preciso ir...

- E eu preciso de você. Muito.

Segurei seu rosto, passando o dedo indicador por seus lábios.

- Eu ainda estou aqui com você, não estou?

Entendida a mensagem, Michel ergueu a minha blusa, afoito, e a jogou longe. Mais uma vez fui inteiramente dele. De corpo e alma, sabe? Sem medo do amanhã ou do que poderia acontecer. Sem minhas inseguranças ou lembranças. Só o deixei preencher o vazio que existia em mim, que era exatamente o vazio que ele tinha deixado há anos atrás.

Naquela noite quando fomos embora ele me deu carona até o meu apartamento. Foi um tanto bobo quando nós demoramos para nos despedirmos como um casal de adolescentes apaixonados. Éramos quase isso, para ser sincera, éramos dois adultos que tiveram um romance da adolescência interrompido que agora finalmente tinha uma continuação.

Bom, ao menos era isso que eu achava...


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A música pertence ao Pato Fu - Rock and Roll Lullaby É linda a música, recomendo ouvirem!


 

Tamiris Vitória
Enviado por Tamiris Vitória em 07/03/2016
Reeditado em 05/06/2022
Código do texto: T5565866
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