Sob Olhar das Erínias — Parte XI

Perturbado, Cristhian avançava pelas ruas mais escuras e quietas. Não havia nada em sua mente que não fosse confuso, a não ser o profundo desejo de vingança. Um forte vento anunciador de chuva começou. Numa locadora de Blue Rays onde estavam, Arthur e Agnes sentiram um calafrio, arrepiando seus corpos.

Cristhian fez menção de dobrar numa esquina quando, de repente, alguém chamou por ele às suas costas.

O garoto virou-se na mesma hora, mas não encontrou ninguém. O farfalhar das arvores tornava-se cada vez mais intenso, e, ao norte, nuvens carregadas aproximavam-se lentamente. Distante trovoadas já podiam ser ouvidas.

Escutou uma voz cavernosa lhe chamar:

- Cristhian...

Sem pestanejar ele voltou-se em direção de onde o chamado parecia vir, todavia, não em encontrou ninguém.

- Aqui Cristhian... - voltou a voz a se manifestar, desta vez parecendo vir detrás dele. Ao virar-se, não viu ninguém.

Então, amedrontado e irritado com aquilo, puxou a pistola e disparou pro alto. Eis que para sua surpresa, sentiu algo golpear suas pernas com tamanha força que o fez rodopiar a quase três metros do chão, caindo de bruços.

- O que foi isso, droga?! - pensou ele, levantando-se com dificuldade, todo dolorido, o mais rápido que pôde.

E logo que conseguiu firmar-se de pé, reparou que á sua frente alguém o observava... uma criatura sinistra: um encapuzado,cujas vestes esfarrapadas eram vermelhas,agitando-se freneticamente ao vento,parecendo um rio de sangue medonho.Sobre o tampão do esgoto,ele encarava Cristhian.

O jovem berrou:

- Você não estava aí! E como sabe o meu nome? Mostre o seu rosto!

O estranho permaneceu calado, envolto de um ar ameaçador. O balançar barulhento da copa das árvores, e as trovoadas, cada vez mais próximas, eram as únicas coisas audíveis naquele momento. Mas, no instante seguinte, a bizarra criatura levou lentamente as mãos em direção ao capuz, e nisso , Cristhian sentiu um terrível medo que o fez apontar a arma pro outro.

O emcaúzado deteve suas as mãos na altura da cabeça e zombeteiramente largou:

- Hu, hu, hu... O que houve? Teme pelo que ira descobrir...? - disse sem qualquer indicio de temor perante a arma do garoto. - Teme enfrentar a sua Sombra?

- Cale a boca! - ordenou Cristhian, afrontado. - Abaixa essas malditas mãos!

Mas, naquele momento, ele notou pelo canto do olho uma sombra. Cuja presença lhe encheu de pavor.Um pavor maior do que aquele que sentira há pouco.Capaz de lhe fazer tremer as pernas.Virou-se ao vulto na hora.Seu coração parou por um momento: o que viu era aterrador.

Viu uma velha encarquilhada vestida com trapos ensanguentados. Cujos cabelos, grisalhos e desgrenhados, alcançavam-lhe os pés descalços. Numa das mãos trazia serpentes horríveis, furiosas, e na outra um chicote escarlate.

Boquiaberto e petrificado de medo, Cristhian não acreditava naquilo que via. A velha estava olhando pra ele direto nos olhos.Os olhos dela eram como duas pequenas bolas de fogo que emanavam uma autoridade e terror sem igual.Perdido naquele olhar flamejante, subitamente, seus joelhos dobraram e ele caiu prostrado.Logo sentiu algo que jamais experimentara antes.Um aperto no peito,uma angustia crescente, um misto de tristeza e vergonha...

Seria arrependimento? Nunca antes se arrependera de nada do que fez na vida. Vivia como se não fosse haver um amanhã,curtindo o momento apenas. Agindo de acordo com sua própria vontade e se espelhando nos exemplos decadentes que vira na mídia a nas pessoas próximas do que é ser feliz...

Por um momento, odiou o mundo em que vivia... começou a pensar no que estava fazendo. Refletiu se não estaria indo longe demais por um amor que, talvez, não existisse mais.Que talvez não estaria prestes a jogar sua vida fora por nada.

Entretanto, todo aquele ódio que parecia ter desaparecido e dado lugar a uma espécie de remorso por suas atitudes, retornou com todas as forças junto de uma recordação: a de quando a Agnes estavam abraçados juntinhos, enroscados nos lençóis, dum quarto de motel, planejando uma vida juntos. Falando sobre carreira,filhos,que tipo de casa comprar...

- Eu amava ela... - disse Cristhian, cabisbaixo, num to amargo. - E ela despedaçou o meu coração por causa de outro... Depois de tudo o que passamos juntos...

Não, não havia espaço para dúvidas e fraquezas. Ele precisava de uma compensação. Seu ego ferido clamava por isso.Ansiava revidar o mal que lhe causaram,fazê-los pagar pela dor que consumia sua alma e destruiu suas fantasias.

Pôs-se de pé, decidido. Cravou os olhos para onde a velha estava mas ela havia sumido.

Voltou a mirar a arma ao encapuzado e,entre dentes,largou:

- Já disse pra baixar as mãos, seu bosta!

- Hu, hu, hu... Esta bem, esta bem... Você quem manda... - e ao fazer o que outro mandou, explodiu gerando uma densa cortina de poeira avermelhada, que logo tornou-se uma relampejante nuvem escarlate e lançou-se sobre o jovem, derrubando-o no chão.

Cristhian foi sufocado pelo fedor cadavérico exalado da nuvem, e começou a ser assando pelo calor infernal que dela irradiava.

Cego pelos intensos lampejos, ele gritava:

- Sai de mim! Sai, vai embora! - tentou se reerguer, porém foi prensado brutalmente contra o solo. - Desgraçado! O que quer de mim?! O quê?!

- Sou o ódio criado por você e Arthur. Nascido há muito tempo... Sou a Sombra de suas almas! - respondeu a criatura, enraivecido. - Desde muito tempo alimentaram-me, e agora estou aqui por vingança! Se não permitir que eu manifeste minha ira, te mato aqui e agora, e então talvez eu seja aplacado!

- Eu aceito, eu aceito! Faça como quiser, mas não me mate! Assim também poderei me vingar! - disse o adolescente sem pensar duas vezes - Seu ódio é o meu ódio!

- Hahahah! Que assim seja! - exclamou a criatura. Em seguida a nuvem inflou grandemente para logo depois penetrar no corpo de Cristhian, causando-lhe uma imensa dor. Era como se uma lamina em brasa atravessasse seu corpo.

Após o ser adentrar por completo no corpo do jovem, este desmaiou, e ficou ali, estatelado no chão, como se estivesse morto. Ou realmente estaria?Não... ele começou a abrir os olhos lentamente... lutou para erguer-se, pois estava exausto, sugado, um tanto cambaleante e pingando de suor. Apanhou a arma do chão e esboçando um sorriso maléfico,para então seguir adiante.

21h00min - Vídeo Locadora

Arthur estava acompanhado de Agnes, Gabriel e Dionathan, procurando filmes para assistirem mais tarde. Enquanto os dois últimos achavam-se na seção de ação/aventura, os outros estavam na de terror.

Arthur apanhou um Blu-ray das prateleiras e comentou:

-"Espíritos - A morte está ao seu lado"... Esse filme foi muito elogiado numa revista famosa de cinema. O que acha de levarmos, Agnes?

- Curto filmes mais light, sabe? Uma comédia romântica, por exemplo...

- Hmmm... Nesse caso vamos levar uns três filmes então. Trouxe dinheiro só pra alugar dois, mas dá pra pagar o resto amanhã. - disse ele, simpático.

- Não, não precisa gastar comigo! - falou Agnes, sentindo-se sem graça - Eu assisto o que vocês levarem, não tem problema.

Sorrindo, o rapaz replicou:

- Tsc,capaz! O que são mais cinco reais? Vai e pega um filme que tu gosta e nós levamos! Vai, vai!

- Tá bom, tá bom! - ela rendeu-se - Mas só porque você insistiu muito, hein! Hahaha!

A garota encaminhou para a sua seção preferida, enquanto Arthur lia a sinopse do filme que escolhera. De repente, pelo canto do olho direito percebeu que junto à entrada do estabelecimento havia um vulto negro observando-o. O vulto parecia ter em mãos algo parecido com uma foice. Arthur rapidamente dirigiu seu olhar para a figura, porém não havia mais ninguém lá.Um calafrio correu-lhe a espinha ,contudo, retornou a sua leitura afim de afastar pensamentos absurdos.

Já Agnes escolhia tranquilamente seu filme, muito concentrada na seleção. Os requisitos de hoje seria uma historia que a ajudasse demonstrar seus sentimentos a Arthur, mas de forma indireta. Sentimentos imaturos nascidos da relação insatisfatória com Cristhian, era verdade, mas fortes o bastante para investir neles.

"Algumas vezes o amor pode surgir de surpresa, nas pessoas mais improváveis", pensou a garota, alegre.

Lá onde Arthur estava ele voltou a notar o vulto, mas agora postado à sua esquerda e bem próximo de si. Assustado, virou-se na direção da criatura, que fugiu ao seu olhar.

Subitamente sentiu alguém passar correndo por suas costas e sussurrar:

- Prepare-se...

Isso lhe causou inúmeros arrepios.

- Mas quem é...? - e apreensivo, virou-se para todas as direções a procura da entidade. Qualquer um que não o conhecesse o taxaria de louco.

- Tudo bem, Arthur? - perguntou a outra, já de volta, notando a agitação do garoto.

- Hã? Ah, sim, sim, tudo bem... Era só um mosquito me incomodando! - respondeu ele, com uma desculpa esfarrapada.

- Tá bom... - assentiu, e logo mostrou descontraidamente um Blu-ray que de capa rosa, trazendo a imagem de uma garota pensativa em uma pose graciosa. - Já viu esse aqui?

- "Talvez Seja Amor"? Hmmm... duvido, não gosto muito desse tipo de filmes. Mas se gostou, levamos esse daí.

- É, esse aqui sim!

- E pensando melhor, acho que não vou levar nada não. Aceito o que você levarem. - disse Arthur, pondo o filme dos "Espíritos" de volta na prateleira.

- Ué, e os "Espíritos"? - pergunta a jovem, curiosa.

- Ah, é melhor deixar eles pra lá, pelo menos por hoje! Hahaha!

- Tá então...

- Bem, vamos ver como os guris estão indo. - e foram pra seção onde estavam Dionathan e Gabriel.

Casa de Agnes - Sala

Os pais da jovenzinha encrenqueira assistiam a novela das nove, até que um forte bater de palmas chamou-lhes a atenção.

Rúbia virou os olhos pra cima e resmungou:

- Ai, ai, ai! Bem na hora da novela... Quem será?!

- Ah, deixa que eu vejo! Deve ser mais uma bomba! - reclamou Roberto, erguendo-se do sofá e pressentindo que realmente coisa boa não era. E quando saiu na varanda viu Cristhian parado no portão com aspecto sombrio e ameaçador. - O que você quer rapaz? Não mandei você sumir daqui?!

- Chama a Agnes! Agora! - ordenou o adolescente, com uma voz dupla e rouca.

- Não vou chamar ninguém! - replicou o outro - E não pense que usando esse truque de voz irá me colocar medo! Se manda daqui seu idiota ou...

- CHAMA A AGNES! - esbravejou o garoto, encolerizado, tornando sua voz ainda mais assustadora.

Sem se intimidar, Roberto tirou o celular do bolso e exclamou:

- Vagabundo insolente! Vai dormir numa delegacia hoje! - mas antes que ele pudesse dar o primeiro digito, Cristhian puxou a pistola de trás das costas e apontou para o homem.

- Solta o telefone!

Pasmo, Roberto gaguejou:

- Que-Que isso Cris-Cristhian?

- Só vou falar mais uma vez... Solta a porra do telefone!!! - e Roberto obedeceu - Agora chuta o celular pra mim e não se mexe!

Roberto chutou o aparelho, que deslizou pela laje e finalmente chegou ao portão. Sem desviar a mira do homem, Cristhian abriu o portão e entrou, e apanhou o celular.

Avançando para adentrar na casa, o garoto gritou:

- Vai, entra! Vou eu mesmo até a Agnes!

O primeiro a entrar foi o dono da casa, e como sua mulher estava absorvida pela novela não notou nada, apenas perguntou:

- Ué, por que a demora?

- Já vai saber a resposta! - respondeu ele, ríspido e de cenho fechado.

A mulher levou um susto quando Cristhian entrou logo atrás do marido, de arma em punho.

- Mas o que é isso? - interpelou Dona. Rúbia, abismada. - Ficou maluco, garoto?

- Cala a boca véia! Vou falar com a Agnes, e vocês vão ficar aqui bem quietinhos! E ai de quem chamar a polícia!

Já cheio daquela situação, Roberto sentou-se no sofá, cruzou as perna, os braços e disse:

- Ah, vai então, procura!

- Mas Ro... - Rúbia tentou protestar, mas seu marido a silenciou com um gesto.

Logo o rapaz começou a vasculhar os cômodos da casa, berrando como um doido pelo nome da garota. Impaciente, Roberto levantou e foi ao pé da escada que levava até o segundo piso.

E em alto e bom som,ele bradou:

- Pense, garoto! Acha que se ela estivesse aqui, ia ficar escondida?! Depois de quase dois anos com a minha filha, acredita que ela faria isso?!

Pensativo, Cristhian desceu lentamente as escadas. Após deter-se num degrau refletiu mais um pouco e por fim, assentiu:

- Não, a Agnes nunca foi covarde. Então voltou sua atenção ao pai da garota e, mais calmo, perguntou: - E pra onde ela foi?

- Ela não disse, como sempre! Ela só saiu correndo!

- Tsc, merda! - largou o rapaz, batendo com o pé no chão. - Pra onde ela deve ter ido?

Ele deu uma coçadinha na cabeça usando o cano da pistola, e então ouviu a voz daquele com quem unira forças, sussurrando um nome:"Arthur..."

- Mas é claro! - soltou o rapaz entre dentes, cheio de ciúmes.

Guardou a arma na cintura, debaixo da camisa e saiu em disparada. E nisso, Roberto aproveitou para chamar a polícia.

Casa de Arthur

Dona Eda, Diana e Lidia assistiam televisão quando ouviram um forte bater de palmas vindo lá de fora.

- Quem deve ser agora? - inquiriu Diana, antes de acrescentar brincando: - Heh! Será outra doida atrás do Arthur?

As palmas continuaram, no entanto, mais intensas. Dona Eda ergueu-se furiosa de sua poltrona e disse:

- Não sei, mas está com pressa. Se for outra guria, o Arthur vai levar um puxão de orelha! Uma das coisas que sempre ensinei pra ele, é der consideração pelos sentimentos dos outros!

Mas Lidia adiantou-se, gentil, foi ela mesma atender:

- Pode deixar tia. Deixa que eu vou.

- Obrigada minha, filha, - agradeceu a mãe de Arthur, voltando a sentar - Só pergunta quem é antes de abrir o portão!

Mas Lidia ignorou o aviso e abriu o grande portão de madeira sem hesitação.

- Sim?

Cristhian usava uma calça preta folgada e um moletom vermelho largo, cujo capuz encobria-lhe a cabeça.

Sem nenhuma cerimônia foi questionando:

- Cadê a Agnes?

- Boa noite pra você também! - replicou a garota, áspera, sentindo-se ofendida pelos maus modos do outro. - E não, ela não está. Foi dar a volta com uns amigos nossos, mas daqui a pouco ela deve estar chegando.

- E o Arthur também? - quis saber o garoto, tentando segurar o nervosismo.

- Isso, foi com eles. Espera aí que logo eles chegam, tchau! - ela ia fechar o portão, mas Cristhian a impediu, empurrando-o de volta.

- Então serve você mesmo! - e para controlá-la, apontou a arma pra Lidia.

- O que tá fazendo...?! - exclamou ela, atônita.

- Fica caladinha, ou leva bala! - ameaçou o outro.

- O que tu quer...? - indagou a amiga de Arthur, baixinho, mas muito assustada.

No mesmo instante em que uma trovoada explodiu no céu, Cristhian esboçou um sorriso maldoso.

- Vingança! - e subitamente fechou o cenho. - Quem tá lá dentro?

- Uma amiga minha e a mãe do Arthur!

- Tá, vem! - e pegou a menina pelo braço, quase que arrastando ela, e Dona Ela pôde ouvir o ruído dos passos e de alguns resmungos contornando a casa.

Intrigada, falou para Diana:

- Ué, a Lidia esta com mais alguém?

E foi com grande espanto que ouviram a voz dupla de Cristhian vociferando enquanto entrava dentro da casa:

- Escutem aqui! Vou levar esta guria comigo! Digam pra Agnes e pro merda do Arthur que estaremos no galpão velho, lá no campo. E que se mais alguém for junto com eles, ou a polícia aparecer, mato ela!

Com o coração na mão, Eda e Diana saíram da sala. Trêmulas, se depararam com o transtornado rapaz.

Perplexa, a mãe de Arthur largou:

- Cristhian, tá louco?!

Diana se alterou:

- Deixa ela, e me leva no lugar! Mas deixa ela, por favor, por favor!

- Fiquem quietas! - esbravejou Cristhian, com a arma na cabeça de Lidia, que permaneceu quieta e contraia o rosto para não chorar - Já estão avisadas! Vamos, guria!

E saiu de pressa, levando a menina como refém. Dona Eda abraçou Diana, que estava em prantos devido ao medo que sentia se caso acontecesse algo com sua querida amiga. Então a senhora tentou reconfortá-la, dizendo:

- Calma, calma. Tudo será resolvido... - "Pelos Deuses,o que tu fez,Arthur?",pensou Dona Eda, não acreditando no que acabara de acontecer.

Pouco tempo depois, Arthur e os outros chegaram na maior algazarra. E ao defrontar com sua mãe e Diana com olhos inchados, o sorriso que havia em seu rosto esvaiu-se.

- O que aconteceu, mãe? Estavam chorando?

Antes que dona Eda respondesse, Agnes sentiu um calafrio percorrer-lhe a espinha, e então veio a resposta:

- O Cristhian esteve aqui e raptou a Lidia, levou ela pro galpão velho lá no campo. - e furiosa interpelou, cravando os olhos em seu filho: - Podem me explicar o que aconteceu? Hein, Arthur?!

- Refém?! Como assim?! - disse Agnes, espantada, quando Arthur ia abrir a boca para falar.

- Sim, e ele estava armado! - completou a senhora, ríspida.

- Armado?! - exclamou Arthur, pasmo com o rumo que as coisas estavam tomando.

Eda largou Diana e encaminhou-se para a porta dos fundos, passando pelos amigos de Arthur, que saiam deixando o caminho livre.

Circunspecta, disse:

- Vem comigo, Arthur!

Sem dizer nada, ele obedeceu, já pressentindo um sermão a caminho.

"O que está feito, está feito!", disse a si mesmo, tomado por uma repentina arrogância.

Ventava muito e os primeiros pingos gélidos de chuva começavam a cair. O farfalhar intenso das arvores aliado ao balançar das outras plantas abafaram a conversa de mãe e filho, que haviam se encaminhado ao Jardim Sagrado, que agora estava mergulhado na escuridão.

Quando Eda começou a falar, sua voz não era a mesma, era mais grave:

- Usou de magia para arruinar o relacionamento dos dois e veja no que deu...

- Jamais! Não tenho nada a ver com isso! - replicou o rapaz, tentando enganar a mãe, sem se dar conta que havia algo de diferente nela.

- Hahahah! - a gargalhada da mulher foi amarga, e logo prosseguiu: - Ah, claro que não... Seja honesto comigo, senão será pior pra você! Não tente me esconder nada!

Sem escolha, ele mirou o céu negro,relampejante, e, após uma trovoada, confessou:

- Tentei me vingar de tudo o que ele me fez! Eu não podia perder essa chance de revidar!

- Quem lhe deu o direito de decidir o que é bom e o que é mau?Por acaso quer assumir o lugar das Senhoras das Retribuições?! - realmente, não era mais dona Eda quem falava, pois sua voz estava grave. E Arthur podia sentir uma outra presença, uma bem poderosa. - Vocês humanos não possuem capacidade o bastante para fazerem julgamentos! Vocês julgam utilizando orgulho ferido, acompanhado de uma mente pequena, deficiente visão da Vida e emoções descontroladas. Tudo isso sob o domínio do Ego, o inimigo da Sabedoria!

- Então por que nunca mostrou sua vingança contra Cristhian? Deixou-o fazer tudo o que queria comigo e, agora que tenho poder para revidar me censura? - retrucou o rapaz, lacrimejante.

Eis que a chuva começou a cair.

- Use a cabeça! - exclamou a deidade. - A colheita destinada a Cristhian não ia ser as das melhores, mesmo sem sua interferência! Já o seu futuro, Arthur, era brilhante! Esperava que você perdoasse e esquecesse as ofensas sofridas, não que armasse todo esse circo...

- Por que "era"?! - perguntou o jovem, com um aperto no peito.

- Porque deixou-se guiar pela ignorância de berço, e não pela Sabedoria que aprendeu! E isso interferiu e muito no destino de Agnes, Cristhian e inclusive o SEU! - Ela balançou a cabeça, cheia de desgosto, e após um suspiro seguiu: - A sábia vingança é buscar sempre ser feliz. Pois se agir assim, mesmo com as inevitáveis agruras da vida, não haverá espaço no coração que permita a entrada de ofensas e tampouco o controle por maus sentimentos,com o intuito de devolver a afronta na mesma moeda.Evitando dessa forma o desperdício de precioso tempo de vida.

Dito isso, ela ficou calada, e seu silencio deixou Arthur com medo, engolindo em seco.

Receoso, o garoto perguntou:

- E agora? O que acontece? Qual é o meu destino?

A outra o fitou com olhos verdes cintilantes, semelhante um par de lanternas na escuridão, e solenemente respondeu:

-Agora o que tem que fazer é reparar o erro lá no galpão. Deve encarar sua Sombra.

Uma lagrima escorreu-lhe pelo rosto do jovem. Então ele partiu dali, determinado a salvar Lidia e redimir-se diante os Deuses.

Gian Felipe Author e A.Henrique
Enviado por Gian Felipe Author em 25/01/2016
Código do texto: T5522657
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