ELE ME ODEIA - capítulo XXXVI
Depois que Dante foi embora, fui ter com meu tio, ele estava na cozinha e acabara de jantar. Me sentei ao lado dele, marcando seus olhos como se fosse meu prisioneiro.
- Está tudo bem, tio?
- Se está tudo bem? Está tudo ótimo! E por que não estaria?
Ele disse, bebendo um pouco de seu café, e eu falei:
- Talvez porque em vez de colocar açucar no café, o senhor colocou sal.
Tio Ricardo cuspiu o café e soprou um ar de esvaecimento, no que entendi que deveras não estava bem.
- Está esquisito... Vai, pode se abrir comigo, o que está te incomodando?
- Hhmm... É Paloma, ontem estávamos conversando e de repente chega o primo dela de carro e ela me deixa sozinho.
- Tio, o senhor não acha que está sendo muito ciumento? Eles são só primos.
- Eu sei, mas é que só de ver Paloma com outro cara eu fico tinino.
- Hummm... Acho que alguém aqui está enamorado.
- Mas, Paloma não gosta de mim.
- Não diga uma tolice dessa, tio! Só eu sei o quanto Paloma fala do senhor.
- Verdade? E o que ela fala de mim?
- Segredo.
- Iva, agora você vai ter que falar.
- Não vou ficar te contando tudo que Paloma me diz só porque o senhor é meu tio. E também sou amiga fiel, quando Paloma me pede segredo eu guardo segredo.
- Sei...
- Mas fica frio, não há nada entre ela e o primo, te garanto. Ah, e obrigada por ter aceitado meu relacionamento com Dante, foi bom ter sua compreensão e vê-lo tão pacífico.
- Eu aceitei isso? Eu estava sob efeito da deprimência!
- Tarde demais para voltar atrás!
- Bom, admito que não ia com a cara daquele grilo de beira de estrada, mas depois de muitas observações percebi que ele não é uma pessoa tão ruim assim. Mas, quero deixar bem claro que haverá um horário para namorar e beijar e nada de encontros tarde da noite, nem amassos e...
- Tio, já somos bem grandinhos e responsáveis, não vamos fazer nenhuma besteira.
- Hum.
- Não confia em mim?
- Em você eu até confio, mas nele...
- Bom, vou tomar um banho.
Fui subindo os degraus da escada, quando tio Ricardo me interrogou:
- Ah, eu esqueci de perguntar: como foi lá com sua avó?
Parei no meio da escada e encolhi os ombros, contando mais uma mentira:
- Foi bom.
- Como ela estava?
- É... Bem, estava bem.
- E te reconheceu?
- Nã-não.
- Puxa... Mas, tudo tem seu tempo, logo ela se lembrará de tudo.
- É verdade. Tô indo tomar uma ducha.
- Tá.
Naquela noite Dante aida me ligou, dizendo que já estava morrendo de saudade e ficamos conversando por horas no telefone. Eu estava tão eufórica que meu sorriso não cabia em minha face, que meu coração dançava frevo, que minhas mãos tremiam e meus olhos brilhavam. Dia seguinte, Dante foi me buscar em casa para irmos à empresa, algo que ainda era muito estranho para tio Ricardo, posto que era sempre ele quem me levava e agora ia sozinho.
Chegamos na empresa e Paloma foi a primeira a estranhar quando me viu sair do carro de Dante e tio Ricardo vindo só, mais atrás. Dante me deu um beijo na boca e foi para sua mesa, ai, como eu estava adorando aquilo! Paloma observava tudo com os olhos esbugalhados e foi correndo falar comigo.
- Iva!
- Oi, Paloma.
- Iva!
- Oi... Paloma.
- Iva!
- Que foi, Paloma?
- Você e Dante se beijaram?
- Sim.
- Na frente de todo mundo, na frente de seu tio!
- Sim.
- Mas, todo mundo estava vendo, isso não te preocupa?
- Não.
- Não?
- Não, porque agora eu e Dante estamos namorando.
- Namorando? Tipo... Beijando na boca e andando de mãos dadas?
- É.
- Puxa vida! É sério, Iva? Mas, como?
- Vem, eu vou te contar tudo.
Fui retratando todos os acontecimentos do dia anterior para Paloma, mas, repentinamente, o celular dela tocou e ela foi atender do lado de fora da empresa. Ouvi Paloma falar que era seu primo. Daí, veio meu tio e encostou em mim e disse:
- Está vendo? Paloma já está de papinho com o primo.
Dante escutou e também se aproximou de nós, com suas gracinhas provocantes para o lado de meu tio, e cantava:
- O Ricardão tem três pontas, tem três pontas o Ricardão, se não tivesse tem três pontas não seria o Ricardão... Hahaha...
- Cala essa boca, piolho de cobra!
- Relaxa, Paloma não deve amar seu primo tanto quanto seus salgadinhos.
- Eu queria ser um salgadinho.
Meneei negativamente a cabeça para os dois, discordando de ambos, e começamos o atendimento. Paloma finalmente desligou o celular e foi para sua cabine, com um sorriso intrigante de orelha a orelha. Ao término do trabalho, Dante me chamou para irmos comer algo, só que pedi para ele esperar um pouco, porque eu almejava ter uma conversinha com Paloma e abordei-a quando saía do banheiro.
- Paloma, antes de ir, queria te perguntar uma coisa...
- Fala, Iva.
- Seja sincera, nunca mentimos uma para a outra.
- O que você quer saber?
- Está rolando alguma coisa entre você e seu primo?
- Hã? Por que está perguntando isso?
- Bem, é porque você... Bom, é que seu primo agora só te trás e te busca na empresa e quando falou com ele ficou tão... Feliz. Fala a verdade, o que há entre vocês dois?
- Nossa, Iva, como você é bobinha!
- Por quê?
- Primeiro: Flávio já é comprometido e a namorada dele é um amor de pessoa e eles se amam muito. Segundo: mesmo que ele não fosse comprometido eu jamais teria algo com ele, já que fomos criados praticamente como irmãos. E terceiro: fiquei feiiz ao falar com ele no celular porque Mariana aceitou o pedido de casamento dele e o coitadinho estava quase tendo um piripaque de tanta ansiedade e agora está pulando de alegria.
- ah, então não há nada entre...
- Claro que não, boba!
- Ufa! Meu tio já estava quase entrando em depressão, doente de ciúme, pensando que você estava tendo um caso com seu primo.
- Ai, meu Deus, ele pensou isso?
- Sim. Anda desconsolado, abatido... É impossível reanimá-lo.
- Puxa, acho melhor eu ir falar com ele.
- Sim!
- Ah, depois quero saber mais sobre você e Dante.
- Unhum.
Após essa conversa com Paloma, Dante me levou para uma pizzaria e matamos a fome e depois nos beijamos muito, ele beijava tão bem, seu beijo era tão gostoso! Sussurrava coisas em meu ouvido e me deixava derretidinha por ele, mas este também delirava quando eu mordia seus lábios e falava com manha. E as tardes agora eram mais prazerosas, as flores eram mais perfumadas, a comida tinha mais sabor, o mundo estava mais colorido, só por que Dante passara de "um amigo" para "um amor".
Continua...