ELE ME ODEIA - capítulo XXII
Às cinco da tarde, metade do pessoal já havia ido embora, mas eu ainda estava em minha mesa, sozinha, a pensar. Senti a aproximação de alguém, era Marcelo, que parou ao meu lado e disse:
- Olá, Iva...
O fitei com menosprezo e, num tom melancólico, falei:
- Me deixa sozinha, Marcelo.
Ele puxou uma cadeira e ali sentou-se, mas eu não tinha prazer de encará-lo. Então ele disse:
- Eu sei que você deve estar pensando que eu fui cúmplice nas brincadeiras de Dante, mas a verdade é que não. Fiquei bastante chateado com a atitude dele e até disse várias vezes pra ele parar com isso. Acredite, também estou bastante indignado.
- Eu fui mesmo muito idiota, só me culpo nisso, em ter sido tão burra. Porque, pensando bem, eu não fiz mal nenhum a ninguém, o inverso, fiz um bem danado a Júlia, evitando de ela viver junto com um mentiroso idiota, que é Dante.
- Sei lá, o cara tá querendo descontar a raiva dele em você e fica te provocando... Não estou querendo puxar teu saco, Iva, mas acho que você merece ser bem amada, merece alguém que valorize seu carinho e Dante não faz nada disso.
Fiquei calada, não tinha mais o que dizer, me faltava coragem. Marcelo então se punha de pé e arrastou a cadeira de volta ao lugar, se despediu de mim deixando um beijo em minha bochecha. Também me levantei para ir embora, peguei minha bolsa, pronta para sair, quando levei um susto ao sentir alguém envolver os braços em minha cintura. Me virei depressa e Dante me prendeu com seus braços. Intrigada, tentei empurrá-lo, contudo, ele me cercava, me sufocava. Falei:
- Me solta, Dante!
Mas Dante prendia-me cada vez mais e sussurrava em meu ouvido:
- Eu sei que você quer meu beijo...
Ele tentava me beijar, ao passo que eu virava o rosto e dizia para ele parar, só que ele insistia e caçava meus lábios.
- Pára, Dante! Me larga!
- Vai fazer o quê? Estamos sozinhos aqui... Posso te encher de beijos... Fica quieta e me deixa morder sua boca...
Ele conseguiu me beijar, foi quando tio Ricardo apareceu e agarrou Dante pela gola da camisa e lhe deu um forte soco, no que ele bateu com tudo contra a mesa de trabalho. Meu tio ainda o segurou novamente pela camisa e Dante já estava com os lábios cortados, disse então meu tio:
- Se voltar a encostar um só dedo em minha sobrinha, vou acabar sendo preso, porque alguém vai acabar morto aqui.
Dante passou a mão na boca e trouxe nela sangue, então vociferou para meu tio:
- Isso é injusto, você me pegou de surpresa!
- É, e nem precisei usar minha arma.
Disse tio Ricardo, chegando até mim e perguntou:
- Ele machucou você? Te fez alguma coisa?
- Não.
Respondi, um pouco atônita e meu tio e eu saímos da empresa. No carro, indo para casa, tio Ricardo conversava comigo:
- É a primeira vez que ele tenta se aproveitar de você?
Eu tinha mágoa de Dante, porém, não me convinha acusá-lo nem descrevê-lo em maldade diante de meu tio, portanto, respondi somente:
- Ele nunca havia feito isso...
- Vocês tem alguma intimidade?
- Um pouco, eu e Paloma conversávamos com ele normalmente.
- Pois eu não quero mais que troque qualquer palavra com ele. E se ele voltar a se insinuar para você é para me avisar, entendeu?
Assenti, e ali encerrou-se aquela conversa. Dias passavam-se e meu rancor não, no ambiente de trabalho Dante estava sob a supervisão de meu tio e eu não sabia ao certo se aquilo estava me fazendo bem ou mal, estar tão afastada de Dante, quando um dia sonhava poder estar bem ao seu lado. Eu evitava passar por perto dele e se ouvia sua voz meu coração gemia, não se sabe se era dor ou amor, mas de uma coisa eu sabia: estávamos quites, eu havia machucado Dante e ele me machucado. E nesse passar de dias, numa e noutra vez, Marcelo vinha me distrair, na expectativa de me tirar do mundo sombrio em que me lancei e tinha vezes que me convidava para um pequinique no parque ou para o cinema, então eu ia me afastando pouco a pouco da minha sofrência sentimental e num desses passeios, Marcelo contou-me de suas intenções, à medida que eu lhe prestava minha total atenção...
- Iva, sei que só agora estamos nos conhecendo e ainda pouco sabemos um sobre o outro, mas este pouco que já sei sobre você me foi o bastante para brotar em mim um imenso carinho por sua pessoa. Não sei se foi só carinho, visto que ao seu lado me sinto muito bem...
- O que quer dizer exatamente?
- Que quero algo mais com você...
- Como o quê?
- Quero andar de mãos dadas com você, dividir todos os momentos de minha vida com você... Com as melhores das intenções, quero ser seu namorado.
Eu não esperava por aquilo, ou talvez sim... Mas estava deveras surpresa, Marcelo era um amigo, em momento algum o imaginei fora dessa categoria, e agora ele podia me imaginar como além de uma amiga. Seria dificultoso pensar naquilo.
- Marcelo, eu... Eu nem sei o que te dizer agora.
- Não, não se precipite! Quero que vá para casa e pense muito bem nisso. Leve em consideração o almejo que tenho em te fazer feliz e as coisas boas que poderemos viver juntos. Mas, não tenha pressa para responder, quando tiver a certeza do que será melhor para você, então me dê sua resposta.
E quanto tempo seria precisso para eu entender que o melhor para mim era esquecer as coisas passadas e investir nas coisas boas da vida? E ainda que me fosse necessária a eternidade, quem poderia me assegurar que tal escolha seria a melhor? Eu precisava analisar bem tudo o que estava me encomodando, para que fosse anuladas essas coisas e substituídas por outras que me beneficiassem... Mas, que coisas seriam essas?
Continua...