A ORDEM VOL. 1: DONS (CAPÍTULO 02 - A EXISTÊNCIA DOS MUNDOS)
Onze anos se passaram depois do que havia acontecido. Sofia havia crescido; estava com 18 anos e frequentava o último ano do ensino médio. Era uma boa aluna, prestava atenção na aula, principalmente na de ciências.
– Em termos científicos, a possibilidade da existência de outras dimensões é mediana, mas quando se trata de crença, muitas pessoas acreditam que possa haver outro lado, um lado desconhecido, mas que existe e está tão perto quanto achamos. Algo que vai além da nossa compreensão, tão possível quanto impossível, as pessoas apenas acreditam – explicou o professor.
– Mas como poderíamos chegar a essa outra dimensão? – perguntou interessada.
– Bom, a não ser que tente desenhar um círculo com giz no chão e fique dando voltas de costas e meditando, eu não sei – debochou.
Todos da classe riram da cara de Sofia.
– Ei, silêncio! – gritou o professor. – Desculpe, Sofia, não foi minha intenção.
– Tudo bem! – disse, levantando-se da carteira e pegando sua mochila.
Quando Sofia saiu da sala, o sinal para ir embora bateu.
Cinco jovens – duas meninas e três meninos – foram atrás dela.
– Ei, Sofia, eu sei como fazer para chegar à outra dimensão! – disse um dos meninos passando na frente dela.
– Como? – perguntou ingenuamente.
– Posso abrir um portal, na minha casa, na minha cama...
Sofia entendeu que estavam caçoando dela, empurrou o garoto e foi embora enquanto os cinco ficaram rindo dela.
Ninguém sabia o que havia acontecido com Sofia quando criança, muito menos que seus pais haviam sido mortos. Sofia sempre aguentou as brincadeiras de mau gosto, às vezes chorava às escondidas em seu quarto, mas nunca deixou que isso a desanimasse, ainda mais porque o ano letivo estava acabando, aquela era a última semana de aula.
Depois das provas, foi marcada a data do baile de formatura da escola.
– Sofia, venha cá! – chamou Ellen.
Sofia foi até o quarto onde Ellen estava.
– Sim, vovó!
– Quero lhe dar este presente!
Era um vestido rosado, lindo, com pedras que imitavam cristais, e uma tiara de brilhante prateada. Sofia sorriu.
– É lindo!
– Ele é seu, comprei na cidade hoje enquanto estava na aula. É para o baile de formatura.
Ellen colocou o vestido na frente de Sofia no espelho e a tiara em sua cabeça.
No mesmo instante, Sofia ficou triste.
– Por que esta carinha?
– Perdoe-me, vovó, mas eu não vou ao baile da escola amanhã!
– Mas por que não?
– Não fui convidada.
– Ah, minha linda, eles não sabem o que estão perdendo! – Ellen a abraçou. – Você está bem?
– Estou sim, vovó! – sorriu.
Na noite do baile, Sofia colocou o vestido e se arrumou como nunca.
– Sofia, você está linda! – elogiou-a a avó.
– Obrigada!
– Vai ao baile?
– Não, mas quero dançar esta música com você! – Sofia foi até o aparelho de música e escolheu uma clássica.
– Eu adoraria, é uma honra!
As duas dançaram no meio da sala, rindo e cantarolando ao ritmo da música. Aquele momento parecia que nunca acabaria, e Sofia guardaria para sempre em sua memória.
O relógio marcava dez horas da noite. A lua, naquele dia, não apareceu e o céu estava nublado, estava muito escuro lá fora. Enquanto Sofia fechava as cortinas e trancava as janelas, viu alguém na rua, parado. Mas quando olhou outra vez, já não havia ninguém lá.
“Deve ser minha imaginação”, pensou.
Quando Sofia foi fechar a última janela, um vento forte a abriu e ela se assustou com a batida das janelas ao encontrarem a parede. Sofia foi trancá-la e ficou observando a estrada. De repente, viu um vulto passando pela janela. Deu um passo para trás e levou sua mão ao coração, que estava acelerado. Por um minuto, Sofia ficou parada, paralisada pelo medo.
Mas, afastando os pensamentos ruins, a garota resolveu não dar importância àquilo, e foi para o quarto de Ellen.
– Vovó, já está dormindo? – perguntou baixinho, com medo de que pudesse acordá-la.
– O sono está vindo, estou sentindo chegar! – respondeu Ellen, no mesmo tom.
– Então, tenha uma boa noite! – Sofia se aproximou para dar um beijo na testa da avó.
– Boa noite, querida!
A jovem saiu, fechou a porta e foi para seu quarto, que ficava ao lado. O aposento era pequeno, havia apenas um armário, uma mesinha com alguns livros e uma mochila pendurada na cadeira, um espelho grande na parede e uma cama, com o ursinho Teddy repousando no travesseiro.
Ao terminar de arrumar a cama e guardar suas camisetas no cabide do armário, Sofia ficou na frente do espelho penteando os cabelos negros. Foi aí que ela sentiu como se algum inseto picasse seu pescoço. Percebeu algo estranho, era uma marca, que parecia com um sol, mas Sofia nunca havia visto aquilo antes.
– Mas o que é isso? – perguntou.
Sofia esfregou a pele, mas a marca não saiu... Outra coisa, porém, chamou a atenção dela. Quando reparou em seus olhos, percebeu que o azul mudava de tonalidade. Em um momento, os olhos ficavam verdes, depois amarelos. De repente, já estavam vermelhos, como terra no deserto, e, por fim, estavam brancos. Mesmo assustada, Sofia não parou de ver aquilo. Aproximou-se do espelho e achou ter visto algo ou alguém no reflexo dos seus olhos... Mas virou-se para trás e esfregou os olhos. Ao se aproximar novamente do espelho, reparou que seus olhos haviam voltado ao normal.
Sofia aprendeu a ser paciente e a esperar, achou que aquilo passaria e que poderia ser apenas algo da sua imaginação. Mal sabia ela que aquilo ainda era o começo de algo muito maior do que poderia imaginar.
O relógio marcava 23h30 e ela ainda não conseguira dormir. Estava tentando lembrar-se da sua imagem no reflexo do espelho, era algo que ela acreditava não ser real, mas que gostaria muito de acreditar. Sofia sempre acreditou em mágica e sempre levou em seu coração que um dia seria diferente das pessoas, tão realistas que chegavam a ser como robôs, faziam as mesmas coisas e quase sempre pensavam da mesma forma. É isso que Sofia achava das pessoas.
Enfim, Sofia adormeceu.