ELE ME ODEIA - capítulo X
Ainda que presos ali, naquela sala fria, Dante e eu trocávamos palavras, trocávamos-as por risos, por fatos, mas nunca pelo silêncio, até chegar um momento em que o cansaço e a fome era o que falava mais alto dentro de nós. Eu lembrei que tinha uma barrinha de cereal dentro de minha bolsa, a peguei e abri a embalagem, ao passo que Dante comia com os olhos e babava.
- Vai me oferecer logo um pedaço, sim ou não?
Ele perguntou e eu sorri, reparti a barrinha no meio e dei um pedaço a Dante. Passado isso, veio o sono, o peso nos olhos, os constantes bocejos. Ainda nem passavam das 21:00h, mas tanto já havíamos falado e coisa alguma resistia ao desconforto e fraqueza do corpo, por conta da fome e da sonolência. Dante encostou a cabeça na parede e seus olhos foram se fechando devagarinho e a cabeça acabou caindo prara o lado e ele dormiu. Eu velava seu sono e ao mesmo tempo repetia para mim como ele era lindo, ainda mais dormindo. Acabou eu também caindo no sono, deitada sobre o chão.
A luz do dia entrou foi clareando a sala às cinco da manhã, um barulho de porta sendo aberta despertou Dante do sono e ligeiramente ele se levantou e correu para a porta ainda trancada, começou a bater e gritar:
- Abram aqui! Abram aqui!
Eu, do mesmo modo, acordei e me levantei, recuperando as lembranças e me adaptando ao cenário. Ouvimos alguém se aproximar da sala e um barulho de chaves. Dante bateu mais uma vez na porta, até que ela foi aberta pela faxineira.
- Graças a Deus! Aleluia!
Dizia Dante, aliviado. Natasha olhou para mim e depois para Dante, e perguntou:
- O que vocês fazem aqui?
E Dante se dispós a responder:
- Alguém trancou a porta enquanto estávamos aqui dentro depois de ouvirmos um barulho enorme vindo daqui.
- Meu Deus! Mas... Vocês estão bem?
Natasha me fitava como se nada soubesse, sendo que sabia daquele meu plano e eu deixava que Dante explicasse tudo, porquanto ele de nada sabia.
- Estamos bem, mas eu sinto uma tremenda fome e frio e dores no pescoço...
Ele disse. Eu apanhei minha bolsa e simplismente falei:
- É melhor eu voltar logo para casa, tomar um bom banho e um bom café, antes que dê hora de trabalhar.
- É verdade, vou correndo para casa.
Dante disse, abandonando a sala antes de mim. Quando ele já estava longe, Natasha se aproximou de mim e perguntou-me:
- E então, como foi?
- Foi a melhor conversa que poderíamos ter, eu disse tudo o que precisava e no fim, nem foi tão ruim como achei que seria. Muita obrigada mesmo, Natasha, você me ajudou muito.
- Não foi nada. E é bom saber que deu certo.
- Não se preocupe, ninguém jamais saberá desse nosso plano.
- Está bem.
Me despedi de Natasha e peguei um táxi direto para casa. Quando tio Ricardo viu-me entrar pela porta, correu para mim e foi logo me interrogando...
- Iva, você está bem? Onde você estava? Liguei várias vezes para o seu celular, mas estava desligado. O que aconteceu?
- Eu... Dormi na casa de uma amiga minha.
- E por que não me avisou nada? Queria me matar do coração?
- O celular descarregou!
- E não sabia telefonar do telefone da casa de sua amiga, sei lá!
- Calma, tio! Eu estou bem.
Falei, indo para a cozinha e abrindo a geladeira à procura do que comer.
- Mas eu não estou! Fiquei a noite inteira preocupado, pensando que algo tinha te acontecido... E que amiga era essa?
- O senhor não conhece.
Retirei o queijo da geladeira e me sentei à mesa, e tio Ricardo não parava de falar...
- Iva, nunca mais desapareça assim sem me avisar, entendeu, mocinha?
- Está bem... Sempre que eu for desaparecer eu te aviso antes.
- Não estou de brincadeira.
Olhei para o relógio da parede e bebi o último gole do café, em pressa e, me levantando, falei:
- Nossa, tenho pouquíssimo tempo para me arrumar, vou acabar me atrasando...
Subi a escada depressa e meu tio reclama em minhas costas...
- Como é? Então você chega em casa depois de passar toda uma noite fora e não dá dez minutos e já está saindo? E eu fico aqui, morrendo de preocupação e nem durmo direito! Iva! Iva!
Chego na empresa ainda com dez minutos adiantados e relaxo em minha mesa. Paloma chegou em seguida, sempre comendo suas guloseimas e ao fitar-me ela franziu o cenho e falou:
- Credo, Iva! O que te aconteceu? Está com uma cara tão derrubada...
- É que... Eu não dormi direito noite passada.
- Humm... E por quê?
- Porque... Porque eu estava sem sono!
- E por que estava sem sono?
- E por que você pergunta tanto? Nossa, que interrogatório mais chato.
Paloma estranhou-me e foi para sua cabine. Em seguida, Dante ia entrando na empresa, lindo e cheiroso como sempre, somente com uma carinha de sono, mas nem isso o empatava de se arrumar bem e dar um nó perfeito na gravata. Eu estava organizando minha mesa, quando ele passou por mim e, num tom suave, disse:
- Bom dia...
Eu me espantei, olhei de um lado para o outro para entender com quem ele havia falado, mas estando só eu ali, era óbvil que havia sido comigo. Assim sendo, eu respondi, educadamete:
- Bom dia.
Quando Dante se afastou, eu quis pular de alegria! "Meu Deus, nem acredito, ele falou comigo!? Me desejou bom dia!" eu dizia em pensamento, e passei todas as horas de trabalho só relembrando isso, o doce som da voz de Dante. Na hora de ir embora, aproveitei para fazer uma coisa... Peguei meu celular e digitei um número, aguardei me atenderem. Paloma veio me chamar para irmos à lanchonete e não deixou de me fazer uma pergunta:
- Para quem você está ligando?
- Shiiiii... Não atende... Estou tentando falar com Júlia para explicar-lhe todo este mal entendido entre ela e Dante.
- Espera aí, deixa eu ver se entendi, você gosta de Dante e quer ajudá-lo a se reconciliar com essa tal de Júlia?
- Eu só quero o ver feliz, Paloma, e consertar meu erro! Além do mais, de que adiantaria tê-lo sem que este nada sentisse por mim?
- É... Sem contar que você merece um cara bem melhor que Dante. Mas me diz, como você conseguiu o número dela?
- Eu pedi a Dante.
- Você pediu a ele? Como?
- Humm... É melhor deixar isso pra lá.
- Não, me conta! Porque eu quero saber como você conseguiu pedir algo a Dante, se nem ao menos consegue se aproximar dele.
- Bom, é uma longa história... Mas, me deixa tentar ligar para Júlia mais uma vez, aí te explico.
Júlia não me atendia, o celular estava desligado, mas não desisti! Depois de contar para Paloma sobre o que houve comigo e Dante noite anterior, fui para casa e continuei tentando falar com Júlia e, quando já eram quase 22:00h e eu já pensava em desistir, ela me atende, com uma voz cansada...
- Alô?
- Alô, Júlia?
- Sim. Quem está falando?
- Você logo lembrará de mim, eu sou quem ocasionou uma triste desavença entre você e Dante. Mas, por favor, peço que não desligue o celular e me escute, pois, se tem alguém culpada nesse história sou eu...
- Você é aquela moça que Dante pediu em noivado, não é?
- O quê? Não! Foi tudo um mal entendido seu, Júlia...
- Como conseguiu meu número?
- Isso não importa. Júlia, por favor, me escuta, eu não tenho nada com Dante e muito menos estou noiva dele! e quer saber? Dante nem gosta de mim, vive me dando foras e...
- Eu vi vocês se beijando e vi o anel que ele te deu... Acha que sou alguma tola? Alguma burra que não entende nada?
- Dante não me beijou, fui eu quem lhe roubei um beijo e, nem sei por que fiz aquilo! Mas Dante jamais que... Alô? Júlia? Alô?
Ela desligou o celular e eu lamentei, mas não iria desistir tão cedo. Me deitei para dormir e pensei com antecedência em algo para convencer Júlia.
Continua...