ELE ME ODEIA - capítulo III
Perto da hora de ir embora, eu ainda estava na cabine e retocava o batom, vi a caixinha dentro da bolsa e retirei-a. Abri e retirei o anel, resolvi experimentá-lo em meu dedo, era lindo, tinha uma pedra azul e o aro dourado. Enquanto eu adimirava-o em mim, Paloma apareceu, com seus salgadinhos 0% saúde, então disse ela:
- O que você está fazendo com o anel do Dante?
- Ele me... Deu? É... Me deu.
- Então, praticamente, vocês estão noivos!
Brincou Paloma, e eu meneei negativamente a cabeça e, quando olhei para trás vi aquela mesma moça de cabelos longos e olhos azuis que ameaçavam jorrar lágrimas, pasmada, e retirou-se depressa.
- Oh não... Júlia, espera!
Eu gritei e Dante, ouvindo-me, se aproximou de mim e perguntou:
- Júlia? Você disse Júlia? Júlia estava aqui?
Eu o fitei, emudecida e ele correu para fora, na expectativa de alcançar Júlia. Eu gritei:
- Dante, espere!
Fui atrás dele e ele conseguira alcançar Júlia e estavam conversando, ao passo que eu acompahava tudo de longe. Júlia parecia melancólica e ao mesmo tempo chateada, Dante a fazia lhe escutar, desolado. Num momento, ele olhou para minha direção, com um olhar negro e eu tentava retirar o anel que apertava em meu dedo. Vi que Júlia estava indo embora e que Dante, na tentativa de impedi-la, se jogava em sua frente, porém, chegou um instante em que ela foi caminhando sozinha e Dante ficou para trás. Minutos passados, ele veio caminhando até mim, à medida que meu coração batia forte e espancava-me! Senti medo... Ele me enfrentou e disse:
- Por que você está usando a droga desse anel?
- Eu tentei tirá-lo, mas... Não consigo!
Dante olhou no fundo dos meus olhos e com aquele tom severo, falou:
- Eu odeio você, Iva... Odeio você.
Ele deu as costas e eu tentava arrancar o anel, ao mesmo tempo em que chorava lágrima após lágrima. Aquelas palavras me machucaram... Muito. Finalmente consegui retirar o anel do dedo, mas ele acabou caindo e rolando pelo chão até o meio da rua... Quis correr para apanhá-lo, mas não tive tempo, um automóvel passou bem por cima da jóia.
- Não!!
Gritei, e o motorista parou de imediato o carro. Ele saiu assustado do carro e perguntou:
- Ai, meu Deus! Eu atropelei alguém? Cadê? O que foi?
- O senhor passou por cima do meu anel.
- Ah!
Ele ralhou e entrou no carro, seguindo seu destino. Me abaixei e apanhei o anel, estava amassado e sem a pedra. Mesmo assim o guardei comigo e fui para casa.
Cheguei em casa aflita, tudo estava se tornando um pesadelo sem fim! Beijei minha avó que tricotava na cadeira de balanço da sala e Imaginei que devorando alguns bombons eu me sentiria melhor (segundo a filosofia de Paloma). Fui até a cozinha e meu tio Ricardo estava abrindo o armário.
- Isso aqui parece mais uma farmácia. Só tem remédio aqui?
Disse ele. Não falei nada, no que ele olhou para mim e notou minha aflição. Perguntou:
- O que você tem? Nem eu que estou faminto estou com essa cara.
- Nada...
Respondi, e lavei as mãos na pia de pratos. Senti a aproximação de meu tio, ele veio por trás de mim e murmurou no pé de meu ouvido:
- Você quer?
Ele mostrou uma laranja na palma da mão. E eu disse, me afastando:
- Não, obrigada. Meus avô continua deitado?
- Sim. Toma, só um pedacinho...
Disse meu tio, repartindo um bague da laranja e tentando me fazer comer.
- Não quero... Que estranho, dias atrás ele estava tão bem!
- Ele quem?
- Meu avô! Tio, o senhor tem certeza que ele tem tomado o remédio?
- Unhum...
Ele disse de boca cheia e retirou do armário um frasco de remédio. Falou:
- Não é este aqui?
- Não acredito! O senhor deu este remédio a ele?
- Sim... Por quê?
- O vovô é alérgico!
- Eu devo ter confundido os frascos.
Corri para o quarto de meus avós e meu avô estava acordado sobre a cama.
- Vô, o senhor está bem?
- Quê? O que você disse, Ivinha?
Ele tinha perdido 40% da audição e era preciso falar muito alto para que pudesse ouvir.
- Perguntei se o senhor está se sentindo bem!?
- Sim... Coff! Coff! Estou bem.
Puxei o cobertor mais para cima e cobri seu peito. Falei:
- Tente dormir um pouco. Qualquer coisa é só me chamar, estarei na sala.
Fui para a sala e me sentei ao lado de minha avô, ela ainda tricotava e mal ponhava os olhos na TV ligada em uma de suas novelas preferidas.
- Vovó, não é melhor parar um pouquinho? Vai cansar os dedos.
- Não, não, querida, eu não canso.
Fitei seu rosto sorridente, mas não me senti confiante de que estava bem. Levantei o olhar para meu tio, que ia se sentando no sofá e disse para mim:
- Não adianta, ela está aí a tricotar desde as 13:00h. Já chamei ela para dar um passeio pelo bairro, mas ela não me dá ouvidos.
Fiquei mirando meu tio, preocupada, me intrigava ver meus avós, que um dia foram tão fortes e alegres, daquele jeito. Consegui fazer a vovó se levantar e tomar um banho quente, enquanto o tio Ricardo ia à padaria. Aquela noite foi de sonhos perturbadores que me faziam revirar na cama e eu despertava constantemente e ficava mirando o teto, à medida que as lembranças de Dante passeavam em minha mente.
Amanheceu e fui ao trabalho, torcendo para que fosse um dia melhor. Logo na chegada, fui surpreendida por Dante me barrando, num tom sério e frio ele disse para mim:
- Onde está o anel? Quero de volta.
Olhei atônita para ele, não esperava que fosse me pedir a jóia de volta, ainda mais depois do desastre que ocorreu.
- O... Anel?
Perguntei.
- Sim. O que você fez com ele?
- É que... É que eu deixei ele cair no meio da rua e... Vinha um carro, então...
Dante baixou a cabeça e alisou a nuca, depois ergueu o rosto e me perguntou:
- Você está com ele aí?
- Estou.
- Me dá aqui.
Mordi os lábios e abri minha bolsa, retirando o anel deformado e entregando-o à Dante. Ele segurou o anel, observando-o... Fechou os olhos e passou a mão no rosto e, depois de um breve suspiro ele me deu as costas e foi para sua cabine.
- Desculpa!
Eu gritei, pressentindo uma nova nuvem negra me devorando e me afastando cada vez mais de meu grande amor. No final da tarde, já indo embora, passei pelo banheiro e ouvi Dante falando ao telefone...
- Se você me der só uma chance, para que eu possa me explicar a você, verá que tudo só trata-se de uma confusão, um mal entendido...
Ele dizia ao celular e eu escutava por trás da porta, e já parecia óbvio quem poderia ser no outro lado da linha... Sem dúvida era Júlia. Dante continuou:
- Deixa eu me encontrar com você, deixa eu te esclarecer tudo! Você sabe o quanto te amo... Não, Júlia, por favor, não desliga... Júlia? Júlia?
Veio o silêncio. Um silêncio absurdo. Também veio aquela sensação de penitência adentro de mim, eu era um gigante na terra dos sonhos de Dante e destruía seus mais belos castelos com meus pés e nas entranhas de um deles estava a princesa dos cabelos dourados e dos olhos cor de azul. Eu me tornei um pesadelo na vida de Dante. Mas, o pior estava por vim... Sucedeu que, chegando perto de casa, me espantei com um tumulto de pessoas cercando a casa e viaturas da polícia ali estacionadas, também uma ambulância e policiais que entravam e saiam da casa. Avistei meu tio do lado de fora, próximo a alguns policiais e corri até ele. Vi que seu braço jorrava sangue e perguntei, em pânico:
- Tio! O que aconteceu?
- A sua avó surtou e quis me ferir com uma garrafa de vidro!
- O quê? Mas, por quê?
- Não sei! Eu só pedi para ela largar um pouco aquelas agulhas e ela se enfureceu.
Não acreditei no que estava acontecendo, corri para dentro da casa e encontrei minha avó sentada no sofá junto à alguns peritos. Ela parecia atordoada e muito nervosa, mas uma enfermeira a tentava sossegar. Me aproximei dela e falei:
- Vó, a senhora está bem? O que houve?
- Me deixe em paz, menina malcriada!
- Vó, calma! Não me reconhece? Sou sua neta Iva.
- Quero minhas agulhas! Saiam daqui!
Me impressionei e pedi a explicação do perito sobre o que ocorrera, no que ele falou:
- Chegamos aqui e sua avó estava alterada, com a garrafa de vidro quebrada ao meio na mão. Só agora conseguimos acalmá-la.
- Mas ela nunca reagiu assim...
- Imaginamos que ela precise de um apoio psiquiátrico.
- O que quer dizer com isso?
- Moça, achamos melhor que sua avó seja internada num azilo, ou... Se for o caso, num hospício, os médicos saberão o melhor.
- Hospício?
Meu coração gelou e senti uma enorme ânsia de chorar, mas tudo parecia só um sonho e eu pensava que logo acabaria... Por que aquelas pessoas estavam invadindo minha casa? Por que minha avó gritava comigo? Não dava para entender aquela confusão.
Continua...