ELE ME ODEIA - capítulo I
Tentei escrever cada palavra dessas para uma outra pessoa, porquanto ele não suportava a idéia de eu amá-lo e, em consideração disso, tentei esquecê-lo. Todavia, tudo em vão, meu coração pertencia a ele, seu rosto estava gravado nos meus olhos... Todos diziam que ele me odiava e que só eu não enxergava isso. Não vêem que o amor é cego? Seu nome está escrito na derma de meu coração, era ele, Dante, o homem dos olhos verdes e cabelos num tom castanho claro, cortados razoavelmente, uma voz calma e delirante, um perfume único, lábios tentadores, mas, que nunca sorriram para mim. Trabalhávamos juntos numa empresa de telemarketing, o que fazia Dante me odiar mais ainda, por ter que se deparar comigo todos os dias e ainda enfrentar com astúcia a pressão dos clientes. O ódio de Dante por mim não surgiu assim à toa, como se num belo dia ele tivesse me visto pela primeira vez e não ido com a minha cara. A valer, eu o dei motivos para criar em si este sentimento severo...
Tudo aconteceu há duas semanas atrás, quando eu ainda tinha esperanças de me aproximar de Dante e conseguir alguma recompensa, nem que pequena. Eu já deixava a empresa para voltar para casa e ele também ia saindo. Ele vestia uma camisa social azul claro que o deixava mais lindo que o normal e me fazia enlouquecer. Eu era muito fraca para o amor, via Dante e já me derretia, como uma garota boba de 11 anos que amava diários. O amor era minha fraqueza. Sem querer perder as oportunidades, corri para acompanhá-lo e ele andava depressa e não olhava para trás. Eu imaginava que Dante já desconfiava que eu o amava, visto que eu nunca soube disfarçar e sempre fazia de tudo para passar por perto dele e demonstrar aquele singelo sorriso que eu passava todo o percurso de casa para o trabalho ensaiando.
- Dante, espera!
Eu gritei, e ele olhou para trás, cessando seus passos apressados. Alcancei-o e sorri para ele, porém o mesmo ele não fez e falou:
- Desculpa, Iva, mas eu tenho pressa.
- Vou ser rápida, juro!
Ele olhou para seu relógio de pulso e respirou fundo. Disse:
- Diga.
- Sabe, eu... Eu sei que mal nos falamos lá na empresa e que não temos muita intimidade...
Enquanto eu falava minhas palavras embaralhadamente pronunciadas, Dante coçava a nunca e mordia os lábios, como num encômodo com o imprevisto, que era eu. Mesmo assim, continuei falando:
- Mas, tem algo em mim que já há tempo queria ter te dito e não... E não tive coragem...
Ele olhou para trás e falou:
- Não pode ser mais direta?
- Olha pra mim!
Ele virou-se para mim e franziu o cenho, eu não me fazia entender, estava muito nervosa e não conseguia me expressar direito.
- Iva, eu estou com pressa... O que você quer?
Me aproximei um pouco mais dele, no que o mesmo se intrigou e não entendeu. Meu rosto ficou bem de frente ao dele e, de surpresa, o beijei... Suavemente. Percebi o peito dele pulsar e sua respiração ficar mais profunda, ele estava assustado e seus olhos permaneciam abertos enquanto eu me deliciava em seus lábios. Num momento ele se afastou de mim e me apartei de sua boca. Me olhou ferozmente e eu não ouvia uma palavra sequer deste, mas notei que seus olhos estavam assustados e olhava para trás de mim. Me virei, e vi uma bela mulher de cabelos loiros e cumpridos presos com um rabo de cavalo e com um corpo perfeito. Ela parecia mais assustada do que qualquer um de nós ali... Então, finalmente ouvi a voz de Dante por trás de mim, dizer:
- Júlia, eu... Eu posso explicar, eu... Não sei porque ela fez isso!
Olhei para Dante e pude entender, eu era o grande erro da história e tentei me explicar à moça:
- Me perdoe! Eu... Eu não quis fazer isso, eu não sei por que o fiz! Eu... A culpa foi minha, toda minha!
Ela fitava Dante e me ignorava, no que eu exaltava minha voz e queria defendê-lo, porque eu era a culpada.
- Ele só é um amigo meu de trabalho, trabalhamos juntos lá na empresa de telemarketing, só...
- Cala a boca!
Dante gritou para mim e eu engoli as palavras a seco. A moça se esforçava para prender em seus olhos as lágrimas, eu podia notar. Ela olhou para Dante e falou, num tom baixo e fraco:
- Eu pensei que você trabalhasse no teatro, como me falou. Você... Mentiu?
Dante tentou se aproximar da moça, mas ela recuava.
- Júlia...
- Você mentiu...
Ela já não conseguia prender as lágrimas, então elas bolaram de seus olhos. Ela foi se afastando e Dante a seguiu, enquanto eu me sentia como uma personagem que entrou na história errada e agora não sabia como iria sair.
- Espere, Júlia! Eu posso explicar!
Ela parou de imediato e virando-se para Dante, agora num tom mais agressivo, disse:
- Também mentiu sobre seus pais? Eles estão mesmo na Suíça? Seu melhor amigo é mesmo deficiente visual? Você se chama mesmo Dante? Aliás, quem é você de verdade?
- Tudo o que te falei é verdade, Júlia! Eu...
- Tudo não, você não trabalha no teatro!
- Tudo bem, eu menti... Mas, isso não importa, esperamos muito tempo para estarmos juntos e...
- Não importa? Para quem?
Dante olhou para mim e me puxou pelo braço, então disse:
- Diga para ela, Iva, por qual maldita causa você me beijou! Diga que não foi por vontade minha!
- Pare de obrigá-la a dizer o que você quer, Dante! Chega de mentiras!
Falou Júlia e eu senti Dante apertar meu braço com mais força, porquanto estava revoltado. Júlia deu de ombros e Dante apressou-se para retirar algo do bolso, me surpreendi quando vi uma caixinha vermelha, com certeza era um anel.
- Espera, Júlia!
Mas, de tão frenético que estava, Dante acabou deixando o objeto cair e eu me dispus a apanhá-lo, só que, sem querer, acabei empurrando com o pé a caixinha para dentro do boeiro. Exprimi os olhos por um segundo, imaginando como Dante poderia estar me fitando... Me virei para ele e vi como a ira se demonstrava em seus olhos... Júlia voltou-se para Dante, esperando o que ele diria, mas o mesmo estava quieto e emudecido.
- Adeus, Dante.
Disse Júlia, em suas últimas lágrimas e foi-se embora. Dante acompanhou os passos dela até perdê-la de vista e eu podia perceber como ele estava explosivo por dentro...
- Me... Me perdoa, por favor! Eu...
Falei, em temor. Ele tão somente me lançou um olhar de ódio e deu as costas. Fiquei ali, desorientada, querendo castigar a mim mesma... Me agachei diante do boeiro e olhei lá dentro...
No dia seguinte, indo ao trabalho, eu não parava de pensar se Dante teria conseguido se acertar com Júlia, se ela teria entendido ele, se tudo teria terminado bem. Entrei na empresa e cumprimentei Paloma, minha amiga gulosa e os demais companheiros de trabalho, vi que Dante já havia chegado e observei-o para tentar reconhecer seu estado, não era agradável... Ele estava imóvel na cabine e seus pensamentos distantes, não dava atenção para os amigos e para quem passava por ele e o cumprimentava. Me sentei em minha cabine e ouvi Marcelo, um amigo, falar para Dante:
- Tenta relaxar, cara... Vai ser pior se tiver que atender os telefonemas assim.
Esquivei a cabeça para fora da cabine para ver a reação de Dante. Ele respirou fundo e bebeu um pouco de café, não estava bem. Minutos depois, toda a atenção do pessoal da sala estava voltada para os gritos de Dante ao telefone...
- Eu já disse, meu senhor, não foi efetuada nenhuma recarga!! Será que eu vou ter que soletrar? Não, meu senhor, eu não estou de Tpm! Desligou? Ótimo... Tudo bem...
Ele bateu o telefone e tomou um gole de seu café, quando Marcelo veio ter com ele.
- Vai surtar agora? Quer perder o emprego, cara?
- Ele achava que...
Apareceu o chefe, Estevão, que também ouviu os estresses de Dante e foi até ele, disse:
- Está atendendo a algum animal? Eu deixei bem claro o tipo de comportamento que é aceito aqui.
- Desculpe, eu me exaltei...
- Você não é exaltador e sim operador de telemarketing, contenha-se.
O chefe se retirou e tudo voltou ao normal, porém, eu sabia que era a culpada por aquilo estar ocorrendo e, no fim do dia, quando já era hora de abandonar o trabalho, aproveitei para falar com Dante, enquanto ele apanhava suas coisas.
- Oi...
-...
- Eu sei que estraguei tudo, mas, se você pudesse me perdoar...
Ele largou sua maleta e virou-se para mim, então disse:
- Você sabe o que fez? Tem idéia? Eu esperei toda uma vida para poder ter Júlia ao meu lado! Eu tive que inventar tolas mentiras só para poder olhar aqueles olhos azuis de perto!
Ele apertava os dentes enquanto eu me estreitava contra a parede e meu coração acelerava, porque Dante estava me devorando com sua fúria e não me dava espaço.
- Eu sei, Dante, e é por isso que venho lhe pedir...
- Não, você não sabe de nada! Sabe o que eu quero? Que você...
Ele fechou os olhos e apertou os dentes novamente, contendo suas palavras cruéis. Pegou a maleta e saiu, me deixando mais uma vez na beira do abismo, tudo aquilo significava que as coisas entre ele e Júlia não acabaram bem, somente acabaram.
Continua...