Sob Olhar das Erínias — Parte IV

19h40min — Nísia Floresta — Sala de Arthur

O sinal para o segundo período soou. Mal o professor do primeiro saiu, adentrou a professora de História.

— Bah, já sora?! — reclamou um adolescente.

— Tem um trabalho pra fazer em aula e quanto antes começarem, melhor. — informou ela, depositando o material em sua mesa.

— De novo?! — manifestou-se outro.

Circunspecta, fitou este ultimo e ralhou:

— Você, Adriano, de todos aqui era quem deveria ficar mais feliz por eu, neste trimestre, ter substituído as provas por trabalhos. Ou já esqueceu a sua nota no boletim?

— Não ta mais aqui quem falô...

Continuou a mestra, agora voltando a atenção para a classe:

— Todos que levaram livros ontem os coloquem na minha mesa, por favor.

Enquanto obedeciam, a professora contara rapidamente quanto estavam presentes.

— Vinte e cinco... — murmurou consigo, antes de, em alto e bom som, ordenar: — Formem grupos de cinco!

No momento em que suas amigas acabavam de ajeitar as carteiras,uma de frente para a outra, Agnes exclamou:

— Arthur, vem pra cá!

Surpreendido com o chamado, não se mexeu. Esperava falar com ela apenas no recreio, para pagar o que lhe devia.

— Tá esperando o quê? Vem logo! — insistiu ela, chamando com um gesto.

— Tá bom, tá bom! — respondeu Arthur, recolhendo o caderno e os demais apetrechos escolares.

Quando Arthur sentou-se diante de Agnes, os grupos já haviam se formado.

Um deles, alojado no fundo da sala, fez a professora franzir a testa e berrar:

— Eu disse pra se agruparem em cinco, não em oito!

— Ah, sora, o que são três a mais? — questionou Pablo.

— Até fica melhor! Vamos terminar mais rápido e com maior qualidade!

— Acreditaria nisso se os integrantes não fossem você, Adriano, Samantha e companhia, cujo comportamento em grupo no trabalho de química, na semana passada, rendeu um zero bem redondo pra cada um. — rebateu a professora.

— É um bocudo o professor Torres, mesmo! — disse Samantha. — Pra que espalhar?

— Chega de papo! — falou a professora, irritada. — Um de vocês passe para o grupo de Agnes, e dois pro do Peter!

Começaram a reclamar.

— Tá, fiquem em oito! Não tenho tempo pra discutir. Mas se não comportarem-se, farei que nem o professor Torres! — avisou, antes de mirar a pilha de livros na sua mesa — Hum, Dez... É, é o suficiente...

De suas coisas ela retirou um monte de folhas de ofício colocou-as do lado dos livros.

Então se virou a turma instruiu:

— Cada membro do grupo vem aqui, pego dois livros e as folhas com as questões do trabalho.

— Deixa que eu vô lá — prontificou-se Arthur, de bom grado.

Logo que ele distanciou-se, Rosana puxou Agnes pelo braço e, ríspida, sussurrou:

— Ficou maluca? Se Cristhian aparece aqui e te vê perto desse garoto, vai dá bolo! Sabe como teu namorado é! E depois da briga que tu contou, ele deve tá mais desconfiado do que nunca!

— Relaxa, Rô. Isso não vai acontecer: semana passada combinei com ele de, no colégio, só nos vermos no recreio. Sabe, pra não me atrapalhar na aula. E, huhuhu...Depois da “conversa” que tivemos na minha casa ,ficou bem claro que eu gosto só dele,mais ninguém…

— Mesmo assim, Ag, deveria tomar cuidado... — concluiu Rosana, soltando-a.

Ao retornar, Arthur pôs os livros e os trabalhos sobre a mesa que ocupa.

Simpático, disse:

— Aqui estão!

Em pé ante a turma, a professora falou:

— Escutem bem! As paginas que usarão para responder as perguntas começam na 407 até a 614. Bom trabalho!

Bloco B

Vera, acompanhada de uma professora e portando uma trombeta, encaminhava-se a sala de Cristhian, donde procedia a grande gritaria e altas risotas.

— Obrigada por vir comigo, professora Vera. Acho que sozinha eu não conseguiria chamar atenção deles.

— Realmente. — concordou a outra. — Sei como repreende os seus alunos e, sem querer te ofender, sequer te olhariam!

A poucos passos da porta, esta se abriu bruscamente.

Cabisbaixo e apressado saiu um professor que bradou:

— Demônios!

As duas professoras entreolharam-se e Vera, séria, avisou:

— Prepare-se, vamos entrar. — e com Vera à frente, adentraram.

A turma estava uma baderna: enquanto grande parte dos adolescentes tagarelava sobre os mais diversos assuntos, um quinteto jogava pôquer no fundo da sala. Debruçados sobre a mesa do professor, três pervertidos olhavam a nova edição da Playboy, ao mesmo tempo em que comentavam sobre a modelo do mês (“Olha a os peito dela, cara!”, “Que peito o quê! O melhor dela são os coxão!”, ”Não é nada! É a bunda! A bunda!”, etc…).

Quatro bestas corriam pela classe arremessando bolinhas de papel uns nos outros; casais se beijavam; alguns curtiam um som (pelo Smartphone, iPhone, BlackBerry mp4, mp5 entre outras parafernálias) e uma minoria dedicava-se a terminar de copiar o texto no quadro.

Vera, a plenos pulmões soprou a trombeta.

Imediatamente as criaturas voltaram a atenção na dupla.

Cristhian tirou sarro:

— Hahahahaha! Que isso, Vera? Enlouqueceu de vez?

— Só assim pra notarem a gente! — retorquiu ela, severamente. — Agora escutem bem, a professora Laís tem algo a dizer!

Laís adiantou-se e, austera, falou:

— Eu só gostaria que vocês falassem mais baixo, pessoal. Minha turma tá de prova aí ao lado e eles só têm até o recreio pra terminar. Respeito não mata, sabiam?

— Ah, qual é sora? — interpelou Cristina, insolente.

— Quieto Cristhian! — mandou Vera, ríspida — Então, vão fazer a gentileza de baixar o volume das matracas e deixar em paz os que querem ser alguém na vida?!

Ninguém respondeu.

— Entenderei isso como um sim! — seguiu, ao mirar a professora: — Tem mais alguma coisa a dizer, Laís?

— Sim. — fitou a turma e mandou: — Comportem-se!

Mal Vera fechara a porta, a balburdia recomeçara.

Percebendo a expressão de desgosto em Laís, ela consolou:

— Eu não esperava que obedecessem. Seria um milagre se isso acontecesse. Mas você pode trocar de sala, se quiser.

— É... Só que eu tinha esperança de que o bom senso os convencesse...

Chateada, mirou a lua que, majestosa nos céus, resplandecia em sua forma mais completa.

Depois de admirá-la por um momento, Laís desabafou:

— Eles não se comportariam tão mal se os pais tivessem se preocupado em educá-los bem. Se tivessem se preocupado em criá-los num ambiente saudável. Um ambiente estruturado em valores, limites e amor...

Voltou o rosto a Vera e, indignada, disparou:

— Mas isso daria muito trabalho! Teriam parar de olhar só pro próprio umbigo e abrir mão dos maus exemplos em que estão mergulhados. Então a saída mais fácil que encontraram foi jogar essa responsabilidade nas costas da escola. Nas nossas costas!Esse dever não é bem nosso...

Nesse momento, uma garota segurando uma folha de oficio aproximou-se de Laís e disse:

— Professora, com licença, é que tem uns exercícios aqui que não entendi...

— Bom, vou indo. — proferiu Vera. — E sobre o que você falou agora pouco, concordo plenamente. Sim, não é nossa obrigação. Contudo, enquanto for assim, devemos orientá-los da melhor maneira possível e torcer para que escolham o melhor caminho na vida deles.

Já se afastando, concluiu:

— Sabíamos onde estávamos nos metendo quando entramos pro magistério!

— Pois é... — concordou Laís, antes de dirigir a atenção aluna e, amável, inquirir: — Quais as dúvidas, querida?

Sala de Arthur

A professora, em pé diante da turma e pronta pra sair, avisou:

— Vai bater pro recreio. E já que ninguém conseguiu terminar, podem levar os livros e as questões pra fazerem em casa. Por favor, usem o fim de semana pra finalizar o trabalho. Semana que vem os outros professores vão começar com suas atividades, fazendo que com que vocês tenham menos tempo e vontade pra terminarem isso. Me ajudem que eu ajudo vocês! Fui! — e foi embora.

— E então, como faremos? — perguntou Agnes a Arthur.

— Podemos nos reunir amanhã. — respondeu ele.

— Pode ser na tua casa? — indagou Agnes, depressa.

— Dá, aí...

— Nós vamos te esperar lá fora, Ag. — interrompeu Gabriele, erguendo-se da cadeira.

— Só não demora muito. — advertiu Rosana. — Daqui a pouco “Você-Sabe-Quem” tá aí...

— Eu sei, eu sei! Já tô indo! — prosseguiu a adolescente, agora com a atenção em Arthur: — Mas o que tu dizia...?

— Não, aí como vocês não sabem onde eu moro nós poderíamos nos encontrar na frente do Dellaziere, lá pelas três tá bom?

— Ótimo!

Bateu o sinal. Então ela pôs-se de pé rapidamente e disse:

— Vou lá com as gurias.

— Claro! Até!

Quando Agnes alcançou a saída, lembrou-se de algo que a fez parar na mesma hora. Então girou nos calcanhares e voltou correndo para Arthur. Diante dele depositou duas notas: uma de vinte e outra de dez.

— Fica com o troco! — afirmou a menina, sorrindo.

Vendo-a ir o rapaz, surpreso, murmurou:

— Ah, valeu...

Gian Felipe Author e A. Henrique SR
Enviado por Gian Felipe Author em 20/10/2015
Reeditado em 20/10/2015
Código do texto: T5420593
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