VALQUIRIA II
A menina Valquíria ganhou asas novas.
Numa bela tarde ela saiu à espreita, cruzou a avenida próxima ao rio de águas escuras e atravessou feito um raio a ponte que separa o Bairro nobre do Bairro pobre.
Ela queria entender os escuros das páginas do livro que lia. E voou. E viajou. E ali parada com as costas no alambrado verde de uma escola, ela devorava um sanduíche enquanto batia o solado do seu all star preto e vinho no asfalto quente. E lia, lia, relia... Até que suas asas te levaram a um beco com latões vazios, pintados de amarelo, laranja e vermelho onde num impulso uma mão que mais parecia osso, agarrou seu braço e tentou te arrastar para um buraco escuro e com cheiro de baratas. Com o coração quase saindo pelas narinas e o ar lhe faltando nos pulmões ela conseguiu com muito esforço soltar daquelas mãos sujas e magras, deixando um pedaço da manga da jaqueta jeans que se soltou com tamanho esforço do livramento. Ela retomou o juízo, o fôlego e a tez se avermelhou novamente, mudando o aspecto de cera.
A menina Valquíria se perdeu naquelas páginas e no horário de voltar do voo Até que se lembrou que tinha que voltar pra casa, pois sua mãe acabava de sair rumo à residência.
A menina alçou um voo de vários pés. em minutos pisou no portão da sua casa.
Ela adentrou a garagem e deu de cara com um gato. Este no susto da chegada dela soltou um forte miado simultâneo ao grito desesperado de Valquíria. Ela subiu as escadas da pequena casa correndo. Escorregou no piso da cozinha e acabou debaixo da mesa de jantar.
levantou a cabeça, olhou pra todos os lados e não viu nem o gato.
Ela calmamente se levantou, colocou a mão nas costas que doía com a queda e tentou arrumar seus cabelos negros e longos. Em vão. Dirigiu-se ao bebedouro e bebeu água. Ela sempre toma água. Ela toma água sempre.
Passado este susto, ela abriu outras páginas e leu insistentemente tentando entender o que tinha acontecido.
Por um momento ela chegou a pensar o que seria dela se não tivesse asas... Viajou.