Dando a Volta por Cima
A velha caminhoneta vinha deixando poeira na estrada, apontando na curva dos pés de eucalipto, o motor ronronando como uma onça cansada. A meninada corria ao seu encontro quando ela parava em frente ao mercado e o motorista, seu Quindim, um homem de idade já avançada, descobria a carroceria infestada de brinquedos de madeira.
- Olha lá, o burrinho com orelhas de couro!, apontava um menino com olhos de encantamento.
- Veja, Nadir, um dormitório completinho para as nossas bonecas!, festejava uma linda menina na ponta dos pés.
Era um Domingo, uma manhã de sol brilhante, o povoado mal acordara e os trabalhadores montavam barracas para venderem suas mercadorias.
Seu Quindim apropriou-se de um microfone improvisado e entonando voz de locutor alertou à molecada:
“Cheguem cá, meus amiguinhos
aproximem-se junto a mim
escolham os brinquedinhos
feito à mão pelo Quindim!”
Meninos e meninas disputavam cada palmo de chão, se acotovelavam, espichavam o pescoço, uma gritaria sem fim, todos ansiavam por um objeto de madeira do seu Quindim.
O velho falou outra vez, valendo-se do improvisado microfone:
“Tenho o estilingue, carrinho e o pião
cama, guarda-roupa, a boneca realeza,
do rapaz o cavalo, a cadeira, e o violão
o telefone e o banquinho da princesa!”
Outra vez um alvoroço e gritos de euforia marcaram o acontecimento.
E aí surge um menino esmolambado, sujo, fraco das pernas e o corpo fragilizado. Deu uma olhadela na variedade dos produtos e lançou um olhar de indisfarçável desejo em direção ao seu Quindim.
O velho suspendeu-o à altura da barra da carroceria e presenteou-o com um carrinho de rolimãs.
A criançada foi ao delírio quando ele partiu, pilotando em alta velocidade, ganhando o mundo como um corredor profissional.