UM SER CHAMADO AMOR
Se você está lendo isso peço muita atenção... Se não gosta de histórias de amor, rodeadas de tristeza, amargura e sofrimento pare por aqui mesmo, mas se você se gosta, continue lendo, pois essa não é uma mera história de amor.
Meu nome é Carlos, desde pequeno sempre soube que eu era diferente dos meus irmãos, tenho dois o João e a Luana eles são totalmente diferente. O João é mais punk, revoltado, com um estilo bem roqueiro, gosta de ouvir musica alta, largar tudo pelos cantos, mesmo com seus 26 anos ainda não se decidiu que carreira seguir e a Luana é totalmente diferente. Com seus 22 anos já sabe o que quer ser uma administradora de empresa, acho que ela não aguenta o tranco, com seu jeito zen de viver, num mercado tão competitivo.
Como dizia anteriormente desde pequeno me sentia diferente. Não sei dizer por que, só sei que essas coisas você sente. Nunca fui de brincar com meninos, sempre tive mais amigas do que amigos; adorava passar a tarde brincando com elas, na escola também ficávamos muito tempo juntos e a noite ainda saímos para passear. Era tudo muito bom.
Quando completei 15 anos e minhas amigas também, começamos a nos soltar mais, sair com mais meninos e elas sempre costumavam contar o que aconteceu. Era horas e horas elas contando seus segredos e eu prometendo guardar, afinal a essa altura só tinha amigas e se as perdesse correria risco de ficar sem ninguém. Quando eu ia para casa, começava a pensar, e se eu estivesse no lugar delas, será que eu seria assim? Será que eu teria feito isso? Até os 18 anos, nunca tinha compartilhado com ninguém sobre tudo o que sentia, nunca tinha me apaixonado ou coisa parecida, mas senti que isso estava começando a mudar.
Ao completar 19 anos consegui uma bolsa integral na melhor faculdade da cidade, no curso de ciências sociais, parece um pouco louco, mas gosto bastante de área. Lá conheci o Rafael, ficamos amigos e é a partir que nossa história de amor começa. Ele é um rapaz muito charmoso, que não gosta de se abrir com ninguém. É um rapaz sagaz, inteligente, de pensamento crítico. Quando o vi na sala pela primeira vez não consegui parar de olhar para ele, meus pensamentos iam e voltavam e nem atenção eu prestava nas aulas. Assim que terminou a aula tomei coragem para falar com ele, mas depois hesitei, era como se alguma coisa impedisse, minha boca estava seca, meu coração batendo numa velocidade inadmissível, meus pensamentos pararam. Não sabia o que fazer. Fiquei com medo de ele me achar chato, sem graça, e então decidi deixar pra lá.
As semanas foram passando até que no fim no semestre ele ficou de prova final, eu fui aprovado. Mesmo sem nunca ter dado um oi, me ofereci para ajuda-lo a estudar e conseguir ser aprovado no semestre seguinte, afinal não queria vê-lo longe de mim.
Ele aceitou prontamente e marcamos na mesma noite de estudar. Não rolou muito papo, mas sim estudo, no fim na noite ele me agradeceu. Na noite seguinte lá estava Rafael na porta da minha casa e eu esperando-o prontamente. Para mim pareceu um sonho. Os dias foram passando e cada vez estudávamos mais, no ultimo dia ele me chamou pra gente ir a uma boate porque estava cansado daquela rotina e precisava relaxar a mente. Chamei mais algumas amigas e juntos fomos curtir a noite.
Só que aquela noite, iria mudar minha vida... Bebemos de mais, dançamos, até que no fim minha amigas já tinha ido embora e o Rafael estava muito ruim, levei-o até em casa, quando chegou à porta de sua casa, ele me confessou que estava gostando de uma pessoa e não sabia como fazer para falar para ela; eu disse que ele poderia confiar em mim que estaria ali sempre que ele precisasse. Em seguida ele me roubou um beijo e entrou sem dizer nada. Fiquei sem reação, afinal aquilo nunca tinha me acontecido.
A noite passou e no dia seguinte, liguei logo cedo pra lembra-lo da prova, ele me atendeu e disse que estava com muita ressaca, mas que na hora da prova estaria bem. Porém ele nem tocou no assunto, nenhum simples gesto, nada saia da sua boca. Preferi não dizer nada, afinal aquilo poderia simplesmente ter sido um beijo de agradecimento e aquilo nunca mais iria acontecer. Às dez horas liguei novamente para saber o resultado da prova ele me disse que fora aprovado. Na hora não contive a reação e chamei-o para comemorar, ele disse que tudo bem, mas que eu levasse a Carolzinha, pois queria que ela fizesse parte da festa também. Nesse momento fui ao céu e voltei tamanha tristeza que fiquei... Só me lembro de ter dito que sim e marcarmos a hora. Contive minhas lágrimas, afinal foi apenas um beijo.
Aproveitei que estávamos na boate pra me esbaldar, nunca dancei e bebi tanto em minha vida, até o Rafa percebeu e pediu pra eu ir devagar. Naquela hora pensei muito em beijá-lo novamente, mas percebi que a Carolzinha estava de olho e preferi deixar pra lá. Continuei a dançar com a Marina, a única que sabia que eu gostava de meninos, mas que não aparentava, até que percebi um rapaz olhando pra mim, nesse momento não me contive e comecei a encarar, em seguida me chamou para ir até o banheiro, não contive e fui, só que quando estava chegando lá senti alguém puxando meu braço era o Rafa pedindo para eu não fazer isso, porque queria ficar comigo. Não aguentei e perguntei por que ele chamou a Carolzinha pra “comemoraçãozinha”, ele me disse que o que queria na verdade era que alguém desse um jeito de ficarmos juntos porque ele sentia algo muito forte por mim. Então olhei nos olhos e eles no meu, comecei a sentir minha respiração um pouco mais forte, então nos beijamos ali no meio de todos, sem ligar pra nada nem pra ninguém. Foi tudo tão perfeito que nem parecia verdade.
Ficamos ali a noite toda, foi então que descobri que Marina e Carolzinha também era um casal, muito apaixonado diga-se de passagem, estavam juntas a pouco mais de quatro meses e já estavam pensando em morar juntas. Só que nessa festa também aconteceu algo inesperado meu irmão estava lá e não gostou nada da cena, eu só fui saber disso na manhã seguinte na hora do almoço, enquanto mamãe e papai estavam no trabalho, ele me chamou no seu quarto e disse que não queria um viadinho na família, que seria muita desonra, na hora fiquei sem reação e ele me fez prometer que acabaria com aquilo. A Luana ouviu tudo e foi me consolar, falou-me que já sabia de tudo, que desde pequeno que já mostrava esse comportamento e que eu podia contar com ela. Nesse momento senti um verdadeiro misto, que oscila entre aperto por saber que o João estava me colocando sob forte pressão e o carinho da minha amada irmã.
Os dias foram passando até que no ultimo dia de aula o Rafa me chamou para ir até o Parque Central pra ver as estrelas, nunca tinha me sentido tão feliz, aproveitava cada momento que a vida estava me proporcionando. Ficamos ali horas e horas... Senti-me tão protegido. A luz da lua parecia que estava emanando energias positivas para que nada destruísse o nosso amor.
Na manhã seguinte fizemos um lindo piquenique, afinal estávamos de férias e queríamos aproveitar tudo aquilo. A cidade era muito bonita tinha um lindo Parque Central, e há poucos quilômetros dali tinha uma cachoeira.
Na semana seguinte decidimos ir os quatro (eu, Rafa, Carolzinha e Marina) à cachoeira. Passamos o dia todo lá e à noite montamos acampamento. Aquela noite também muito especial, pois foi a primeira vez que me entreguei ao Rafa, foi tudo tão lindo, tudo foi pensando nos mínimos detalhes, o jantar, o vinho à luz da lua, o doce perfume que ele me deu de presente. Foi tudo maravilhoso, mas aquela felicidade minha um preço.
De madrugada ouvi passos, a priori pensei que fosse só a meninas, só que me enganei, era meus pais acompanhados com o João. Eles foram ríspidos comigo, nem parecia meus pais, carinhosos, amigos, que sempre me ouviram. Eles, influenciados pelo João me deram uma escolha, ou eu ficava com eles, me formava, casava e teria filhos ou ficava com o Rafa.
Fiquei sem saída, em seguida respondi que não sabia o que dizer, pois amava o Rafa como nunca amei ninguém. Só vi o braço do meu atingir meu rosto e a minha mãe chorava sem parar. João falou que eu já tinha feito a minha escolha e meu pai por fim disse que eu não fazia parte daquela família, foram embora e me deixaram ali caído. Eu não sabia o que fazer, mas aquilo era só o começo. Meu amor tentava me acalmar de todas as formas, nem mesmo seu beijo carinhoso conseguiu fazer isso, o fim de noite parecia que não passava mais e lá no fundo eu sabia que aquilo era só o começo. Ao amanhecer, nem esperei as meninas e o Rafa, fui para casa tentar contornar a situação, que não estava nada fácil.
Ao chegar em casa logo senti o cheiro de queimado, era meu pai e meu irmão dando fim a todos os meus pertences enquanto minha irmã tentava controlar sem sucesso minha mãe, peguei o que pude mas não me restou quase nada, fui expulso da família.
Não sabia o que fazer não tinha roupa, material da faculdade, nem mesmo onde morar. O Rafa veio atrás de mim e me chamou pra morar com ele, falei que era provisório, ele me disse que não, que tudo que era dele a partir de então seria meu, erámos um casal e não devíamos explicações a ninguém. Saímos abraçados enquanto meu pai e meu irmão profanavam palavras das quais jamais sairiam da minha cabeça.
Os dias foram passando até que as aulas voltaram, não foi nada fácil, mas consegui vencer o semestre, estava à procura de emprego, mas nada dava certo em minha vida e foi ficando cada vez pior. Minha sorte era que o meu amor estava comigo junto com as minhas amigas. Então no fim do semestre decidi que era hora de mudar de cidade, num lugar onde eu fosse totalmente desconhecido, mas como fazer o Rafa precisava continuar os estudos e não queria me deixar ir. Por uma sorte do destino, chamaram-me para trabalhar a 30 km da cidade como professor estagiário de sociologia para uma turma de alunos do ensino fundamental, não pagava tão bem, mas dava pra me sustentar. Minha vida ia voltando aos eixos até que um dia uma tragédia abalou a minha vida.
Sai pra trabalhar logo cedo e deixei o Rafa deitado. Aquele dia estava um pouco nublado, como se as nuvens anunciasse que algo aconteceria, o sol não brilhava com a mesma intensidade de todos os dias, meu coração estava numa ansiedade que quase não aguentei dar aula. Parece que a natureza conspirava tentando me falar algo, mas não percebi os sinais. Ao chegar em casa procurei o Rafa por todos os cantos, mas não o encontrava, até que pra minha decepção vi-o estirado no banheiro todo ensanguentado. Meu coração ficou todo espedaçado, parecendo que me deram uma facada e para minha surpresa o bandido estava ali atrás da porta, era meu pai também estirado e com uma arma na mão e uma carta na outra, dizendo:
“Meu filho me desculpe por tudo isso, mas não aguentei ver você ao lado de outro homem, tinha esperanças para você, afinal foi sempre meu queridinho, o fato de você ser gay acabou com todas as minhas expectativas. Desculpe-me, mas matei o Rafael para não ver a infelicidade de sua mãe”.
Ao ler aquela meu coração que já estava despedaçado, ficou ainda pior por saber que meu pai matou meu amor, não aguentei a pressão, não sabia o que fazer dali por diante, afinal não mais acordaria todas as manhãs com o Rafa me dando bom dia, ou estudando juntos ou assistindo tevê, não mais teria o Rafa ali perto de mim com as suas brincadeiras que sempre me tiravam do sério, então numa atitude precipitada, mas válida, escrevi um pequeno trecho no espelho do banheiro dizendo “desculpa mundo, não sou o bom o suficiente para viver aqui... Adeus”... Tirei a arma do meu pai e acabei me suicidando.
Como disse no começo, essa não foi uma simples história de amor.