Parâmetros curriculares nacionais : terceiro e quarto (1998)

Brasil. Secretaria de Educação Fundamental.

Parâmetros curriculares nacionais : terceiro e quarto

ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa/

Secretaria de Educação Fundamental. . Brasília: MEC/SEF, 1998. 106 p.

Um projeto educativo comprometido com a democratização social e cultural atribui à escola a função e a responsabilidade de contribuir para garantir a todos os alunos o acesso aos saberes lingüísticos necessários para o exercício da cidadania.

Ao professor cabe planejar, implementar e dirigir as atividades didáticas, com o

objetivo de desencadear, apoiar e orientar o esforço de ação e reflexão do aluno, procurando garantir aprendizagem efetiva. Cabe também assumir o papel de informante e de interlocutor privilegiado, que tematiza aspectos prioritários em função das necessidades dos alunos e de suas possibilidades de aprendizagem.

Saber que a escola é um espaço de interação social onde práticas sociais de linguagem acontecem e se circunstanciam, assumindo características bastante específicas em função de sua finalidade: o ensino.

O texto produzido pelo aluno, seja oral ou escrito, permite identificar os recursos

lingüísticos que ele já domina e os que precisa aprender a dominar, indicando quais

conteúdos precisam ser tematizados, articulando-se às práticas de escuta e leitura e de

análise lingüística.

O texto, uma seqüência verbal constituída por um conjunto de

relações que se estabelecem a partir da coesão e da coerência.

Cada aluno se torne capaz de interpretar diferentes textos que circulam socialmente, de assumir a palavra e, como cidadão, de produzir textos eficazes nas mais variadas situações.

Em síntese, pela linguagem se expressam idéias, pensamentos e intenções, se

estabelecem relações interpessoais anteriormente inexistentes e se influencia o outro,

alterando suas representações da realidade e da sociedade e o rumo de suas (re)ações.

A nova realidade social, conseqüente da industrialização e da urbanização crescentes,

da enorme ampliação da utilização da escrita, da expansão dos meios de comunicação

eletrônicos e da incorporação de contingentes cada vez maiores de alunos pela escola regular

colocou novas demandas e necessidades, tornando anacrônicos os métodos e conteúdos

tradicionais. Os índices brasileiros de evasão e de repetência . inaceitáveis mesmo em

países muito mais pobres . são a prova cabal do fracasso escolar.

Pode-se

dizer que hoje é praticamente consensual que as práticas devem partir do uso possível aos

alunos para permitir a conquista de novas habilidades lingüísticas, particularmente daquelas

associadas aos padrões da escrita, sempre considerando que:

1.a razão de ser das propostas de leitura e escuta é a compreensão

ativa e não a decodificação e o silêncio;

2. a razão de ser das propostas de uso da fala e da escrita é a

interlocução efetiva, e não a produção de textos para serem

objetos de correção;

3. as situações didáticas têm como objetivo levar os alunos a pensar

sobre a linguagem para poder compreendê-la e utilizá-la

apropriadamente às situações e aos propósitos definidos.

Os gêneros existem em número quase ilimitado, variando em função da época

(epopéia, cartoon), das culturas (haikai, cordel) das finalidades sociais (entreter, informar), de modo que, mesmo que a escola se impusesse a tarefa de tratar de todos, isso não seria possível. Portanto, é preciso priorizar os gêneros que merecerão abordagem mais aprofundada.

Uma rica interação dialogal na sala de aula, dos alunos entre si e entre o professor e

os alunos, é uma excelente estratégia de construção do conhecimento, pois permite a troca de informações, o confronto de opiniões, a negociação dos sentidos, a avaliação dos processos pedagógicos em que estão envolvidos.

Dessa forma, cabe à escola ensinar o aluno a utilizar a linguagem oral no planejamento e realização de apresentações públicas: realização de entrevistas, debates, seminários, apresentações teatrais etc.

A visão do que seja um texto adequado ao leitor iniciante transbordou os limites da

escola e influiu até na produção editorial. A possibilidade de se divertir com alguns dos

textos da chamada literatura infantil ou infanto-juvenil, de se comover com eles, de fruí-los esteticamente é limitada. Por trás da boa intenção de promover a aproximação entre alunos e textos, há um equívoco de origem: tenta-se aproximar os textos, simplificando-os aos alunos, no lugar de aproximar os alunos a textos de qualidade.

A especificidade do texto literário: Ele os ultrapassa e transgride para constituir outra mediação de sentidos entre o sujeito e o mundo, entre a imagem e o objeto, mediação que autoriza a ficção e a reinterpretação do mundo atual e dos mundos possíveis.

Ele é relevante para a formação de leitores capazes de reconhecer as sutilezas, as particularidades, os sentidos, a extensão e a profundidade das construções literárias.

A atividade epilingüística está fortemente inserida no

processo mesmo da aquisição e desenvolvimento da linguagem. Ela se observa muito cedo na aquisição, como

primeira manifestação de um trabalho sobre a língua e sobre suas propriedades (fonológicas, morfológicas, lexicais,

sintáticas, semânticas) relativamente independente do espelhamento na linguagem do adulto. Ela prossegue

indefinidamente na linguagem madura: está, por exemplo, nas transformações conscientes que o falante faz de seus

textos e, particularmente, se manifesta no trocadilho, nas anedotas, na busca de efeitos de sentido que se expressam

pela ressignificação das expressões e pela reconstrução da linguagem, visíveis em muitos textos literários.

Há intenso fenômeno de mescla lingüística, isto é, em um mesmo espaço social convivem mescladas diferentes variedades lingüísticas, geralmente associadas a diferentes valores sociais.

Por que e para que aprender gramática na escola?

No dia-a-dia, contudo, a organização da fala, incluindo a escolha de palavras e a organização sintática do discurso, segue padrões significativamente diferentes daqueles que se usam na produção de textos.

Assim, por exemplo, professores e gramáticos puristas continuam a exigir que se

escreva (e até que se fale no Brasil!):

O livro de que eu gosto não estava na biblioteca,

Vocês vão assistir a um filme maravilhoso,

O garoto cujo pai conheci ontem é meu aluno,

Eles se vão lavar / vão lavar-se naquela pia,

Quando já se fixou na fala e já se estendeu à escrita, independentemente de classe social ou grau de formalidade da situação discursiva, o emprego de:

O livro que eu gosto não estava na biblioteca,

Vocês vão assistir um filme maravilhoso,

O garoto que eu conheci ontem o pai é meu aluno,

Eles vão se lavar na pia.

Para isso, a escola deverá organizar um conjunto de atividades que, progressivamente,

possibilite ao aluno:

. utilizar a linguagem na escuta e produção de textos orais e na

leitura e produção de textos escritos de modo a atender a

múltiplas demandas sociais, responder a diferentes propósitos

comunicativos e expressivos, e considerar as diferentes

condições de produção do discurso;

. utilizar a linguagem para estruturar a experiência e explicar a

realidade, operando sobre as representações construídas em

várias áreas do conhecimento:

* sabendo como proceder para ter acesso, compreender e fazer

uso de informações contidas nos textos, reconstruindo o

modo pelo qual se organizam em sistemas coerentes;

* sendo capaz de operar sobre o conteúdo representacional

dos textos, identificando aspectos relevantes, organizando

notas, elaborando roteiros, resumos, índices, esquemas etc.;

* aumentando e aprofundando seus esquemas cognitivos pela

ampliação do léxico e de suas respectivas redes semânticas;

. analisar criticamente os diferentes discursos, inclusive o próprio,

desenvolvendo a capacidade de avaliação dos textos:

* contrapondo sua interpretação da realidade a diferentes

opiniões;

* inferindo as possíveis intenções do autor marcadas no texto;

* identificando referências intertextuais presentes no texto;

* percebendo os processos de convencimento utilizados para

atuar sobre o interlocutor/leitor;

* identificando e repensando juízos de valor tanto

socioideológicos (preconceituosos ou não) quanto historico-culturais

(inclusive estéticos) associados à linguagem e à

língua;

* reafirmando sua identidade pessoal e social;

. conhecer e valorizar as diferentes variedades do Português,

procurando combater o preconceito lingüístico;

. reconhecer e valorizar a linguagem de seu grupo social como

instrumento adequado e eficiente na comunicação cotidiana,

na elaboração artística e mesmo nas interações com pessoas de

outros grupos sociais que se expressem por meio de outras

variedades;

Os conteúdos das práticas que constituem o eixo USO dizem respeito aos aspectos

que caracterizam o processo de interlocução. São eles:

1. historicidade da linguagem e da língua;

2. constituição do contexto de produção, representações de mundo e interações sociais:

. sujeito enunciador;

. interlocutor;

. finalidade da interação;

. lugar e momento de produção.

3. implicações do contexto de produção na organização dos discursos: restrições de

conteúdo e forma decorrentes da escolha dos gêneros e suportes.

4. implicações do contexto de produção no processo de significação:

. representações dos interlocutores no processo de construção

dos sentidos;

. articulação entre texto e contexto no processo de compreensão;

. relações intertextuais.

13 Na perspectiva deste documento, a escuta refere-se aos movimentos realizados pelo sujeito para compreender e

interpretar textos orais.

14 Essa organização articula propostas de João Wanderley Geraldi para o ensino de Língua Portuguesa, apresentadas

em .Unidades básicas do ensino de Português. (in O texto na sala de aula) e em .Construção de um novo modo de

ensinar/aprender a Língua Portuguesa. (in Linguagem e ensino: exercícios de militância e divulgação).

ó ï

USO REFLEXÃO

PRÁTICA de PRÁTICA de

ESCUTA PRODUÇÃO PRÁTICA

e de de de

LEITURA TEXTOS ANÁLISE

de ORAIS e LINGÜÍSTICA

TEXTOS ESCRITOS

36

Os conteúdos do eixo REFLEXÃO, desenvolvidos sobre os do eixo USO, referem-se

à construção de instrumentos para análise do funcionamento da linguagem em situações

de interlocução, na escuta, leitura e produção, privilegiando alguns aspectos lingüísticos

que possam ampliar a competência discursiva do sujeito. São estes:

1. variação lingüística: modalidades, variedades, registros;

2. organização estrutural dos enunciados;

3. léxico e redes semânticas;

4. processos de construção de significação;

5. modos de organização dos discursos.

Na segunda parte do documento, que se refere às especificidades de cada ciclo, os

conteúdos aqui relacionados em torno dos eixos serão distribuídos e expandidos nas práticas,

de modo a possibilitar dois desdobramentos: a explicitação necessária de sua dimensão

procedimental . saber fazer . e a discretização15 dos múltiplos aspectos conceituais

envolvidos16 em cada um deles, em função das necessidades e possibilidades dos alunos

no interior de cada ciclo.

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Parâmetros curriculares nacionais : terceiro e quarto (1998)
Enviado por J B Pereira em 30/11/2013
Reeditado em 30/11/2013
Código do texto: T4593465
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