Para além do meu jardim

PARA ALÉM DO MEU JARDIM

Dentro de um jardim de rosas diversas e de diversas cores nasceu Rosalinda. Como todas as outras de sua parentela, manteve-se sempre presa ao caule de sua progenitora. Quando, uma aqui ou outra ali, muito longe andou, foi cuidadosamente retirada pelas mãos de um bom jardineiro que no mesmo jardim a plantou.

Rosalinda foi muito longe dentro do mesmo jardim, nos seus sonhos, na imaginação, na sua vontade de aventurar-se que nunca se tornou realidade. Foi mantida ali, fixada ao cordão umbilical de sua mãezinha, sem jamais conhecer outras culturas.

Chegou o tempo de Rosalinda casar-se,e nesse feliz sacramento se fez mãe de duas lindas rosinhas . A primeira, foi batizada com o nome de Rosi Kelly, e segunda - Rosa Keila. Eram dois anjinhos em forma de rosas. Sempre muito apreciáveis por todos do jardim.

O mundo se modificou bastante até que Rosi Kelly e Rosa Keila tiveram que fazer suas escolhas profissionais. Elas optaram por fitopatologia. Rosalinda, a princípio não compreendeu. Ela se revoltou nestas palavras: “_ Como ? Querem cuidar de patos ? Eles vivem fazendo cocô na gente ! Se não fossem meus amigos : o orvalho, o vento e a chuva , estaríamos todas cheias de cacaca desses sem educação!

Rosi Kelly e Rosa Keila acharam engraçado o fato de sua mãe não saber o que é fitopatologia e explicaram: “_Calma mamãe! Fitopatologia é o estudo das doenças que atacam as plantas, tais como os fungos, as bactérias, vírus e outros.

Rosalinda ficou boquiaberta . Lembrou-se que o jardim há muito tempo vem sofrendo com diversas enfermidades . Ficou feliz por saber do destino de suas filhas, porém triste por saber que elas teriam que realizar esse estudo longe de casa, num jardim distante, onde a linguagem, os costumes, a cultura enfim é outra . Rosalinda também sentiu medo de tudo isso. Pensou em fazer um financiamento para que suas filhas pudessem estudar perto dela,no mesmo jardim, porém perceberam que ficaria fora do orçamento da família.

Levando em consideração a nova era, a era da liberdade feminina, por exemplo, Rosalinda acreditou que estudar longe seria bom para suas filhas, assim elas aprenderiam a tomar decisões sozinhas. Chegariam a maturidade mais rápido e seriam profissionais mais competentes. Perto dos pais ficariam sempre dependentes e mimadas.

A mãe rosa acreditava que estava pronta para a separação. Oh! Como estava enganada consigo mesma! Quando viu que era chegada a hora em que a mão impiedosa do jardineiro viria sobre elas, já começou a chorar. Ela disfarçava para que a família não notasse, para que não ficassem preocupados. Num instante essa mãe pode conhecer o verdadeiro amor de mãe. Trancou-se no quarto para chorar sua dor. Quando Rosa Kelly percebeu foi até lá, e junto com sua maninha abraçou a mamãe muito forte. Dessa forma, Rosalinda se acalmou.

O jardineiro veio e cumpriu sua árdua missão. Ele sabia o quanto os pais daquelas duas rosas estavam sofrendo, porém era o destino que se cumpria. Rosalinda, por sua vez não sabia que sofreria muito mais. Depois que as jovens partiram, Rosalinda foi ao médico. Descobriu que estava doente. Seu corpo doía demais, dormia mal. Era o começo da depressão. Nada lhe alegrava. Ficou assim durante vários anos. Seu esposo já não sabia o que fazer .

Nesse período Rosalinda foi aprendendo coisas novas sobre espiritualidade. Aprendeu até que deveria perdoar os patos por enchê-la de vez em quando de nhaquinha. Ela percebeu que eles faziam isso sem querer, assim como ela sem querer, por vezes feria alguém com seus espinhos. Lembrou-se que todos nós temos nossas qualidades e nossas fraquezas. Precisamos controlar nosso egoísmo, e usar nossos espinhos somente para nos defender no último caso. Um caso de luta pela sobrevivência mesmo.

Aprendeu que aqui, somos passageiros nesse imenso jardim. Viemos para que possamos passar , espiritualmente por um filtro que nos fará criaturas melhores. Precisamos aprender a viver sem ter que fazer uso de nossos espinhos com tanta frequência. Usar mais da bondade, da partilha, do amor, da gratidão, do perdão e de toda sabedoria vinda do alto, iluminada por nosso criador.

Rosalinda ainda tinha muito que aprender sobre espiritualidade. Inconscientemente ,ainda sofria pela ausência das filhas.Certa noite foi dormir com aquela melancolia bem típica dela mesma. De uma rosa, cujas lágrimas inundou o solo e espantou até um formigueiro que ali vinha se instalar. Uma plantinha mais delicada também foi à óbito com tanta água que caía.

Seu mundo ficou tão limitado e triste que, no céu um anjo se compadeceu . Ele numa noite estrelada, surgiu. Foi delicadamente em busca das mãos de Rosalinda, tomou-as suavemente, e para que ela não se assustasse foi dançando dois passinhos para lá e dois para cá e conduzindo a bela dama, que seguia cantando :

“Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco.Bendita sois vós entre as mulheres e bendita é o fruto do vosso ventre Jesus. Santa Maria mãe de Deus, rogai por nós pecadores , agora e na hora de nossa morte . Amém.”

Ele a levou para diversos lugares. Pararam diante de uma casa grande e escura. Rosalinda por um instante teve medo. Pensou, pensou e falou : “_ Que venha a luz!”

Em alguns segundos surgiu um fogo que levou a casa assustadora. Em seguida, Rosalinda se percebeu desenhando uma cruz. Então acordou do sonho profundo. Ela entendeu que não deveria continuar triste porque era ruim para ela e para todo mundo. Sua doença não teria cura assim. Desenhar a cruz significou para ela que deveria aceitar e abraçar seu destino, ou seja oferecer condições financeiras e psicológicas para as filhas estudarem longe. Elas viriam depois na missão de curar os enfermos de seu jardim . Isso deu conforto ao coração de Rosalinda que passou a aceitar a situação com mais alegria e contentamento.

Será lançado em 20 de dezembro de 2013 pela CBJE na coletânea: Se todos fossem iguais a você.

Lindalva
Enviado por Lindalva em 17/10/2013
Reeditado em 10/11/2013
Código do texto: T4529347
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