Nas profundezas de uma vida (nada) normal - Capítulo 15

Nas profundezas de uma vida (nada) normal

Capítulo 15 - Ele vai se casar

Uma dor de cabeça tremenda resolveu vir pra mim. Senti meu corpo pesar. Estava deitada em alguma coisa dura.

Abri os olhos calmamente e a primeira coisa que vi foi branco. Isso mesmo. Branco total. Uma parede branca, um armário branco, um teto branco e adivinha? Até o diabo do ventilador daquele lugar era branco!

- Acordou? - de repente uma mulher apareceu na minha frente com olhos castanhos gigantes me observando. Eu levei um susto e quase cai da cama em que estava. Que por sinal era branca.

- Onde estou? - perguntei. Realmente não sabia.

- Na enfermaria, querida. - Ah! Isso explica o fato de tudo ser da mesma cor.

- E... O que aconteceu exatamente? - a única coisa a qual lembrava era que eu e Erik estávamos abraçados no chão do corredor da escola enquanto o tempo ainda estava congelado ao nosso redor.

- Bom... Eu não estava lá pra ver, mas um aluno de intercâmbio veio deixar você aqui dizendo que você tinha batido a cabeça no chão. Mas pelos ferimentos, parece mais que você levou um soco ou algo assim...

Aluno de intercâmbio? Cabeça? Soco? Mas do que é que ela estava falando?

- Erik! - gritei de repente - O nome desse "garoto de intercâmbio" era Erik?

- Sim... E alguma coisa... - eu ia levantar de uma vez da cama mas a dor de cabeça voltou. Toquei a minha testa e vi que tinha uma pequena gaze no topo. Levei um soco na cabeça?

- Ai!... O-Onde ele está? Ele tá aqui?

- Não, querida. Ele foi embora. Disse que tinha que dar um mergulho no mar o que quer que fosse o que ele quis dizer. Mas tem um outro menino aqui, está desacordado ainda. Está cheio de vermelhos e roxos pelo rosto.

- E as aulas...?

- Você ficou desmaiada por todo o tempo. Provavelmente alguém irá vir te buscar.

Então olhei para o lado mas não vi nada. Não encontrei ninguém ao meu lado como a mulher havia falado minutos antes. Cabines separadas, claro. Levantei-me devagar e andei na companhia da enfermeira ao meu lado. Como se ela pensasse que eu fosse ficar tonta ou coisa assim. Não era difícil reconhecer a pessoa deitada ali. Lipe, obviamente. O garoto que tinha acabado de acertar meu namorado minutos antes.

"Meu namorado". Rá rá. Erik nem era isso. Quer dizer éramos mais que amigos, mas... mesmo aquilo no corredor eu não poderia chamá-lo de namorado. Ele não tinha me pedido em namoro. E para casar com ele eu teria que ser namorada antes... E ai! Isso fazia me cabeça doer mais ainda! O que eu estava pensando?

Não olhei mais do que uma vez para a cabine onde o menino de olhos cor de mel estava. Ele era um idiota por completo e tinha provado isso. Fora ele quem me dera o tal soco na cabeça? Porque a posição que ele estava quando o tempo parou era essa, pronto para atacar.

A enfermeira perguntou se eu estava bem e se precisava voltar para a maca. Respondi que estavam bem sim mesmo sabendo que não era verdade. Andei até a porta de saída daquela sala retangular branca. Precisava mais era sair e ver outras cores!

Quando eu ia saindo minha tia apareceu. Poxa, havia ligado para ela? Ai Deus Poseidon não creio que a fizeram ficar preocupada comigo por uma coisa que foi culpa do Lipe!

- Mar! Ai minha querida, você está bem? - ela me abraçou - Ligaram da sua escola dizendo que você tinha levado um soco e eu vim o mais rápido que pude. O que foi que você fez?

- Ah... Sim estou bem. Não fiz nada, tia Lita. Foi culpa do Lipe, ele estava tendo uma briga feia com o Erik e eu quis separá-los. Só isso. Mas acabou que o Lipe me bateu, mas não foi nada demais. Eu estou aqui, e bem! - sorri para que ela visse que o que eu disse era verdade. Ou pelo menos uma parte.

- Que bom! O importante é que você se recuperou... E o Erik?

- Foi mergulhar. - disse da forma mais normal possível, afinal humanos também mergulham no mar. E a enfermeira não precisava ouvir mais do que isso.

- Ah sim. - foi tudo o que minha tia respondeu.

Depois disso eu fui para casa normalmente. Não falamos nada no carro. Quando cheguei na porta da escada principal da sala para ir até meu quarto minha tia disse que eu deveria mergulhar também.

- Vai ser melhor pra você... Tenho certeza que essa dor de cabeça aí, vai passar na água.

- Claro.

- E aproveita e chama Erik para voltar aqui para a superfície, o almoço já já vai sair!

Fui até a água. Meus pés quase congelaram. Andei até a parte que começava a ficar fundo e tirei minhas roupas o bastante para que minha própria pele fizesse camadas de "roupa" em mim.

Ouvi ao longe o telefone tocar. Minha tia deve ter antedido. Acho que ela gritou meu nome também, mas agora já estava muito fundo para voltar.

Passei calmamente pelos corais que davam a entrada escondida de Thamisian. Fiquei andando pelas casas, senti os peixes coloridos passarem por mim e sorri mesmo com a cabeça ainda doendo um pouco. Pelo menos minha respiração estava bem melhor. Exite mais oxigênio na água, afinal.

Parei para ver minha antiga casa. Provavelmente já tinha outro dono, pois eu era basicamente órfan e a casa na verdade era dos meus pais, então... Mas eu adorava saber que continuava em bom estado e principalmente que as paredes ainda estavam com seu tom verde limão que eu amava.

E então, depois de nadar um pouco mais, vi a casa de Erik. Parecia vazia a princípio. Depois toquei a campainha. Ninguém atendeu. Ouvi alguém conversar lá de dentro, mesmo que baixinho.

- Mãe... É sério. Eu e a Mari...

Era o Erik com certeza. Colei meu ouvido na "janela". Não consegui ouvir absolutamente nada do que a mãe dele dizia.

- Eu sei... Mas a gente pode se cancelar, dizer que foi um engano, que eu já arrumei outra sereia...

E então ela veio para tão perto da janela que só aí consegui entender absolutamente tudo. Não só sobre o que estavam conversando como também as respostas...

- Tarde demais Erik. Já falei com a Nália, e ela me parece uma boa pessoa. Dentro de alguns dias você vai estar vestindo este terno de cima que estou preparando pra você. Vocês vão se casar, como espera que eu fique depois de ter quase implorado por uma conversa com a pobre sereia?

- Mãe por favor, eu amo a Mari, e olha posso te provar que bom... Somos um destino completo.

- Não se preocupe com a nossa pequena sereia, Erik. Eu também adoro muito e cuidaria como uma filha, mas agora não é possível mais. E bom... Todos sabemos aquela história que os humanos as vezes contam. A pequena sereia se casa com um deles. Um príncipe que nem ao menos sabe respirar debaixo d'água.

- Sim, mãe... Mas a Mari é diferente, e você sabe disso. Eu te disse que sou eu quem escolho o meu futuro.

Ouvi a porta da frente da casa ser aberta com força. Quer dizer, não que eu tenha ouvido, mas deu para ver as bolinhas que se formaram por causa da pressão, sem contar nas pequenas ondas que tocaram minhas barbatanas.

- Mari? O que você tá fazendo aqui?

Ouvi a voz dele ao meu lado com uma cara de surpresa. Eu também estava. Estava muito, muito surpresa, só que não era por um motivo bom! Eu não acreditava que aquilo estava acontecendo! Eu aceitei me casar e de repente levo uma bomba dessa!

- E-Eu... - as palavras não quiseram sair da minha boca.

Ele ia se casar! Só que... Ele ia se casar com uma sereia, só que essa sereia não era eu... E tudo estava pronto! Ele não podia mesmo deixar a menina esperando, isso ia ser tão desrespeitoso...

Ele olhou para o meu rosto tentando me abraçar e dizer que ele ia achar uma solução para aquilo, porque sabia perfeitamente que eu tinha escutado tudo.

Senti brilhinhos na minha frente e sabia perfeitamente que se eu estivesse em terra firme, eles seriam lágrimas. Eu não sabia o que estava acontecendo e minha cabeça voltou a doer como se o soco tivesse sido ali àquela hora. Comecei a nadar mais rápido do que nunca para um lugar desconhecido.

Eu queria ficar sozinha. Eu não queria ouvir mais nada. Eu só precisava de um pouco de paz.

Fiquei pensando se as vezes... O destino na verdade só existe para que nós ficássemos separados.

Bec
Enviado por Bec em 23/07/2013
Código do texto: T4400848
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