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A covardia no amor - Capítulo 10

Bruna Merten

Era uma alegria descomunal chegar na minha casa depois de quase 1 mês em São Paulo. Eu juro que se soubesse que duraria tanto tempo eu teria ido embora.

Mentira.

Com a minha mãe perto não tinha como fugir, mas eu bem que tentei. Agora mais do nunca entendo porque Eveline resistiu bravamente a trabalhar com a minha mãe. Entendo e apoio a decisão dela.

Deitei no sofá e fiquei por 5 minutos curtindo a delícia que era estar no meu lugar. Claro que minha paz não duraria muito tempo porque agora em casa, estava ainda mais incomodada do que antes. E eu não gosto de me sentir incomodada, muito menos sem um motivo aparente.

Liguei para Demétri. Chamou 1, 2, 3 vezes e depois caiu na caixa postal. Tudo bem, não é mesmo? Super normal ligarmos pra uma pessoa e chamar três vezes (o que não são 1 ou 2 vezes, são 3, o que em minha opinião é suficientemente bom para uma pessoa atender uma ligação) até cair na voz eletrônica da caixa de mensagem. Liguei de novo, de novo e mais uma vez até que para a minha surpresa a campainha toca, atendo a porta e encontro Demétri com uma expressão indecifrável. Eu geralmente consigo lê-lo, saber o que está pensando, isto é porque nos conhecemos há muito tempo. Havia uma angústia quase escorrendo em seu olhar, uma dor, saudade, não sei, não consegui explicar até o momento em que ele me abraçou num desespero enorme, como se quisesse nos unir num corpo só, para eu não mais fugir, nunca mais deixa-lo.

Eu me derreti em seus braços.

- Eu senti muitas saudades esse tempo todo. – Sussurrou ele, em meu ouvido. Suas palavras fizeram meu estômago girar e mesmo estando juntos, a sensação estranha continuava ali.

- Eu também, desculpe pela minha ausência. – Eu toquei seu rosto. Demétri beijou a minha testa e respirou com leveza em meus lábios. Seu hálito adocicado me deu uma vontade incontrolável de beija-lo. E foi a minha vez de mostrar toda a dor que senti ficando longe dele. Só paramos quando uma criança passou pelo corredor e nos olhou como se fossemos dois aliens. – Eu preciso dizer uma coisa. – Murmurei, entrando em casa e sendo seguida por ele.

- Pode falar.

Eu vou mesmo pedir ele em noivado? Não, não pode ser. Eu, Bruna Merten pedindo alguém para se unir a mim dessa forma? Não... Eu...

- Quer ser meu noivo? – Ele arregalou os olhos verdes. Estava achando que era brincadeira, no mínimo. – Não, não é brincadeira. E por favor, não fique me olhando com esses olhos verdes quase saltando da cara.

A sensação estranha que ainda não tinha passado, estava cada vez mais forte.

E quando ele finalmente respondeu eu entendi a sensação ruim que me invadia de forma tão firme.

- Eu acho que finalmente entendi o que tu dizias quanto a sermos tão diferentes... – E conforme ele falava, ia se afastando e me fitando com precaução. Como se eu fosse ataca-lo por suas palavras. – Isso é mesmo um problema e vai piorar se continuarmos nesse relacionamento sem pé nem cabeça.

- Relacionamento sem pé nem cabeça? – Perguntei, histérica. Foda-se o meu autocontrole e orgulho impecáveis. Ele está mesmo fazendo isso? – Eu não acredito nisso, Demétri!

- Só tenta me entender...

- TE ENTENDER? – Eu apontei o indicador em seu rosto. – TU PASSOU MESES ME DIZENDO QUE EU NÃO ERA CORAJOSA, QUE FUGIA DOS MEUS SENTIMENTOS POR TI E AGORA ME APRONTA UMA COVARDIA DESSAS? 1 MÊS FOI O SUFICIENTE PRA TU MUDAR ASSIM? – Demétri baixou a cabeça, desolado. – QUEM FOI QUE PÔS MERDA NA SUA CABEÇA?

- Só me abriram os olhos. – Eu engoli a vontade de chorar, mas engoli com muita bravura. Eu sabia quem tinha feito isso. Era mais que óbvio. – E tu sabe que é verdade. A gente é incompatível.

- A gente se completa. – Eu rebati. – Droga, tu tá fazendo isso pra que?

- Estou fazendo isso para não chegarmos aos 30 anos nos odiando ou sei lá, disputando a guarda dos nossos filhos na justiça. Tantas coisas.

Eu não segurei quando minha mão virou contra seu rosto. Foi um tapa forte, bem forte. Demétri colocou a mão na bochecha.

- Tu tá fazendo besteira. Eu não vou te perdoar. – Ainda trêmula, pasma e sem saber o que fazer, eu o vi andar até o elevador. – Então é assim? Tu tá desistindo?? Eu esperava covardia do Lennon, de todos os caras que já me envolvi, menos de ti!

Naquele momento, comandada pelas minhas emoções, que como sempre estavam afloradíssimas, fui até Demétri, que já estava quase entrando no elevador e o empurrei.

- Não torna a situação mais difícil do que já está sendo.

- DIFÍCIL? – O elevador fechou após apertar o térreo. – PARA DE AGIR COMO SE TU ESTIVESSES SE LIVRANDO DE ALGO QUE NÃO PODES CUIDAR! PORRA, O QUE AQUELA ALINE COLOCOU NA TUA CABEÇA? EU VENHO LUTANDO TODO DIA CONTRA MEUS DEMÔNIOS INTERIORES PRA FICAR CONTIGO E TU VAI SIMPLESMENTE TERMINAR TUDO?

Ele nem ousou negar que fora Aline que o colocara contra mim.

- É, vou.

- Tá! – Eu iniciei uma sessão de tapas. – COVARDE!! ISSO QUE TU É! – E mais tapa. – TU TÁ APAIXONADO POR ELA? É ISSO?

Ele se defendia como podia.

- MANÉ APAIXONADO. EU NUNCA PENSEI QUE EU SOFRERIA TANTO POR CAUSA DA SUA AUSÊNCIA, ME SENTI RIDÍCULO, NÃO CONSIGO LIDAR COM ISSO, NÃO CONSIGO. EU SOU INDIVIDUALISTA, EGOÍSTA, EU QUERO TU SÓ PRA MIM!

- NÃO ME VEM COM ESSA! – Demétri segurou meu punho e me puxou. – AI, MERDA.

Fomos silenciados por um estrondo seguido de um apagão. O elevador quebrou. Como se a minha chegada já não estivesse sendo uma droga, ainda passarei a noite no elevador com meu namorado. Ex. Ex!!!!

- OLHA AI! – Ele gritou, como se a culpa do elevador ter quebrado fosse minha. – Merda...

- IA SE ENCONTRAR COM ELA? – Eu me sentei no piso do elevador.

- Te cala, Bruna. Pelo o amor de Deus! Se tu não tivesse me enchido o saco nós nem estaríamos passando por isso. – Esbravejou, sentando-se também.

A luz do elevador voltou.

- Jura mesmo que tu estás me culpando por causa disso? – Ele revirou os olhos. Eu não sei o que aquela guria fez com ele, mas eu nunca odiei alguém como estou odiando ela. Nem mesmo Isabel! Meu Deus, eu reclamava a toa daquela ali. – Que bobagem eu me estressar né, tu me culpa por tudo.

- Vamos encarar isso de uma forma menos traumática?

- Sua covardia agora tem que ser encarada assim? – Rebati, apoiando a mão no queixo e fingindo pensar. – Me diga como é largar a namorada por simplesmente ter se tornado uma pessoa volúvel em 1 MÊS que ela passou fora por motivos PROFISSIONAIS?

- É. Tu tá certa, sou volúvel. Não aguentei e dei credibilidade a ela. – Demétri não parecia se sentir culpado por ter acredito na vagabunda. Parecia mais tranquilo, como se alguém o tivesse tirado de seu mundinho. Nosso mundinho. – Pode me julgar.

- Covarde. Só isso que eu tenho pra te dizer. Incrível como tu conseguiu com 20 minutos fazer toda a nossa história ir por água a baixo, fazer tudo parecer uma imensa mentira. – Desabafei, sentindo um nó se formar em minha garganta.

Não sei lidar com as pessoas me deixando. Ninguém sabe. E Demétri mesmo conhecendo todas as minhas fraquezas e medos, está fazendo isso comigo.

- To poupando sofrimento a nós dois.

- Admite que tá fazendo uma besteira sem tamanho.

Ele não respondeu. Eu quis morrer com seu silêncio. Isso tinha mesmo que acontecer agora que tenho a maior certeza do mundo que eu preciso estar ao lado dele? Logo agora que eu deixei de resistir, que eu aprendi a trabalhar o meu orgulho?

- Eu vou te amar pra sempre. Sem pieguice, apenas a verdade. Esse tempo que tu se manteve longe, o maior tempo desde que nos conhecemos, me fizera enxergar algumas coisas que contigo por perto eu não conseguia.

- Isso tá me soando como uma vingança. – Ignorei suas palavras, pois minha conclusão tinha sido certeira demais pra eu não falar.

- O que??

- É uma vingança. – Estou sendo comandada por algo que nem eu mesma sei. – Depois de tudo o que te fiz é claro que uma hora tu teria que se vingar. Óbvio!

- Tu tá falando bobagem. – Ele me fitou, impassível.

- Eu te magoei uma vez, nada mais justo que tu retribua o meu feito... E da mesma forma. – Quando o ouvi suspirar sem saber o que dizer ou como dizer, eu senti a primeira traiçoeira lágrima deslizar pelos meus olhos. – Parabéns, Demétri. Meus parabéns. Doí mesmo ter o coração quebrado, ainda mais por quem a gente ama.

Tamiris Vitória
Enviado por Tamiris Vitória em 01/05/2013
Reeditado em 19/05/2018
Código do texto: T4269399
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