[Original] Volver - Capítulo 6 - Parte 3
Capitulo 6 – A ação, a reação e o ciúmes. - Parte 3
Bruna Merten
O almoço da família Scholz foi meio que uma sessão de indiretas e cutucadas entre os primos, mesmo quando a mãe dele estava agradecendo a presença de todos em seu aniversário, a coisa não cessou.
Sem contar, ou contando, não sei, que o primo de Demétri estava me comendo com os olhos. Eu adoraria, claro, se eu não estivesse completamente louca pra fazer o final de semana com meu ex-namorado ser calmo e sereno.
- Não se sinta presa a mim por conta do nosso relacionamento. – Revirei os olhos ao ouvir Demétri e seus comentários que ele jura ser despretensioso. – Sério!
Eu o fitei.
- Cala a boca.
- É sério.
- Eu ainda não sou uma peteca pra tu ficar me jogando pros outros. – Finalizei a conversa de modo ríspido.
Como estávamos falando aos sussurros, ninguém ao nosso redor prestava atenção.
E pela tarde, quando tudo parecia realmente tranquilo, eu me sentei na grama e tentei absorver alguma coisa daquele ar tão puro e ambiente tão diferente do que eu estou acostumada. E foi ilusão minha achar que seria possível.
- Bah, fala aí guria. Tu é só amiga do meu primo né? – Eu franzi o cenho ao ver Ricardo sentar ao meu lado. Ele realmente tem uma inveja quase palpável do Demétri. – Não é possível ele ter algo com uma guria tão bonita como tu.
- Achei elegante seu modo de cutucar o Demétri e ao mesmo tempo me elogiar. – Ele riu forçado.
Ricardo não era o tipo de guri que me atraia. Ele é bonito, mas é só isso. Não tem nada de encantador, mesmo que exista uma certa semelhança física entre ele e o primo. Sabe conversar, mas de certa forma, sua competitividade e mania de grandeza o tornam chato. E eu tenho problema com gente chata.
- Só falei verdades... Demétri já te contou que (...)
E ele dedicou 30 minutos de seu tempo contando coisas aparentemente suspeitas sob seu primo. Ricardo queria que eu me surpreendesse negativamente, mas eu fui uma adolescente tão mente aberta que não vi nada surpreendente em sair desfilando em frente à avenida Brasil de cueca rosa. Já fiz coisa pior que isso.
Quando finalmente o dia cessou, a mãe de Demétri nos levou para o único quarto disponível na casa. Eu precisava urgentemente dormir. Segui Demétri que carregava nossas mochilas. Ele estava tenso e eu não entendi o porquê até vê-lo parar em frente a uma porta junto com a mãe.
- Bom, eu espero que não tenha problema pra vocês... – Ela disse, abrindo a porta para nós.
Eu dei de ombros. Dormir com ele não era um problema pra mim.
- Mãe...
Mas claro que era um problema pra ele.
“Estava demorando...” – Pensei, balançando a cabeça negativamente.
- O que?
- Eu posso dormir na sala e...
- Já está ocupada. Eu aposto que não haverá problemas pra vocês, certo? – Eu, por muita habilidade nisso, notei a malicia na pergunta da minha ex-sogra.
- Por mim tudo bem.
Demétri me fitou de modo acusatório.
Eu o ignorei e entrei no quarto.
- Depois sou eu que dificulto tudo.
Demétri Scholz
- Tu podia ter dito que tinha problema. – Falei, enquanto colocava nossas mochilas em cima da cômoda. Bruna riu e fechou a porta do quarto.
- Não gosto de mentir.
- Isso inclui também seus sentimentos? – Perguntei, mas num tom baixo. Ela me olhou e franziu o cenho.
- Que?
- Não falei nada.
- Onde é o banheiro? – Ela perguntou, tirando a blusa que vestia rapidamente. Eu engoli seco. Esse tipo de coisa é pra testar a minha resistência. Eu queria responder, mas a visão estava me impedindo. – Hein?
Ela abriu o zíper da calça jeans.
- No banheiro. – Respondi, sem perceber a idiotice que eu estava respondendo.
- Ah, jura? – Bruna riu ao ver minha expressão. Me encostei ao guarda-roupas para poder me apoiar. Ela se aproveitou disso. – Tu tá bem?
- To ótimo.
- Mesmo?
- Mesmo.
E ela tirou a calça.
- Quer água?
- Não.
- Então me ajuda a tirar o sutiã.
E sem esperar resposta, ela ficou de costas e jogou o cabelo pra frente se encostando propositalmente a mim.
Respirei fundo e trêmulo, abri seu sutiã, quando a peça caiu no chão, Bruna deitou a cabeça sob meu ombro.
- Porque tu tá fazendo isso?
- Isso o que?
A mão dela guiava a minha sob sua barriga sedosa. Às vezes ameaçava subir, mas eu a forçava a baixar.
- Bruna...
Ela se afastou de repente e me fitou.
- Vou tomar banho. – Era notável a decepção em suas palavras.
Frustrado, me sentei na cama e tentei me distrair com qualquer coisa que não fosse à visão de Bruna de calcinha e sutiã andando livremente pelo quarto.
- Pronto.
Agora ela estava enrolada em uma toalha branca com os cabelos molhados colado no rosto trazendo a tona um dos meus maiores fetiches. Respirei fundo e fingi não ver aquilo, mas Bruna odeia não ser notada.
- Seu primo me disse algumas coisas... – Ela começou a falar enquanto andava até sua mochila. – Guri falante ele.
- Ah é?
- Aham. Me contou alguns podres seus... Nada demais.
- Estou interessado em saber os – fiz aspas com os dedos – “podres” que fiz.
- Não quero tu nervoso por conta disso.
- Bah, e por conta do que eu ficaria nervoso?
- Não sei, tu fica estressado a toa né. – Bruna deu de ombros e pegou
uma camisola preta. Eu olhei pra qualquer lugar que não fosse aquele canto especifico do quarto onde – Melhor evitar...
- Claro, sou um descontrolado emocionalmente.
- ...Além do que, eu não quero que tu fique nervoso a toa...
- Não precisa se preocupar com isso. E eu já ia te perguntar que tanto assunto vocês dois tinham.
- ...Tu nervoso me assusta, e outra, vai que num desses estresses tu vai lá e infarta?
- Bruna... – Murmurei, impaciente. Ela só fazia isso quando queria mudar de assunto.
- Já pensou? Meu Deus, Demétri!
- Tu tá me irritando!! – Ela riu de canto e já pronto, sentou-se ao meu lado e penteou os cabelos com os dedos. – Fala o que ele disse.
- Achei que não se preocupasse com o que seu primo diz.
- Não me importo com o que ele fala, mas me importo como tu interpreta as coisas.
- Ah é?
- É.
- Bom... – Eu a fitava ansioso. – Ele disse que uma vez tu perdeu uma aposta, Ricardo não quis me contar qual, e foi obrigado a pintar o cabelo de rosa choque e ir pra escola por uma semana... Pena que eu morava em Porto ainda... - Respirei fundo ao ouvir só aquilo. Poderia ter sido pior. Bruna caiu na gargalhada. – Eu fiquei imaginando tu mais novo com o cabelo rosa choque e... Bah...
- Ah, tu achou engraçado... – Murmurei, perigosamente. Ela arregalou os olhos, assustada com meu tom de voz. Com isso, foi se mexendo na cama, tentando se afastar. – Eu, honestamente, não vejo graça alguma nessa história.
- E-eu percebi. – Bruna gaguejando era um milagre, e como não podia perder a oportunidade, eu me aproveitei o máximo que pude.
- Tu ainda esta achando engraçado?
- Não.
Quando ela estava próxima do travesseiro, eu fiquei de pé na ponta da cama e a puxei pelas pernas, mas pela força não calculada, acabei caindo por cima dela.
Meio assustada e deliciada com a situação, Bruna me roubou um beijo e depois sorriu marota.
- Eu te amo.
Eram apenas três palavras. Três.
As que eu mais queria ouvir desde o momento em que eu tive certeza de que meu sentimento por ela não tinha morrido. Essas três palavras de uma força imensa que todo ser humano quer ouvir na vida. Nem que seja uma vez, mas que seja dita de forma verdadeira.
Ainda em silêncio, eu a fitava sem saber o que dizer.
- Vai ficar me olhando como se eu fosse uma paisagem? Já disse que te interno se continuar a me olhar assim.
- To surpreso.
- E por quê?
- Tu falou isso pra mim pouquíssimas vezes.
- Eu sei... – Ela alisou meu rosto e nos movemos na cama até conseguirmos trocar de posição. Agora eu estava deitado com Bruna em cima de mim e minhas pernas flexionadas lhe servindo de apoio. –
Sempre tive medo do poder dessas palavras... Uma vez dita errada tem sérias consequências.
- E quantas vezes tu disse eu te amo pra alguém?
Observei com certo prazer ela se mexer desconfortável por cima de mim.
- Nunca contei.
- Ah, claro. – Concordei, debochado.
- Ah, qual é. Estávamos indo bem até agora.
- E tu quer que fiquemos bem?
- Eu quero tu. – Eu sorri, sem jeito. – E não to bêbada, antes que solte essa piadinha pra mim.
- Eu sei que não. Me responda uma coisa?
- Claro.
- O que mais Ricardo te disse?
- Ah... Disse que eu era bonita demais pra estar acompanhada de ti. – Ela deu de ombros. Eu revirei os olhos. – Bah, tu que perguntou oras.
- Qualquer ser humano que infla seu ego devia ser extinto da terra.
- Olha o ciúme aí, gente! – E antes que eu pudesse responder, Bruna se baixou sedutoramente sob mim e roçou seus lábios nos meus. – Ele é um bonito vazio, não tem concorrência.
- Eu não tenho ciúme de ti. E nem ligo se ficarem. Não me importo. – Foi a minha vez de dar de ombros. Era uma mentira deslavada, claro, mas eu não podia demonstrar o que praticamente está na cara.
- Tá bom.
Ela saiu de cima de mim e foi caminhando tranquilamente até a porta. Percebendo sua intenção, corri para impedi-la segurando-a pela cintura.
- Ué!!
- O que tu está fazendo?
- Estou indo dormir com o Ricardo! – Respondeu como se fosse óbvio demais o que estava fazendo.
- Tu ainda não perdeu o juízo. – Eu a girei contra a porta e a pressionei com firmeza.
- Então assume que tem ciúme do Ricardo, aliás, dele e de qualquer um.
- Não.
- Então me solta.
- Nunca.
- Tu está...
- Cala a boca, Bruna!
Eu a beijei com tanta vontade e posse que tive a certeza de ouvi-la suspirar por isso. Suas mãos foram para o meu pescoço e seus pés ficaram em ponta, para poder se igualar a minha altura.
- Gestos dizem mais do que palavras. – Ela sussurrou em meu ouvido, fazendo-me arrepiar na hora. – Não é?
- Isso.
Com a mão livre, fechei a porta à chave. Depois fomos caminhando de volta a cama. Era uma luta de mãos contra carícias, de desejo contra uma paixão incontrolável. Algo que ia muito além da nossa compreensão.
Ergui sua camisola, deixando-a na metade da barriga e fui trilhando um caminho de beijos por todo o seu corpo. Ela foi correspondendo e me enlouquecendo com seus gemidos que soavam como música para mim. Puxei suas mãos, fazendo-a sentar na cama. Tirei sua camisola, ela a minha blusa e não demorou muito pra que já estivéssemos prontos um para o outro.
- Eu te amo. – Ela repetiu novamente, e dessa vez li em seus olhos que ela queria ouvir o mesmo.
- Eu sempre te amei.
Dia seguinte
O dia amanheceu e eu fui acordado graças à fome incontrolável dominava Bruna pela manhã.
- É só tu ir na cozinha, minha mãe vai estar lá, não tem o porque de tu estar envergonhada.
- Cala a boca e se arruma logo pra descer comigo.
- Seu mau-humor também é ótimo pela manhã. – Retruquei, me levantando e caçando minhas roupas pelo chão.
- Eu sei. – Ela me olhou pensativa. – Demétri?
- Sim?
- Quer namorar comigo?
Eu a fitei, surpreso.
- Bah...
- Sim ou não.
- Eu acho que mereço uma aliança por isso.
Ela bufou e cruzou os braços.
- Eu pensei um monte de vezes pra isso, então não brinca.
- Capaz. Eu aceito. – Fui até ela a puxei para um abraço. – Estarmos namorando não significa que eu não te odeie, ok?
- Sim, eu sei. Só significa que fortalecemos a nossa relação e demos um passo a mais.
- Só isso.
- Tu é muito tonto. – Eu ri enquanto a enchia de selinhos. – Bah, chega, estou com fome.
Ela me empurrou e foi em direção à porta.
- Essa tua fome tá me deixando assustado... – Comentei, franzindo o cenho.
- Não to grávida. Me cuido pra que isso não aconteça antes da hora, ok! – Disse, meio ofendida e saiu andando na frente.
Eu soltei o ar preso. Ainda não to preparado pra ser pai.
O café da manhã teve como estrela minha então namorada Bruna. Minha família a enchia de perguntas, algumas sem o menor sentido, outras pessoais demais. Ela sabia tirar de letra, claro.
- Falou muito sobre novelas dormindo no mesmo quarto que o Demétri, Bruna? – O silêncio que caiu sob a cozinha foi um tanto desconfortável. Fitei Ricardo e balancei a cabeça em negativa. Como alguém pode ser tão babaca?
- Olha, teve um tempo que eu achei que era pura implicância... Mas depois de tanto tempo eu concluo que isso é pura inveja. – Ana comentou, revirando os olhos para o irmão.
- Se isso não for uma paixão incubada... – Tabata o fitou com nojo.
- Bah, calem a boca! – Ricardo saiu da cozinha sendo alvo de muitas risadas.
- E como vocês estão? – Eu nem notei quando minha mãe sentou-se ao meu lado na mesa de madeira do quintal. Vi que Bruna jogava vôlei com minhas primas.
- Ela me pediu em namoro hoje de manhã.
- Hã? – A cara de surpresa dela foi hilária. – Demétri!
- Mãe, nunca fomos um casal comum.
- É, eu notei. Torço pela tua felicidade... Sei o quanto tu sofreu por ela, mas vocês são muito bonitos juntos. – Minha mãe me abraçou de lado.
- Eu também torço por nós, mesmo que às vezes ela me faça desistir.
- Ela é uma garota solitária, filho.
- É...
Eu e minha mãe agora observávamos Bruna saltar para sacar a bola para Ana. Ela parecia tão tranquila ali com a minha família.
- Ela cresceu só. E não há nada mais triste do que a ausência dos pais na fase mais complicada dos filhos: a adolescência.
- Ainda bem que ela teve a Eve ao lado dela.
Minha mãe conhecia um pouco da história da família Merten.
- Sim, ainda bem. Ela precisa de ti, sempre precisou, mas ela é orgulhosa, como toda mulher é.
- Tu é orgulhosa, mãe? – Ela sorriu maternal.
- Eu já fui, mas deixei de ser quando me apaixonei pelo seu pai, tão, ou mais orgulhoso que a Bruna.
- Isso quer dizer que...
- Bah! O amor muda a gente, Demétri. Nos obriga a aceitar coisas que jamais aceitaríamos.
E ela saiu dali, me deixando a refletir sobre suas palavras.
“Palavra de mãe é uma coisa que devemos levar a sério.” – Concluí mentalmente, antes de dar um longo suspiro.